1. Não me conto entre os que auguram vida curta ao novo Governo do PSD-CDS, atendendo à sua base parlamentar ultraminoritária (80 deputados em 230). Pelo contrário.
O meu argumento é o seguinte: nenhum Governo minoritário (mesmo Cavaco Silva em 1985 ou Guterres em 1995) iniciou funções em condições económicas e financeiras tão favoráveis como este: economia a crescer, emprego e salários a subir, folga orçamental substancial e receitas públicas a aumentar, peso da dívida pública a descer, o PRR a "bombar" financiamento do investimento público e privado, inflação controlada. Acresce que a esperada descida da taxa de juros pelo BCE vai facilitar o crédito ao consumo e ao investimento, estimulando o crescimento, e aliviar os encargos do crédito à habitação.
A não sobrevir nenhum fator adverso inesperado, basta ao Governo explorar adequadamentea a herança recebida para sobreviver e, mesmo, ser bem-sucedido.
2. Com efeito, nestas condições extremamente favoráveis, o Governo bem pode começar por satisfazer as reivindicações das corporações do setor público que tanto "azucrinaram" o Governo cessante (professores, polícias, militares, pessoal do SNS), apesar do significativo aumento da despesa pública corrente que elas implicam, e preparar a "compra" do voto do Chega no orçamento no final do ano, incluindo o início da prometida desoneração fiscal e do novo aumento das pensões mais baixas.
Se as coisas não decarrilaram, por inépcia ou sofreguidão governamental, não se vê como pode verificar-se uma convergência do Chega e do PS para derrubar o Governo (e só ela o poderia deitar abaixo). Como fazem lembrar as experiências em 1987 (derrube do I Governo de Cavaco Silva) e de 2021-22 (derrube do II Governo de A. Costa) - que resultaram em maioria absoluta do Governo derrubado, nas eleições subsequentes -, o pior que as oposições podem fazer é juntarem-se para derrubarem um Governo minoritário a quem as coisas estão a correr bem.