domingo, 24 de outubro de 2004

Em resposta a "O financiamento do Ensino Superior"

1 - «Se estivesse atenta às reivindicações estudantis saberia que a questão das propinas não é a única bandeira do movimento apesar de ser a que, por motivos de urgência, tem mais protagonismo.
2 - Aprovada em Assembleia Magna uma das maiores reivindicações da AAC é a revisão do processo de Bolonha nomeadamente no modelo 3+2 ou 4+1 dos cursos, seu subsequente financiamento, bem como a questão da mobilidade (os seus custos e democraticidade) e a questão da uniformização dos cursos a nível europeu».
Ao contrário do que pensa, estou atenta. Não é a única bandeira, mas tem sido a principal, de tal modo que parece a única. Mas sei que alguns estudantes estão atentos ao processo de Bolonha e conhecem bem os dossiers. Testemunhei com muito agrado isso mesmo na reunião do Senado anterior à que estamos a discutir. Só não percebo a razão pela qual essa questão é, depois, subvalorizada. (Espero que não seja pelo facto de só vir a reflectir-se sobre os estudantes vindouros e não sobre os actuais). De resto, a minha chamada de atenção não era dirigida aos estudantes de Coimbra, mas sim aos deputados de S. Bento.

3 - «A questão de Bolonha não detém exclusividade no que diz respeito ao futuro de uma Universidade Pública e Gratuita em Portugal. Para isso também é necessário que o acesso público à Universidade seja efectivamente democrático e não através do filtro do poder económico da família do estudante».
No meu post não discuti a justiça ou injustiça das propinas, embora tenha obviamente uma opinião sobre esse assunto: (Fica para outra oportunidade). Apenas contestei a legitimidade dos estudantes para interromperem o Senado, que não têm em qualquer caso.

4 - «É pena que o corpo docente não só seja insensível às questões que mais lesam os estudantes e a Universidade como boicote sucessivamente as tentativas de resolução dessas questões e ajam em conluio descarado com um governo que está a fazer um grave e descarado ataque ao Ensino Superior em Portugal».
O corpo docente não é um corpo, felizmente. Para corporativismo bastaram-nos 40 anos. Os docentes são pessoas, umas mais atentas e outras menos (como os estudantes); umas mais participativas e outras menos (como os estudantes); umas a favor e outras contra as propinas (como os estudantes); umas mais preocupadas e outras menos com a reforma de Bolonha (como os estudantes). Não posso falar por todos, mas a avaliar pela discussão e votação no último Senado, aquilo que nos une e nos distingue de alguns estudantes é que não saímos ou berramos quando a votação não nos convém.

Márcio Diogo Augusto (aluno da Universidade de Coimbra)
Maria Manuel Leitão Marques (Professora no mesmo lugar)

Em resposta a "O voto do Partido Socialista"

1 - «Parte do princípio que o Senado é o órgão legítimo para fazer o trabalho sujo do governo - fixar propina».
O Senado tem que fazer o que lhe compete, mesmo quando o que lhe compete não aquilo que lhe é mais agradável decidir. O Senado é um órgão de governo de uma instituição pública e por isso está sujeito às leis da República. Ossos de ofício para quem no Senado quer estar representado.

2 - «Se a aprovação do Orçamento de Estado implica a exclusão de cidadãos do exercício dos seus direitos e da sua própria existência no seio do Estado governado por quem o aprova, a opção hipotética que expõe não me parece tão descabida».
Não é isso que se passa. Tenhamos tento naquilo que falamos quando discutimos a fixação do valor de uma propina. Não se trata de proscrever ninguém.

3 - «Parte do princípio que os estudantes "desafiaram" a polícia».
Até a Televisão o mostrou! Quem deitou abaixo a grade que protegia a porta? Era, aliás, um cenário previsível.Mas não é essa a questão mais importante.

4 - «Parte do princípio que os estudantes não querem deixar funcionar o Senado quando, na verdade, o objectivo é não deixar fixar propinas».
Pois é, mas acontece que fixar o seu valor é da competência do Senado. É claro que podemos sempre decidir acabar com a gestão democrática. Comissão administrativa, venha ela. O governo que a nomeie e assim não seremos obrigados a decidir coisa nenhuma.

