terça-feira, 28 de dezembro de 2004

Vamos voltar a acreditar nas regiões?

É, de facto, uma excelente notícia, a do nome de Braga da Cruz para cabeça-de-lista do Partido Socialista pelo distrito do Porto. Subscrevo inteiramente o comentário de VM sobre os méritos pessoais e os desígnios de Braga da Cruz, quer no apego à causa da regionalização, quer no repúdio ao modelo de pacotilha ensaiado por Isaltino de Morais.

A herança da Santana Lopes

"A economia portuguesa à beira de nova recessão" -- tal é manchete de hoje do Jornal de Negócios.
Depois de ter recuado mais de 1% no terceiro trimestre do ano corrente, os indicadores económicos disponíveis apontam para a continuação do recuo no quarto trimestre, que agora termina, o que caracteriza tecnicamente uma nova recessão (dois trimestres consecutivos com crescimento negativo). Ainda mais grave do que a recessão é a irresponsável lenga-lenga da "retoma", que Santana Lopes e os seus apaniguados insistem em vender aos portugueses, contra todas as evidências, e ainda mais o criminoso anúncio do "fim da austeridade", decretado há poucas semanas pelo primeiro-ministro, a acompanhar os levianos sinais de descida dos impostos pessoais e as promessas de aumento do poder de compra.
Eis a herança da coligação: nem consolidação orçamental nem retoma económica. Só sobrou a demagogia, a leviandade e a desonestidade política. Tal é a verdadeira marca da coligação governamental e, em especial, do seu presente líder: incompetência, irresponsabilidade e descrédito. É isso que está em causa nas próximas eleições.

Referências

1. Textos
"Referendo a Santana", de Miguel Coutinho
"Os equívocos da política económica", por Luís Mira Amaral, no Diário Económico (indisponível na edição online)

2. Entre aspas
«Os dados relativos à parte final de 2004 mostram, com toda a clareza, que o mito da retoma se esfumou e que a competitividade da economia continua a agravar-se. Para 2005, o melhor que podemos esperar é que nos livre dos simplismos que pretendem resolver à martelada problemas complexos e nos reserve um pouco mais de bom senso, de honestidade política e também da sageza necessária para ajudar a encontrar soluções reais para os problemas, em vez daquela com que alguns intelectuais se comprazem em recordar a nossa arraigada incapacidade para os resolver.»
"Tempo de Balanço", por Teodora Cardoso.

Diário eleitoral (2)

A candidatura de Braga da Cruz a encabeçar a lista socialista do Porto -- hoje noticiada pelo Jornal de Notícias -- poderá ser um sinal de que o PS vai retomar o dossier da regionalização se ganhar as eleições? Antigo presidente da Comissão de Coordenação Regional do Norte, conhecido adepto da regionalização -- no modelo das cinco macro-regiões correspondentes às circunscrições territoriais das actuais Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) --, crítico da organização intermunicipal de geometria variável lançada pelo Governo PSD-CDS, o ex-ministro de António Guterres bem pode protagonizar um novo impulso regionalizador no futuro Governo.
No entanto, a retoma do tema da regionalização exige a maior prudência, importando tirar as lições do desaire no malfadado referendo de 1998. Ninguém deve ter ilusões de que um novo referendo nos mesmos termos e nas mesmas condições está igualmente condenado. As pessoas não votam mapas abstrusos nem soluções desconhecidas, cujas vantagens e desvantagens não possam medir. Para ter êxito, a regionalização tem de ser o desenvolvimento "natural" das estruturas para-regionais existentes, designadamente as CCDRs e demais organismos da administração regional do Estado. Importa proceder à desgovernamentalização e democratização progressiva das CCDRs, conferir-lhes personalidade jurídica própria (como "institutos públicos territoriais") e ampliar as suas atribuições e os seus recursos financeiros. No final só há que referendar a sua transformação em autarquias territoriais regionais, com órgãos directamente eleitos, um "pequeno" passo que não será tão vulnerável aos fantasmas anti-regionalistas como foi a desastrada tentativa de há mais de 6 anos.
Nesta matéria toda a precipitação pode ser fatal e a demora, virtuosa.

A difícil transição democrática

A vitória de Iuchenko nas eleições presidenciais da Ucrânia parece representar a retoma do processo de transição democrática, que tinha sido "capturado" por uma autocracia após a independência, há mais de uma dúzia de anos. Resta saber se as condições económicas e políticas possibilitam a estabilização e a consolidação democrática desse País saído da desintegração da antiga URSS.
No antigo mundo comunista há processos de democratização bem arrastados no tempo e de êxito ainda incerto (como mostram também os casos da Bielo-Rússia e da própria Rússia). A mudança ucraniana pode bem significar o reinício da revolução democrática no extremo Leste Europeu.

