quarta-feira, 23 de fevereiro de 2005

"Le garçon des vaches"

Bush na Europa: as televisões mostraram palmadinhas nas costas, gargalhadas e sorrisos, a ementa escolhida (french fries e vinho da Califórnia) - reflexos de novo clima nas relações transatlânticas. Bush a querer parecer simpático para com a "velha Europa". Timothy Garten Ash, citado no Financial Times de ontem, precisa os limites da simpatia: "Bush mudou ao reconhecer a Europa como parceira; mas o seu discurso traz também uma lista das tarefas para a Europa executar". Talvez por isso, inconscientemente, Bush tivesse visto no Presidente francês um possível "cowboy para o seu rancho".
O Iraque continua no centro de tudo. Depois das eleições de 30 de Janeiro, parecem criadas condições para um relacionamento transatlântico mais construtivo. Os EUA sabem que as eleições foram apenas um primeiro passo e que muitas incógnitas surgem no processo democrático (-teocrático?). Sabem que o que se avizinha será, porventura, o mais difícil. Perceberam que, sozinhos, não poderão assegurar a estabilização e pacificação do Iraque. Precisam, cada vez mais, do contributo da comunidade internacional. E a Administração Bush parece pronta a aceitar estratégias de saída que até há pouco rejeitava liminarmente. Como o "grupo de contacto" sob supervisão da ONU, sugerido pelos republicanos Henry Kissinger e George Shulz, em artigos no Washington Post de Novembro e Janeiro passados.
Mas não basta que se entendam os parceiros de ambos os lados do Atlântico. É preciso que os iraquianos queiram e acreditem. E para isso há que mudar, desde logo, a percepção que eles têm sobre as forças militares estrangeiras. Vistas até aqui, como forças de ocupação.
Dois estimulantes para que a percepção mude: um calendário para a saída das tropas estrangeiras do país, dependente das condições de segurança no terreno e da vontade do Governo transitório iraquiano; e um papel central efectivo da ONU na estabilização política e na reconstrução. O anúncio de uma data para a saída das tropas da actual coligação e a atribuição de papel central à ONU no enquadramento de uma força de manutenção da paz (em que forças americanas se poderiam naturalmente incluir), com o acordo do Governo transitório, sossegaria receios de ocupação estrangeira interminável. Em especial, se, tal como sugere Kissinger, essa força fosse também integrada por países muçulmanos. E, acrescento eu, por países não conotados com o esforço de guerra levado a cabo pela coligação. As forças da coligação decresceriam, conforme o calendário, à medida que crescessem, em preparação e número, as forças militares e de polícia iraquianas.
A UE decidiu agora participar na formação, fora do Iraque, de quase um milhar de funcionários , na magistratura, polícia e administração penitenciária. Decidiu ainda criar um "Gabinete de ligação" no Iraque. No quadro da NATO deu-se luz verde ao treino, nos arredores de Bagdad, de 1000 militares iraquianos por ano. Chirac, por seu lado, decidiu avançar com acções de treino de militares iraquianos, embora fora do território iraquiano e fora do âmbito da NATO. 1500 - mais, em número, do que a NATO. Quem é que não gostaria de ter este "garçon des vaches" a trabalhar no seu rancho?

Bom começo

Respondendo ao PCP -- que quer avançar para a despenalização do aborto sem referendo -- e ao BE -- que quer precipitar imediatamente um referendo até ao Verão --, José Sócrates lembrou que o PS tem um compromisso eleitoral para realizar novo referendo e que tal referendo deve ser cuidadosamente preparado para ser ganho. Ora, embora desta vez seja de esperar que, ao contrário do que ocorreu em 1998, todo o PS, a começar pelo seu Secretário-geral, se empenhará no triunfo do "sim", ninguém pode dar-se ao luxo de correr riscos desnecessários. A precipitação intempestiva poderia ser fatal. O PS não pode hesitar em recusar qualquer "chantagem" neste ponto (dá para ver o que seria se não houvesse uma maioria absoluta...).

