As reportagens da visita do PM a Angola fizeram-me recordar notas da minha última estadia naquele fabuloso e massacrado país, em Setembro de 2003. Na ABA DA CAUSA pode ler-se o texto que escrevi então e serviu de base a um artigo publicado em Outubro de 2003 pela revista VISÃO, sob o título "Angola em mudança".
Fui a Luanda como Secretária Internacional do PS e não por acaso: fui para ver se as mudanças que a paz trouxera teriam repercussões positivas para Angola e para o relacionamento luso-angolano e fui determinada a contribuir para quebrar o ciclo de traumas, ingerências e equívocos que marcava o relacionamento do PS com aquele país. Em Luanda, fartei-me de ouvir recriminações sobre a obstrução repetida que o MPLA atribuia ao PS, frustrando-lhe o intento de entrar na Internacional Socialista. Fartei-me de ouvir gozar com as viagens frequentes que o meu predecessor, José Lamego, fazia a Luanda, a despeito das tais reservas do PS.
Voltei impressionada com as mudanças, o ritmo das mudanças, o desejo de eleições (sobretudo por parte de alguns sectores do MPLA), o anuncio das eleições (entretanto adiadas, sine die). E por isso propus a Ferro Rodrigues e a toda a direcção do PS que se alterasse a posição relativamente à pretensão do MPLA de entrada na IS (IS, coitada, com vários membros muito pouco recomendáveis...).
No mês seguinte, em reunião do Comité África da IS, no Benin, em representação do PS, votei favoravelmente a entrada do MPLA na IS. Decisão que seria confirmada um mês mais tarde, em Congresso da IS, em S. Paulo, sob presidência de António Guterres.
Folgo muito, por isso, ao ver dirigentes do PS, como o Eng. Lello que hoje é Secretário Internacional, destacarem a propósito desta visita do PM, como a pertença comum à IS acabou por ser útil ao PS, ao Governo e, portanto, a Portugal. Na altura ouvi sobretudo ratar...
Cabe, no entanto, notar que a entrada do MPLA na IS não deve ter por consequência um desinteresse do PS pelos direitos humanos e a democracia em Angola. Pelo contrário: eleva o grau de exigência. Esse foi o critério da direcção Ferro Rodrigues: ouvi o próprio, uns meses mais tarde, explicar a um alto visitante do MPLA que, enquanto SG do PS, não visitaria Angola enquanto não houvesse eleições democráticas.
Por isso, quando oiço as teses dos «doutores da roca» de serviço à viagem do PM, de que falar de direitos humanos e pressionar sobre as eleições seria «ingerência nos assuntos internos angolanos», fico à beira de um ataque... de vómitos.