Memórias acidentais - Henrique de Barros



Recebi há dias a fotobiografia de Henrique de Barros organizada pela Comissão executiva da comemoração do centenário do seu nascimento, a cuja comissão de honra me aprouve pertencer.
O seu nome e a sua obra de economista agrícola eram conhecidos de todo o estudante de esquerda nos anos 60. Mas foi somente em 1969 que o conheci pessoalmente, no âmbito da Comissão Democrática Eleitoral (CDE) de Coimbra, que o convidou para cabeça de lista da oposição democrática às "eleições" desse ano para a Assembleia Nacional, realizadas no contexto da incipiente (e depois frustrada) "liberalização marcelista", convite que ele aceitou com notável galhardia, tanto mais que, embora sendo natural de Coimbra, vivia desde criança em Lisboa. Recordo a sua paciente firmeza nos embates internos com os raros trotskistas e maoistas que contestavam a ampla convergência das forças oposicionistas, bem como a sua seriedade e discrição nas poucas sessões públicas que a escassez de meios e as limitações oficiais permitiam realizar.
Voltei a encontrá-lo depois da revolução na Assembleia Constituinte (1975-76), para a qual ele tinha sido eleito pelo Partido Socialista, e da qual viria a ser eleito Presidente. Nas conturbadas circunstâncias de então foi sempre uma voz de equilíbrio, moderação e seriedade, que contribuiu decisivamente para o êxito dos trabalhos. A sua assinatura de presidente da Constituinte consta do exemplar autêntico da Lei Fundamental de 1976. Não foi por simples deferência que no final da missão foi aprovado por unanimidade um voto de reconhecimento em sua homenagem.
Ministro de Estado no primeiro Governo de Mário Soares (1976), marcava por vezes a sua presença na AR, intervindo em alguns dos debates mais importantes dessa legislatura decisiva (em que também participei, na oposição...), por exemplo na controversa lei da reforma agrária (que ficou conhecida por "Lei Barreto", do nome do então ministro da Agricultura, António Barreto). Mas a sua obra governativa ficaria sobretudo associada à criação do Instituto António Sérgio do Sector Cooperativo, cuja defesa pessoalmente assumiu em São Bento e que culminava uma vida de dedicação à causa do cooperativismo, na senda de um dos seus mestres, António Sérgio.
É por tudo isto que entre os "pais fundadores" da actual República democrática tem de se incluir necessariamente Henrique de Barros.

(Pode ver a gravura em tamanho maior clicando sobre ela.)

segunda-feira, 27 de dezembro de 2004

Referências

1. Textos
"O PS, as Listas e o Poder", por Rui Namorado.
"And the Olho Vivo Goes To...", por Eduardo Cintra Torres.

2. Entre aspas
«A lei deve interferir sem pejo na orgânica geral dos partidos e impor-lhes uma maior democraticidade interna, tão essencial à concorrência das ideias e dos projectos como à renovação das elites. Estamos mal servidos de políticos, reconheça-se, porque também estamos mal servidos de democracia na esfera interna dos partidos.»
"A Renovação da Classe Política", por Rui Valada.

A Ambar do nosso descontentamento

Há quarenta anos, a marca Ambar animava as caricas dos putos da minha rua com as caras dos seus ciclistas, protagonistas secundários das Voltas a Portugal da era analógica. Lembro-me do Dinis Silva, do Wilson Sá e de outros cromos que o destino não quis transformar em campeões, mas que marcaram a memória da minha geração. Mais tarde, já adulto, Ambar foi sinónimo de agendas bem engendradas, daquelas onde numa só folha se podia fazer a programação semanal e cada dia era dividido nas suas dez horas úteis. Durante os tempos pré-globais, a Ambar produziu as recargas com que os seus inúmeros clientes substituíam, ano após ano, o caderno de registos passados, de um modo simples e eficiente. Em 2002 acabaram-se as recargas e, em seu lugar, apareceram novos formatos de capa rígida, três vezes mais caros. À falta de concorrência, passámos (nós, os das agendas analógicas) a ter de efectuar penosas operações de corte e colagem, que só a devoção à marca e ao melhor formato do mundo justificavam. Este ano, após incessantes buscas nas papelarias tradicionais lisboetas, lá descobri por fim (na Rua do Comércio) o caderno desejado, agora mais caro, mais raro e mais modernaço. Ao que soube, a Ambar reduziu ao mínimo (a três) o número de modelos e prepara-se, em 2006, para liquidar o formato que tantos clientes fidelizou. Não conheço os manuais de gestão em que a empresa se terá inspirado nem a sua noção de serviço, mas sei que muitos dos seus fãs desertarão sem hesitações diante do primeiro concorrente chinês que se lhes apresentar em Dezembro de 2005. Malvado mundo global!

