quarta-feira, 20 de outubro de 2004

Malthusianismo profissional

«Gostaria imenso que pudesse dar-me a sua opinião sobre as ordens profissionais, (...) uma vez que sou um estudante do ensino superior que acha que a Assembleia da República deu um poder desmesurado às ordens profissionais. Sendo eu estudante de contabilidade numa das mais reconhecidas instituições de ensino superior nessa área vejo o meu ingresso na Câmara de Técnicos Oficiais de Contas vedado porque os membros que lá estão não querem concorrência.
(...) Esta questão não afecta só a mim mas a milhares de estudantes que ingressam no ensino superior a pensar que um dia vão poder desempenhar as funções para que estudam, e no entanto, não são as universidades mas sim as ordens profissionais que decidem o seu futuro. As ditas ordens profissionais argumentam com a qualidade dos profissionais que saem da universidade mas isso é falso. (...) Os que pretendam ingressar no Ordem dos Revisores Oficiais de Contas têm de pagar cinco mil euros para fazer os exames, e ainda fazer um estágio de três anos. Ora essa medida barra o acesso aos licenciados com menos possibilidades financeiras. Não está em questão o seu conhecimento.»

(E. Oliveira)

Comentário

Sou muito crítico desde há muito tempo da tendência malthusiana das ordens profissionais, no sentido de restringirem excessivamente o acesso à profissão, o que fazem pelos mais variados modos: elevando os requisitos académicos, conseguindo limitar logo o acesso aos cursos (como sucedeu escandalosamente com a Medicina), exigindo a "creditação" dos cursos pelas próprias ordens, criando barreiras ao acesso (exames à entrada), estabelecendo longos estágios profissionais, agravando a exigência dos exames de estágio, de modo a reprovar muitos candidatos, fixando taxas incomportáveis de estágio e de exame, etc. Infelizmente os estatutos da ordens, cujos projectos são elaborados pelas mesmas, são em geral "carimbados" sem discussão pela AR ou pelo Governo, sem que se definam as salvaguardas necessárias para garantir a liberdade de acesso. Penso que neste momento existem entre nós restrições desproporcionadas e injustificáveis à liberdade profissional.

O que resta

Num artigo de hoje no Público, Domingos Lopes defende a hipótese de Carvalho da Silva, o prestigiado secretário-geral da CGTP, para a liderança do PCP. Ainda há quem prefira alimentar ilusões de "aggiornamento" na Soeiro Pereira Gomes! Quando nada mais resta...

Poder judicial

«Serve o presente para manifestar a minha total concordância com o post "Poder Judicial, literalmente". A questão da nomeação de uma Académica reputada para a direcção do CEJ é a prova acabada de que a visão predominantemente estatutária que tem marcado a leitura de muitas nomeações confunde o essencial com o acessório. Isto é, ao polarizar-se o acerto ou desacerto da nomeação no "status" da pessoa nomeada, desmerece-se as qualidades da pessoa. Não interesssa se é magistrado ou não. Interessa antes se é uma pessoa capaz e habilitada ao exercício do cargo.
Ora, (...) manda a lógica que, na perspectivação contrária, não vislumbre qualquer "diminuição de capacidade" por parte dos magistrados (quaisquer que estes sejam) para o exercício de outros cargos públicos, em que também sobreleve o serviço à República. Apesar do "politicamente correcto" apontar para a hermetização dos magistrados nos tribunais, são ainda as mesmas razões de (i) "desendogeneização", (ii) de ausência de "incapacidades de exercício" e de (iii) enriquecimento de experiências que me levam a defendê-lo. Só assim evitaremos que "haja dois pesos e duas medidas", ou, nas suas acertadas palavras, que desejemos "sol na eira e chuva no nabal".»

(A F Cunha)

Passou-se!

As declarações do ministro dos Assuntos Parlamentares perante a Alta Autoridade para a Comunicação Social sobre a existência de uma espécie de "conspiração objectiva" do Expresso, do Público e de Marcelo Rebelo de Sousa para atacar o Governo são destrambelhadas.
Pelos vistos, para ser ministro deste governo não é preciso ser dotado de um mínimo de siso político. Qual será o próximo disparate do áulico de Santana Lopes?

