Quanto aqui escrevi que se tentava fazer tempestade num copo de água com a questão do regresso do embaixador à Tailândia, bem ao gosto de um certo jornalismo especialista em dramatização, precisamente num momento em que o horror da verdadeira tempestada nos entrava pelos olhos dentro, foi obviamente no pressuposto de que o encarregado de negócios faria o seu papel. Nestas circunstâncias, o que conta são os actos e não os galões de quem se mexe. Contudo, amigos de Macau relatam-me que, infelizmente, o problema assumiu outras dimensões. Telefones da embaixada em atendimento automático, auxílio do leitor de português não solicitado, etc. etc. Enfim, a ser verdade tudo o que vem sendo relatado por quem estava na Tailândia, a ausência do embaixador ter-se-á traduzido na ausência de representação diplomática portuguesa. Seria bom que o Ministro António Monteiro voltasse a esclarecer-nos, visto que a explicação do Embaixador de que o voo demora 24 h é ridícula e não esclarece absolutamente nada sobre o papel da Embaixada.
Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
sexta-feira, 31 de dezembro de 2004
Referências
Publicado por
Vital Moreira
1. Opiniões
"O Boato na Campanha", por Mário Bettencourt Resendes
"Uma certa escroqueria universitária", por Ademar Ferreira dos Santos.
2. Entre aspas
«Um PS com maioria absoluta em Março talvez consiga governar. Um PS dependente do Bloco ou do PCP a executar a política que vai ter de executar não vai poder governar».
Saldanha Sanches, "A Falência de um Sistema", no Expresso de hoje (suplemento Economia & Internacional), indisponível on-line.
"O Boato na Campanha", por Mário Bettencourt Resendes
"Uma certa escroqueria universitária", por Ademar Ferreira dos Santos.
2. Entre aspas
«Um PS com maioria absoluta em Março talvez consiga governar. Um PS dependente do Bloco ou do PCP a executar a política que vai ter de executar não vai poder governar».
Saldanha Sanches, "A Falência de um Sistema", no Expresso de hoje (suplemento Economia & Internacional), indisponível on-line.
Qual é a lógica?
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Vital Moreira
Zita Seabra, cabeça-de-lista pelo PSD em Coimbra. Que sentido faz isso? Só para protagonizar um duelo feminino com Matilde Sousa Franco? (E não era ela uma conhecida "marcelista"?...). E Carlos Encarnação, o presidente do município coimbrão, que era dado como líder da lista de candidatos, por que foi despromovido?
Enviesamento ocidental
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Vital Moreira
Segundo os últimos números a tragédia do maremoto pode ter causado centenas de milhares de vítimas nos países atingidos, designadamente na Indonésia. As televisões, porém, têm ocupado grande parte do seu tempo com as vítimas estrangeiras nas estâncias turísticas da Tailândia e das Maldivas (em grande parte nacionais de países europeus).
As vidas não têm todas o mesmo valor.
As vidas não têm todas o mesmo valor.
Mais de 100 000
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Vital Moreira
A exposição de Paula Rego em Serralves ultrapassou os cem milhares de visitantes. Um "record" nacional. Um justíssimo sucesso para a pintora e para o Museu do Porto.
Nem tudo é negativo em Portugal.
Nem tudo é negativo em Portugal.
Razões afectivas...
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Vital Moreira
... na decisão de Matilde Sousa Franco para aceitar a candidatura à frente da lista do PS por Coimbra nas próximas eleições parlamentares. De facto, ela está longe de ser uma "paraquedista" no círculo eleitoral por que se candidata.
Saudade da Bahia (3)
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Vital Moreira
Diário Eleitoral (4)
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Vital Moreira
O artigo de Miguel Portas, publicado ontem no Diário de Notícias, do qual foi reproduzido um excerto num post precedente, parece firmar a posição oficial do Bloco de Esquerda sobre a atitude a tomar em relação ao Governo que vier a resultar da previsível vitória eleitoral do PS nas próximas eleições. Invocando as divergências em matéria europeia (mas o discurso poderia igualmente invocar as diferenças na política doméstica), ele vem asseverar que o BE não está disponível para uma coligação de Governo com o PS, preferindo ficar na oposição, pronto a aprovar somente as leis e outras medidas com que concordar.
Admitindo que uma coligação com o PCP, mesmo que este a deseje, não se afigura mais provável, pelas mesmas ou maiores razões (basta referir o fosso no que respeita à UE), isto significa que, caso vença sem maioria absoluta, o PS não poderia contar com apoios à sua esquerda para formar uma maioria parlamentar de apoio ao Governo. Tudo indica que, nesse caso, forçado novamente a constituir um governo minoritário, lhe faltaria o necessário apoio parlamentar para assegurar as incontornáveis políticas de disciplina orçamental e de contenção da despesa pública que se tornam imperiosas enquanto a retoma económica não aliviar a situação financeira.
Sendo assim, resta ao PS contar somente consigo mesmo e empenhar-se a sério na obtenção de uma maioria absoluta. Ao excluir antecipadamente o apoio pós-eleitoral a um Governo do PS, o BE acrescenta um bom argumento para reforçar esse objectivo eleitoral.
Admitindo que uma coligação com o PCP, mesmo que este a deseje, não se afigura mais provável, pelas mesmas ou maiores razões (basta referir o fosso no que respeita à UE), isto significa que, caso vença sem maioria absoluta, o PS não poderia contar com apoios à sua esquerda para formar uma maioria parlamentar de apoio ao Governo. Tudo indica que, nesse caso, forçado novamente a constituir um governo minoritário, lhe faltaria o necessário apoio parlamentar para assegurar as incontornáveis políticas de disciplina orçamental e de contenção da despesa pública que se tornam imperiosas enquanto a retoma económica não aliviar a situação financeira.
Sendo assim, resta ao PS contar somente consigo mesmo e empenhar-se a sério na obtenção de uma maioria absoluta. Ao excluir antecipadamente o apoio pós-eleitoral a um Governo do PS, o BE acrescenta um bom argumento para reforçar esse objectivo eleitoral.
quinta-feira, 30 de dezembro de 2004
Só se não tivesse um mínimo de amor próprio
Publicado por
Vital Moreira
Recusando qualquer cooperação com Santana Lopes, Manuela Ferreira Leite rejeitou primeiro ser candidata a deputada e depois ser mandatária da lista de Lisboa do PSD. Ainda há quem se sinta com as ofensas pessoais e políticas!
Referências
Publicado por
Vital Moreira
1. Opiniões
"Língua Portuguesa: À procura do Futuro", por Carlos Reis
2. Entre aspas
«Percebe-se, assim, que a política europeia obriga as esquerdas a apresentarem-se separadamente às eleições. E o que está em jogo impossibilita quaisquer coligações de governo. As coisas são como são.»
"Nós e a Europa", por Miguel Portas.
"Língua Portuguesa: À procura do Futuro", por Carlos Reis
2. Entre aspas
«Percebe-se, assim, que a política europeia obriga as esquerdas a apresentarem-se separadamente às eleições. E o que está em jogo impossibilita quaisquer coligações de governo. As coisas são como são.»
