1. Ainda bem que, segundo o Expresso (que se tornou um canal de comunicação suplementar do PR...), o Presidente da República vai vetar a eventual lei de recriação de centenas de freguesias, que aqui denunciei como uma manobra de oportunismo político de grosso calibre, em vista das eleições locais do próximo ano.
A confirmar-se este anúncio, oxalá esta travagem da lei por Belém consiga o mesmo efeito que há mais de 20 anos o Presidente Jorge Sampaio conseguiu, ao parar a irresponsável deriva demagógica para a criação de dezenas de novos municípios, nessa altura também apoiada pelo PS (a que naturalmente me opus decididamente).
Eis um campo privilegiado para o exercício do poder de veto presidencial, no cerne do poder moderador dos excessos das maiorias parlamentares: evitar as derivas políticas que ameaçam desestruturar o território.
2. Só comparavel, como erro político, com a promessa de 2015 de repor as 35 horas de trabalho semanal na função pública (que foi levada a cabo, com enormes custos orçamentais e alargando o fosso entre a função pública e o trabalho no setor privado), esta proposta de fragmentação do território (que MRS teria qualificado, justamente, como "loucura" política), iria inutilizar em grande parte uma reforma do território que era necessária e é globalmente digna de aplauso, conferindo dimensão crítica a muitas freguesias que a não tinham.
Para além dos seus custos orçamentais, a fragmentação da freguesias é um atentado qualificado à racionalidade e eficiência da administração local.
3. Se o veto do Presidente merece todo o aplauso, já é puramente farisaica a resposta do Ministério da Reforma do Estado, argumentando que a proposta de lei se limita a estabelecer o quadro geral de criação de freguesias e que sua criação efetiva dependerá dos interessados, das assembleias municipais e da AR, .
Torna-se evidente que a lei é feita para a "desbunda" e que, logo que ela fosse aprovada, haveria uma corrida à criação de todas as freguesias possíveis, sem que ninguém tivesse a coragem para travar a vaga populista, limitando-se a AR no final a carimbar as propostas.
Como se mostrou no caso dos municípios há um quarto de século, o mal nestas coisas de fragmentar o território é abrir uma brecha no dique de contenção. Depois, é "fartar vilanagem".
4. Se a proposta de lei do Governo só merece ser rejeitada, o PCP ainda a acha pouco ambiciosa, defendendo que todas as freguesias extintas por agregação em 2013 devem ser restauradas, se tal for a vontade das populações interessadas. Mas esta proposta do PCP só pode qualificar-se como aquilo que é: irresponsabilidade política de primeiro grau.
Por vontade do PCP, voltaríamos às mais de 4 000 freguesias do antigo regime! Que importa que muitas delas não tivessem o mínimo de população e de recursos para sobreviverem, se isso significasse mais umas dezenas de freguesias sob gestão comunista?
Cada vez mais confinado na gestão municipal, o PCP aposta num último reduto de gestão paroquial. E o Governo serve de prestimoso comissário...