segunda-feira, 25 de outubro de 2021

Assim vai a política (10): RIP


Fonte da imagem AQUI,

1.  Les jex sont faits! 

Juntando-se ao Bloco na rejeição do orçamento, e apesar das cedências enormes que conseguira obter do PS, o PCP derruba inapelavelmente o Governo e abre uma crise política de resultados imprevisíveis, mas em qualquer caso com graves prejuízos para recuperação económica do País, pela incerteza política criada e pelo atraso no lançamento dos investimentos financiados pelo PRR da UE. Isto sem falar na interrupção das importantes reformas legislativas em curso, como, por exemplo, a despenalização da eutanásia ou a reforma das ordens profissionais.  

Mais uma legislatura que não chega ao fim, agravando as estatísticas da instabilidade política em Portugal, com a agravante que esta crise exclui uma opção de governação que parecia estar aberta desde 2015

2. Tal como em 2011, os dois partidos da esquerda radical juntam-se a toda a direita para negar ao Governo do PS um instrumento essencial de governação, apesar de deste vez denegarem a muitos portugueses cujos interesses dizem defender (pensionistas, funcionários públicos, pessoas de baixos rendimentos) uma substancial melhoria das suas condições de vida, que decorria das propostas iniciais e das cedências posteriores do Governo a ambos os partidos.

Mais uma vez, porém, prevaleceu o radicalismo doutrinário e o atavismo "antissocial-democrata" da esquerda radical. 

3. Acresce que nada indica que ambos os partidos venham a ser politicamente premiados por esta opção nas eleições subsequentes, pelo contrário. Os cidadãos em geral não gostam de crises políticas e o eleitorado de esquerda em especial deve penalizar quem o privou de alguma conquistas que o orçamento lhe assegurava.

O PCP, em especial vai seguramente dar mais um passo em direção ao declínio eleitoral que há muito o corrói. Mas, aparentemente, prefere o suicídio à asfixia eleitoral que erradamente atribui à aliança com o PS. 

Decididamente, está-lhes "na massa do sangue". Mas, ao porem fim abruptamente à solução governativa que os comprometia e ao regressarem ao estatuto de "partidos de protesto", o Bloco e o PCP desobrigam o PS do desvio à esquerda que ensaiou em 2015, em homenagem à "geringonça". RIP!

Adenda 
Um leitor acusa-me de "preconceito antigeringonça". Mas não se trata de nenhum preconceito. Ao longo destes anos expus reiteradamente neste blogue (por exemplo AQUI e AQUI) as razões por que entendia que a aliança privilegiada do PS com os partidos à sua esquerda carecia de bases políticas minimamente sólidas, não somente por causa das profundas diferenças ideológico-programáticas, mas também pela compulsiva irresponsabilidade política da esquerda radical (como agora se confirma). A sua longevidade foi conseguida à custa (i) da renúncia do PS a reformas políticas necessárias (sistema eleitoral, justiça, sistema fiscal, governo das autarquias locais, carreiras especiais na função pública, "condição de recursos" nas prestações sociais não contributivas, etc.) e (ii) do continuado aumento da despesa pública corrente (salários, pensões, etc.), à custa do investimento público e da manutenção de uma carga fiscal excessiva, limitando o crescimento económico e pondo em risco a sustentabilidade das finanças públicas. Era curioso averiguar os custos orçamentais imputáveis à "Geringonça" acumulados neste seis anos...

Adenda (2) 
Num artigo no Público, Boaventura de Sousa Santos - que não pode ser acusado de preconceito contra a "Geringonça" -, observa pertinentemente que os dois partidos à esquerda do PS se sentem «sempre mais confortáveis na oposição contra a direita [e contra o PS, poderia acrescentar-se] do que na construção de políticas de esquerda». Aí está o busílis da questão...