"Nós e a Europa", por Miguel Portas.
A razão de Serrão
Publicado por
Anónimo
Escrevo com algum atraso relativamente à controvérsia levantada pelo despique parlamentar entre o líder do PS-Madeira, Jacinto Serrão, e o líder da bancada do PSD-M, Jaime Ramos. Mas a distância temporal é, muitas vezes, boa conselheira: permite-nos avaliar de forma mais fria e racional os factos que nos propomos comentar. É esse, precisamente, o caso.
Serrão foi alvo de duras críticas por causa da sua reacção excessivamente emocional às habituais, grotescas e intoleráveis provocações de Ramos. A repetição de passagens da sua intervenção em alguns canais televisivos sublinhou esse excesso e proporcionou severas interpretações moralistas. Ou seja: ao falar assim, Serrão ter-se-ia colocado ao nível do interlocutor e mostrado que o recurso à vulgaridade e à má-criação deixou de ser um exclusivo do jardinismo, contaminando a natureza do «debate» político na Madeira. Pior: reagindo dessa forma, Serrão teria favorecido o abstencionismo cívico dos madeirenses que rejeitam o sistema jardinista mas também recusam uma oposição que recorre a uma linguagem idêntica à dos seus adversários políticos.
Compreendo esses argumentos, mas tenho uma opinião diferente. E considero que alguns dos argumentos invocados têm por base um moralismo hipócrita. Não é legítimo exigir a quem é sistematicamente alvo de insultos que tenha a frieza de lhes responder de uma forma urbana e bem-educada. Se sou insultado e não reajo -- ou reajo de uma forma tão suave e gentil que deixa indiferentes ou até sorridentes os que não conhecem outra linguagem senão a do insulto e da boçalidade mais primária -- corro o risco de passar por ingénuo, por parvo, ou até por cobarde. É isso, aliás, o que tem acontecido, ao longo de décadas, à oposição madeirense.
É certo que teria preferido que Serrão se tivesse controlado mais, que não tivesse descido ao nível de tratar por tu e pelo diminutivo o seu adversário. Mas como é possível, em nome da hipocrisia do «politicamente correcto», negar a alguém o direito de, pelo menos uma vez, exceder-se e perder literalmente a cabeça quando é confrontado com um troglodita que parece saído das grutas pré-históricas e só sabe vociferar grunhidos simiescos para discutir com os humanos? Posso discordar da forma como Serrão reagiu, mas não discuto o fundo. De resto, já aqui escrevi que para responder a um malcriado só há uma forma comprovadamente eficaz -- é mostrar que, apesar da nossa boa-educação, somos capazes de ser ainda mais malcriados do que ele.
Aliás, no que se refere aos «sifões de retretes», Serrão nem sequer foi original: limitou-se a repetir uma expressão consagrada pelo general Carlos Azeredo, no seu livro de memórias, a propósito de Jaime Ramos. E quanto ao resto, creio bem que, depois do que aconteceu, Ramos e os seus colegas de má-criação militante, além do inefável presidente do parlamento madeirense, não deixarão de extrair as devidas consequências do caso. Se souberem que o insulto não fica impune e implica um direito de retaliação, talvez se cuidem, futuramente, nos modos e na linguagem que se devem observar num debate parlamentar.
Vicente Jorge Silva
(Este texto é também publicado na próxima edição do quinzenário madeirense «Garajau»)
Serrão foi alvo de duras críticas por causa da sua reacção excessivamente emocional às habituais, grotescas e intoleráveis provocações de Ramos. A repetição de passagens da sua intervenção em alguns canais televisivos sublinhou esse excesso e proporcionou severas interpretações moralistas. Ou seja: ao falar assim, Serrão ter-se-ia colocado ao nível do interlocutor e mostrado que o recurso à vulgaridade e à má-criação deixou de ser um exclusivo do jardinismo, contaminando a natureza do «debate» político na Madeira. Pior: reagindo dessa forma, Serrão teria favorecido o abstencionismo cívico dos madeirenses que rejeitam o sistema jardinista mas também recusam uma oposição que recorre a uma linguagem idêntica à dos seus adversários políticos.
Compreendo esses argumentos, mas tenho uma opinião diferente. E considero que alguns dos argumentos invocados têm por base um moralismo hipócrita. Não é legítimo exigir a quem é sistematicamente alvo de insultos que tenha a frieza de lhes responder de uma forma urbana e bem-educada. Se sou insultado e não reajo -- ou reajo de uma forma tão suave e gentil que deixa indiferentes ou até sorridentes os que não conhecem outra linguagem senão a do insulto e da boçalidade mais primária -- corro o risco de passar por ingénuo, por parvo, ou até por cobarde. É isso, aliás, o que tem acontecido, ao longo de décadas, à oposição madeirense.
É certo que teria preferido que Serrão se tivesse controlado mais, que não tivesse descido ao nível de tratar por tu e pelo diminutivo o seu adversário. Mas como é possível, em nome da hipocrisia do «politicamente correcto», negar a alguém o direito de, pelo menos uma vez, exceder-se e perder literalmente a cabeça quando é confrontado com um troglodita que parece saído das grutas pré-históricas e só sabe vociferar grunhidos simiescos para discutir com os humanos? Posso discordar da forma como Serrão reagiu, mas não discuto o fundo. De resto, já aqui escrevi que para responder a um malcriado só há uma forma comprovadamente eficaz -- é mostrar que, apesar da nossa boa-educação, somos capazes de ser ainda mais malcriados do que ele.
Aliás, no que se refere aos «sifões de retretes», Serrão nem sequer foi original: limitou-se a repetir uma expressão consagrada pelo general Carlos Azeredo, no seu livro de memórias, a propósito de Jaime Ramos. E quanto ao resto, creio bem que, depois do que aconteceu, Ramos e os seus colegas de má-criação militante, além do inefável presidente do parlamento madeirense, não deixarão de extrair as devidas consequências do caso. Se souberem que o insulto não fica impune e implica um direito de retaliação, talvez se cuidem, futuramente, nos modos e na linguagem que se devem observar num debate parlamentar.
Vicente Jorge Silva
(Este texto é também publicado na próxima edição do quinzenário madeirense «Garajau»)
Saudade da Bahia (2)
Publicado por
Vital Moreira
"Marmôto"!
Publicado por
Vital Moreira
Por estes dias consumou-se mais uma corrupção da língua portuguesa nos meios de comunicação. A palavra "maremoto" (que é o termo português para "tsunami", este quase desconhecido até aqui fora dos círculos de especialistas...), que vem do Latim por via erudita (mare + motus, que significa "movimento do mar") e que tem 4 sílabas (ma-re-mo-to), está a ser sistematicamente pronunciada como se tivesse somente três sílabas (mar-mo-to). Até já a vi escrita num blogue como está a ser dita, ou seja, como "marmoto"! Ainda por cima por vezes é pronunciada com um som fechado na sílaba acentuada (-mo-), o que soa como "marmôto" (contaminação de "marnoto" ou de "Mar Morto"?)!