Direitos humanos

Participei ontem em Lisboa na sessão pública de entrega dos prémios de direitos humanos para os meios de comunicação (um para a imprensa, outro para a rádio e televisão), a cujo júri de selecção presidi, uma iniciativa da Comissão Nacional para a Comemoração dos 50 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, cujo mandato agora se concluiu. Desde 1999 apreciei centenas de trabalhos apresentados para o prémio e partilhei da selecção dos melhores. Os que foram premiados agora, relativos a 2004, figuram entre os mais impressionantes.
Um dos objectivos da celebração do meio século da DUDH de 1948 era a educação para os direitos humanos. Esta iniciativa da nomissão nacional constituída para o efeito, a que Mário Soares presidiu, representou um excelente meio de sensibilização dos média para os direitos humanos. Uma tarefa gratificante!

Afinal não era um cheque em branco para políticas de direita?

«Jerónimo de Sousa esperançoso com maioria absoluta».

"Reconstrução da direita"

Um efeito colateral positivo das hecatombes eleitorais é obrigar à reflexão sobre as causas da derrota e sobre as saídas para a situação. Nada mais natural, portanto, do que as reflexões que começam a surgir à direita. Entre as primeiras merecem referência por exemplo esta e esta. Um debate para 4 anos, de que a esquerda não se pode alhear...

Confusão

quem tenha confundido a minha explicação dos círculos eleitorais territoriais com a defesa do nosso actual sistema eleitoral. Que hei-de eu fazer?

"Revolução eleitoral"

Tal é o título do meu artigo de ontem no Público (agora também disponível, como habitualmente, na Aba da Causa, aí com a correcção de um lapso do texto publicado no jornal).

terça-feira, 22 de fevereiro de 2005

Referendo europeu

«(...) A questão que lhe gostaria de colocar reporta-se à participação no referendo espanhol: acredita que se trata mesmo de uma vitória pelo facto do "sim" ganhar com 75% dos votos quando a abstenção é de 57,68% e os votos em branco ascenderam a 6%?
Da minha parte interpreto este resultado como preocupante (...). A questão central são os índices de participação que espelham o real afastamento das populações em relação ao Projecto Europeu. Não deixa de ser irónico que uma consulta popular acerca de um Tratado Constitucional espelhe tanta indiferença. Esta é a minha preocupação: que Europa é esta que se está a construir que não consegue cativar os cidadãos? Será mesmo uma vitória?»

(J. Mário Teixeira)

Nota
Os referendos têm em geral menos participação do que as eleições. Mas o que conta são os votos dos que se interessam, e não os demais. Em Portugal ambos os referendos de 1998 tiveram uma participação inferior a 50% e no entanto ninguém pôs em causa a sua legitimidade política. Nos Estados Unidos a participação nas próprias eleições é normalmente inferior a 50%.
A abstenção não significa "afastamento", quando muito indiferença. A convocação do referendo permite que milhões de pessoas se interessem pela Constituição, o que é um ganho em si mesmo, dado que ela poderia ser aprovada pelo parlamento sem referendo e logo sem envolvimento popular. Aliás, nos referendos a abstenção desfavorece em geral o "sim", pois quem vota "não" está normalmente mais motivado para ir votar. De resto, quantas questões "domésticas" conquistariam a atenção de tanta gente como este referendo em Espanha?
Vital Moreira

Cabe ao próximo governo, pois claro

«As dívidas de Portugal a organizações internacionais científicas passavam dos dez milhões de euros, no final de 2004. Isto significa que a promessa da ministra da Ciência, Graça Carvalho, de pagar todas as contribuições a essas organizações até ao fim do ano passado ficou por cumprir, e que caberá ao próximo Governo liquidá-las.» (no Público).
Mais uma prova da irresponsabilidade financeira do governo cessante. Deve tratar-se aliás apenas de um exemplo das dívidas deixadas debaixo do tapete...