Diário eleitoral (1)

O procedimento eleitoral das eleições de 20 de Fevereiro está em marcha. Foi publicado pela Comissão Nacional de Eleições o mapa oficial da distribuição territorial dos 230 deputados pelos 22 círculos eleitorais, correspondentes aos 18 distritos administrativos do Continente, às duas regiões autónomas e aos dois círculos de residentes no estrangeiro (Europa e resto do Mundo). Tirando estes dois últimos, que legalmente elegem dois deputados cada um, independentemente do número de eleitores neles recenseados (em geral baixo), os demais 226 deputados são repartidos pelos círculos eleitorais do território nacional proporcionalmente ao número de eleitores de cada um. Por isso pode haver variações de eleição para eleição, se tiver havido variação relativa da população. Foi o que sucedeu desta vez, em que o Madeira elege mais um deputado (passa a ter 6) em prejuízo de Portalegre, que agora elege somente dois. Em contrapartida Lisboa continua a eleger 48 deputados e o Porto, 38.
Sendo proporcional o nosso sistema eleitoral, como pode haver um mínimo de proporcionalidade na repartição dos deputados pelos partidos concorrentes com círculos de dois deputados? E como pode haver um conhecimento mínimo dos candidatos e dos deputados eleitos com listas de dezenas deles? Independentemente das grandes reformas eleitorais até agora falhadas, não seria de pensar em fundir os círculos mais pequenos (Trás-os-Montes, Beira Interior e Alentejo) e fraccionar os círculos maiores?

Almas gémeas

Respigando as notícias nacionais durante a minha ausência no estrangeiro topo com os rasgados elogios mútuos de Alberto João Jardim e de Pinto da Costa, por ocasião de uma visita deste à Madeira. Para completar a ideia de Jardim na presidência da República só faltava mesmo imaginar Pinto da Costa como primeiro-ministro! Estão bem um para o outro. Só o PS portuense parece não se dar conta disso, no seu continuado e interesseiro "flirt" com o dirigente do F. C. Porto...

A incógnita

Num texto do Público de terça-feira passada sobre a ideia de José Sócrates de retomar a co-incineração, presumivelmente na cimenteira de Souselas, perto de Coimbra -- texto de que só agora tomei conhecimento, por ausência no estrangeiro -- escreveu Ana Sá Lopes:
«A incógnita reside no protagonista desejado pelos socialistas para cabeça-de-lista por Coimbra: Vital Moreira, que chegou a ser deputado nos tempos do guterrismo, "rompendo" depois e abandonando o Parlamento. Vital foi contra a co-incineração e tomou várias posições públicas - nomeadamente em artigos do PÚBLICO - contra a ideia defendida pelo então ministro do Ambiente, José Sócrates.»
Importa desfazer a incógnita: (i) mantenho a minha posição crítica sobre a co-incineração em geral e sobre a sua localização em especial; (ii) o meu apoio ao "Fórum Novas Fronteiras" não envolve a concordância com todas as posições do PS (são conhecidas as minhas divergências noutros pontos, por exemplo no caso das SCUT); (iii) a minha hipotética candidatura nas próximas eleições não tem nenhum fundamento.

Promiscuidades jornalísticas

«[Sobre o seu post acerca de um mail do jornalista João Oliveira] é sintomático que o autor do e-mail, João Manuel Oliveira, seja um assessor em efectividade de funções. A displicência com que faz as acusações (com alta probabilidade, todas verdadeiras) também é sintomática. Que isto se escreva e nada aconteça é, igualmente, sintomático. Finalmente, não deixa de ser sintomático que alguns comecem a estrebuchar quando o CJ avança, sem tibiezas, na defesa da dignidade da profissão.
O comentário à «entrevista» a Morais Sarmento não foi o primeiro sobre a promiscuidade entre assessores, agências de comunicação e jornalistas publicado no CJ On Line.
Sugiro, por exemplo, uma visita a [este sítio

