sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Um pouco mais de prudência, sff

Surpreende-me a segurança com que tantos leigos em matéria jurídico-constitucional asseguram que o Tribunal Constitucional vai chumbar a convergência do regime de pensões do sector púbico com o regime geral, por alegada violação do princípio da protecção da confiança.
Há, porém, algumas razões para ser cauteloso nesta questão:
- primeiro, tal como qualquer outro princípio jurídico, os princípios constitucionais nunca são absolutos, sendo sempre dotados de uma certa flexibilidade, que dá ao juiz uma margem maior ou menor de liberdade para a sua concretização de acordo com as características de cada situação concreta (como se viu ainda recentemente na decisão do TC sobre o aumento do horário semanal de trabalho da função pública para as 40 horas);
- segundo,  no caso concreto, o dito princípio da protecção da confiança tem de se articular, numa tarefa de ponderação prática, com o princípio da igualdade (como se referiu aqui), o qual não tem menos peso do que aquele;
- terceiro, tratando-se de uma medida de fortíssimo impacto orçamental, há um outro princípio constitucional, importado do direito constitucional da UE (e que por isso goza de primazia sobre os princípios do direito constitucional interno), que é o princípio da sustentabilidade orçamental, se se mostrar que não havia medida menos gravosa nem mais equitativa para alcançar os objectivos da redução do défice orçamental a que o País está obrigado.
Tal com na vida, também no direito constitucional nem tudo o que parece é...

quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Conselho Superior de 19 de Novembro


O Primeiro-Ministro (PM) veio no sábado dia 16 acenar com o sucesso da Irlanda, ao anunciar querer voltar a financiar-se nos mercados sem recorrer a mais empréstimos sob as condições da Troika, para começar a justificar antecipadamente as medidas de austeridade ainda mais duras que a coligação Coelho/Portas prepara impor aos portugueses quando falharem as injustas medidas que agora tenta fazer passar por via do Orçamento de Estado para 2014 -  medidas que o PM sabe ser inexequíveis, com decisão reprovadora do Tribunal Constitucional ou não.

Num primeiro momento, o Ministro Marques Guedes e escribas de serviço deixaram perceber espanto e decepção com a decisão irlandesa: tantas esperanças haviam posto no ir de carrinho com a Irlanda, que quando ela passou e os deixou apeados, maldisseram a sorte de terem de desbravar sozinhos o que será um programa cautelar da Troika, o mais tardar em Junho de 2014. Mas, na desfaçatez irrevogável que caracteriza a coligação Coelho/Portas logo trataram de sublimar o revés, convertendo-o em arma de arremesso - contra os portugueses e o PS, claro....

Para isso, vá de recorrer a truque de pacotilha, da que gastam os marqueteiros da coligação: durante anos andaram a propagandear que “Portugal não era a Grécia”, que o tigre irlandês “é que era” modelo que Portugal seguia.  Quando a Irlanda, por sua conta e risco, ousa levantar voo da prisão da Troika - porque tem condições para isso, que Portugal não tem - Coelho/Portas ensaiam a cambalhota na desgovernada coelheira, descartam a incapacidade herbívora de emular o tigre, tratando de brandir a proeza celta como incentivo para porem os portugueses a comer ... mais erva.

O PM debitou, com quantos dentes tem na boca, propaganda enganosa:
argumentou que Portugal para ter sucesso semelhante precisa ainda de fazer cortes em salários e pensões como a Irlanda. Ora, pelas mãos insensíveis e empobrecedoras de Coelho e Portas, em cortes nos salários dos sectores publico, cortes nas prestações sociais incluindo pensões, subsídio de desemprego e outros, Portugal já fez sacrifícios muito mais substanciais do que a Irlanda. Acresce que os níveis de desemprego são muitos mais gravosos em Portugal do que na Irlanda - de 2009 para 2013 o desemprego entre nós subiu de 10,6 para 17,4 e na Irlanda apenas de 12 para 13%.

Se Coelho e Portas se inspiraram na Irlanda, imitaram porventura  o que lá acharam de mais cruel e iníquo, mas nunca tentaram sequer emular na firmeza, inteligência e mesmo intransigência negocial irlandesa na Europa, batendo o pé à Alemanha, a outros governos preconceituosos e ultraliberais do Norte europeu e à barrosa Comissão Europeia.

