quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

Angelices...

O Dr. Marques Mendes, sempre com "inside information" santificada por S. Bento, questionado esta noite por Paulo Magalhães na TVI24 sobre os riscos de Portugal ser arrastado para o cenário grego, tratou de nos fazer saber que o PM saiu da recente chamada a Berlim com um grande trunfo na manga: garantias da Sra. Merkel de que, se a Grécia entrar em bancarrota, a Alemanha não deixará cair Portugal!!!
Convém não sermos anjinhos e não nos fiarmos em angelices:
- Cabe recordar que a 2 de Março de 2011 o então PM Sócrates também vinha entusiasmado com a certificação pública dada pela sua grande amiga Angela Merkel àos seus esforços para consolidar as contas públicas portuguesas. A chanceler alemã atreveu-se a prognosticar que “Portugal está num muito bom caminho” e, segundo as agências internacionais, aproveitou mesmo para frisar que “nunca” a Alemanha afirmara que Portugal deveria pedir ajuda externa, seguindo os exemplos grego e irlandês.
Ora, apenas vinte e um dias depois, a 23 de Março, José Sócrates apresentava a demissão, por os partidos à direita e à esquerda do PS se mancumunarem para derrubar o governo, chumbando o PEC 4, apesar de devidamente ungido pela germânica patrona.
E duas semanas depois apenas, a 6 de Abril, José Sócrates via-se encostado à parede pelos banqueiros e pelo seu ministro das Finanças, passando pela humilhação (ele e todos nós, portugueses) de ter de estender a mão à ajuda financeira externa.
Foi nisto que deu a lusa fézada em germânicas angelices!
A nível europeu, a iluminada Chanceler também não brilha pelo que dá por garantido. As suas inabaláveis convicções e punitivas receitas não ajudaram nada a resolver a crise, pelo contrário foram sucessivamente enterrando mais a Europa (Alemanha incluida), hoje à beira de espiral recessiva com potencial estilhaçante global, avisa até o FMI:
- quem poderá esquecer a luterana Angela a garantir, na primavera de 2010, que não haveria resgate para a Grécia (e já vamos no terceiro pacote de ajuda...).
- e a garantir afincadamente, em todas as tonalidades, que os investidores privados tinham de se sujeitar a "haircuts" nas suas carteiras de dívida soberana - medida formalmente deixada cair na última Cimeira Europeia, depois de se constatar como desastrosamente estimulara a especulação contra o euro e depois de, mesmo restringida apenas à Grécia, ser preciso chamar-lhe "voluntária"...
- e que dizer das angelicais garantias de que sem "regra de ouro" nas constituições, nicles de mais ajuda europeia - "angelice" que o projecto de acordo intergovernamental também já deixou cair nesta fase, nem três meses passaram....
- e as garantias supostas inscrever no mármore de um novo tratado, que afinal passou logo a acordo a 26 e hoje nada garante que venha a ver a luz do dia (veja-se o que diz o actual Presidente do PE, confirmado pela resolução adoptada no passado dia 18 por esmagadora maioria dos deputados de todos os partidos europeistas).
- sem falar nas garantias sobre o Banco Central Europeu, que está há muito a fazer "quantitative easing", embora chamando-lhe uma "angelice" qualquer.
- e sem falar do imposto sobre transacções financeiras, a que D. Angela inicialmente garantiu torcer o nariz, mas entretanto passou a advogar.
- e os "eurobonds" que continua a excomungar publicamente, mas já vêm a caminho, embrulhados na trouxa da cegonha de serviço, Barroso, crismados agora de "stability bonds"?
A lista de angelices ao longo desta crise, já vai longa. Mas pode ainda ser alongada.
Moral da história - que o Dr. Marques Mendes não devia esquecer:
as garantias da intransigente chanceler Angela Merkel não valem, afinal, o papel dos jornais que as reproduzem.
Fie-se Passos Coelho nas garantias de Angela Merkel e mais cedo terá destino tão angelical como o de Sócrates.