Poder judicial, literalmente

Num agreste comunicado, a Associação Sindical dos Juízes (ASJP) manifesta «frontal discordância» em relação à nomeação de um não magistrado (a Prof. Anabela Rodrigues, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) para director do Centro de Estudos Judiciários (CEJ), a instituição pública de formação de magistrados judiciais e do Ministério Público. O sindicato dos juízes acrescenta que essa nomeação «não credibiliza as instituições judiciárias, e não é abonatória da independência do poder judicial».
O escândalo da ASJP tresanda a corporativismo vulgar. A lei não estabelece nenhuma "reserva judicial" desse cargo, e nada a impõe ou recomenda. Até há boas razões para uma direcção "leiga": do que se trata é de formar magistrados de acordo com o interesse geral da justiça e não necessariamente segundo a concepção endógena dos próprios interessados. Por último, não faz nenhum sentido neste contexto a invocação da «independência do poder judicial», que em nada é afectada pela qualidade do director do CEJ.
Só é pena que o zelo da ASJP na defesa da independência do "poder judicial" não se tenha expresso até agora numa igualmente «frontal discordância» da nomeação de juízes para cargos exteriores aos tribunais, na maior parte dos casos por escolha política do Governo, o que é seguramente muito mais comprometedor para a sua independência. Sol na eira e chuva no nabal...
(Revisto)

Direito à independência, de quem?

Promovida pelo blogue Briteiros está em curso uma petição para conferir à Madeira o direito à independência. O propósito é virtuoso, mas duvido que eles queiram, enquanto o dinheiro continuar a jorrar abundantemente de Lisboa para o Funchal. Não será melhor conferir o direito à independência do resto do País em relação à Madeira de Jardim?! Era sucesso garantido...

terça-feira, 19 de outubro de 2004

"Jardinismo"

Os resultados das eleições regionais da Madeira -- a vitória menos expressiva de sempre do PSD e o melhor resultado de sempre do PS --, poderão eles tornar previsível a alternância democrática na Madeira e significar o princípio do fim do "jardinismo", após quase três décadas de hegemonia? Tal é o tema do meu artigo no Público de hoje (também coligido no Aba da Causa, com link aqui ao lado, na coluna da direita).

Benfica

Só agora me recompus da derrota de domingo ante o Porto. Os meus amigos lampiões é que ainda não. Dizem que tudo é preferível a perder-se assim, espoliados pelos árbitros, e que teria sido bem melhor se tivéssemos sido dominados futebolisticamente pelo clube das Antas e ponto final. Discordo. Prefiro ter perdido assim. É bem mais transparente e encorajador para a Luz.

Não subscrevo, porém, a maioria dos comentários desbragados dos da minha cor. É claro que fomos prejudicados em momentos capitais - um golo e dois penaltis por marcar -, mas não quero acreditar que tenha havido qualquer intenção dolosa por parte de Benquerença e dos seus auxiliares. O que aconteceu dentro e fora das quatro linhas decorre da normalidade futebolística lusitana.

Primeiro, o golo negado. É bem verdade que o lance é de difícil análise e que só o recurso a meios tecnológicos modernos, comuns noutras modalidades e sistematicamente negados por esse grupo de gerontes incompetentes da FIFA e do International Board, poderá um dia introduzir mais rigor na arbitragem. Acontece que a forma como o lance se desenrola e o movimento de Baía a safar a bola de dentro da baliza não deveriam deixar dúvidas a uma equipa treinada e paga para ajuizar lances difíceis num desporto de alta competição. Bastaria que, nas acções de reciclagem, tivessem aulas de física. Na sua ausência e perante a conhecida correlação de forças no futebol português, os Benquerenças aplicaram a regra habitual: em situações difíceis, o Porto deve gozar do benefício da dúvida. O mesmo se passou nos dois lances sobre Karadas, ambos para castigo máximo, como as imagens e as fotos evidenciaram.

