segunda-feira, 7 de março de 2005

Memórias acidentais: Por que não fui ministro...

...há 10 anos. Sem filiação partidária nem actividade política desde a minha saída contenciosa do PCP vários anos antes, eu tinha participado empenhadamente nos "Estados Gerais" que contribuíram para a vitória do PS nas eleições de 1995. Por insistência de Guterres, tinha aceitado ser candidato a deputado por Coimbra (embora apenas como primeiro suplente, para tornar claro que não desejava voltar à AR) e tinha assumido algum protagonismo na campanha eleitoral, por causa de doença de Manuel Alegre, que era o cabeça de lista. Apesar disso, foi com alguma surpresa que, poucos dias depois das eleições, Guterres me chamou ao largo do Rato para me convidar para o Governo.
Ele disse as razões do seu interesse em ver-me no Governo e da escolha para a pasta em causa (que tinha natureza eminentemente política), nomeadamente o meu empenhamento na vitória socialista, a minha passada experiência parlamentar, o meu saber académico e profissional. Eu já levava preparada a resposta negativa (mesmo não sabendo ao certo qual era o pelouro), pelo que não pedi nenhum tempo de reflexão. Invoquei dois argumentos pessoais e dois políticos, qualquer deles bastante só por si: (i) tinha agendadas provas académicas dentro em pouco, que não poderia adiar vários anos e que não queria prestar na condição de governante; (ii) não me sentia muito motivado para desempenhar tarefas governativas; (iii) tinha algumas divergências políticas com o programa eleitoral (por exemplo a eliminação de portagens na CREL), com as quais teria de me solidarizar no Governo; (iv) sendo independente, eu não poderia desempenhar bem um cargo que pressupunha uma forte identificação com o Partido e com o grupo parlamentar. Com tais argumentos não me foi difícil resistir à sua insistência.
Assim se frustrou, por vontade própria, essa minha oportunidade ministerial. O mínimo que posso dizer é que ainda hoje considero ter sido uma decisão acertada. Já o mesmo não posso dizer de, pouco tempo depois, ter recusado também o convite para representante do PS no Conselho de Estado, que implicava muito menos compromissos. Em contrapartida, passado um ano vim a aceitar o desafio para presidir à Comissão parlamentar de revisão constitucional, entretanto constituída, para o que tive de assumir o mandato de deputado. Como se sabe as coisas estiveram longe de correr bem e senti-me forçado a abandonar o cargo antes do fim da tarefa, que se revelou pouco gratificante. Com isso dei também por encerrada a minha vida parlamentar.
Definitivamente a actividade política directa deixara de me fascinar como antes. Recolhi-me desde então a um assumido distanciamento crítico, semanalmente pontuado pela coluna no Público...