1. No Brasil, o Governo de Bolsonaro acaba de prometer um bónus orçamental de 10 milhões de reais por ano (2,3 milhões de euros), durante os próximos quatro anos, aos deputados que aprovem a reforma previdenciária (segurança social), a somar à verba orçamental normal de mais de 15 milhões de reais anuais a que já têm direito os parlamentares (através de "emendas" orçamentais), para investimento nos seus territórios eleitorais.
Na verdade, essas verbas orçamentais cativas a favor dos deputados e senadores constituem uma das razões para o verdadeiro "mercado parlamentar" existente em Brasília, quer para atrair partidos para o lado "governista" da câmara, quer para atrair os próprios deputados para as bancadas "governistas", mudando de partido (visto que no Brasil é admitida a mudança de partido por "justa causa", definida em termos assaz imprecisos). Pelos vistos, no Brasil o "mandato livre" dos parlamentares vai ao ponto de o transformar em mercadoria política!
2. Em Portugal ficou célebre o episódio do "orçamento limiano" (ou "orçamento do queijo limiano"), em que o segundo Governo minoritário de Guterres (1999-2002) "comprou" o voto de um deputado da oposição (CDS) para aprovar os orçamentos do Estado de 2000 e 2002, a troco de investimentos públicos no seu município (Ponte de Lima). Essa insólita experiência parlamentar conta-se, porém, como um momento menos feliz na nossa história política, não tendo voltado a ocorrer.
De resto, em Portugal o transfuguismo parlamentar é proibido pela própria Constituição (os deputados podem deixar o partido por que foram eleitos, mas não podem inscrever-se noutro partido nem juntar-se a outro grupo parlamentar, sob pena de perda do mandato) e a prática política é caracterizada pela estrita disciplina de voto na votação do orçamento (e noutras votações que possam pôr em causa a subsistência do Governo), como é norma num sistema de governo de natureza parlamentar. No caso do "orçamento limiano" o deputado em causa foi suspenso pelo CDS.
Por conseguinte, embora livre de qualquer mandato vinculado em relação aos eleitores (como é próprio de uma democracia representativa), o mandato dos deputados é essencialmente (embora não absolutamente) vinculado às orientações partidárias. De resto, ao contrário do que sucede no Brasil, em Portugal os cidadãos votam primariamente em partidos, não nos candidatos individualmente considerados.