Fora das quatro linhas, foi a rasquice suprema, para gáudio do povão.
Luís Nazaré

Esquerda v direita

«Compreendo a sua reinvindicação (...) de que "a distinção entre esquerda e direita continua a fazer sentido", mas a verdade é que os resultados de algumas sondagens recentes revelam um progressivo desinteresse dos portugueses acerca de uma tal distinção.
Julgo que seria oportuno tentar entender as razões que levam os portugueses a desinteressar-se por esta matéria. Uma explicação plausível será a de que os portugueses se encontram confundidos com a prática política dos partidos que habitualmente tomam conta do governo da nação, PS e PSD, o primeiro de esquerda e o segundo de direita, pelo menos de um ponto de vista formal.
Assim sendo, coloca-se uma pergunta óbvia. Na prática política, quem terá contribuído para a confusão e desinteresse dos portugueses: a direita, por adoptar atitudes de esquerda, ou a esquerda por adoptar atitudes de direita?
A resposta não parece difícil e convinha que fosse objecto de alguma meditação. Até porque, hoje em dia, se torna difícil classificar algumas das figuras políticas mais emblemáticas. (...)»

(Jorge Oliveira)

Serviços públicos e mercado

Os que se opõem à existência de um serviço público de rádio e televisão, como garantia mínima de uma esfera de pluralismo de informação, de ideias e de opinião (entre outras coisas), costumam defender também que deixe de haver escolas públicas, hospitais públicos, e outros serviços públicos que visam proporcionar acesso universal, equitativo e plural (e por vezes gratuito) a certos bens básicos (informação, educação, cuidados de saúde, etc.) que o mercado só por si não proporcionaria nessas condições. São coerentes, sempre pela mesma razão: eles não precisam desses serviços públicos para terem acesso privilegiado a esses bens e por isso também não querem pagá-los. Uma posição inquestionavelmente racional, pois claro!
É também por isso que a distinção entre esquerda e direita continua a fazer todo o sentido!

Guilhermina Suggia



Nos últimos dias tenho-me deliciado a trabalhar ao som de uma excelente interpretação de obras para violoncelo e piano de Heitor Villa-Lobos, que uma amiga minha brasileira, sabedora da minha paixão por obras de violoncelo, me trouxe do Brasil. Eis senão quando recebo um mail de Virgílio Marques, um dos autores do blogue Guilhermina Suggia, a anunciar a criação de uma associação de amigos/admiradores da grande violoncelista. Não resisto a divulgar o blogue e a apoiar a ideia da associação.

segunda-feira, 18 de outubro de 2004

O sono da razão democrática

Na Madeira, ainda não se processou, no plano dos factos, a transição da ditadura para a democracia: é uma constatação que qualquer pessoa com formação democrática mínima pode fazer. Mas é o que nunca fizeram, até hoje, os órgãos de soberania que, ao longo de décadas, têm contemporizado e sido cúmplices com uma situação de excepção que atenta contra os valores consagrados na Constituição da República.

Tudo se passa como se uma parte do território nacional pudesse subtrair-se ao regime democrático que nos rege. E como se isso não violasse o próprio conceito de Estado unitário ou alguns princípios essenciais do Estado de direito -- que asseguram o respeito pelas liberdades e garantias dos cidadãos, incluindo o pluralismo das opiniões.

A menoridade democrática da Madeira é entendida, por vezes, como uma fatalidade incontornável ou um fruto espúrio, uma consequência perversa dessa conquista democrática que são as autonomias. Mas estarão as autonomias à margem da lei fundamental do país? O preço a pagar pelas autonomias (cada vez mais alargadas ao longo de sucessivas revisões constitucionais) é a impunidade do regime jardinista? Eis uma questão a que os mais altos responsáveis políticos do Estado se têm furtado a responder.

A «obra» deixada por Alberto João Jardim parece caucionar a sua inimputabilidade política. Mesmo sem pôr em questão a importância física dessa «obra» (aliás altamente discutível em termos de desenvolvimento sustentado de uma região e com custos terríveis para as gerações vindouras), alguém admitirá, porém, a bondade de regimes autoritários ou totalitários (como os de Hitler ou Estaline) em nome da «obra» edificada pelos respectivos ditadores? A falta de alternância democrática da Madeira poderá ser evocada como normal e positiva em nome da «estabilidade», mesmo que essa estabilidade se confunda já com aquela que conhecemos durante o salazarismo?

