1. Não pude estar no lançamento da biografia de Francisco Lucas Pires, mas vou lê-la seguramente, não só pelo importante legado político-doutrinário que ele deixou, mas também pelo respeito intelectual e pela amizade que nos ligou desde os tempos de Coimbra, que o interesse comum pelo constitucionalismo facilitou, e que já tive oportunidade de registar publicamente aqui no Causa Nossa.
É verdadeiro o episódio que esta notícia sobre o livro evoca, do nosso serviço militar nas Caldas da Rainha no final de 1974. Embora já com cerca de 30 anos, ambos já casados e com filhos, tínhamos gozado do adiamento do serviço militar, primeiro como estudantes bem-sucedidos e depois como assistentes e doutorandos da FDUC, o que nos livrou da guerra colonial. Chegada a Revolução, ambos decidimos interromper o doutoramento que preparávamos no estrangeiro, eu em Londres, ele na Alemanha, para nos entregarmos à luta política, nos campos políticos opostos a que pertencíamos.
Nenhum de nós resistiu ao apelo da Revolução.
2. Foi aí que inesperadamente fomos chamados ao cumprimento do serviço militar, não no Curso de Oficiais Milicianos (COM), em Mafra, como era antes do 25 de Abril - entretanto extinto, como "excrescência elitista" -, mas sim na recruta geral, no quartel das Caldas da Rainha. Foi uma experiência exigente, num clima agreste, de frio e chuva - entre as faxinas, a aprendizagem no manejamento da G3 e o rastejamento em percursos lamacentos -, enquanto a Revolução fervia cá fora, depois do 28 de Setembro.
Felizmente, como a referida notícia refere, tive a sorte de o acompanhar não poucas vezes, depois do quartel, à casa que Teresa, sua mulher, tinha arrendado em Óbidos, em longos repastos e fértil discussão política. Uma muito grata recordação!
3. Terminada a nossa breve missão militar, viemos a seguir caminhos afins: ele foi preparar um projeto de Constituição para o CDS e eu fui integrar o grupo de trabalho do PCP para a preparação do respetivo projeto de Constituição.
Mais tarde, a vida encarregar-se-ia de nos aproximar politicamente, tendo ambos deixado os nossos partidos de origem, ele no centro-direita e eu no centro-esquerda, continuando a cultivar a amizade e a admiração recíproca que nos ligara desde Coimbra, até ao seu desafortunado desaparecimento prematuro.
Apraz-me verificar que este livro vem resgatar merecidamente o seu pioneiro legado político-intelectual na direita liberal e europeísta entre nós.