quinta-feira, 11 de maio de 2023

Guerra na Ucrânia (55): Cancelamento

Era de temer que a passional onda antirrussa desencadeada no Ocidente pela invasão da Ucrânia, que logo se manifestou no cancelamento da atuação de artistas e desportistas russos, viesse a dar lugar a atitudes como esta do Reitor da Universidade de Coimbra, que, com base na denúncia pública de dois cidadãos ucranianos, sobre alegada "propaganda pró-Putin", despediu sumariamente um professor russo do departamento de estudos russos da Faculdade de Letras, rescindindo imediatamente o seu contrato (aliás, gracioso), sem nenhum processo de averiguação, nem audição do acusado.

Neste caso, a simples denúncia de posições filorrussas legitimou a expedita punição, com despedimento, do delito de opinião, sem contraditório, de nada valendo o vínculo contratual nem a tradicional garantia da liberdade académica. Como é bom de ver, quando a exclusão ideológica chega à academia, preparemo-nos para o pior...

Adenda
Como diz um leitor, na "caça às bruxas" anticomunista do senador MacCarthy nos EUA, a seguir à Guerra, ainda havia acusação e processo público, o que agora se dispensa nesta «purga antirrusa». 

Adenda 2 (14/5)
Outro leitor lembra que na ditadura do Estado Novo o banimento de professores por motivos político-ideológicos era «feito pelo Governo, sob denúncia da PIDE, e não pelas próprias universidades, abusando da sua autonomia»Tem razão. O que não mudou, porém, hoje como ontem, é a cumplicidade, pelo silêncio, da generalidade da academia perante estes atos sumários de exclusão...

Adenda (3) (18/5)
Concordo com o leitor que comenta que, «se, em vez de um reitor de direita a despedir sumariamente um professor por alegada propaganda pró-Putin [aliás, entretanto desmentidos pelos alunos], fosse um reitor de esquerda a despedir um professor por alegada propaganda pró-Trump, o caso daria seguramente a iradas acusações de perseguição política nas televisões e mesmo na AR». Sim, a tradicional duplicidade de critérios...