A governamentalização da sociedade civil e a sua asfixia pelos poderes públicos, a desresponsabilização dos actores políticos que fazem «obra» sem assumir os compromissos devidos aos seus custos (e, ainda por cima, sufocam as liberdades) não é normal num Estado de direito democrático. Trata-se de uma efectiva monstruosidade. Mas é uma monstruosidade que não provoca grandes incómodos entre os admiradores continentais de Jardim (antes pelo contrário) nem parece ser suficiente para mobilizar de forma consequente os seus opositores.

Em relação à Madeira vivemos uma espécie de sono da razão democrática. Só que é um sono cujo vírus contamina a consciência e a vivência da democracia em Portugal. Se aceitamos como normal ou até motivo de elogios (e imitação) o que se passa na Madeira, que impede que se pense o mesmo relativamente ao resto do país?

Vicente Jorge Silva

A notícia e a não-notícia

Os Açores foram notícia no passado domingo, a Madeira não. As previsões apontavam para uma disputa de resultado muito incerto nos Açores, onde se admitia que a coligação PSD-CDS pudesse ganhar as eleições regionais. Na Madeira, pelo contrário, a única dúvida sobre o resultado eleitoral residia na maior ou menor expressão da inevitável e fatal maioria absoluta de Alberto João Jardim. Ora, numa democracia normal não há certezas absolutas sobre vencedores antecipados e, por isso, o factor surpresa faz parte da própria lógica democrática. A surpresa açoriana teve como contraponto a não-surpresa madeirense (se exceptuarmos o melhor resultado de sempre do PS). É a surpresa, a novidade, que cria a notícia, não aquilo que é previsível, velho, conhecido por antecipação. E que, como o jardinismo, cheira a mofo.

Mas a surpresa açoriana relativizou, ainda mais, a não-surpresa madeirense. Apesar de já se saber que o jardinismo estava «condenado» a obter uma oitava maioria absoluta consecutiva, ninguém se atreveu a apostar que o PS/Açores registasse uma percentagem de votos superior ao PSD/Madeira. Foi isso, porém, o que aconteceu. E assim percebe-se melhor o comportamento de Jardim na noite eleitoral. Depois do espectáculo de circo e inaugurações em que investiu mundos e fundos, não conseguiu disfarçar o inconfessável: o rancor e o ciúme por ter sido ultrapassado pelo seu congénere socialista açoriano (o qual, ainda por cima, parece ter feito uma decepcionante campanha eleitoral). Tanto circo para ficar atrás de César? Impensável. A culpa só poderia ser mesmo da imprensa do continente (os tais «patetas» que tanto o atormentam) ou dos jornalistas da Madeira que não estão comprados por ele, e que, por isso, ameaça publicamente de saneamento.

Este é certamente mais um motivo de vergonha para a Madeira, a somar aos tantos que Jardim tem protagonizado ao longo de vinte e muitos anos. Mas a Madeira tem um motivo ainda maior para continuar a sentir-se envergonhada: é por Jardim, embora em recuo, ainda tratar os madeirenses como gado eleitoral -- e esse gado eleitoral ainda gostar de sê-lo, obediente, apático e servil, às ordens de um pastor cuja boçalidade e carácter rancoroso constituem uma ofensa aos valores mais básicos da boa-educação e da civilidade. Para não falar, é claro, de valores democráticos -- que é coisa ainda muito distante da vivência quotidiana dos madeirenses.

Vicente Jorge Silva

A coligação com o PP é um mau negócio eleitoral para o PSD?

Não concordo com a tese, que vem desde as eleições europeias, de que a coligação PSD-PP seja eleitoralmente prejudicial para o PSD. É de admitir que haja uma ligeira perda de votos, quando comparada com a soma que teriam os dois partidos separadamente, mas essa desvantagem pode ser compensada com a vantagem da atribuição de mandatos, que tira proveito da concentração de votos. Além disso, pode permitir à direita ganhar ao PS, quando o PSD não o pode fazer sozinho, o que pode ser essencial para saber quem forma governo. Por isso, não creio que a coligação tenha sido responsável pela humilhante derrota de Vítor Cruz nos Açores. Basta ver o que sucedeu na Madeira, onde, concorrendo separados, tanto o PSD como o PP perderam votos, em proveito do PS. O que sucede é que a coligação governamental nacional está manifestamente em perda, pelo que os dois partidos perderão sempre votos, coligados ou não.
Mas é evidente que a ideia de que a coligação é um mau negócio permite aos próprios (sobretudo ao PSD) amenizar as derrotas, imputando-as ao parceiro de coligação, e à oposição semear a cizânia nas hostes governamentais.