A Irlanda, realmente, nunca foi modelo a que Portugal se pudesse colar: quando se viu forçada a pedir 85 mil milhões de euros  à Troika, a Irlanda tinha feito as contas do que precisava para resgatar os bancos ultra-endividados; tinha um plano de reformas do Estado faseado e já em curso, com objectivos  claros e datas;  tinha batido o pé à Alemanha, à Comissão Europeia e até o Parlamento Europeu, recusando mexer no IRC de 12,5 % - legalmente batoteiro na selva fiscalmente que se tornou esta  UE dominada pelo ultraliberalismo;  tinha um acordo de concertação social a ser rigorosamente cumprido e tinha um governo de coligação envolvendo o partido trabalhista, da família política do PS.

Tudo substancialmente diferente de Portugal, desde a reforma do Estado que o Governo levou dois anos (incluindo os mais de nove meses de gestação Portas)  para tirar do tinteiro, do acordo de concertação social que o Governo negociou mas  não cumpre e à inexistência  de consenso politico parlamentar que a coligação Coelho/Portas se empenhou em perpetuar.

E em muitas outras áreas as condições da Irlanda eram muito mais favoráveis do que as de Portugal, além da vantagem competitiva incomensurável de ser um país de língua inglesa, há décadas sede de multinacionais. Na Irlanda a economia está solidamente assente nas exportações, que representaram 108% do PIB entre 2009 e 2013, enquanto em Portugal, apesar do mínimo aumento que Coelho e Portas hossanam como milagre económico, não passam dos 39% do PIB.

A economia da Irlanda era, à partida,  muito mais competitiva do que a nossa, com mais capacidade de resistir á quebra da procura interna, em que a Troika e  coligação Passos/Portas, mais troikista  que a Troika, se empenharam. Por  isso a Irlanda se propõe voltar a buscar financiamento no mercado  quando apresenta um défice orçamental de  8,2 % - mais do dobro da meta que Portugal se obrigou a  cumprir em 2014, quando deveria regressar aos mercados. E a Irlanda paga já hoje 3,5  de taxa de financiamento nesses mesmos mercados. Enquanto Portugal - como explicou na Índia o inefável Ministro dos Negócios Estrangeiros dando mais umas machetadas no desconchavo governamental - se não conseguir taxas de juros de 4,5% em 2014, pode assobiar às botas de um eufemistico programa cautelar – restar-lhe-á um segundo resgate, puro e ainda mais duro.

O Primeiro-Ministro aplica-se agora a usar o exemplo da Irlanda para pressionar o Tribunal Constitucional e para pressionar o PS, supondo que o intimida como anti patriótico se não assinar o cheque em branco que a coligação pretende, para enterrar  mais o país naquilo a que chama de programa cautelar e que ninguém sabe o que poderá ser. Certo, certinho é que implicará mais condicionantes e prorrogará a supervisão da Troika. Porventura, será apenas um eufemismo para o segundo resgate que o próprio PM brandia ameaçadoramente antes das eleições autárquicas.

 
Se a receita da Troika e da coligação mais troikista do que Troika tiver resultado, Portugal fará como a Irlanda, vai financiar-se aos mercados e manda a Troika à fava... Se precisarmos de segundo resgate, é porque a Troika e a coligação Passos/Portas falharam. Resta a Passos demitir-se e passar o país a eleições. Só assim haverá governo com credibilidade, legitimidade e, espera-se, engenho e arte para negociar em nome de Portugal,  o que for preciso - chame-se segundo resgate, programa cautelar ou para-raios merkeloso, arrancado a Merkel e Barroso.

segunda-feira, 25 de novembro de 2013

40 horas

«Tribunal Constitucional deixa passar lei das 40 horas na função pública».
As dúvidas sobre a constitucionalidade eram legítimas mas a decisão é correcta. Como aqui se defendeu na altura própria.

Adenda
Ao contrário do que é noticiado, a questão essencial - ou seja, que as 40 horas não são inconstitucionais --, foi votada por unanimidade (como se pode ler no acórdão). Os "votos de vencido" dizem respeito ou somente à fundamentação ou apenas ao art. 10º, que proíbe a derrogação das 40 horas por qualquer instrumento de regulação do trabalho em funções públicas.

Antologia das proclamações improváveis

«Oficiais: Demissão do director da PSP representa "ingerência do poder político".»
Homessa! Então o Governo já não tem o poder de mudar a chefia das forças de segurança? Será que a  PSP também já acha que tem direito a autogestão!?