(João Alferes Gonçalves)

domingo, 26 de dezembro de 2004

Foguetório existencial

Ao fim de seis meses como director de um jornal diário, e absurdamente embalado pela nostalgia natalícia, resolvi fazer um balanço interior do que em mim mudou nestas semanas de delírio. Poupo os detalhes da alma, ainda assim o essencial. Mas sacrifico à partilha, os desabafos a que, por conveniência de linguagem, reduzo, desde já, a uma espécie de foguetório existencial sem a mais pequena importância.
Ainda assim, devo dizer, os delírios perturbaram-me a ponto de uma noite mal dormida, de 25 para 26 e sem qualquer interferência, antes assim fosse, de uma qualquer rena desorientada por ter perdido o rasto do grupo dos milagres.
Em seis meses - quando supostamente estaria condenado à construção de um pacto com a candente sociedade de informação -, sinto-me mais ignorante, desinteressante e amargo do que antes de ser director de A Capital. Não, não me interpretem mal. Leio todos os jornais portugueses e alguns estrangeiros, estou mais de 12 horas ligado a canais de informação, o meu computador apita quando cai alguma informação da agência e sou capaz de falar de petróleo, macroeconomia, situação política na Ucrânia, Bush, eleições portuguesas, subsídios do teatro... Mas em tantas semanas li um único livro, fui três ou quatro vezes ao cinema - sempre à meia-noite -, perco as peças de teatro dos meus amigos, perco os meus amigos, almoço com políticos, homens de negócios, gente à procura de emprego e que não vê motivo para que eu não seja portador de boas notícias. Raramente janto.
Mas estou feliz. Ainda assim estou feliz. Vou fechar a edição de amanhã. Na primeira página, a fotografia do homem que premiámos como personalidade do ano na cultura: Nuno Teotónio Pereira. Depois, sou capaz de ir ver Alexandre, o Grande. Ou, então, quem sabe, regressar aqui. E gastar palavras à espera que, desse lado, continue a sentir a sua presença.

Luís Osório

sábado, 25 de dezembro de 2004

Ainda há momentos fantásticos

Felizes dos que tiveram hoje a oportunidade de assistir, na RTP 2, a mais um magnífico espectáculo do Cirque du Soleil, o Varekai, actualmente em digressão pela costa leste dos Estados Unidos. E um cumprimento especial a José Pacheco Pereira pelo seu sublime post natalício, no Abrupto, sobre as fronteiras do universo. A qualidade do texto e da fotografia de Saturno obtida pela sonda Cassini dispensam quaisquer outros comentários.

sexta-feira, 24 de dezembro de 2004

Pinto da Costa olé!

Para quem alguma vez se deixou embalar pelos cantos regionalistas do presidente portista, a recente visita do grémio das Antas à Madeira permitiu desfazer todas as dúvidas sobre a elevação das suas ideias políticas. Pinto da Costa revelou finalmente o que lhe vai na alma - uma profunda devoção por Alberto João Jardim. Viva o anarco-populismo atlântico! Morte a Lisboa e às suas gentes mouras e cubanas!

Carta ao Menino Jesus

Eis os meus pedidos natalícios, aqui ao lado, no Aba da Causa.

quarta-feira, 22 de dezembro de 2004

Co-imolação?

O frenesim de Luís Nobre Guedes nesta fase terminal da governação não tem passado despercebido a ninguém, a começar pelo próprio Santana Lopes. Aparentemente, os dois ter-se-ão desentendido, à antiga portuguesa, a propósito da requentada polémica sobre os resíduos tóxicos. A caminho da co-imolação?

segunda-feira, 20 de dezembro de 2004

Eleições à força

Se a violência que reina no Iraque tivesse lugar em qualquer outro país do mundo, já a comunidade internacional, com os EUA à cabeça, teria exigido o adiamento das eleições. Mas Bush acha que não. E os restantes chefes de Estado calam-se.
Fingir é a marca anglo-americana em tudo o que diz respeito ao Iraque: fingir que existiam armas infernais, fingir que tinham cobertura da ONU para invadir o país, fingir que as tropas estrangeiras eram desejadas, fingir que o país está pacificado e em reconstrução, fingir que o petróleo iraquiano não lhes interessava mesmo nada.
Agora, mais um fingimento: há condições para proceder a eleições democráticas no Iraque. E a seguir? Quererão convencer-nos de que a ONU deve assumir os cacos que deixam por todo o país?