Márcio Diogo Augusto (aluno da Universidade de Coimbra)
Maria Manuel Leitão Marques (Professora no mesmo lugar)

Já não há respeito

Parece que a AAC vai desencadear uma acção judicial contra a polícia, por ela ter impedido aleivosamente os estudantes de exercer o seu direito fundamental a invadir a reunião do Senado da Universidade de Coimbra; e contra a própria UC, por o Senado da mesma ter deslealmente tomado decisões sem esperar pela invasão dos estudantes, violando assim o seu direito de interrupção.
Realmente já não há respeito nenhum pelos direitos dos oprimidos...

É o Governo que nomeia a direcção do "Diário de Notícias"?

O Expresso de ontem informava ter confirmado junto de «fonte governamental» a nomeação de Clara Ferreira Alves para directora do Diário de Notícias. Só pode ser intriga do semanário, pois claro. O que é que o Governo tem a ver com a direcção do Diário de Notícias? Será que a Lusomundo foi intervencionada pelo Governo de Santana Lopes?

Estudantes e polícia na UC

«Como toda a gente, detesto a polícia na Universidade, o que admito ser um reflexo de uma visão clássica da UC como feudo de fidalgos e de clérigos a quem a polícia serviria para manter a plebe (os futricas) no seu lugar.
Com a polícia à porta da Universidade, seria de temer o confronto entre a força da razão e a razão da força. O que vi foram duas forças que se opunham: uma em defesa de um processo democrático de decisão, outra a favor de interesses de uma minoria de privilegiados que repetidamente boicotou aquele processo.
O uso da força é quase sempre detestável, sobretudo numa Universidade onde se espera se esgrimam argumentos. Os polícias que eu vi na TV não se comportaram pior que os seus opositores; poderiam ter sido estudantes universitários se lhes tivessem sido dadas as oportunidades que os outros tiveram.»
(HC Mota)

Democracia interna no PCP

«Desculpará mas creio que o seu texto sobre o cumprimento das regras da lei dos partidos pelo PCP padece de diversas omissões, preconceitos e entorses.
Concretamente:
(...) Não faz nenhum sentido envolver as eleições de delegados ao Congresso do PCP numa fórmula geral de «proposta oficial, vinda de cima». De facto, nesse aspecto não há qualquer diferença entre a metodologia usada pelo PCP e pelos outros partidos. De acordo com o regulamento da fase preparatória do Congresso,qualquer militante se pode candidatar a delegado ou apresentar propostas para a eleição de delegados. E, Congresso após Congresso, creio que nunca houve qualquer impugnação ou reclamação de militante ou militantes por lhe ter sido negado esse direito. (...)
Ainda no âmbito do que chama de «proposta oficial, vinda de cima» creio que, nas opiniões que emitiu, parece não estar a ter em conta que a eleição da Comissão Política e do secretário-geral do PCP decorrem no Comité Central e eu pelo menos não conheço nenhuns Estatutos nem regulamentos internos do PCP que impeçam qualquer membro do Comité Central de, nessa reunião, se auto-propor ou propor outro membro do Comité Central para Secretário-geral ou de fazer propostas globais ou parciais quanto à Comissão Política a eleger.(...)»

(Adriana Sampaio, membro do PCP)

sábado, 23 de outubro de 2004

Ferro Rodrigues ainda lhe deve estar grato!

Agora Souto Moura vem dizer em entrevista ao Expresso que, tendo sido nomeado por um Governo socialista, ele «seria o último a querer prejudicar o PS» no caso "Casa Pia". O PGR não se dá conta de que com esta pequena manobra de diversão ele só pretende esconder que foi justamente por dever a nomeação ao PS que ele o deixou massacrar e ao seu secretário-geral durante meses, sem fazer nada, só para exibir uma zelosa independência e não poder ser acusado de estar a fazer um "jeito" a quem devia o cargo. Há complexos assim...

