Em qualquer caso, o PCP será o grande vencedor do processo orçamental: viabilizando o orçamento, obtém importantes ganhos políticos, impensáveis à partida, impondo um claro revés político ao Governo, que sairá debilitado desta provação, vencido pela chantagem política comunista; chumbando o orçamento, derruba inexoravelmente o Governo e pode alterar o xadrez político nacional, abrindo um ciclo de imprevisível instabilidade política.
Depois de ter sido o grande derrotado das recentes eleições autárquicas, acelerando o seu declínio, o PCP torna-se inesperadamente o principal protagonista da vida política naci0nal. Chapeau!
2. Em qualquer caso, quem perde sempre é o País.
Havendo orçamento nos termos oferecidos ao PCP, teremos mais despesa pública e mais rigidez do mercado laboral, sacrificando a consolidação das contas públicas e a competitividade da economia, respetivamente, e isto sem contar com as novas alterações que a votação na especialidade pode trazer.
Havendo rejeição do orçamento, teremos crise política e convocação de eleições antecipadas, com uma prolongada fase de governação com capacidade política e orçamental diminuída, incapaz de fruir plenamente do Programa de Recuperação e de Resiliência, até à formação de novo Governo (não se sabe com que base partidária e com que orientação política) e à aprovação de novo orçamento (não se sabe com que maioria), num prazo incerto.
Se é de evitar a incerteza política imediata da segunda opção, não podem, porém, desvalorizar-se os custos duradouros de um mau orçamento.
3. Em qualquer das hipóteses, tudo parece indicar o fim da solução governativa de governo minoritário do PS, baseada na aliança privilegiada com os partidos da sua esquerda parlamentar, incluindo em matéria orçamental, prescindindo de alianças de geometria parlamentar variável, como era tradicional nos governos minoritários do PS antes da experiência da "Geringonça" de 2015.
Se as divergências político-ideológicas de fundo (União Europeia, alianças internacionais, economia de mercado, disciplina das finanças públicas, etc.) impedem uma verdadeira coligação de governo do PS com os partidos da "esquerda da esquerda", esta provação orçamental vem mostrar que uma tal aliança também não é possível em termos de gestão económica e orçamental sustentável, frustrando a tentativa de os trazer para o "arco da governação".
Ao optar, à partida, por negociar exclusivamente com a sua esquerda parlamentar, o Governo tornou-se inapelavelmente refém do seu sectarismo doutrinário e do seu oportunismo político, expondo a sua própria vulnerabilidade política.
No parecer do Conselho das Finanças Públicas sobre a proposta do orçamento lê-se que «uma comparação com o ano de 2019 revela que mesmo removendo da despesa os efeitos das one-off, o impacto do PRR e as “medidas de emergência”, a despesa primária prevista para 2022 situar-se-á 3,4 p.p. do PIB acima do valor pré-pandemia.» Ora, com a despesa adicional resultante das cedências do Governo ao PCP, o excesso será ainda maior. Um tal ritmo de crescimento da despesa primária, em grande parte despesa corrente, é pura e simplesmente insustentável.