Pobre língua! Não será de exigir ao menos aos "media" de qualidade que cuidem da qualidade do Português que usam e que, se for caso disso, instituam um Provedor da Língua, que evite estes atentados grosseiros?
Pobre língua! Não será de exigir ao menos aos "media" de qualidade que cuidem da qualidade do Português que usam e que, se for caso disso, instituam um Provedor da Língua, que evite estes atentados grosseiros?
quarta-feira, 29 de dezembro de 2004
Diário Eleitoral (3)
Publicado por
Vital Moreira
Está na ordem do dia a escolha dos candidatos partidários às eleições parlamentares. É sempre uma ocasião de grande disputa interna, se bem que normalmente surda. Na imprensa apareceram artigos de militantes qualificados a alertar contra a manipulação e a falta de transparência nesse processo. Trata-se de uma questão de importância decisiva para a qualidade do futuro parlamento, visto que no nosso sistema eleitoral os eleitores têm um voto de lista, onde nem sequer figuram os nomes dos candidatos, e cuja composição e ordenação não podem alterar (diferentemente do que sucede em outros sistemas eleitorais da família do nosso). Na verdade, muitos eleitores nem sequer sabem o nome da maior parte dos candidatos que vão eleger ao votar numa determinada lista.
A lei dos partidos nada impõe a esse respeito, deixando-lhes plena liberdade de decisão. Os partidos políticos observam em geral normas estatutárias que conferem tal poder às comissões distritais, porém com uma reserva de decisão para o líder ou para a direcção nacional no que se refere aos nomes cimeiros de cada lista, a começar pelos cabeças-de-lista.
Curiosamente no Le Monde de hoje, Pierre Rosanvalon discorre sobre as eleições primárias dentro dos partidos políticos para escolher os seus candidatos às eleições, o que como se sabe é uma prática corrente nos Estados Unidos, onde os partidos são organizações assaz fluidas, mas que pelos vistos entrou também na agenda política francesa. Em Portugal não falta quem defenda igual solução, como forma de "democratização" da escolha dos candidatos. Alguns vão mesmo ao ponto de preconizar a imposição desse método aos partidos por via legislativa. Mas parece claro que não está iminente nenhuma conversão dos partidos portugueses a esse procedimento adicional de democracia interna.
A lei dos partidos nada impõe a esse respeito, deixando-lhes plena liberdade de decisão. Os partidos políticos observam em geral normas estatutárias que conferem tal poder às comissões distritais, porém com uma reserva de decisão para o líder ou para a direcção nacional no que se refere aos nomes cimeiros de cada lista, a começar pelos cabeças-de-lista.
Curiosamente no Le Monde de hoje, Pierre Rosanvalon discorre sobre as eleições primárias dentro dos partidos políticos para escolher os seus candidatos às eleições, o que como se sabe é uma prática corrente nos Estados Unidos, onde os partidos são organizações assaz fluidas, mas que pelos vistos entrou também na agenda política francesa. Em Portugal não falta quem defenda igual solução, como forma de "democratização" da escolha dos candidatos. Alguns vão mesmo ao ponto de preconizar a imposição desse método aos partidos por via legislativa. Mas parece claro que não está iminente nenhuma conversão dos partidos portugueses a esse procedimento adicional de democracia interna.
Solidariedade global?
Publicado por
Anónimo
Se O G 7 (8 ou 9) servisse hoje como grupo de países capazes de financiar e organizar o apoio às regiões afectadas pelo maremoto (o que inclui refazer casas, actividades económicas e restaurar o tecido social na medida em que tal seja possível), isso seria uma excelente forma de mostrar que os tantas vezes contestados clubes exclusivos dos países mais ricos, que governam o mundo global, também existem e são relevantes na hora da solidariedade.
Tocante
Publicado por
Anónimo
No meio das histórias de horror dos últimos dias, é tocante o reconhecimento do apoio prestado pelas populações locais aos turistas que se encontravam nas Maldivas, conforme relatava hoje à SIC uma jovem portuguesa recém chegada a casa. Nem nesse momento em que muitos ficaram sem casa, sem emprego e sem futuro próximo faltaram os habituais cocos e as bananas para oferecer aos seus visitantes.
No meio deste notável esforço para poder cuidar dos outros, que inclui o dos médicos tailandeses de serviço há mais 48 h, o "estardalhaço" sobre se o embaixador português na Tailândia deveria ter regressado de imediato ou 2 dias depois, considerando que o encarregado de negócios fez o seu papel, é uma questão pequena e relativamente irrelevante, tal como o Embaixador António Monteiro, notoriamente agastado, referiu hoje aos jornalistas.
No meio deste notável esforço para poder cuidar dos outros, que inclui o dos médicos tailandeses de serviço há mais 48 h, o "estardalhaço" sobre se o embaixador português na Tailândia deveria ter regressado de imediato ou 2 dias depois, considerando que o encarregado de negócios fez o seu papel, é uma questão pequena e relativamente irrelevante, tal como o Embaixador António Monteiro, notoriamente agastado, referiu hoje aos jornalistas.
Escarro
Publicado por
Vital Moreira
«Soberba dá-se nos abruptos incontinentes, traidores por feitio e natureza, que sempre se venderam por uma sacola de 30 dinheiros. É o pecado dos sem-vergonha, sem pátria e sem coluna. E dos inchados. E são muitos...». Assim discorreu o inevitável Luís Delgado no desafortunado jornal que o tem de suportar como administrador e colunista. Obviamente o inequívoco alvo do ódio do obcecado militante santanista (sublinhei desnecessariamnte o termo "abruptos") não vai responder a este insulto furtivo e rasteiro, quanto mais não seja por uma questão de dignidade política e intelectual. Mas lá que dá vontade de devolver o escarro à procedência, lá isso dá!
Referências
Publicado por
Vital Moreira
1. Artigos
«O País "Retalhado"», por Manuel Carvalho (editorial do Público)
2. Entre aspas
«Santana fez a sua plataforma e vai "eleger" quatro deputados com 0,51% dos votos [do PPM e do MPT], isto é, o Parlamento vai ter quatro personagens que não representam ninguém; e como se isso fosse pouco Nuno da Câmara Pereira assegura que a questão do referendo à monarquia já «foi tratada com o PSD» (A Capital). (...) Que mal fez este país a Deus para lhe ter saído um Santana Lopes na rifa?»
O Jumento
«O País "Retalhado"», por Manuel Carvalho (editorial do Público)
2. Entre aspas
«Santana fez a sua plataforma e vai "eleger" quatro deputados com 0,51% dos votos [do PPM e do MPT], isto é, o Parlamento vai ter quatro personagens que não representam ninguém; e como se isso fosse pouco Nuno da Câmara Pereira assegura que a questão do referendo à monarquia já «foi tratada com o PSD» (A Capital). (...) Que mal fez este país a Deus para lhe ter saído um Santana Lopes na rifa?»