O financiamento do ensino superior

Se os deputados da oposição estivessem atentos ao que está a preparar-se para o ensino superior, estariam a perguntar à Ministra responsável se pensa financiar o segundo ciclo, após a entrada em vigor da reforma de Bolonha. Ou, pelo contrário, se vai limitar a comparticipação pública aos três primeiros anos, deixando às famílias e ao crédito a total responsabilidade pelo financiamento dos restantes dois. Essa sim é uma questão que influenciará decisivamente o futuro da universidade pública democrática em Portugal.

O voto do Partido Socialista

Que o Bloco de Esquerda tenha proposto um voto de protesto contra o facto de o Reitor da Universidade de Coimbra ter pedido à polícia que garantisse o normal funcionamento do Senado não me admira. Que o PCP tenha apoiado tal voto também não. Que o Partido Socialista tenha ido a reboque é que me espanta. Imagine-se que um grupo de cidadãos, incluindo até deputados do PCP e do Bloco, impedia o funcionamento do plenário da Assembleia da República, democraticamente eleita, como forma de protesto contra a votação do orçamento. E fazia isso uma, duas, três vezes. À terceira, o presidente chamava polícia para permitir que a Assembleia funcionasse. Que faria o Partido Socialista? Pelos vistos viria cá para fora protestar, desafiar a polícia, ou no mínimo aprovaria um voto de solidariedade com os manifestantes. (1975 foi de facto há muito tempo).

Os acontecimentos de quarta-feira em Coimbra

Os estudantes têm todo direito a manifestar-se, sejam muitos, sejam poucos, estejamos ou não de acordo com os seus objectivos. Não podem é ser poder e contrapoder ao mesmo tempo. Se querem estar representados no Senado, onde têm direito a falar, a fazer propostas e a votar, devem também, na hora própria, saber ganhar e saber perder. Em democracia, não podem é servir-se do Senado quando lhes convém e impedir o seu funcionamento pela arruaça quando tal não acontece.

sexta-feira, 22 de outubro de 2004

Confissões teológicas

É conhecida a forma decidida, sem quaisquer dúvidas, com que Durão Barroso envolveu Portugal na guerra do Iraque. Em Maio de 2003, poucas semanas depois da invasão, o então Primeiro Ministro admitia a participação portuguesa nas forças de estabilização, escusando-se a adiantar os moldes em que seria feita ou se seria enquadrada num mandato internacional. Questionado sobre a posição do PR acerca do assunto, Durão Barroso afirmou então que "o importante é responder às necessidades do povo iraquiano em vez de estarmos com uma discussão teológica ou formal".
Um mês mais tarde, poucas semanas antes do atentado que vitimou Sérgio Vieira de Mello e outros funcionários das NU no Iraque, Durão Barroso dizia "as NU, nesta fase, em vez de se perderem numa discussão teológica acerca de problemas de legitimidade, deveriam era colaborar pragmaticamente para a melhoria das necessidades do povo iraquiano".
Questionado agora nesta crise suscitada pela sua escolha para Comissário europeu do Sr. Buttiglione, indigitado para a pasta da Justiça e Liberdades, sobre se considerava a homossexualidade um pecado, Durão Barroso confessou finalmente: "é uma matéria teológica e em matéria teológica as minhas competências são muito limitadas".

P.S. Nada teológico, aposto, será na próxima semana o voto da esmagadora maioria das deputadas ao PE, sejam de direita ou de esquerda, ofendidas pelas tiradas arcaico-fundamentalistas do Sr. Buttiglione, em especial a última «pérola» sobre a capacidade educativa das mães sozinhas.

Ana Gomes

A democracia interna no PCP

O antigo dirigente comunista Edgar Correia tem razão quando diz que o PCP não cumpre a lei dos partidos no que respeita às eleições por voto secreto, visto que se limita a anunciar, contrafeito, o voto secreto na eleição do comité central no próximo congresso, quando a lei requer o voto secreto em todas as eleições, o que abrange desde logo as eleições de delegados ao congresso, bem como as posteriores eleições da comissão política e do secretário-geral. Causa estranheza que o partido se arrisque a ver judicialmente impugnado o congresso e as referidas eleições...
Para além disso torna-se desnecessário dizer que o PCP continua a não respeitar outro requisito essencial da democracia eleitoral, ou seja, a liberdade e igualdade de candidaturas em todas essas eleições, havendo somente a proposta oficial, vinda de cima. Enquanto os dogmas leninistas do "centralismo democrático" continuarem a prevalecer, o PCP estará sempre à margem das comuns regras democráticas na sua organização interna.

