Noticiam os jornais que José Sócrates, o Primeiro Ministro de Portugal, vai amanhã em visita-relâmpago à tenda de Khadaffi, o ditador que mantem o povo líbio e até cidadãos estrangeiros (entre eles, seis enfermeiras búlgaras e um médico cubano condenados à morte), sujeitos a todo o tipo de violações de direitos humanos. Khadaffi, o governante terrorista que mandou os seus esbirros armadilhar os aviões da UTA e PANAM que explodiram matando centenas de inocentes passageiros e habitantes da vila escocesa de Lockerbie, e que por isso teve o seu país diversos anos refém, sob pesadas sanções do Conselho de Segurança da ONU (que Portugal votou quando lá esteve).
Aparentemente o PM vai em busca de negócios reluzentes, cheirosos a petróleo, pontes e estradas para empresas de Portugal... Faz mais do que fizeram antes, desgostantemente, um MNE do PS, Jaime Gama, e um MNE do PSD, Martins da Cruz (que eu, enquanto Secretária para as Relações Internacionais da mesma direcção do PS a que pertencia José Sócrates, critiquei duramente e voltaria a criticar). Porque José Sócrates não é só MNE: é Primeiro-Ministro e vai com a nutrida companhia dos Ministros da Defesa, da Economia, das Obras Públicas, segundo a imprensa. Tudo, decerto, para melhor cativar o louco terrorista, que passou a ser «respeitável» desde que anunciou desistir do «brinquedo» nuclear que pretendia para as suas macabras diversões.
Não sou adepta do corte de relações diplomáticas com qualquer regime, por mais detestável que seja. O processo de Timor-Leste serviu-me também para aprender que na era da globalização, quanto mais relações houver, quanto mais contactos diplomáticos, comerciais, turisticos, culturais e outros se desenvolverem, mais se pode ajudar quem, sujeito a esses regimes, luta pela mudança e pela liberdade. Mas para isso, para falar se preciso for com o diabo, se fizeram os diplomatas. E para isso também servem as empresas e outros interlocutores ditos técnicos, maxime os ministros das pastas «técnicas». Mas o envio de um MNE e, por maioria de razão, de um Chefe de Governo ou de Estado, transmite um sinal de caução política inegável e indelével. Para quem recebe e sobretudo para quem o emite.
Não venham com a desculpa esfarrapada de que outros já foram também ao beija-mão do criminoso beduíno - nenhum deles irradia decoro ou decência. A começar por Tony Bliar (mas a pérfida Albion também nunca se armou em decente, verdade se diga....).
Já se imagina os visitantes que poderão desfilar em Pyongyang proximamente (mas ainda não consta que haja petróleo)! A fila deles seria longa agora em Bagdad, de novo a comer à mão de Saddam, se o torcionário se tem deixado daquela irritante mania de jogar o gato-e-o- rato a própósito das ADM que afinal não tinha.... Por este andar, se a familia Bin Laden conseguir desalojar os Saud em Riade, ainda os haveremos de ver a todos (ou sucessores igualmente invertebrados) em bicha à porta da tenda do «travesso» Ossama, basta que este esboçe um ténue acto de contrição....
Dá jeito um Primeiro Ministro perceber alguma coisinha de política externa. Se não percebe, convem que se aconselhe bem - é para isso que servem um MNE e conselheiros diplomáticos. A política externa portuguesa não pode ser ditada apenas por cifrões e por patrões, muito menos chicos-espertos, construam eles estádios de futebol, estradas, plataformas petrolíferas ou vendam telefones ou tapetes. Portugal não abriu sequer ainda uma embaixada em Tripoli, não tem lá quaisquer estruturas que apoiem empresas ou instituições que tenham alguma coisa a fazer na Líbia. Uma ida à tenda de Khadaffi pelo Primeiro-Ministro neste contexto, ao beija-mão de quem vai, não pode deixar de ser interpretada como um endosso da respeitabilidade política de um ditador terrorista que devia estar preso e a ser julgado por crimes contra a Humanidade.
Não é em meu nome, em nome do meu Portugal, nem do meu PS, que José Sócrates irá à Libia beber chá com Khadaffi.