O Jumento
Prioridade II - Ajudar a Indonésia
Publicado por
AG
Prioridade - apoio aos nossos compatriotas apanhados na crise. A seguir - prestar ajuda humanitária de emergência aos países e comunidades afectados.
As necessidades são tremendas, sem precedentes, na maior catástrofe humanitária de que há registo, segundo a ONU - a contagem dos mortos vai agora em 68.000, a dos semi-vivos necessitados ainda está por calcular. A comunidade internacional tem de ajudar, organizadamente para ser eficaz, repartindo tarefas - e ninguém pode substituir a inestimável experiência da ONU e suas agências, inclusivamente coordenando o direccionamento da ajuda não governamental.
Portugal tem escassos recursos, não pode chegar a todo o lado. Anuncia-se a partida de dois aviões transportando ajuda portuguesa, governamental e não governamental, com destino ao Sri Lanka - onde não temos sequer embaixada, apesar dos intensos laços históricos e humanos (é ver os Pereras, Gonçalves e Fernandes que testemunham dali para as cadeias de TV internacionais nestes dias). Diversas razões podem explicar esta escolha de alvo: é mais fácil (até pela língua), é mais perto, é mais acessível, é mais barato, começou por ser dado como o país mais afectado, recuperava duma longa guerra civil, aproxima-se a celebração do aniversário do primeiro encontro com portugueses há 5 séculos (apesar dos desencontro do último século, sobretudo por desinteresse nosso ...), tem potencial turistico, etc....
Mas se há país afectado que deveria ser considerado prioritariamente, do ponto de vista político, para a ajuda portuguesa, é a Indonésia. É o mais traumatizado e o mais necessitado. No Aceh, provincia já tão martirizada por 30 anos de conflito armado, sofreu-se agora a devastação primeiro do tremor de terra e depois do tsunami. Seguir-se-ão as epidemias, se não se enterram rapidamente os mortos, e os motins se não se dá rapidamente apoio mínimo a quem sobreviveu.
É uma zona até aqui vedada à comunidade internacional - mas a tragédia obrigou as autoridades indonésias a abri-la ao auxilío exterior, o que não se pode desaproveitar, sobretudo na perspectiva de ajudar também, do mesmo passo, a por termo ao conflito armado e reconstruir as relações dos acehneses com Jacarta.
O Aceh tem com Portugal laços históricos e humanos tão antigos e tão ou mais fortes que o Sri Lanka, como provam Lamno e outros «kampung portugis» agora, porventura, destroçados ou a precisar de auxilio básico e reconstrução. É, tenho a certeza, à semelhança de toda a Indonésia, uma zona onde a ajuda portuguesa será bem acolhida e muito especialmente apreciada.
Por outro lado Portugal continua a precisar de cultivar particulamente as suas relações com a Indonésia, para recuperar dos anos de conflito político e diplomático por causa da questão de Timor-Leste, pelas nossas valiosas relações bilaterais seculares e pelas perspectivas de relacionamento comercial e económico que desde 2000 se abriram ( e que Lisboa não soube, nem quis explorar e desenvolver, para minha maior frustração). E, também pelo impacte positivo que o bom entendimento Lisboa-Jacarta tem sobre o relacionamento entre a Indonésia e Timor-Leste.
Por Timor- Leste, em última análise, deviamos neste momento ter aviões de ajuda de emergência a partir para o Aceh.
Bem sei que o Estado não pode tudo financeiramente, sobretudo quando se acha tão mal governado nos últimos anos e tão desgovernado nos últimos meses. Mas pode estabelecer prioridades políticas. É para isso que serve o MNE. E a sociedade civil pode ajudar financeiramente o Estado: que se cheguem à frente os bancos e empresários, da Opus Dei ou dos «Compromissos Portugais» e outros que tais. Para darem sentido prático aos chavões de «responsabilidades social», «ética corporativa» com que já vão, volta e meia, cosmopolitanamente salpicando o discurso. Fico à espera de os ver estimular e financiar uma intervenção humanitária de emergência portuguesa no Aceh-Indonésia.
Ana Gomes
As necessidades são tremendas, sem precedentes, na maior catástrofe humanitária de que há registo, segundo a ONU - a contagem dos mortos vai agora em 68.000, a dos semi-vivos necessitados ainda está por calcular. A comunidade internacional tem de ajudar, organizadamente para ser eficaz, repartindo tarefas - e ninguém pode substituir a inestimável experiência da ONU e suas agências, inclusivamente coordenando o direccionamento da ajuda não governamental.
Portugal tem escassos recursos, não pode chegar a todo o lado. Anuncia-se a partida de dois aviões transportando ajuda portuguesa, governamental e não governamental, com destino ao Sri Lanka - onde não temos sequer embaixada, apesar dos intensos laços históricos e humanos (é ver os Pereras, Gonçalves e Fernandes que testemunham dali para as cadeias de TV internacionais nestes dias). Diversas razões podem explicar esta escolha de alvo: é mais fácil (até pela língua), é mais perto, é mais acessível, é mais barato, começou por ser dado como o país mais afectado, recuperava duma longa guerra civil, aproxima-se a celebração do aniversário do primeiro encontro com portugueses há 5 séculos (apesar dos desencontro do último século, sobretudo por desinteresse nosso ...), tem potencial turistico, etc....
Mas se há país afectado que deveria ser considerado prioritariamente, do ponto de vista político, para a ajuda portuguesa, é a Indonésia. É o mais traumatizado e o mais necessitado. No Aceh, provincia já tão martirizada por 30 anos de conflito armado, sofreu-se agora a devastação primeiro do tremor de terra e depois do tsunami. Seguir-se-ão as epidemias, se não se enterram rapidamente os mortos, e os motins se não se dá rapidamente apoio mínimo a quem sobreviveu.
É uma zona até aqui vedada à comunidade internacional - mas a tragédia obrigou as autoridades indonésias a abri-la ao auxilío exterior, o que não se pode desaproveitar, sobretudo na perspectiva de ajudar também, do mesmo passo, a por termo ao conflito armado e reconstruir as relações dos acehneses com Jacarta.
O Aceh tem com Portugal laços históricos e humanos tão antigos e tão ou mais fortes que o Sri Lanka, como provam Lamno e outros «kampung portugis» agora, porventura, destroçados ou a precisar de auxilio básico e reconstrução. É, tenho a certeza, à semelhança de toda a Indonésia, uma zona onde a ajuda portuguesa será bem acolhida e muito especialmente apreciada.
Por outro lado Portugal continua a precisar de cultivar particulamente as suas relações com a Indonésia, para recuperar dos anos de conflito político e diplomático por causa da questão de Timor-Leste, pelas nossas valiosas relações bilaterais seculares e pelas perspectivas de relacionamento comercial e económico que desde 2000 se abriram ( e que Lisboa não soube, nem quis explorar e desenvolver, para minha maior frustração). E, também pelo impacte positivo que o bom entendimento Lisboa-Jacarta tem sobre o relacionamento entre a Indonésia e Timor-Leste.