Eanes

A homenagem ao primeiro Presidente da República da era constitucional-democrática é inteiramente merecida. Como poucos dos que tiveram intervenção na implantação do regime democrático em Portugal ele passou o teste do tempo, com sabedoria, equilíbrio, modéstia e moderação. E sem ressentimentos!
Virtuosos não são os homens de Estado que presumem nunca ter errado mas sim os que sempre procuraram agir acertadamente.

Europeístas para todas as estações

Numa entrevista ao jornal i, Vicente Jorge Silva (que foi cofundador deste blogue há dez anos) declara-se desiludido com a União Europeia, chegando a considerar a saída do euro.
VJS não está sozinho nesta desilusão: 60% dos cidadãos europeus compartilham desse sentimento, o dobro dos que assim pensavam antes da crise.
Eis o verdadeiro problema da integração europeia: tendo baseado a sua legitimação e a sua popularidade nos resultados durante décadas (crescimento, aumento do bem-estar, abolição de fronteiras, etc.), a sua aceitação é posta em causa quando ela entra em crise e deixa de providenciar as vantagens que tradicionalmente proporcionava. Depois da crise, a União Europeia precisa de uma base de legitimação democrática mais funda, mais genuína e mais estável. A União Europeia precisa de criar europeístas não somente para os tempos das "vacas gordas" mas também para os tempos difíceis, por sobre os tempos e as circunstâncias -- ou seja, europeístas para todas as estações.

Constitucionalite

No Público de ontem, Manuel Carvalho perguntava se a violência política é constitucional, respondendo obviamente que não. Todavia, numa democracia a violência política não é inaceitável só por ser inconstitucional, mas sim, antes de mais, por ser ... antidemocrática!
A observação do prestigiado jornalista deixa no entanto entender até que ponto o vírus da "constitucionalite" se está a espalhar entre nós, tornando todo o debate político em debate constitucional. Em princípio, o que é constitucionalmente ilegítimo é-o por ser politicamente ilegítimo, e não o contrário.

Antologia de proclamações improváveis

«Vasco Lourenço avisa governantes: "Ou saem a tempo ou vão ser corridos à paulada"».
Não consta que entre os meios para remover governantes num regime democrático conste a paulada. Decididamente, há cabeças demasiado excitadas no País neste momento...

domingo, 24 de novembro de 2013

"Violência legítima"

Ao contrário de alguns arroubos bélicos, num Estado de direito democrático a violêncua nunca é um meio legítimo de ação política ou de protesto cívico.

sábado, 23 de novembro de 2013

Mário Soares

O voluntarismo e activismo do "velho leão" socialista é digno de toda a admiração; o radicalismo das posições e a violência da linguagem, não.

Dez anos de Causa Nossa

Há exactamente uma década nasceu o Causa Nossa. Dez anos na vida de um blogue é muito tempo!
Quando o blogue surgiu, éramos mais do que hoje a fazê-lo. Mas fora isso, e o impacto da grande crise (orçamental, económica, social) por que o País passa, não mudou o essencial, ou seja, a orientação e a atitude do Causa Nossa, tal como expresso no seu texto fundador.
Os governos e as circunstâncias passam, o Causa Nossa fica.

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Não sei por que ...

... espera o Presidente da República para enviar para o Tribunal Constitucional a lei da convergência de pensões. Se há uma questão em que todo o debate político, bem ou mal, assentou sobre a questão da constitucionalidade, é esta lei. É preciso clarificá-la, num ou noutro sentido. E quando mais depressa, melhor.
De resto, o Presidente da República nem sequer tem de se comprometer na questão constitucional, visito que na "fiscalização preventiva" não tem de pedir ao Tribunal Constitucional a declaração de inconstitucionalidade, bastando-lhe invocar as objecções suscitadas no debate político e pedir ao Tribunal que esclareça a questão. E é evidente, que se o não fizer, Cavaco Silva só vai acirrar a ira dos que o acusam, fundada ou infundadamente, de não fazer cumprir a Constituição.

