"(...) Obrigado pela sua exposição clara das contradições do não.
No ponto 5 do seu texto faz notar que: "Ao defender agora a dispensa de punição (...), os partidários do não entram em contradição com a principal razão da sua oposição à despenalização, que é a utilização da ameaça de punição penal como meio de dissuasão da decisão de abortar."
Estes desenvolvimentos recentes da posição do "não" demonstram claramente que o interesse essencial dos proponentes do "não" é a imposição de um princípio doutrinário católico (pessoa humana desde a concepção) através dos aparelhos legal e judicial do estado Português. A insensibilidade com que se pode propor uma pseudo-solução que agrava o problema do aborto clandestino mostra que o que realmente conta é a condenação simbólica de toda a infracção do indissimulável dogma. A ocorrência reiterada das infracções torna-se até uma vantagem.
(...) Presumo que seja mais fácil reagir a este problema de forma projectiva (acusando de intolerância quem faz notar a nudez do rei) do que encarar os próprios demónios.
Pôr o dedo na ferida não será politicamente aceitável em Portugal onde os brandos costumes são soberanos (só) à superfície, mas será legítimo deixar essa brandura insalubre persistir?»
Miguel M.