O mundo de Bush

«Muitos dos suspeitos de terrorismo detidos na base americana de Guantanamo foram sujeitos de forma regular e continuada a tratamentos coercivos passíveis de serem considerados tortura» - conta hoje o Público, referindo uma investigação do New York Times. Os pormenores são de estarrecer. Eis a (in)cultura de direitos humanos e o "rule of law" (Estado-de-Direito) à maneira de Bush!

«Bush is the Problem»

«América yes, Bush no» - é assim que o vespertino francês Le Monde sintetiza o resultado do inquérito de opinião realizado em dez países sobre os Estados Unidos, cuja análise pode ser vista neste site do Guardian de Londres. Na verdade, são três os principais resultados a registar:
a) Existe uma enorme rejeição de George Bush e uma correspondente preferência por John Kerry na disputa presidencial norte-americana; Bush sofreria derrotas humilhantes em vários deles (apenas 13% em Espanha, 16% na França, cerca de 20% no Canadá e no México, 22% no Reino Unido...).
b) Mantém-se porém uma apreciação muito positiva em relação aos Estados Unidos em todos os países, com taxas relativamente elevadas em vários deles;
c) No entanto, a imagem dos Estados Unidos degradou-se nos últimos anos por causa de Bush e em especial da guerra do Iraque, fortemente condenada em quase todos os países.
Isto permite tirar especialmente duas conclusões:
a) O sentimento dominante anti-Bush não decorre de nenhum "anti-americanismo", como defendem os partidários daquele;
b) Pelo contrário, é a política de Bush que arruina o retrato da América no Mundo e amplia o sentimento anti-americano.
O ainda presidente dos Estados Unidos é o principal factor do anti-americanismo. Uma reeleição de Bush para novo mandato só pode piorar a imagem e o crédito dos Estados Unidos no mundo. Como titulava um jornal sul-coreano sobre o inquérito, «Bush is the problem».

Soma e segue

Nas eleições regionais dos Açores o PS ganhou folgadamente à coligação de direita, reforçando mesmo a maioria absoluta, com cerca de 20% de diferença na votação, esmagando as veleidades do PSD de recuperar o poder. Na Madeira, como era previsível, Jardim voltou a ganhar confortavelmente mas em nítida perda (com a menor maioria de sempre e com votação inferior à de César nos Açores), tal como o PP, ao mesmo tempo que o PS obteve uma notável subida, encurtando significativamente o enorme fosso que o separava do PSD. Quem sabe, o princípio do fim do jardinismo...
Resultado: uma jornada fagueira para o PS e claramente negativa para a direita em geral e para o PSD em especial. Na estreia eleitoral de Sócrates e de Santana Lopes à frente dos respectivos partidos (pese embora a dimensão essencialmente regional destas eleições), é evidente que, depois do triunfo nas eleições europeias em Junho passado, o PS ganhou igualmente o segundo "round" do ciclo de eleições que termina daqui a dois anos com as eleições parlamentares, no fim da presente legislatura (se não for antes...).

domingo, 17 de outubro de 2004

Previsões à moda de Zandinga

Custa dizer que a culpa do que se passou nos últimos dias, em matéria de previsões sobre as eleições regionais nos Açores, foi da comunicação social. Não sei, não estive lá para saber se o que as televisões relatavam correspondia ou não ao que viam no local. Mas a sensação que ficava em quem as ouvia, aqui no continente, era a de que o lugar de Carlos César estava em perigo. Basta lembrar a importância que foi dada às declarações de Marcelo de Rebelo de Sousa. Que o tipo de intervenções do partido socialista, dizia o comentador em tom convicto e supostamente fundamentado, era um sinal indiscutível de que se sentiam perdedores.
Lição a tirar depois dos resultados: um esforço acrescido de isenção e objectividade aconselha-se para as próximas campanhas eleitorais. A bem do prestígio da comunicação social, muito em especial da que é paga por todos nós.

Mais quatro anos, não!