Alvo errado

Poucas pessoas têm criticado Cavaco Silva com a dureza com que o tenho feito em várias ocasiões (ver, por exemplo, aqui e aqui, aqui e aqui). Mas não me passa pela cabeça transformar o Presidente da República em principal responsável pela dura crise económica e social que devasta o País nem como primeiro alvo a abater politicamente.
Em Portugal, o Presidente da República não governa nem o Governo depende dele; existindo uma maioria parlamentar, não pode nem deve o inquilino do Palácio de Belém tornar-se um factor de instabilidade política e partir em guerra contra o Governo (fê-lo contra Sócrates, e aí, sim, muito mal).
Curiosamente, quem deve folgar com esta situação é o próprio Governo, que é afinal quem governa efetivamente o País, mas que  é poupado enquanto a guerra for centrada sobre Belém. Estranha maneira de fazer oposição!

quinta-feira, 21 de novembro de 2013

Exageros

Que a democracia constitucional em Portugal não está propriamente de boa saúde -- eis um tema quase consensual. Mas a notícia de que «estamos a caminho de uma nova ditadura» é "ligeiramente exagerada" (parafraseando Mark Twain).
E há coisas sobre que convém não exagerar...

Esticar a corda

A União Europeia esticou tanto a corda em relação à Ucrânia -- incluindo a exigência de libertação da ex-primeira-ministra Timoschenko, condenada a pena de prisão por malversação de dinheiros públicos --, que o Parlamento ucraniano achou demais e rejeitou a chantagem, obrigando o Governo a suspender a assinatura do acordo de parceria com a União Europeia, que incluía um ambicioso acordo de liberalização comercial e a definitiva viragem da Ucrânia para ocidente.
Quem deve rejubilar com este impasse é Moscovo, que acentuou nos últimos meses a pressão sobre Kiev para evitar a aproximação entre a Ucrânia e a União Europeia e para a atrair de novo à órbita da Rússia. Quem demasiado quer, arrisca-se a perder tudo...

segunda-feira, 18 de novembro de 2013

"Delatores"

Parece que há juízes incomodados com o convite da PGR para a denúncia de casos de violação do segredo de justiça.
Mas não se compreende o incómodo. A violação do segredo de justiça é crime, e denunciar crimes praticados por servidores públicos no exercício de funções não é somente um direito, é um dever.

Dilema constitucional

A convergência das pensões do sector público -- incluindo as que se encontram já atribuídas -- em relação às do sector privado vai colocar um problema complicado ao Tribunal Constitucional.
Se aplicar o "princípio da protecção da confiança" com o carácter absoluto com que o fez no caso da segurança no emprego no sector publico, o Tribunal deveria declarar a lei inconstitucional na parte em que a redução das pensões abrange os actuais pensionistas. Porém, se o fizer, não somente mantém uma flagrante desigualdade de tratamento entre os pensionistas do sector público e os do sector privado (visto que em igualdade de circunstâncias as pensões dos primeiros são mais elevadas), mas também criará uma segunda desigualdade, agora entre os pensionistas do sector público (visto que, em igualdade de circunstâncias, os novos pensionistas terão uma pensão inferior à dos actuais).
Até agora, nas questões relativas ao sector público, o Tribunal aplicou isoladamente cada um dos referidos princípios, ou seja, o princípio da protecção da confiança e o princípio da igualdade. Agora o Tribunal vai ter de articular ambos os princípios numa mesma situação (note-se que a questão da articulação entre os dos referidos princípios já se colocava no caso do chamado "regime de mobilidade" dos funcionários públicos, onde porém o Tribunal decidiu ignorar a questão da igualdade...).

terça-feira, 5 de novembro de 2013

Partidos à medida

É compreensível a tentação de pensar que se não encontranos no leque dos partidos existentes um que nos satisfaça inteiramente é porque existe um espaço vazio para um novo partido.
Todavia, por definição, os partidos políticos são organizações de agregação de posições individuais mais ou menos diversas dentro do espaço que eles ocupam no espectro politico. Quanto maiores e menos radicais forem, mais diferenciados tendem a ser internamente. Só os micropartidos radicais são monolíticos, como as seitas (enquanto não houver dissidências...).
Se para pertencer a um partido fosse necessário concordar com tudo o que está no seu programa e com todas as posições que o partido toma, e com o qual nos identificamos em tudo, seria necessário ter um partido... para cada pessoa.