O sistema eleitoral norte-americano (adenda)

Um leitor chama-me a atenção para que o Colorado vai efectuar um referendo sobre a alteração do sistema eleitoral no sentido da repartição proporcional dos seus representantes no colégio eleitoral, que se realizará no mesmo dia das eleições presidenciais, para ter efeito imediatamente em relação a elas. Note-se que se em 2000 tivesse havido distribuição proporcional dos representantes do Colorado, Bush não teria sido eleito presidente, visto que ganhou as eleições nesse Estado com pouco mais de metade dos votos, beneficiando da totalidade dos 9 representantes, ao passo que só teria direito a 5 se tivesse havido representação proporcional, o que daria a vitória a Gore no colégio eleitoral nacional. Não é por acaso que os Republicanos se opõem à mudança de regime no Colorado.

O sistema eleitoral norte-americano é democrático?

Como se sabe a eleição do presidente dos Estados Unidos não é propriamente uma eleição directa. O que os cidadãos elegem é um colégio eleitoral composto pelos representantes dos Estados, cujo número é igual ao número de representantes de cada Estado no Congresso Federal (2 senadores mais um número de deputados proporcional à população de cada Estado).
O modo de eleição dos membros do colégio eleitoral é definido pelos próprios Estados, não estando fixado na Constituição federal. Ora quase todos os Estados escolhem esses representantes em eleições directas por um sistema maioritário de lista a nível de todo o Estado, ou seja, o candidato presidencial que tiver mais votos em cada Estado ganha todos os seus representantes (the winner takes all). Além de reduzir a disputa a dois candidatos, esse sistema permite que em caso de eleição mais renhida a vitória favoreça um candidato sem maioria de votos a nível nacional, como sucedeu com Bush nas eleições de 2000, em que Al Gore obteve maior percentagem de votos. Com apenas mais umas escassas centenas de votos na Flórida do que Gore (resultado aliás muito contestado) Bush ganhou todos os "grandes eleitores" deste Estado, um dos maiores, que lhe deram uma vitória tangencial no colégio eleitoral nacional.
Se fosse usado o sistema proporcional na eleição dos representantes estaduais deixaria de se verificar a discrepância referida. Mesmo se fosse usado o sistema de círculos uninomimais que servem de base à eleição da Câmara dos Representantes (como sucede no Nebraska e no Maine), também poderia haver uma distribuição menos iníqua dos "grandes eleitores" de cada Estado.
Ora o sistema maioritário de lista não é comum em sistemas democráticos, onde a alternativa é entre a eleição proporcional de lista ou a eleição maioritária individual. Os sistemas maioritários de lista foram em geral adoptados nos Estados autoritários que pretenderam exibir algum tipo de eleições (como sucedeu em Portugal durante o Estado Novo), com o fim de afastar qualquer hipótese de representação da oposição.
Infelizmente não se conhece nenhum movimento para alterar o controverso sistema eleitoral do Presidente dos Estados Unidos. A verdade é que a alteração só teria sentido caso fosse feita simultaneamente a nível de todo o país, visto que os Estados tradicionalmente republicanos não vão alterar o sistema se os Estados dominados pelo partido democrata o não fizerem também (e vice-versa). Por isso, a alteração só é de esperar, quando muito, nos Estados onde nenhum dos grandes partidos é hegemónico.

quinta-feira, 21 de outubro de 2004

Não há limites...