(Des)proporcionalidade (3)

Se houvesse somente um círculo eleitoral a repartição dos deputados pelos partidos seria muito mais proporcional, correspondendo aproximadamente à sua percentagem de votos.
Os círculos eleitorais distritais (ou regionais) existem por cinco razões: (a) para permitir listas de candidatos mais pequenas, que os eleitores possam conhecer; (b) para dar expressão na AR a diferentes interesses territoriais (os interesses de Lisboa não são necessariamente os mesmos dos Açores); (c) para evitar que todos os candidatos e deputados sejam tendencialmente de Lisboa; (d) para atenuar a proporcionalidade e tornar menos difícil a conquista de maiorias monopartidárias; (e) para limitar o número de partidos com representação parlamentar, impedindo o acesso a micropartidos sem um mínimo relevante de expressão eleitoral (muitos sistemas eleitorais prevêem explicitamente "cláusulas-barreira" para este efeito). Salvo erro, fora de Estados minúsculos, só existem dois países com um sistema proporcional na base de um círculo eleitoral único, a Holanda e Israel, ambos muito mais pequenos e territorialmente mais homogéneos do que Portugal.

(Des)proprocionalidade (2)

A "majoração" dos partidos mais votados, quanto ao número dos seus deputados, saiu reforçada nestas eleições em virtude da grande diferença do primeiro para o segundo partido (mais de 16%) e de ter havido três partidos com votações entre os 6% e os 8% (PCP, CDS e BE), os quais não conseguiram eleger deputados em quase nenhum dos pequenos e médios círculos eleitorais (excepção para o CDS em Viana do Castelo), vendo por isso desperdiçada uma importante quota-parte do seus votos, com relevo para o BE.

(Des)proporcionalidade (1)

Ao conseguir eleger 120 deputados (ou seja, 53% do total de 226) com 45% dos votos, o PS beneficiou de uma "majoração" de 8% na sua representação parlamentar, conseguindo uma folgada maioria absoluta de deputados sem correspondente maioria de votos.
O benefício dos partidos mais votados é normal no nosso sistema eleitoral. Mas, ao contrário do que muitas vezes se afirma, tal assimetria não resulta directamente do "método de Hondt", ou seja, da fórmula de repartição proporcional dos deputados, mas sim da existência de muitos círculos eleitorais que elegem um número relativamente pequeno de deputados, sendo portanto necessária uma percentagem de votos assaz elevada para alcançar um deputado. Assim, por exemplo, em Coimbra o PS elegeu 6 deputados em 10 (60%) com 45% dos votos (majoração de 15%), em consequência do total desperdício dos votos do BE, do PCP e do CDS, que não elegeram ninguém, apesar de terem somado em conjunto 17% dos votos.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2005

O mistério de Leiria

Na média nacional, o PS cresceu mais de 7% em relação a 2002 (45% contra 37,8%). A subida ocorreu em todos os círculos, mas com consideráveis assimetrias nos vários círculos eleitorais, havendo subidas bem acima daquela média (como Bragança, Guarda, Castelo Branco, Vila Real, Açores) e outras sensivelmente abaixo da mesma (como Coimbra, Setúbal, Lisboa, Leiria).
O distrito com menor subida é o de Coimbra, pouco acima de metade da média nacional (4%). O facto terá a ver, entre outros factores, com o impacto negativo da questão da co-incineração e com a qualidade da lista e da campanha do BE. Em Setúbal e em Lisboa a principal razão do menor progresso eleitoral socialista deve estar ligada a um maior desvio do eleitorado de esquerda para o BE. De resto, nesses dois grandes círculos a votação do PS ficou abaixo do "score" nacional de 45%, o que limitou a capacidade de subida socialista.
Mas o pior círculo eleitoral do PS no Continente é o de Leiria, com apenas 35,5% dos votos, quase 10% baixo da média nacional (aliás somente com mais 0,5% do que a Madeira), sendo mesmo o único distrito onde o PS tem menos deputados do que o PSD. O défice socialista em Leiria é tanto mais surpreendente quanto se trata de um distrito do litoral, com índices de desenvolvimento económico e urbano relativamente elevados. Um mistério.