Por Timor- Leste, em última análise, deviamos neste momento ter aviões de ajuda de emergência a partir para o Aceh.
Bem sei que o Estado não pode tudo financeiramente, sobretudo quando se acha tão mal governado nos últimos anos e tão desgovernado nos últimos meses. Mas pode estabelecer prioridades políticas. É para isso que serve o MNE. E a sociedade civil pode ajudar financeiramente o Estado: que se cheguem à frente os bancos e empresários, da Opus Dei ou dos «Compromissos Portugais» e outros que tais. Para darem sentido prático aos chavões de «responsabilidades social», «ética corporativa» com que já vão, volta e meia, cosmopolitanamente salpicando o discurso. Fico à espera de os ver estimular e financiar uma intervenção humanitária de emergência portuguesa no Aceh-Indonésia.
Ana Gomes
Prioridade I: Apoiar os portugueses afectados
Publicado por
AG
Prioridade I: apoio aos nossos compatriotas apanhados no horror do tsunami asiático. Os dramas dos vivos e dos mortos ainda mal se começaram a saber, já nos parte o coração a dor da mãe a quem a onda roubou dos braços a bébé.
A maioria dos portugueses veranevam na Tailândia. Para lá confluem os repórteres dos media nacionais, incluindo uns cujos dotes reporteiros conheço de gingeira... Compensa sempre mediaticamente atirar sobre a embaixada - ninguém se interessa é pelos meios (humanos, materiais e logísticos) que ela terá à partida ao seu dispôr para acorrer a qualquer emergência, sem falar numa catástrofe destas dimensões, e sobretudo quando ocorre num local distante... Meios que não passam, necessariamente, pela presença do embaixador, por muito útil que possa ser até para alimentar informativamente os repórteres. Meios cuja gritante falta é geralmente suprida pela dedicação, carolice, engenho, imaginação e solidariedade extenuada dos funcionários na linha da frente, seja na embaixada, seja nas células de crise montadas no MNE. Desunhando-se para localizar turistas que quando chegam, naturalmente, não avisam as embaixadas dos hoteis onde vão ficar, das praias onde vão passear...
Vêm-me à cabeça as condições que tivemos para intervir na Indonésia, sempre que houve crises em Timor-Leste e em Timor-Ocidental, nos anos de 1999 e 2000. E em 2002, no horror do atentado de Bali. Basta dizer que parti para Jacarta em Janeiro de 1999 com três meses adiantados de ajudas de custo no bolso, sem fundos para funcionamento dos serviços e sem qualquer fundo para uma emergência, que só no auge da crise de Setembro de 1999 foi disponibilizado (depois do embaixador da Holanda me emprestar dinheiro para pagar - adiantado - o avião que evacuou os jornalistas portugueses atacados no famigerado Hotel Makhota). Mas os problemas nunca são apenas financeiros - são sobretudo de falta de meios humanos qualificados (designadamente na comunicação em língua local) e apoio logístico, em especial se a tragédia ocorre em zonas distantes da capital onde temos embaixada ou serviços consulares.
Todas as atenções dos nossos media estão centradas na Tailândia, compreensivelmente. Mas não haverá portugueses noutros países apanhados pela tragédia? Ninguém se questiona sobre o apoio de que necessitam, se lhes estará a ser prestado pelas embaixadas onde as tenhamos, se estas terão meios para actuar? Se lhes estão a valer outras embaixadas da UE?
Ana Gomes
A maioria dos portugueses veranevam na Tailândia. Para lá confluem os repórteres dos media nacionais, incluindo uns cujos dotes reporteiros conheço de gingeira... Compensa sempre mediaticamente atirar sobre a embaixada - ninguém se interessa é pelos meios (humanos, materiais e logísticos) que ela terá à partida ao seu dispôr para acorrer a qualquer emergência, sem falar numa catástrofe destas dimensões, e sobretudo quando ocorre num local distante... Meios que não passam, necessariamente, pela presença do embaixador, por muito útil que possa ser até para alimentar informativamente os repórteres. Meios cuja gritante falta é geralmente suprida pela dedicação, carolice, engenho, imaginação e solidariedade extenuada dos funcionários na linha da frente, seja na embaixada, seja nas células de crise montadas no MNE. Desunhando-se para localizar turistas que quando chegam, naturalmente, não avisam as embaixadas dos hoteis onde vão ficar, das praias onde vão passear...
Vêm-me à cabeça as condições que tivemos para intervir na Indonésia, sempre que houve crises em Timor-Leste e em Timor-Ocidental, nos anos de 1999 e 2000. E em 2002, no horror do atentado de Bali. Basta dizer que parti para Jacarta em Janeiro de 1999 com três meses adiantados de ajudas de custo no bolso, sem fundos para funcionamento dos serviços e sem qualquer fundo para uma emergência, que só no auge da crise de Setembro de 1999 foi disponibilizado (depois do embaixador da Holanda me emprestar dinheiro para pagar - adiantado - o avião que evacuou os jornalistas portugueses atacados no famigerado Hotel Makhota). Mas os problemas nunca são apenas financeiros - são sobretudo de falta de meios humanos qualificados (designadamente na comunicação em língua local) e apoio logístico, em especial se a tragédia ocorre em zonas distantes da capital onde temos embaixada ou serviços consulares.
Todas as atenções dos nossos media estão centradas na Tailândia, compreensivelmente. Mas não haverá portugueses noutros países apanhados pela tragédia? Ninguém se questiona sobre o apoio de que necessitam, se lhes estará a ser prestado pelas embaixadas onde as tenhamos, se estas terão meios para actuar? Se lhes estão a valer outras embaixadas da UE?
Ana Gomes
E os «orang portugis» no Aceh ?
Publicado por
AG
"Você é portuguesa? Então tem de ir a Lamno, "kampung portugis" (aldeia portuguesa) a 60 km daqui, na costa..." disse-me o Governador, em Banda Aceh, brilhando-lhe os extraordinários olhos azuis. E disseram-me todos os outros interlocutores acehneses, excitados, contando a lenda do barco português naufragado que trouxera a terra os fundadores da aldeia, séculos atrás. Foi em Março de 2000, na visita da missão europeia que, valendo-me da nossa presidência da UE, consegui «impôr» ao Aceh, a provincia em conflito, fechada ao exterior desde 1974.
Não pude então desviar caminho até Lamno. E nunca cheguei a concretizar o projecto de lá ir. E hoje se calhar os "orang portugis" (os "portugueses") de Lamno estão todos mortos, varridos do mapa pela fúria do tremor de terra, primeiro, e do tsunami depois... Como mortos podem estar os habitantes das outras «kampung portugis» que - vim depois a descobrir, por amigos acehneses em Jakarta - existiriam noutras zonas do Aceh, designadamente em Meulabo, na costa oeste - onde ainda nem sequer ninguém conseguiu chegar para avaliar os estragos e socorrer sobreviventes.