domingo, 19 de dezembro de 2004

Jaime Ramos de costas

O episódio da troca de mimos entre Jacinto Serrão, líder da bancada socialista madeirense, e Jaime Ramos, líder da clique jardinista primária, deixou os continentais boquiabertos. Não pelo nível da discussão, a que a pérola do Atlântico há muito nos habituou, mas por dois factores singulares: o primeiro, a coragem de alguém pôr a nu, nos mesmos modos de Alberto João e seus sequazes, as singularidades do progresso madeirense; o segundo, o facto de a reportagem televisiva, a cargo da RTP Madeira, ter tido o primoroso cuidado de nunca ter filmado Jaime Ramos de frente durante a altercação parlamentar. É caso para dizer que há conluios traseiros na terra de Jardim.

Lobotomia: sim ou não?


O inefável ministro Arnaut transmitiu, em entrevista ao Expresso desta semana, o seu pensamento profundo sobre a actual situação política. O homem perorou sobre tudo e todos, da forma directa e cristalina a que nos habituou, não poupando ganchos aos amigos e aos inimigos.

Por mim, aceito o desafio de Arnaut: há que confrontar os políticos com questões essenciais, por forma a que os eleitores possam decidir conscientemente. Lanço, pois, uma questão moderna: alguns segmentos mais extremistas defendem a lobotomia compulsiva para os casos manifestos de indigência mental. O que pensa sobre a matéria o ministro José Luís?

sexta-feira, 17 de dezembro de 2004

Decadentes mas felizes

Ou a preocupante situação da economia portuguesa, aqui ao lado, no Aba da Causa. Boas Festas.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2004

Portas-aviões

Fui acompanhando - pela imprensa, apenas - o folhetim da compra dos aviões C-130J, da Lockheed Martin, escolhidos pelo Ministro da Defesa Paulo Portas para substituir os A400M da Airbus europeia - que antes tínhamos encomendado, sendo co-produtores e co-proprietários, com evidentes vantagens para a industria aeronautica e outras industrias nacionais de alta tecnologia.
A decisão de mudança do Ministro, anunciada em Agosto de 2002 e reiterada por altura da invasão do Iraque, em Fevereiro 2003, constituiu um dos primeiros sinais do afastamento de Portugal da convergência europeia e do clientelismo do Governo Barroso-Portas relativamente aos fabricantes de armamento americanos. Recordo-me de ter levantado, numa sessão contra a guerra no Iraque na Aula Magna em Março de 2003, a questão do abandono do projecto europeu dos A400M, provocando grande crispação no Governo e em alguma imprensa veneradora do poder (mas, significativamente, sem incomodar a AR...).
Leio agora, no Diário de Notícias de 12.12.04, três interessantes artigos de investigação do jornalista Joaquim Brito Camacho, pondo o dedo na ferida outra vez e sublinhando um sem número de problemas que têm impedido a Força Aérea dos EUA, que contratou a aquisição do mesmo tipo de avião à Lockeed Martin, de utilizar os referidos aviões em missões operacionais. O DN salienta ainda a desvantagem do método da aquisição aparentemente seguido pelo Ministro Paulo Portas, permitindo a escalada de ano para ano dos preços dos aviões.
E enquanto se compram ou não se compram, presumo que os C-130 possuidos pela Força Aérea portuguesa deixaram de ser modicamente «up-graded» nas OGMA, para poderem servir no lugar dos A400M enquanto estes não estivessem disponíveis.
Diz o DN que, como Portugal, só a Itália de Berlusconi abandonou o projecto europeu da Airbus. O Reino Unido, a França, a Alemanha, a Bélgica e a Espanha mantiveram o compromisso inicial.
Numa altura em que o processo de desenvolvimento e reforço da Política de Segurança e Defesa Europeia avança significativamente, entre outros aspectos com a missão Althea na Bósnia-Herzegovina e a criação da Agência Europeia de Defesa, antecipando mesmo o previsto na Constituição Europeia e procurando encorajar programas de cooperação entre os Estados Membros na perspectiva da criação de um mercado europeu de equipamentos de defesa, seria interessante avaliar ao certo onde nos deixa o desgoverno da coligação PSD-PP.
Onde ficamos, afinal, relativamente ao projecto europeu de construção do futuro avião militar europeu pela Airbus?
Desistimos ou não, tivemos de pagar alguma indemnização pela desistência ou não? E a que distância nos deixa a trindade Barroso-Portas-Lopes do processo de integração europeia em matéria de Segurança e Defesa? Quanto nos periferizou mais em relação à montagem da Agência Europeia de Defesa ? quantos portugueses a vão integrar, por exemplo, que estruturas nacionais vão com ela inter-agir? Qual é hoje o compromisso do Estado português em relação à aquisição do avião C-130J à Lockheed Martin, na sequência do que foi anunciado pelo Ministro Paulo Portas em 2002 e 2003 ?
Segundo o DN, "o Ministério da Defesa português não respondeu às perguntas do DN sobre este assunto".