... para a leviandade e irresponsabilidade deste (des)governo. Santana Lopes propõe que os professores desocupados, por não terem horário atribuído, sejam utilizados como assessores dos juízes, não se sabe a fazer o quê!
Vai-se avolumando dia a dia a antologia dos dislates do primeiro-ministro...

as saudades que eu já tinha

Há um 4º andar na Avenida das Forças Armadas que, durante algum tempo, evitei. Olhar a casa, passar na rua. Depois habituei-me à ideia, voltei a usufruir da avenida quando havia necessidade de a percorrer e, inclusive, voltei naturalmente a observar - de passagem - o 4º andar onde passei o ano mais feliz da minha vida.
Durante algum tempo, tive a sensação de que estava abandonado. Mais tarde, repentinamente, comecei a aperceber-me de luz, de pintura nova, de mudanças na sua grande varanda.
Hoje, ao descer de carro a avenida, notei o vulto de um casal movendo-se atrás das persianas. Parado num semáforo, vi-os claramente e adivinhei-lhos os rostos e as intenções. Não tive dúvidas. Não se tratavam de novos moradores. Eram dois fantasmas, dois alegres fantasmas do tempo em que lá morou a felicidade.

20000 numa esplanada

Andava há dias a sentir um estranho mal estar físico cuja origem desconhecia. Súbito, fez-se luz: percebi que estava atrasado no meu elogio quinzenal ao Rui Branco. Assim, e aproveitando o pretexto de chegarem hoje às primeiras 20.000 visitas, saúdo o Rui, o Nuno Costa Santos, o Alexandre Borges, o João Pedro George e o Filipe Nunes (agora em Madrid, nas míticas pisadas do desaparecido Vasco Lourinho) - com um abraço de parabéns. Eles são a extraordinária equipa do ESPLANAR, um blog que, por entre poemas, traduções, análises, humor, literatura e comentários avulsos, vai cumprindo a nobre função de "Martinho da Arcada" virtual. Eles trazem-nos todos os dias as suas perspectivas sobre a vida, as relações humanas, a política, a cultura e o país - por isso saravá, um calduço no toutiço, um afago na nuca, uma festinha na moleirinha, um abraço amigo, fraterno e um grande bem-hajam!

1000 espectadores depois

O blogue e os espectáculos das Urgências continuam nos cuidados intensivos.

Domingos Farinho

Além de grande amigo, advogado, poeta, professor de Direito, aficcionado da blogoesfera e animador de meia-dúzia de blogues, o Domingos é um notável pensador político, um futuro comentador de mão cheia. E resolveu dar a cara, com coragem, em Uma Campanha Alegre - onde assina na primeira pessoa uma série de comentários e análises ao bagunçado forum onde nos calhou viver, este portugalzinho de hoje.

Para ler e aprender e discutir e comentar e linkar e.

uma questão de dialéctica

Último (e único) comentário sobre o Benfica-Porto:

Zahovic disse, um dia antes do jogo, que "não via como poderiam parar este Benfica".
Olegário Benquerença deu a resposta cabal 24 horas depois.

Referendar a Constituição europeia (2)

No que respeita à aprovação popular da Constituição, os dois primeiros referendos já marcados não suscitam dificuldades, salvo algum percalço inesperado. Na Espanha ela é praticamente pacífica em quase todo o espectro político. Em França, apesar da oposição da direita e da esquerda nacionalistas, bem como da divisão dentro do PS a esse respeito, uma sondagem recente dá ao "sim" uma confortável margem de quase 70%.
E em Portugal, como será?

Referendar a Constituição Europeia

Desta peça do Diário de Notícias de hoje retira-se que tudo se encaminha para uma revisão constitucional extraordinária (3 meses depois de uma ordinária!...) para permitir pôr a referendo a Constituição Europeia em si mesma, globalmente considerada, e não um conjunto das suas opções de fundo individualmente enunciadas. O que é incrível, e abona muito pouco a favor dos partidos e dos deputados, é que não se tenham dado conta atempadamente daquilo que era evidente, ou seja, que o pretendido referendo não cabia no actual texto da CRP...
Quanto à data do referendo, a indicada pelo Governo -- Abril do próximo ano -- pode considerar-se a data limite, tendo em conta o nosso calendário político do próximo ano (com a proximidade das eleições locais no Outono e eleições presidenciais no início de 2005). Em Espanha o referendo já se encontra marcado para Fevereiro, e em França aponta-se para Maio. Entretanto o Parlamento Europeu exprimiu a sua preferência pela simultaneidade dos referendos previstos em vários Estados membros, tendo indicado as datas de 5-8 de Maio.