Em 2000 fiz seis horas de carro pela costa norte da ilha de Sumatra, entre Lhoksomawe e a capital do Aceh, por uma estrada serpenteando frágeis aldeias de pescadores nas praias, campos verdejantes, povoações queimadas (pelos militares), montanhas prodigiosas à esquerda. Em Banda Aceh encontrei o bulício citadino sob ocupação militar, a famosa mesquita, homens e mulheres bonitos, exalando dignidade, afáveis para com os estrangeiros, desconfiados, magoados para com os javaneses. O porto pitoresco, a fábrica de cimentos da Lafarge, a Universidade Kuala Tripa, a RATA - ONG local de apoio às vitimas da tortura - , as aldeias semeadas de mesquitas, a casa da heroína Cut Niah Dihn num cenário idílico, palmeiras, arrozais verdes, o mar azul espelhado a arrulhar por perto...
Mas nos últimos dias, pela CNN, só vejo destroços, devastação, cadáveres alinhados nas ruas cobertos de panos e plásticos, mulheres e homens destroçados à procura de familiares desaparecidos entre os mortos, tapando o nariz por causa do cheiro. Imagino as tremendas necessidades de tudo para os semi-vivos arranjarem forças para enterrar os mortos e começar a limpeza e reconstrução: água potável, comida, medicamentos e apoio médico, tectos, combustível, comunicações. De organização e experiência de recobrar de tragédias, infelizmente, não têm falta os acehneses.
No centro da cidade, resta de pé a mesquita, imponente, belissima, esmagadora, tudo arrasado em redor: Alá, Deus, um poder do além, o poder da Natureza, sei lá eu, impante, reafirmado sobre a fragilidade da condição humana.
32.500 mortos confirmados, são as últimas noticias, pode chegar aos 40.000, disse o Vice-Presidente Yusuf Kalla - e ele tem experiência, sei que se pode confiar nele. Quem vai alguma vez conseguir contabilizar toda a miudagem que habitualmente brincava nos areais, salpicando a ondulação azul?
Vejo o atordoamento, as olheiras do Presidente Bambang, as mãos abertas a rezar, humildade e impotência diante de tamanha devastação. A experiência de direcção militar já em acção, vitalmente. Abriu o Aceh aos correspondentes de imprensa internacional e ao auxilio exterior. Que diferença da outra senhora - anda no meio das pessoas, afaga-as, ouve-as!
Que ao menos tão terrível catástrofe contribua para reconciliar os acehneses com a Indonésia.
Ana Gomes
Não pude então desviar caminho até Lamno. E nunca cheguei a concretizar o projecto de lá ir. E hoje se calhar os "orang portugis" (os "portugueses") de Lamno estão todos mortos, varridos do mapa pela fúria do tremor de terra, primeiro, e do tsunami depois... Como mortos podem estar os habitantes das outras «kampung portugis» que - vim depois a descobrir, por amigos acehneses em Jakarta - existiriam noutras zonas do Aceh, designadamente em Meulabo, na costa oeste - onde ainda nem sequer ninguém conseguiu chegar para avaliar os estragos e socorrer sobreviventes.
Em 2000 fiz seis horas de carro pela costa norte da ilha de Sumatra, entre Lhoksomawe e a capital do Aceh, por uma estrada serpenteando frágeis aldeias de pescadores nas praias, campos verdejantes, povoações queimadas (pelos militares), montanhas prodigiosas à esquerda. Em Banda Aceh encontrei o bulício citadino sob ocupação militar, a famosa mesquita, homens e mulheres bonitos, exalando dignidade, afáveis para com os estrangeiros, desconfiados, magoados para com os javaneses. O porto pitoresco, a fábrica de cimentos da Lafarge, a Universidade Kuala Tripa, a RATA - ONG local de apoio às vitimas da tortura - , as aldeias semeadas de mesquitas, a casa da heroína Cut Niah Dihn num cenário idílico, palmeiras, arrozais verdes, o mar azul espelhado a arrulhar por perto...
Mas nos últimos dias, pela CNN, só vejo destroços, devastação, cadáveres alinhados nas ruas cobertos de panos e plásticos, mulheres e homens destroçados à procura de familiares desaparecidos entre os mortos, tapando o nariz por causa do cheiro. Imagino as tremendas necessidades de tudo para os semi-vivos arranjarem forças para enterrar os mortos e começar a limpeza e reconstrução: água potável, comida, medicamentos e apoio médico, tectos, combustível, comunicações. De organização e experiência de recobrar de tragédias, infelizmente, não têm falta os acehneses.
No centro da cidade, resta de pé a mesquita, imponente, belissima, esmagadora, tudo arrasado em redor: Alá, Deus, um poder do além, o poder da Natureza, sei lá eu, impante, reafirmado sobre a fragilidade da condição humana.
32.500 mortos confirmados, são as últimas noticias, pode chegar aos 40.000, disse o Vice-Presidente Yusuf Kalla - e ele tem experiência, sei que se pode confiar nele. Quem vai alguma vez conseguir contabilizar toda a miudagem que habitualmente brincava nos areais, salpicando a ondulação azul?
Vejo o atordoamento, as olheiras do Presidente Bambang, as mãos abertas a rezar, humildade e impotência diante de tamanha devastação. A experiência de direcção militar já em acção, vitalmente. Abriu o Aceh aos correspondentes de imprensa internacional e ao auxilio exterior. Que diferença da outra senhora - anda no meio das pessoas, afaga-as, ouve-as!
Que ao menos tão terrível catástrofe contribua para reconciliar os acehneses com a Indonésia.
Ana Gomes
Saudade da Bahia
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Vital Moreira
Capa do CD com uma selecção das melhores músicas de Dorival Caymmi -- incluindo naturalmente a "Saudade da Bahia" -- numa gravação efectuada ao vivo pelos três filhos do compositor baiano, por ocasião do seu nonagésimo aniversário. Um presente recente dos meus amigos de Salvador. Para ouvir quando se tem saudade da Bahia (e só não tem quem nunca lá foi...).
(Clicar na imagem para a ver em tamanho maior).
Memórias acidentais -- As "eleições" de 1969
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Vital Moreira
A evocação de Henrique de Barros (ver post abaixo) trouxe-me à memória o episódio das eleições de 1969 para a Assembleia Nacional do "Estado Novo" (decorreram 35 anos em Outubro passado), que a oposição democrática resolveu disputar, aproveitando a frustre "abertura marcelista" de então para agitar a opinião pública contra o regime. As dificuldades eram enormes. Apesar do alargamento do sufrágio então decretado, eram uma minoria os recenseados, com presença esmagadora dos funcionários públicos, dos militares e agentes das forças de segurança, dos religiosos e dos apaniguados do regime, todos oficiosamente inscritos, por força da lei ou do zelo da Legião Portuguesa. Muitos oposicionistas não constavam dos cadernos, por terem direitos políticos suspensos, ou por simples corte arbitrário das autoridades, que manipulavam livremente o recenseamento eleitoral. A massa do povo estava fora da vida política.