Ana Gomes

Trapalhadas "non stop"

Mesmo demitido e em funções de mera gestão, o Governo Santana-Portas não pára de brindar o País com novas trapalhadas. Ontem de manhã anunciava-se que os veículos monovolume e os jipes iam ser equiparados aos automóveis ligeiros nas auto-estradas, passando portanto a pagar menos portagens; mas à tarde uma nota oficial veio dizer que afinal eram somente os monovolumes os beneficiários da redução (Autoeuropa oblige...).
A TSF, reproduzindo uma rádio local, emitiu as afirmações incendiárias de um secretário de Estado sobre os serviços de bombeiros, o qual veio logo depois veio dizer que a gravação tinha sido feita clandestinamente, mas sem denegar as afirmações. A referida rádio local de Portalegre veio desmentir categoricamente o governante (?), afirmando que ele sabia que estava a ser gravado, tendo um microfone da emissora à sua frente.
De manhã os jornais faziam manchete do propósito governamental de venda maciça de edifícios públicos, entre eles alguns muito emblemáticos; ao fim do dia o Governo veio dizer que afinal não ia alienar a propriedade mas sim somente o direito da sua exploração (o que não passa de uma forma eufemística de dizer que o Estado realiza um empréstimo sobre eles, assegurando a amortização do mesmo com a afectação de uma renda paga sobre os edifícios em causa...).
Comentários para quê? É o Governo Santana-Portas em todo o seu esplendor. Está-lhe na massa do sangue...

Não acreditar quando convém

«Certamente também registou aquilo que se poderá chamar a frase da noite, no momento da assinatura do acordo do PP/PSD.
Disse Paulo Portas: " Se nós (PP e PSL) acreditássemos em sondagens já teríamos mudado de ramo "...
Então o que devemos entender? Como não mudaram (ainda) de ramo, continuam a acreditar?
Então as sondagens eram credíveis quando feitas pela AMOSTRA - por PP e PSL - e agora não servem para nada, quando não lhes são favoráveis ?
E nós? Podemos acreditar neles?»

(NH)

A memória do vinho do Porto em saldo

«Na exposição "Jardins Suspensos", que é a Exposição Programática para o Museu do Douro, na Rua da Ferreirinha, junto ao Solar do Vinho do Porto, uma e outro instalados no Armazém da Ameixoeira, ou Armazém 43, na cidade de Peso da Régua, uma das últimas fotografias que os visitantes podem ver é precisamente a do edifício-sede do Instituto dos Vinhos do Douro e Porto, na cidade do Porto. (Hoje, a sede legal desse Instituto é precisamente na Régua). E os técnicos do Museu, quando ali chegam, chamam normalmente a atenção dos visitantes para as características do edifício, mas logo de imediato mostram uma fotografia de fiscalização de um carregamento de Vinho do Porto, no cais, pronto a exportar. Lembra-se o papel do Instituto do Vinho do Porto na credibilização desse produto que tem afirmado Portugal no Mundo como um produto de alta qualidade.
Daí que eu também seja levado a perguntar: porquê estes edifícios e não outros? Porquê vender o edifício do IVDP, na baixa portuense, que tem um grande significado para o sector do Vinho do Porto, para o Douro, para o país?
Como em tempos me opus à venda em hasta pública da sede da Casa do Douro, também me oponho a esta, porque a considero uma péssima opção. E, a ajuizar por alguns especialistas, nem é um solução sustentável para resolver o problema do "deficit".»

(A. Martinho)

quarta-feira, 15 de dezembro de 2004

Durão queixinhas...