quarta-feira, 20 de outubro de 2004

Malthusianismo profissional

«Gostaria imenso que pudesse dar-me a sua opinião sobre as ordens profissionais, (...) uma vez que sou um estudante do ensino superior que acha que a Assembleia da República deu um poder desmesurado às ordens profissionais. Sendo eu estudante de contabilidade numa das mais reconhecidas instituições de ensino superior nessa área vejo o meu ingresso na Câmara de Técnicos Oficiais de Contas vedado porque os membros que lá estão não querem concorrência.
(...) Esta questão não afecta só a mim mas a milhares de estudantes que ingressam no ensino superior a pensar que um dia vão poder desempenhar as funções para que estudam, e no entanto, não são as universidades mas sim as ordens profissionais que decidem o seu futuro. As ditas ordens profissionais argumentam com a qualidade dos profissionais que saem da universidade mas isso é falso. (...) Os que pretendam ingressar no Ordem dos Revisores Oficiais de Contas têm de pagar cinco mil euros para fazer os exames, e ainda fazer um estágio de três anos. Ora essa medida barra o acesso aos licenciados com menos possibilidades financeiras. Não está em questão o seu conhecimento.»

(E. Oliveira)

Comentário

Sou muito crítico desde há muito tempo da tendência malthusiana das ordens profissionais, no sentido de restringirem excessivamente o acesso à profissão, o que fazem pelos mais variados modos: elevando os requisitos académicos, conseguindo limitar logo o acesso aos cursos (como sucedeu escandalosamente com a Medicina), exigindo a "creditação" dos cursos pelas próprias ordens, criando barreiras ao acesso (exames à entrada), estabelecendo longos estágios profissionais, agravando a exigência dos exames de estágio, de modo a reprovar muitos candidatos, fixando taxas incomportáveis de estágio e de exame, etc. Infelizmente os estatutos da ordens, cujos projectos são elaborados pelas mesmas, são em geral "carimbados" sem discussão pela AR ou pelo Governo, sem que se definam as salvaguardas necessárias para garantir a liberdade de acesso. Penso que neste momento existem entre nós restrições desproporcionadas e injustificáveis à liberdade profissional.

O que resta

Num artigo de hoje no Público, Domingos Lopes defende a hipótese de Carvalho da Silva, o prestigiado secretário-geral da CGTP, para a liderança do PCP. Ainda há quem prefira alimentar ilusões de "aggiornamento" na Soeiro Pereira Gomes! Quando nada mais resta...

Poder judicial

«Serve o presente para manifestar a minha total concordância com o post "Poder Judicial, literalmente". A questão da nomeação de uma Académica reputada para a direcção do CEJ é a prova acabada de que a visão predominantemente estatutária que tem marcado a leitura de muitas nomeações confunde o essencial com o acessório. Isto é, ao polarizar-se o acerto ou desacerto da nomeação no "status" da pessoa nomeada, desmerece-se as qualidades da pessoa. Não interesssa se é magistrado ou não. Interessa antes se é uma pessoa capaz e habilitada ao exercício do cargo.
Ora, (...) manda a lógica que, na perspectivação contrária, não vislumbre qualquer "diminuição de capacidade" por parte dos magistrados (quaisquer que estes sejam) para o exercício de outros cargos públicos, em que também sobreleve o serviço à República. Apesar do "politicamente correcto" apontar para a hermetização dos magistrados nos tribunais, são ainda as mesmas razões de (i) "desendogeneização", (ii) de ausência de "incapacidades de exercício" e de (iii) enriquecimento de experiências que me levam a defendê-lo. Só assim evitaremos que "haja dois pesos e duas medidas", ou, nas suas acertadas palavras, que desejemos "sol na eira e chuva no nabal".»

(A F Cunha)

Passou-se!

As declarações do ministro dos Assuntos Parlamentares perante a Alta Autoridade para a Comunicação Social sobre a existência de uma espécie de "conspiração objectiva" do Expresso, do Público e de Marcelo Rebelo de Sousa para atacar o Governo são destrambelhadas.
Pelos vistos, para ser ministro deste governo não é preciso ser dotado de um mínimo de siso político. Qual será o próximo disparate do áulico de Santana Lopes?