Como a lei não previa que as listas concorrentes constassem de um boletim único, a oposição tinha de imprimir os seus próprios boletins de voto e distribui-los pelos eleitores, o que era uma tarefa trabalhosa e dispendiosa, e só cobriu parte dos eleitores inscritos. Para que os boletins de voto fossem iguais aos da Acção Nacional Popular (novo nome da antiga União Nacional, o partido oficial), conseguimos saber pelos tipógrafos comunistas clandestinos como seriam os dela, tendo depois feito imprimir os nossos com o mesmo tipo de papel e de impressão. Qual não foi a nossa surpresa quando nas vésperas da eleição recebemos os boletins de voto da ANP, impressos num papel de textura e de tonalidade ostensivamente diferentes e com uma impressão facilmente reconhecível pelo tacto. Tinham alterado à última da hora os boletins de voto, para os diferenciarem propositadamente dos nossos, de modo a inibir quem tivesse receio de ser identificado como votante da oposição...
Fui designado delegado da CDE numa das assembleias de voto, que teve lugar num amplo salão da então União de Grémios dos Lojistas de Coimbra, um organismo corporativo oficial. Mas a mesa era composta exclusivamente por agentes do regime e presidida por um conhecido legionário sem escrúpulos. A minha cadeira de delegado estava a mais de 5 metros da mesa, pelo que era impossível fiscalizar o que quer que fosse. Os meus veementes protestos só me valeram uma ameaça de expulsão. No final impugnei por escrito todos os votos da ANP, por serem manifestamente reconhecíveis pelo tacto e pela transparência do papel, violando por isso o segredo do voto, pois permitiam distinguir também os votos da oposição, por comparação. Os meus protestos nem sequer foram decididos. A mesa encerrou os trabalhos com a proclamação dos resultados, naturalmente com a vitória fácil do partido oficial. Assim foram as penúltimas eleições no Estado Novo!
Foi um erro a ida da oposição até às urnas (o que acontecia pela primeira vez em eleições para a AN na história do "Estado Novo"), dando um arremedo de legitimidade ao "marcelismo". Era evidente que o regime não se transformaria voluntariamente pela via eleitoral. Em 1973, aprendida a lição, a oposição fez novamente campanha mas retirou-se nas vésperas do sufrágio. Era a última fantochada "eleitoral" solitária do Estado Novo. O regime entrara em contagem decrescente para o seu fim.
Como a lei não previa que as listas concorrentes constassem de um boletim único, a oposição tinha de imprimir os seus próprios boletins de voto e distribui-los pelos eleitores, o que era uma tarefa trabalhosa e dispendiosa, e só cobriu parte dos eleitores inscritos. Para que os boletins de voto fossem iguais aos da Acção Nacional Popular (novo nome da antiga União Nacional, o partido oficial), conseguimos saber pelos tipógrafos comunistas clandestinos como seriam os dela, tendo depois feito imprimir os nossos com o mesmo tipo de papel e de impressão. Qual não foi a nossa surpresa quando nas vésperas da eleição recebemos os boletins de voto da ANP, impressos num papel de textura e de tonalidade ostensivamente diferentes e com uma impressão facilmente reconhecível pelo tacto. Tinham alterado à última da hora os boletins de voto, para os diferenciarem propositadamente dos nossos, de modo a inibir quem tivesse receio de ser identificado como votante da oposição...
Fui designado delegado da CDE numa das assembleias de voto, que teve lugar num amplo salão da então União de Grémios dos Lojistas de Coimbra, um organismo corporativo oficial. Mas a mesa era composta exclusivamente por agentes do regime e presidida por um conhecido legionário sem escrúpulos. A minha cadeira de delegado estava a mais de 5 metros da mesa, pelo que era impossível fiscalizar o que quer que fosse. Os meus veementes protestos só me valeram uma ameaça de expulsão. No final impugnei por escrito todos os votos da ANP, por serem manifestamente reconhecíveis pelo tacto e pela transparência do papel, violando por isso o segredo do voto, pois permitiam distinguir também os votos da oposição, por comparação. Os meus protestos nem sequer foram decididos. A mesa encerrou os trabalhos com a proclamação dos resultados, naturalmente com a vitória fácil do partido oficial. Assim foram as penúltimas eleições no Estado Novo!
Foi um erro a ida da oposição até às urnas (o que acontecia pela primeira vez em eleições para a AN na história do "Estado Novo"), dando um arremedo de legitimidade ao "marcelismo". Era evidente que o regime não se transformaria voluntariamente pela via eleitoral. Em 1973, aprendida a lição, a oposição fez novamente campanha mas retirou-se nas vésperas do sufrágio. Era a última fantochada "eleitoral" solitária do Estado Novo. O regime entrara em contagem decrescente para o seu fim.
Susan Sontag (1933-2004)
Publicado por
Vital Moreira
Foi através do seu ensaio sobre a fotografia (num tempo em que o tema me apaixonava) que cheguei à demais obra ensaística e literária desta multifacetada criadora que foi Susan Sontag: ensaísta, novelista, dramaturga, realizadora de cinema, encenadora de teatro. A sua morte deixa também um vazio entre os activistas dos direitos humanos, da liberdade de expressão e de criação literária e da paz. A sua última batalha foi a denúncia da guerra do Iraque e do fosso politico-cultural entre os Estados Unidos e a Europa. Enfim, desapareceu uma dos grandes intelectuais americanos das últimas décadas.
terça-feira, 28 de dezembro de 2004
Os poderes presidenciais
Publicado por
Vital Moreira
Ao contrário do que ele mesmo defendeu, o Presidente da República não deve ter o poder de nomear as "autoridades reguladoras independentes", porque se trata de entidades administrativas, embora pudesse e devesse ter o poder para nomear outros titulares de cargos públicos, na área judicial e da União Europeia. Os argumentos a favor desta tese podem ser encontrados no meu artigo de hoje no Público (também recolhido, como habitualmente no Aba da Causa, com link na lista de blogues aqui ao lado).
Vamos voltar a acreditar nas regiões?
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Anónimo
É, de facto, uma excelente notícia, a do nome de Braga da Cruz para cabeça-de-lista do Partido Socialista pelo distrito do Porto. Subscrevo inteiramente o comentário de VM sobre os méritos pessoais e os desígnios de Braga da Cruz, quer no apego à causa da regionalização, quer no repúdio ao modelo de pacotilha ensaiado por Isaltino de Morais.
A herança da Santana Lopes
Publicado por
Vital Moreira
"A economia portuguesa à beira de nova recessão" -- tal é manchete de hoje do Jornal de Negócios.