Isenções

Há que reconhecer que o programa de ajuste orçamental fez atacar de frente alguns dos cancros das finanças públicas nacionais, como as SCUT rodoviárias, a situação calamitosa dos transportes públicos de Lisboa e do Porto e as rendas douradas da indústria farmacêutica, que arruinavam o SNS. Tudo para aplaudir.
Há, no entanto, outras situações de que ninguém fala, não menos lesivas da gestão financeira do Estado. Ocorrem-me duas:
- As regiões autónomas (Açores e Madeira) estão isentas de contribuírem para sustentar os encargos gerais do Estado (órgãos de soberania, justiça, forças armadas, forças de segurança, embaixadas, contribuição para organizações internacionais, etc.), que por isso ficam a cargo somente dos contribuintes do Continente. Porquê?!
- As taxas de utilização dos sistemas hidro-agrícolas públicos estão muito abaixo do necessário para manter e amortizar o enorme investimento público (pense-se por exemplo no regadio do Alqueva). Por que é que as grandes empresas agrícolas têm estes bónus (que se traduz num pingue subsídio), à custa do orçamento do Estado? O que se espera para actualizar essas taxas?

"E não vai acontecer nada?"

Em relação a este post, que remetia para uma notícia de imprensa, foi-me enviado este esclarecimento da Universidade do Porto. Fica assim corrigida a notícia em causa e prejudicado o referido post..

segunda-feira, 4 de novembro de 2013

Antologia do dislate político

Alijar responsabilidades

O primeiro-ministro e os seus ventríloquos nos meios de comunicação social saíram agora com um achado retumbante: a colaboração do PS é indispensável para a felicidade que está ao nosso alcance, desde evitar um segundo resgate até à anunciada baixa de impostos! Se as coisas correrem mal, a culpa é do PS, pois claro, que não quer colaborar com o Governo...
Tal como foi acusado de ser responsável pela vinda da troika -- que afinal só veio depois de a então oposição se ter unido para chumbar o PEC IV e para desencadear a crise política ... --, também agora o PS seria de novo responsável, desta vez por omissão, ou seja, por não se dispor a validar a acção e os projectos do Governo.
Esta lógica retorcida não faz sentido. O Governo tem maioria absoluta no Parlamento e o apoio do Presidente da República. Não precisa de a oposição deixar de o ser e passar a apoiar o Governo. Se for bem sucedido em concluir o programa de ajustamento e voltar a abrir ao País o mercado da dívida, o Governo averba uma indiscutível vitória; se o não conseguir, só poderá culpar-se a si mesmo. Não procure alijar responsabilidades em quem nenhuma tem pela condução do País depois da vinda da troika...

domingo, 3 de novembro de 2013

Aposentação por limite de idade

A aposentação obrigatória por limite de idade aos 70 anos na função pública foi estabelecida há muito tempo, quando a aposentação voluntária era permitida aos 60 anos e a esperança de vida -- e portanto o tempo de vida como aposentado -- era muito menor do que hoje. Entretanto, a idade da reforma foi elevado para os 65 anos (66, a partir do próximo ano).
Apesar disso, o limite dos 70 anos da aposentação obrigatória não foi mexido, tendo-se reduzido para metade (e em breve, menos de metade) o tempo adicional de exercício de funções que é permitido a quem o deseje. É tempo de elevar também o limite de idade da aposentação obrigatória. Por um lado, não há nenhuma razão para afastar pessoas que ainda têm muito para dar, especialmente em cargos onde a maturidade e a experiência são um activo e não um passivo -- como os magistrados, os investigadores, os professores universitários, os médicos e as funções "intelectuais" em geral  --, obrigando-as a ir para a actividade privada a contre-coeur. Por outro lado, ao aposentarem-se mais tarde, essas pessoas libertam o sistema de pensões de encargos com elas durante esses anos (continuando aliás a pagar as cotizações), o que é importante quando aquele está sujeito a enorme pressão orçamental.

Adenda: Como declaração de interesses, desde já manifesto a minha disponibilidade para permanecer no activo depois dos 70 aos, se tal vier a ser legislado. Não podem é demorar muito a mudar o Estatuto da Aposentação (mas podem fazê-lo já na lei do orçamento...)

sábado, 2 de novembro de 2013

Negação

Francamente, fora a fidelidade ao mito da "espiral recessiva", não sei qual a vantagem política em negar os sinais de retoma económica, a qual aliás sucede apesar do Governo e não por mérito das suas politicas, que só prolongaram a recessão para além do previsto e atrasaram a natural retoma da economia. Por pouco expressivos que sejam, os indicadores de muudança de ciclo económico são vários e consistentes (consumo privado, criação de empresas, receita fiscal, clima de confiança económica, etc.). Até o fracasso das recentes manifestações anti-austeridade converge nesse sentido. É certo que os cortes no rendimento do orçamento do próximo ano ainda podem fazer estragos na economia, mas nada faz crer que invertam a mudança em curso.
Quem quiser continuar a apostar na continuação da recessão -- e não nos erros políticos que a agravaram e a tornaram muito mais penosa para o nível de vida dos portugueses -- arrisca-se a ficar sem discurso político.

