1. Depois deste desastre eleitoral, numas eleições que podia e devia ter evitado, e que só surpreendeu pelos números, o que deve fazer o PS, além de lamber as feridas e preparar o processo de seleção de nova liderança?
Ocorre-me recordar o que escrevi num post há tempos:
«(...) estando excluída entre nós, pelo menos por agora, a hipótese de governos de grande coligação ao centro (à alemã), não é impossível, porém, equacionar um pacto estável entre os dois tradicionais partidos de governo , no sentido de, em caso de vitória eleitoral sem maioria absoluta, cada um deles deixar governar o outro - salvo coligação governamental maioritária alternativa -, viabilizando a constituição do Governo e prescindindo de votar moções de censura, a troco da negociação dos orçamentos (...).
Parecendo-me excluída a repetição de maiorias absolutas monopartidárias - por causa fragmentação da representação parlamentar - e também pouco provável a hipótese de coligações maioritárias, quer do PSD com a sua direita (excluindo obviamente o Chega), quer do PS com a sua esquerda (excluindo o Bloco e o PCP), este acordo entre os dois partidos de governo faz todo o sentido, para ambos, agora e no futuro.
Um acordo desta natureza era obviamente inviável para o PS sob a liderança de PNS - refém daquilo que eu chamo há muito a "ala bloquista" do PS -, mas não vejo como pode deixar de ser equacionado por uma nova direção, necessariamente menos radical e mais racional.
2. Julgo que, além da estabilidade governativa que um acordo destes geraria, bem como do quadro favorável aos necessários "acordos de regime" entre ambos os partidos (na reforma da justiça, da lei eleitoral, do SNS, etc.), ele torna-se neste momento essencial para assegurar ao PS um seguro contra o risco de tentação do PSD de utilizar a maioria de 2/3 dos deputados que a nova AR confere ao conjunto dos partidos de direita, para fazer aprovar contra o PS, não somente alterações às leis que carecem daquela maioria (entre as quais a lei eleitoral) e a designação de cargos públicos de topo (como os juízes do Tribunal Constitucional), mas também a própria revisão constitucional.
Ou seja, além da estabilidade governativa, o que está em causa é também a própria estabilidade do regime constitucional vigente, o que, nas vésperas da celebração dos seus 50 anos, devia estar entre as prioridades políticas de ambos os partidos, e em especial do PS.