Depois de ter recuado mais de 1% no terceiro trimestre do ano corrente, os indicadores económicos disponíveis apontam para a continuação do recuo no quarto trimestre, que agora termina, o que caracteriza tecnicamente uma nova recessão (dois trimestres consecutivos com crescimento negativo). Ainda mais grave do que a recessão é a irresponsável lenga-lenga da "retoma", que Santana Lopes e os seus apaniguados insistem em vender aos portugueses, contra todas as evidências, e ainda mais o criminoso anúncio do "fim da austeridade", decretado há poucas semanas pelo primeiro-ministro, a acompanhar os levianos sinais de descida dos impostos pessoais e as promessas de aumento do poder de compra.
Eis a herança da coligação: nem consolidação orçamental nem retoma económica. Só sobrou a demagogia, a leviandade e a desonestidade política. Tal é a verdadeira marca da coligação governamental e, em especial, do seu presente líder: incompetência, irresponsabilidade e descrédito. É isso que está em causa nas próximas eleições.
Depois de ter recuado mais de 1% no terceiro trimestre do ano corrente, os indicadores económicos disponíveis apontam para a continuação do recuo no quarto trimestre, que agora termina, o que caracteriza tecnicamente uma nova recessão (dois trimestres consecutivos com crescimento negativo). Ainda mais grave do que a recessão é a irresponsável lenga-lenga da "retoma", que Santana Lopes e os seus apaniguados insistem em vender aos portugueses, contra todas as evidências, e ainda mais o criminoso anúncio do "fim da austeridade", decretado há poucas semanas pelo primeiro-ministro, a acompanhar os levianos sinais de descida dos impostos pessoais e as promessas de aumento do poder de compra.
Eis a herança da coligação: nem consolidação orçamental nem retoma económica. Só sobrou a demagogia, a leviandade e a desonestidade política. Tal é a verdadeira marca da coligação governamental e, em especial, do seu presente líder: incompetência, irresponsabilidade e descrédito. É isso que está em causa nas próximas eleições.
Referências
Publicado por
Vital Moreira
1. Textos
"Referendo a Santana", de Miguel Coutinho
"Os equívocos da política económica", por Luís Mira Amaral, no Diário Económico (indisponível na edição online)
2. Entre aspas
«Os dados relativos à parte final de 2004 mostram, com toda a clareza, que o mito da retoma se esfumou e que a competitividade da economia continua a agravar-se. Para 2005, o melhor que podemos esperar é que nos livre dos simplismos que pretendem resolver à martelada problemas complexos e nos reserve um pouco mais de bom senso, de honestidade política e também da sageza necessária para ajudar a encontrar soluções reais para os problemas, em vez daquela com que alguns intelectuais se comprazem em recordar a nossa arraigada incapacidade para os resolver.»
"Tempo de Balanço", por Teodora Cardoso.
"Referendo a Santana", de Miguel Coutinho
"Os equívocos da política económica", por Luís Mira Amaral, no Diário Económico (indisponível na edição online)
2. Entre aspas
«Os dados relativos à parte final de 2004 mostram, com toda a clareza, que o mito da retoma se esfumou e que a competitividade da economia continua a agravar-se. Para 2005, o melhor que podemos esperar é que nos livre dos simplismos que pretendem resolver à martelada problemas complexos e nos reserve um pouco mais de bom senso, de honestidade política e também da sageza necessária para ajudar a encontrar soluções reais para os problemas, em vez daquela com que alguns intelectuais se comprazem em recordar a nossa arraigada incapacidade para os resolver.»
"Tempo de Balanço", por Teodora Cardoso.
Diário eleitoral (2)
Publicado por
Vital Moreira
A candidatura de Braga da Cruz a encabeçar a lista socialista do Porto -- hoje noticiada pelo Jornal de Notícias -- poderá ser um sinal de que o PS vai retomar o dossier da regionalização se ganhar as eleições? Antigo presidente da Comissão de Coordenação Regional do Norte, conhecido adepto da regionalização -- no modelo das cinco macro-regiões correspondentes às circunscrições territoriais das actuais Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) --, crítico da organização intermunicipal de geometria variável lançada pelo Governo PSD-CDS, o ex-ministro de António Guterres bem pode protagonizar um novo impulso regionalizador no futuro Governo.
No entanto, a retoma do tema da regionalização exige a maior prudência, importando tirar as lições do desaire no malfadado referendo de 1998. Ninguém deve ter ilusões de que um novo referendo nos mesmos termos e nas mesmas condições está igualmente condenado. As pessoas não votam mapas abstrusos nem soluções desconhecidas, cujas vantagens e desvantagens não possam medir. Para ter êxito, a regionalização tem de ser o desenvolvimento "natural" das estruturas para-regionais existentes, designadamente as CCDRs e demais organismos da administração regional do Estado. Importa proceder à desgovernamentalização e democratização progressiva das CCDRs, conferir-lhes personalidade jurídica própria (como "institutos públicos territoriais") e ampliar as suas atribuições e os seus recursos financeiros. No final só há que referendar a sua transformação em autarquias territoriais regionais, com órgãos directamente eleitos, um "pequeno" passo que não será tão vulnerável aos fantasmas anti-regionalistas como foi a desastrada tentativa de há mais de 6 anos.
Nesta matéria toda a precipitação pode ser fatal e a demora, virtuosa.
No entanto, a retoma do tema da regionalização exige a maior prudência, importando tirar as lições do desaire no malfadado referendo de 1998. Ninguém deve ter ilusões de que um novo referendo nos mesmos termos e nas mesmas condições está igualmente condenado. As pessoas não votam mapas abstrusos nem soluções desconhecidas, cujas vantagens e desvantagens não possam medir. Para ter êxito, a regionalização tem de ser o desenvolvimento "natural" das estruturas para-regionais existentes, designadamente as CCDRs e demais organismos da administração regional do Estado. Importa proceder à desgovernamentalização e democratização progressiva das CCDRs, conferir-lhes personalidade jurídica própria (como "institutos públicos territoriais") e ampliar as suas atribuições e os seus recursos financeiros. No final só há que referendar a sua transformação em autarquias territoriais regionais, com órgãos directamente eleitos, um "pequeno" passo que não será tão vulnerável aos fantasmas anti-regionalistas como foi a desastrada tentativa de há mais de 6 anos.
Nesta matéria toda a precipitação pode ser fatal e a demora, virtuosa.
A difícil transição democrática
Publicado por
Vital Moreira
A vitória de Iuchenko nas eleições presidenciais da Ucrânia parece representar a retoma do processo de transição democrática, que tinha sido "capturado" por uma autocracia após a independência, há mais de uma dúzia de anos. Resta saber se as condições económicas e políticas possibilitam a estabilização e a consolidação democrática desse País saído da desintegração da antiga URSS.
No antigo mundo comunista há processos de democratização bem arrastados no tempo e de êxito ainda incerto (como mostram também os casos da Bielo-Rússia e da própria Rússia). A mudança ucraniana pode bem significar o reinício da revolução democrática no extremo Leste Europeu.
No antigo mundo comunista há processos de democratização bem arrastados no tempo e de êxito ainda incerto (como mostram também os casos da Bielo-Rússia e da própria Rússia). A mudança ucraniana pode bem significar o reinício da revolução democrática no extremo Leste Europeu.
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