Sem surpresa, o prestigiado New York Times apoia expressamente John Kerry na corrida à presidência dos Estados Unidos. Mesmo se esperado, o editorial que justifica o «apoio entusiástico» ao senador merece uma leitura, quanto mais não seja pelo fundamentado requisitório contra Bush. Mais um «mandato desastroso», não!

O Inverno



Aproxima-se o Inverno, os dias pequenos e de luz coada. O sol é menos quente e menos frequente. Desaparecem as esplanadas dos cafés. Nas ruas, anda menos gente. As janelas fecham-se nas casas.
Poderíamos fazer contra-corrente. Guardar a cor e a luz no que vestimos. Deixar a loucura criativa de Galliano inspirar as nossas opções. Mas não. No Inverno, domina o preto ou o cinzento, nas roupas e nos sapatos. As montras tornam-se mais tristes. Só nos resta esperar que o Verão regresse. E depressa, por favor.

Afinal, este Governo é igual aos outros?

Em aparente tentativa de apaziguar as pouco discretas provocações de Santana Lopes, o Presidente da República declarou, em entrevista à Antena 1 (muito fala agora o Presidente!...), que o actual governo "não está em diferentes condições do que outros no que respeita à sua apreciação [pelo Presidente]". Ora, para além de não ter havido nenhum governo acerca de cuja nomeação o Presidente tivesse hesitado tanto tempo, também foi a primeira vez que ele achou necessário estabelecer publicamente exigências de continuidade de políticas essenciais em relação ao governo anterior, o que obviamente aumenta a necessidade de escrutínio presidencial.
Com esta declaração do PR, em que ficamos? Belém acha afinal que este governo é igual a qualquer outro saído directamente de eleições parlamentares?

Os argumentos discutem-se, as pessoas não

Ao contrário do que acusa Gabriel Silva no Blasfémias, eu não chamo nomes às pessoas. Posso desqualificar (por vezes indevidamente...) ideias, posições e argumentos, mas não desconsidero os autores.

Confederação sindical europeia pela Constituição

Qualificando-a como um «claro progresso em relação aos actuais tratados da UE», a Confederação Europeia de Sindicatos manifestou o seu apoio à Constituição Europeia. A decisão foi aprovada por grande maioria, somente com um voto contra (a FO francesa, tradicionalmente hostil à integração europeia) e algumas abstenções, entre as quais a CGT francesa e a CGTP portuguesa.
Sabendo-se que a força política mais influente na central sindical nacional, o PCP, é militantemente contra o novo tratado constitucional (o mesmo sucedendo com o BE), a abstenção adoptada em Bruxelas não deixa de ser uma posição prudente. Resta saber que atitude é que a organização presidida por Carvalho da Silva vai tomar no debate interno sobre o assunto, designadamente no previsto referendo.

sábado, 16 de outubro de 2004

Portucaliptal


Citado pelo Expresso de hoje, com base num jornal regional de Aveiro, o secretário de Estado das Florestas, Luís Pinheiro (que deve mudar o nome para Luís Eucalipto...), anunciou uma política de apoio à expansão do eucaliptal em Portugal, tendo em conta o abastecimento de matéria prima da indústria de celuloses. Ou seja: a política florestal hipotecada aos interesses particualres de uma indústria, apesar dos enormes prejuízos para o património florestal e o ambiente, sem esquecer a devastação dos fogos florestais! O que é bom para a Portucel é bom para o País...
Por que é que em Portugal o secretário de Estado das Florestas há-de aparecer sempre como comissário das empresas da pasta de papel? E os movimentos ecologistas, ficam silenciosos, porquê?

Fanatismo de mercado

Se se quiser uma amostra de fundamentalismo liberal em matéria económica, a posição de João Miranda sobre o limite do número de operadores de televisão de sinal aberto é exemplar. O dogma reza: não deve haver barreiras artificiais à entrada de novos "players" no mercado; logo, todo a limitação é sempre má por definição, mesmo que, como ocorre no caso, esteja em causa a utilização de um bem do domínio público, que só pode ser usado mediante licença pública, precedida de concurso, não podendo haver por definição liberdade de acesso nessa esfera e podendo haver razões assaz compreensíveis para limitar o número de operadores e para assegurar a estabilidade do quadro televisivo (desde logo, por exemplo, para não estar a repetir concursos para as vagas resultantes da falência recorrente de operadores excedentários...).