"Reforma do Estado" (9)

Um dos principais problemas do Pais tem a ver com a governabilidade e com a eficiência do sistema de governo, tanto ao nivel nacional como ao nivel local, Isso passa em grande parte pela reforma das leis eleitorais no sentido de facilitar as soluções de governo, melhorar a capacidade de ação e reforçar a responsabilidade dos governos perante as assembleias representativas.
No entanto, o "Guião" governamental ignora de todo em todo essa matéria

"Reforma do Estado" (8)

Como é que se pode reflectir sobre a reforma do Estado sem pensar a administração territorial?
Porém, para além da ideia tardia da agregação de municípios, o "guião" governamental nem uma palavra tem sobre a administração autárquica supramunipal nem sobre a administração terriorial (desconcentrada) do Estado, como se nada houvesse a fazer aí!...

sexta-feira, 1 de novembro de 2013

"Reforma do Estado" (7)

Só pode ser piada a ideia de lançar um processo de "agregação de municípios",
Não porque ela não seja necessária, pois há pelo menos 10% dos municípios que não têm um mínimo critico de população para justificar a existência de uma autarquia municipal. O problema é que o Governo desperdiçou deliberadamente a oportunidade que lhe foi dada pelo programa de ajuatamento com a troika, que impunha a redução do número de autarquias e não somente das freguesias, como o Governo preferiu fazer. E com isso deixou de poupar dinheiro público e de racionalizar a administração local entre nós-
Agora é tarde! Só em situações excepcionais é que se consegue mexer no mapa da administração territorial para o reduzir...

"Reforma do Estado" (6)

Nem tudo é frouxo, indefinido ou simplesmente mau no "guião da reforma do Estado". Entre as coisas positivas, destaque-se o capítulo da simplificação administrativa, que retoma e prossegue, passados dois anos de inércia, as notáveis iniciativas do Governo Sócrates neste domínio (Simplex, lojas do cidadão, etc.).
Resta saber se existe a necessária vontade politica para avançar, desde logo para vencer as resistências e os atavismos dentro dos próprios ministérios e serviços administrativos do Estado (basta reparar na ausência das repartições de finanças nas lojas do cidadão...) e das autarquias locais.

quinta-feira, 31 de outubro de 2013

"Reforma do Estado" (5)

Sou de opinião de que o PS não deve acantonar-se confortavelmente na oposição à espera das eleições nem cortar as pontes do diálogo político com o Governo na busca de convergências e de compromissos "constitucionais", lá onde eles possam existir. Mas como é que o Governo pode esperar cativar o PS para participar na discussão de uma reforma do Estado tão desequilibrada e em alguns aspectos tão ideologicamente sectária, como a que consta do "guião" apresentado por Paulo Portas?
Sim, o que está em causa é o papel do Estado na garantia de um mínimo de igualdade e coesão social e também de autonomia individual para todos. A liberade não é somente a liberdade económica e política, mas também a liberdade face à doença, face às privações e face à destituição, sem a qual a liberdade individual pode não passar de servidão.

"Reforma do Estado" (4)

Emm matéria de impostos, o governo limita-se a prometer continuar a baixar o IRC (os lucros das grandes empresas estão ansiosos para viajar para as contas dos accionistas...) e a iniciar a baixa do IRS (umas migalhas bastarão para um foguetório no orçamento para 2015, ano de eleições...).
O que é estranho é que o Governo deixe de lado porventura a mais importante redução da tributação, que seria a TSU das empresas, que permitiria diminuir os custos não salariasi do trabalho, aumentar a competitividade das empresas e facilitar o emprego. Em vez de diminuir os custos laborais das empresas o Governo cuida dos accionistas. Em vez de favorecer o emprego e dar trabalho a quem o não tem, o Governo acena com um alívio do IRS sobre os rendimentos do trabalho, para quem o tem...