Em 30 de Novembro de 2005 escrevi aqui, a propósito da visita do Primeiro-Ministro chinês a Lisboa e do embargo de armas da União Europeia sobre a China:
"a firme oposição do PE ao levantamento do embargo (e eu não me arrependo de ter trabalhado nesse sentido). Pelo menos enquanto não houver avanços significativos na protecção dos Direitos Humanos naquele país e um esclarecimento sobre a sorte das vítimas que sobreviveram ao massacre de Tien An Men, muitas até hoje desaparecidas, outras presas. (...)Os governantes chineses, com proverbial paciência, aguardam presidências [da União Europeia] mais favoráveis, disponíveis para a vergar numa questão que envolve ... negócios da China. Com os olhos em Portugal, que em 2007 assumirá a presidência da UE."
Depois de o MENE ter considerado os Direitos Humanos uma questão marginal nas relações com a China, o próprio Primeiro Ministro declarou que "há pontos que estão a ser trabalhados há muito tempo (...) esses pontos exigem negociação", como é o caso "do embargo da venda de armas."
Lembro que a presidência luxemburguesa em 2005 teve que pôr travões a fundo à ânsia de convencer os outros parceiros da UE a levantar o embargo de armas à China, por causa da pressão combinada dos EUA, do Parlamento Europeu e de dezenas de ONGs de Direitos Humanos.
Lembro que a situação dos Direitos Humanos na China continua desastrosa, com a Amnistia Internacional a assinalar a execução de quase 1.800 pessoas naquele país só em 2006, revoltas rurais a serem reprimidas de forma sangrenta e a censura do regime a asfixiar a livre troca de ideias até na internet. Mas acima de tudo, Pequim não dá sinais de querer revelar o que verdadeiramente aconteceu a centenas de mortos e desaparecidos na sequência do massacre de Tian An Men, nem de levar a cabo reformas políticas para pôr fim à ditadura que, apesar de alguns progressos no plano económico, continua de ferro no campo das liberdades civis e políticas.
Lembro que, quando o PM e o MENE afirmam que a posição de Portugal a este respeito "é a mesma da União Europeia", estão a omitir o facto de o Conselho Europeu estar profundamente dividido em relação ao levantamento do embargo.
Se estas declarações do PM e MENE indicam, como parecem, que a Presidência portuguesa da UE vai levar a cabo uma ofensiva diplomática a favor do levantamento do embargo de armas sobre a China, devem estar preparados para uma confrontação com o Parlamento Europeu, com ONGs de todo o mundo e... com os Estados Unidos. (E aí, mais com o Congresso, do que com a Administração).
Se, por outro lado, estas declarações não passarem de uma ofensiva de charme para chinês ver, então tudo isto é triste e pouco digno - e diz muito sobre uma visão de curto prazo e sem princípios da política externa.
Mas nada disto surpreende, sabendo-se como estão a ser geridos outros dossiers internacionais. E sabendo-se também que acaba de ser eliminada a Divisão de Direitos Humanos do MNE...
Não é preciso muito mais para demonstrar como o Primeiro Ministro está mal aconselhado em matéria de política externa.