Poder judicial, literalmente

Num agreste comunicado, a Associação Sindical dos Juízes (ASJP) manifesta «frontal discordância» em relação à nomeação de um não magistrado (a Prof. Anabela Rodrigues, da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra) para director do Centro de Estudos Judiciários (CEJ), a instituição pública de formação de magistrados judiciais e do Ministério Público. O sindicato dos juízes acrescenta que essa nomeação «não credibiliza as instituições judiciárias, e não é abonatória da independência do poder judicial».
O escândalo da ASJP tresanda a corporativismo vulgar. A lei não estabelece nenhuma "reserva judicial" desse cargo, e nada a impõe ou recomenda. Até há boas razões para uma direcção "leiga": do que se trata é de formar magistrados de acordo com o interesse geral da justiça e não necessariamente segundo a concepção endógena dos próprios interessados. Por último, não faz nenhum sentido neste contexto a invocação da «independência do poder judicial», que em nada é afectada pela qualidade do director do CEJ.
Só é pena que o zelo da ASJP na defesa da independência do "poder judicial" não se tenha expresso até agora numa igualmente «frontal discordância» da nomeação de juízes para cargos exteriores aos tribunais, na maior parte dos casos por escolha política do Governo, o que é seguramente muito mais comprometedor para a sua independência. Sol na eira e chuva no nabal...
(Revisto)

Direito à independência, de quem?

Promovida pelo blogue Briteiros está em curso uma petição para conferir à Madeira o direito à independência. O propósito é virtuoso, mas duvido que eles queiram, enquanto o dinheiro continuar a jorrar abundantemente de Lisboa para o Funchal. Não será melhor conferir o direito à independência do resto do País em relação à Madeira de Jardim?! Era sucesso garantido...

terça-feira, 19 de outubro de 2004

"Jardinismo"

Os resultados das eleições regionais da Madeira -- a vitória menos expressiva de sempre do PSD e o melhor resultado de sempre do PS --, poderão eles tornar previsível a alternância democrática na Madeira e significar o princípio do fim do "jardinismo", após quase três décadas de hegemonia? Tal é o tema do meu artigo no Público de hoje (também coligido no Aba da Causa, com link aqui ao lado, na coluna da direita).

Benfica

Só agora me recompus da derrota de domingo ante o Porto. Os meus amigos lampiões é que ainda não. Dizem que tudo é preferível a perder-se assim, espoliados pelos árbitros, e que teria sido bem melhor se tivéssemos sido dominados futebolisticamente pelo clube das Antas e ponto final. Discordo. Prefiro ter perdido assim. É bem mais transparente e encorajador para a Luz.

Não subscrevo, porém, a maioria dos comentários desbragados dos da minha cor. É claro que fomos prejudicados em momentos capitais - um golo e dois penaltis por marcar -, mas não quero acreditar que tenha havido qualquer intenção dolosa por parte de Benquerença e dos seus auxiliares. O que aconteceu dentro e fora das quatro linhas decorre da normalidade futebolística lusitana.

Primeiro, o golo negado. É bem verdade que o lance é de difícil análise e que só o recurso a meios tecnológicos modernos, comuns noutras modalidades e sistematicamente negados por esse grupo de gerontes incompetentes da FIFA e do International Board, poderá um dia introduzir mais rigor na arbitragem. Acontece que a forma como o lance se desenrola e o movimento de Baía a safar a bola de dentro da baliza não deveriam deixar dúvidas a uma equipa treinada e paga para ajuizar lances difíceis num desporto de alta competição. Bastaria que, nas acções de reciclagem, tivessem aulas de física. Na sua ausência e perante a conhecida correlação de forças no futebol português, os Benquerenças aplicaram a regra habitual: em situações difíceis, o Porto deve gozar do benefício da dúvida. O mesmo se passou nos dois lances sobre Karadas, ambos para castigo máximo, como as imagens e as fotos evidenciaram.

Fora das quatro linhas, foi a rasquice suprema, para gáudio do povão.
Luís Nazaré