Segundo o "Público" de ontem, o Presidente da Comissão Europeia vai queixar-se ao Eng. José Sócrates por alguns deputados socialistas (entre os quais eu) terem ousado não votar a favor da "sua" Comissão em Novembro.
Expus as razões por que me abstive na declaração que efectuei logo após a votação no Parlamento Europeu e que publiquei no mesmo dia neste blogue. Razões alheias à pessoa do novo Presidente da Comissão - sobre quem já no PE tinha especificamente votado em Julho - mas resultantes de preocupação com actuações e antecedentes de alguns Comissários.
O que estava em causa na votação do PE em Novembro era a Comissão Europeia e não o seu Presidente. Mas não terá sido esse o entendimento do Presidente da Comissão: "Provavelmente prefeririam que o presidente da Comissão fosse um grego em vez de um português", indignou-se Durão" - escreve o jornal, sugerindo despeito presidencial disfarçado de "bairro-nacionalismo". A mim, assumidamente, mais que a nacionalidade, importa-me que o Presidente da Comissão seja íntegro, competente, progressista e empenhado na construção europeia. Se for português, tanto melhor.
Não estava em causa na votação no PE qualquer "consenso europeu entre os dois maiores partidos portugueses", cuja quebra, relata o "Público", terá "profundamente surpreendido, magoado e incomodado" o Dr. José Manuel Barroso. Em Portugal, o julgamento do PM Barroso já tinha sido feito nas eleições europeias, pelo povo português. No PE não se julga - nem julgará - o Dr. Barroso, líder do PSD, mas sim o líder da Comissão.
Que seja o próprio Dr. Barroso a acusar o PS (ou alguns deputados do PS) de "quebrar o consenso europeu" entre os dois maiores partidos portugueses, só dá vontade de rir (a quem já tiver passado a indignação)...
Mas, então, não foi o Dr. Barroso que assinou a "Carta dos Oito", provocando a clivagem da Europa na questão do Iraque? Não foi o Dr. Barroso que foi anfitrião na Cimeira dos Açores, cavando ainda mais a ruptura entre parceiros europeus (que o diga a Presidência grega da UE de então, que procurava uma posição convergente)? Então não foi o Dr. Barroso que, apregoando apoiar o Comissário Vitorino para Presidente da Comissão ("para português ver" porque sucesso não teve nenhum), em Bruxelas cozinhava a fuga que o havia de catapultar da governação nacional para os píncaros da liderança europeia? Então, não foi o Dr. Barroso que rompeu o consenso nacional que desde 1974 pusera o Portugal Democrático a respeitar o Direito Internacional - consenso e posicionamento absolutamente essenciais para Portugal ter podido ajudar Timor-Leste a concretizar o direito à auto-determinação ? Ou não foi o Dr. Barroso que, marimbando-se para o PS, o Parlamento e o povo português, pôs Portugal a apoiar a invasão ilegal do Iraque?
Não sei dos dotes de consolar do Eng. Sócrates. Não será melhor ir queixar-se à mãezinha?

Ana Gomes

Turquia - exigência para aderir à UE

Hoje no Parlamento Europeu votei a favor da abertura das negociações com a Turquia.
Votei a favor da abertura de um processo de adesão, o que não implica decidir sobre o resultado final desse processo, que vai demorar anos a negociar. E votei contra um estatuto de parceria, como o que uma certa direita europeia agora quer oferecer à Turquia, porque isso significaria que a UE não honraria as suas promessas, que respeitavam à possibilidade de adesão e mais nada. Tal não exclui, porém, que no decorrer do percurso negocial, ambas as partes venham a preferir outra solução do que a adesão.
Votei a favor, determinada, sobretudo, pelos testemunhos de inúmeros defensores dos direitos humanos turcos que no PE (e fora dele) confirmaram a existência de desenvolvimentos positivos na situação da Turquia, em especial nos últimos dois anos do Governo Erdogan. Desenvolvimentos que são resultado da pressão exercida pela UE. Desenvolvimentos que não chegam, claramente: ainda há mais de 5.000 presos políticos na Turquia, ainda há tortura nas cadeias, ainda não se ensina a língua curda nas escolas oficiais nas zonas curdas, ainda não foram reintegrados os milhares de curdos desalojados das suas aldeias, a Turquia ainda ocupa militarmente parte de Chipre, etc... Mas uma ruptura do processo de abertura de negociações nesta fase teria consequências desastrosas para a situação dos direitos humanos e para o desenvolvimento das instituições democráticas e o reforço da sociedade civil na Turquia.
Votei a favor, não obstante estar ciente de que a Europa, que ainda não digeriu o último alargamento, terá cada vez mais dificuldade em aprofundar a sua construção se a perspectiva da adesão de um colosso como a Turquia se concretizar; até porque a partir daqui não haverá coerência em excluir a possibilidade da entrada da Ucrânia, da Bielo-russia, da própria Russia...
Mas votei a favor, porque a UE não podia, agora, virar as costas ao povo turco, renegando os seus próprios compromissos. Compromissos, frequentemente reafirmados ao longo de tantos anos por governos de direita e de esquerda, incluindo socialistas portugueses. Compromissos assumidos sem ponderação das implicações concretas para a UE e reflectindo, muitas vezes, um alinhamento acrítico pelas posições dos EUA e de outros, porventura mais interessados na divisão ou na diluição do que na união da Europa.
Votei a favor, apesar de os governantes europeus de esquerda ou de direita levianamente não terem até hoje promovido uma reflexão séria sobre para onde deve ir a Europa e quais os limites das suas fronteiras geográficas. Porque recuso as fronteiras político-culturais da "Europa - clube cristão" e não quero dar trunfos ao cumprimento das profecias desastrosas para a Humanidade do "confronto de civilizações", sobretudo numa era de tanta injustiça e tensão política a fomentarem o terrorismo internacional.
Votei a favor, no pressuposto de que a Turquia não pode protelar o reconhecimento da República de Chipre, membro da UE, nem protelar a retirada da parte que ocupa militarmente.
Votei a favor do reconhecimento do genocídio do povo arménio por parte da Turquia, por considerar que ele é essencial para a reconciliação com os seus vizinhos e com a sua história e condição indispensável para consolidar um Estado de Direito.
Não gostei nada, francamente, de parte da argumentação que as autoridades e algumas personalidades turcas estão a usar para levar a UE a dar luz verde à abertura das negociações, sobretudo havendo ainda tanto trabalhinho de casa por fazer.
Mas votei, finalmente, a favor, por acreditar que a UE estará assim em melhor posição para ser exigente e vigilante quanto à evolução à Turquia em matéria de respeito pelos direitos humanos e edificação do Estado de direito democrático. Procurarei zelar por isso, como deputada ao PE.

