É sabido que não concordo com F. J. Viegas, quando ele afirma que «a abstenção é uma arma mais poderosa, infinitamente mais poderosa, do que o "voto em branco": ela significa o desinteresse absoluto».
Imaginemos que em vez de 30% de abstenção – uma taxa hoje considerada aceitável – havia 30% de votos brancos. Não tenho dúvidas de que toda a gente consideraria estarmos perante uma situação muito grave. Quase um em cada três eleitores tinha-se dado ao trabalho de ir às urnas manifestar a sua rejeição dos candidatos.
Quem se abstém não vota, abdica de intervir, renuncia ao seu direito de voto, aliena-se dos mecanismos democráticos. Mas da abstenção não é possível retirar nenhum sentido geral nem unívoco, pois tanto pode significar uma absoluta rejeição dos mecanismos democráticos (um monárquico que se recusa a votar na eleição do presidente da República), como o simples desinteresse (“a minha politica é o trabalho”), como uma atitude de inutilidade (julgar antecipadamente decidido o resultado eleitoral), como o simples impedimento ocasional.
Provavelmente, se tivessem de votar, a maior parte dos abstencionistas votaria numa das candidaturas (em eleições) ou numa das opções (no caso dos referendos). É por isso que nos países onde o voto é obrigatório a percentagem de votos brancos, embora seja tendecialmente maior do que nos países onde o voto é facultativo, fica muito longe das taxas de abstenção destes.
Ao contrário, o voto branco revela sempre uma atitude activa de rejeição, seja dos candidatos e das opções em disputa, seja do próprio mecanismo electivo em si mesmo. Quem vota branco vota ainda, participa no jogo democrático, ao contrário de quem se asbtém. Mas, participando no jogo democrático, recusa-se a exercer uma escolha entre as que lhe são propostas.
É por isso que é discutível a relevância que a nossa Constituição dá à abstenção nos referendos (que só são vinculativos se houver uma participação superior a metade dos eleitores) e a irrelevância dos votos brancos na eleição presidencial (que não contam para o apuramento da maioria absoluta).