sexta-feira, 5 de novembro de 2021

Eleições parlamentares 2022 (1): O dilema eleitoral do PS

1. A principal questão a que o PS vai ter de responder nos próximos quatro meses, até às eleições - e quanto mais cedo, melhor -, é a seguinte: depois do falhanço da "Geringonça" como fórmula de governo - pois foram os próprios "aliados" que deliberada e friamente derrubaram o Governo -, e caso as eleições não alterem substancialmente o atual quadro parlamentar (como as primeiras sondagens deixam entender), vai o PS insistir nessa fórmula, tornando-se de novo refém do BE e do PCP quanto à duração do mandato, ou vai optar por alianças de geometria variável com outros partidos, conforme os temas em causa, incluindo quanto ao orçamento, como era tradicional nos governos minoritários do PS? 
A resposta antecipada a esta questão pode ser importante para os próprios resultados eleitorais do PS, pois a opção de muitos eleitores vai depender da perspetiva de recondução, ou não, da aliança privilegiada à esquerda e do consequente "afunilamento" ou abertura das opções governamentais
 
2. No campo socialista há observadores que defendem que o PS integra o mesmo "campo político" que o PCP e o BE, ou seja, a esquerda, com a qual deve governar (como defende hoje Pedro Adão e Silva, no Expresso), em oposição ao campo da direita, liderado pelo PSD. 
Só que até 2015 prevalecia no PS o entendimento de haver três campos políticos: a extrema-esquerda (BE e PCP), o centro-esquerda ou esquerda moderada (PS) e a direita (PSD e CDS). O previsto crescimento substancial do Chega nas próximas eleições - provavelmente o principal beneficiário da antecipação das eleições - vai, aliás, dar lugar a um quarto campo político, a extrema-direita, tão diferenciada da direita moderada como a extrema-esquerda do PS. 
Neste quadro político, reduzir o espectro partidário à bipolarização entre Esquerda e Direita, no singular, constitui uma simplificação grosseira da realidade política. Em Portugal, a chamada Esquerda declina-se no plural (as esquerdas), e existem mais profundas diferenças políticas e programáticas entre o PS e as demais esquerdas do que entre o PS e o centro-direita. 
Se se considera má solução uma grande coligação de governo ao centro - opinião de que compartilho, pois entendo que deve haver sempre uma alternativa de governo na oposição -, com que lógica se defendem soluções que implicam coligações ou protocoligações à esquerda, onde há muito menos convergência de posições e que, aliás, põem em causa a autonomia estratégica do PS, como mostrou a experiência destes anos?

Adenda
Um leitor dá uma solução: o PS anunciar que só encara uma nova aliança política à esquerda com base num compromisso assinado - que provavelmente o próprio PR vai exigir - , segundo o qual não seria posto em causa nem o rigor das finanças públicas nem a competitividade da economia, «deixando ao Bloco e ao PCP o ónus de recusar essa fórmula governativa». Não é mal pensado...