Ana Gomes

A maldição do défice

Vejo na capa do Jornal de Negócios de hoje as fotografias dos edifícios sede do Instituto da Vinha e do Vinho e do Instituto Camões, que constam da lista de imóveis do Estado a alienar para realizar os fundos suficientes para manter abaixo dos 3% o défice nominal das contas públicas do corrente ano. Depois no corpo da notícia vejo mencionado também o edifício do Instituto dos Vinhos do Porto e do Douro!
É revoltante! Que racionalidade pode justificar tal alienação, tratando-se, como se trata, de edifícos públicos de grande qualidade arquitectónica e de grande simbolismo para os respectivos sectores (nomeadamente os relacionados com o vinho)? E porquê esses edifícios e não outros, menos simbólicos? Sendo edifícios necessários para o funcionamento dos organismos públicos neles sedeados, quanto não vai o Estado ter de pagar em rendas no futuro para manter esses organismos nos mesmos edifícios ou noutros?
Maldito défice, mais a incompetência de quem se colocou na situação de ter de recorrer a tais medidas para o respeitar!

Um blogue chamado "Pi"

Já não me lembro da sua fisionomia, pois foi já há uns bons anos, em plena rua, que me foi apresentado pelo pai, meu amigo e antigo correligionário político. Era ele então um jovem estudante à procura de orientação para os seus estudos. Lembro-me de termos falado de sociologia, que o interessava e que outrora também me atraíra. Hoje quando recebi um mail dele a informar-me da criação do seu blogue, verifiquei que não tive grande êxito nessa longínqua conversação. Na verdade, o Álvaro Peliz -- assim se chama o jovem -- tornou-se cientista e tem um blogue chamado Pi, dedicado à vida científica e aos problemas dos cientistas mais jovens dentro das instituições científicas.
Diz-me que «talvez seja apenas mais um blog, talvez não tenha pernas para andar, mas logo se verá». Aqui fica uma ajuda, dando-o a conhecer aos interessados. Felicidades!

Jornalistas

Do e-mail de João Oliveira, acabado de publicar no post antecedente, respigo a seguinte passagem:
«Vai descobrir (...) jornalistas de economia e que têm acções das empresas de que falam. As empresas de comunicação pagam viagens a jornalistas! As de telemóveis oferecem-nos no Natal!! Há jornalistas nos grandes jornais de referência que acabam as suas entrevistas e passam a vender os seus produtos de comunicação aos entrevistados.»
Se este retrato da profissão é fiel é caso para clamar "aquid'elrey"! No meio deste panorama deprimente não restará ninguém para dizer que sem deontologia profissonal não pode haver jornalismo digno desse nome?