1. Existe finalmente uma iniciativa legislativa destinada a reordenar o regime jurídico das ordens profissionais, cujos principais objetivos são quatro:
- combater a atávica tendência das ordens, tanto para limitar o acesso à profissão (malthusianismo profissional), sobretudo através de exames e estágios à entrada na profissão, como para expandir a esfera das atividades profissionais reservadas aos seus membros (monopólio profissional);
- admitir a prestação integrada de diferentes serviços profissionais (por exemplo, advocacia e consultoria financeira, economia e engenharia), através de escritórios multidisciplinares;
- autonomizar e reforçar a função pública de regulação, supervisão e disciplina das ordens, através de uma reformulação da composição e das competências do conselho de supervisão, que o regime vigente já prevê;
- reforçar os direitos dos destinatários dos serviços profissionais contra abusos ou más práticas profissionais, através da obrigatoriedade do provedor do utente.
É fácil ver que esta iniciativa legislativa ataca os principais pontos críticos da atual regulação jurídica das ordens e das más práticas de quase todas elas, colocando-as ao serviços do interesse público que as justifica.
É de saudar e de sufragar, portanto, esperando a sua aprovação parlamentar.
2. Todavia, com o tempo, tenho-me tornado cada vez mais crítico da solução tradicional das ordens profissionais, propendendo cada vez mais para suprimir as suas funções corporativas de representação e defesa de interesse profissionais, reduzindo-as a entidades de regulação e disciplina da profissão, em substituição do Estado.
Entendo que que num Estado de direito liberal, baseado na separação entre o Estado e a sociedade civil, não compete a entidades públicas, como as ordens são, a tarefa de representação e defesa oficial e unicitária de interesse profissionais, a qual deve caber exclusivamente a sindicatos e associações profissionais de livre iniciativa dos interessados.
Não existe nenhuma razão para conferir a certas profissões o privilégio de ter a representação de defesa dos seus interesses profissionais a cargo de entidades públicas, de inscrição e quotização obrigatórias e de representação unicitária, quando as outras profissões têm de recorrer a sindicatos e associações voluntárias, desprovidas de estatuto e de poderes públicos.
Sem enveredar por essa revolução, é evidente que esta iniciativa legislativa, pelo menos, autonomiza e reforça a função de supervisão e de disciplina profissional, atenuando o risco da sua captura pela função corporativa paralela das ordens. Um enorme progresso!
Adenda 3