PS
- Eu não disse nada contra as estações regionais de televisão. Só defendi que o pluralismo "externo" delas resultante não poderia servir de "compensação" para a eventual falta de pluralismo "interno" a nível das estações de âmbito nacional.

Buttiglione

Ao contrário de José Manuel Fernandes, que ontem subscreveu no Público um editorial de apoio a Rocco Buttiglione, o polémico comissário europeu designado, entendo que faz sentido a posição da comissão de liberdades do Parlamento Europeu, que o reprovou. O problema não é a personalidade do comissário que Barroso escolheu para a pasta da justiça nem os valores morais/religiosos que ele defende. O problema é a inadequação entre eles e a pasta para que foi designado. Nenhum problema se levantaria se se tratasse do pelouro da agricultura e das pescas, por exemplo. Mas provavelmente nem no Governo de Berlusconi, a que ele ainda pertence (Assuntos Europeus), seria pacificamente aceito na pasta da justiça.
De facto, Buttiglione é um fundamentalista religioso com opiniões fortemente reaccionárias em matéria de casamento, contracepção, homossexualidade, aborto, etc., o que seria o menos. Mas os fundamentalistas religiosos tendem geralmente a impor os seus valores religiosos a todos por via de lei (como é fácil ver no caso da punição penal do aborto), pelo que as declarações em contrário de Buttiglione são tudo menos tranquilizadoras. De facto, na Convenção Europeia já se opôs ao princípio da não discriminação por razões de orientação sexual. Para além disso, como amigo e ministro de Berlusconi, Buttiglione também não dá nenhumas garantias de fazer avançar a cooperação judiciária a nível da UE, que Berlusconi tem torpedeado sistematicamente, por razões pessoais, estando a Itália em falta na implementação de várias medidas comunitárias nesta área. Buttiglione não está, portanto, à altura de suceder a António Vitorino nessa sensível pasta. Por isso parece-me que Barroso faria bem em mudá-lo de pelouro.

PS. Como efeito fácil, JMF apoda de modernos "torquemadas" os críticos de Buttiglione. É uma evocação infeliz. Torquemada foi sim um antepassado da família religiosa de Butiglione. Ao contrário, os seus críticos de hoje não pretendem fazê-lo abjurar das suas "heresias", muito menos queimá-lo vivo...

sexta-feira, 15 de outubro de 2004

O "derby"

Quem ouvir o relato do que se passou hoje com jogo entre o Benfica e o FCP acreditará que organizámos o Euro, há tão poucos meses, com indiscutível e reconhecido sucesso?
Parece que só nos excitam os grandes desafios. Ganhamos à Rússia mas não ao Liechtenstein. Fazemos o Euro, mas corremos o risco de falhar num mero jogo da Liga!

Os da Causa, fora dela

Notícia de textos publicados por autores do Causa Nossa noutros média:
- Luís Nazaré no Jornal de Negócios de ontem, sobre o regresso do tema do papel do Estado nas sociedades contemporâneas;
- Vicente Jorge Silva no Diário Económico de hoje sobre o caudilhismo jardinista na Madeira.
Ambos vão ser coligidos no Aba da Causa (link aqui ao lado, na coluna da direita).

Pedido de desculpas

(com publicidade subliminar)

Tenho andado arredio da postagem aqui no Causa. Tenho pena mas ando atarefado com diversas porcarias e alguns prazeres trabalhosos como este. A estreia é hoje às 21h30. Todos os meus companheiros de blogue estão convidados - é só mandar um mail a este que vos pede desculpa e promete voltar às responsabilidades brevemente. Um abraço, e não se esqueçam de passar no vizinho do lado. As URGÊNCIAS estão aí.

clube do pulmão

Duas da manhã, num extra. Tenho o tabaco mas falta-me o fogo. Desespero. Só existem isqueiros azuis com o símbolo do Futebol Clube do Porto. Hesito. Pergunto por fósforos. Por seixos. Por paus secos. Não há nada, só pequenos acendedores com o FCP carimbado. Pago 90 cêntimos para possuir o fogo e acendo o cigarro mais envergonhado de sempre. Afinal, não sou do Benfica. O meu clube é o tabaco.