O caso da presidente da câmara municipal de Felgueiras a contas com a justiça, voltou de novo à ribalta, a propósito da notícia da anulação da decisão do Tribunal da Relação de Guimarães que lhe tinha aplicado como "medida de coacção" preventiva a suspensão do mandato municipal, em virtude de o Tribunal Constitucional - na linha de uma sua orientação antiga - ter considerado inconstitucional a norma em que se baseara essa medida.
A anulação da referida restrição deu lugar a muita especulação e maior confusão (ver um exemplo aqui). Não faltou quem anunciasse que ela poderia voltar ao exercício do seu cargo, esquecendo que lhe foi aplicada também a prisão preventiva (que não foi revogada), a que ela se furtou, saindo do País.
Clarificando algumas questões:
1º - O que é que o TC decidiu? Decidiu apenas que a norma do art. 199º do CPP, que permite ao juiz de instrução penal suspender os arguidos do exercício de "função pública", como "medida de coação" autónoma e cumulativa com outras, não é aplicável aos titulares de cargos políticos, visto que eles não são funcionários públicos;
2º - Os membros das câmaras municipais, incluindo o presidente, podem ser sujeitos a prisão preventiva? Seguramente que sim (desde que obviamente se verifiquem os respectivos pressupostos legais), visto que os "autarcas" não gozam de nenhuma imunidade nesse aspecto.
3º - Caso um autarca seja sujeito a prisão preventiva, isso implica a suspensão automática do mandato e a sua substituição por outra pessoa? Parece que não; a lei eleitoral das autarquias locais (art. 221º-5) só prevê incompatibilidade do exercício de funções autárquicas com a condenação final em pena de prisão, durante o respectivo cumprimenta; ora, não é esse o caso da prisão preventiva. Se o próprio não solicitar voluntariamente a suspensão do mandato, não se abre vaga nem há substituição.
4º - O facto de um autarca se encontrar fora do país tem alguma relevância? Claro que sim; se isso não for acompanhado de um pedido de suspensão do mandato nos termos legais (arts. 77º e 78º da Lei nº 169/99), cria-se uma situação de abandono de funções, que pode conduzir à perda do mandato por faltas injustificadas.
5º - É possível o exercício não presencial de funções autárquicas (por motivo de prisão preventiva ou por ausência no estrangeiro)? A resposta é negativa, pois a lei não prevê tal situação, e nem se vê como tal poderia suceder.
Vital Moreira