Instabilidade no PSD

O que vai fazer Santana Lopes da sua devastadora derrota eleitoral está para se ver. Ao recusar demitir-se, parece que vai vender cara a pele na luta pela liderança do PSD. O controlo do aparelho do partido pode dar-lhe hipóteses de sobrevivência. O pior pode ser, porém, o abandono dos autarcas, que temem a repetição do "tsunami" eleitoral em Outubro, de que eles serão as primeiras vítimas. O presidente da câmara municipal de Tavira pode ser o primeiro de uma debandada geral?

Correio dos leitores: Maioria absoluta

«"Maioria absoluta: responsabilização absoluta". O texto de Ana Gomes com este título, para mim, resume o que vai ser, a partir de agora, a vida do PS.»
(António Gouveia)

Correio dos leitores: Os vencedores

«Deixe-me acrescentar um vencedor [das eleições]: o "Causa Nossa", pela aposta diária na maioria absoluta, mérito que não lhe é alheio. Certo?»
(A. C. Guedes)

Correio dos leitores: As eleições

«A análise das eleições feitas no "Causa" (...) diz praticamente tudo. No entanto, julgo que faltam dois aspectos a realçar:
1) A magna importância histórica deste momento para o Partido Socialista e para os seus militantes de base. O PS deve mostrar inequivocamente:
a) que consegue e sabe governar em tempos de crise;
b) que a prioridade deve ser a protecção dos mais desfavorecidos (no âmbito do combate à pobreza e ao desemprego);
c) que consegue, num primeiro momento, governar sem aumentar a despesa pública e, num segundo momento, que consegue diminuí-la;
d) que consegue conter os ímpetos do aparelho na fase das nomeações governativas, promovendo o mérito e a juventude em detrimento do cartão de militante;
e) que consegue decidir sem hesitações, sem eternizar as discussões e sem ceder a pressões corporativas.
2) Confirma-se que a melhor e mais perfeita forma de demonstração colectiva dos Portugueses é nas urnas. De Cavaco, passando por Guterres, e agora com Durão e Santana, o "eleitorado" premiou os bons governos e penalizou os maus governos. Perante a catástrofe governativa da coligação PP/PSD de Santana e Portas, urgia uma mudança. A resposta dos Portugueses não podia ter sido mais esclarecedora.»

(Gonçalo M. da Maia)

Menos de um terço

Com menos de um terço dos deputados (tem 72, podendo alcançar o máximo de 75, se ganhasse 3 dos 4 da emigração...), o PSD deixa de ser necessário para aprovar leis que precisem de uma maioria de 2/3, desde que o PS obtenha o apoio dos demais partidos da oposição. E isso só não inclui a revisão constitucional porque a próxima revisão ordinária só ocorre em 2009, no final da legislatura que agora principia.

Legislatura longa

A legislatura que agora se inicia tem duração bem superior a 4 anos, visto que só terminará em Outubro de 2009 (se não houver antecipação de eleições por decisão presidencial...). O Governo tem por isso mais do que tempo para dar conta do recado.
Além disso, a partir das eleições locais no próximo Outono, realizadas ainda em "estado de graça" para o PS, serão quatro anos sem outras eleições partidárias de âmbito nacional, visto que as eleições europeias só terão lugar no Verão de 2009 (e as eleições regionais, limitadas aos Açores e à Madeira, só ocorrerão no Outono de 2008). Ou seja, o Governo não vai ter de governar para eleições locais ou europeias, nem temer os efeitos colaterais de uma pesada derrota eleitoral nessas eleições, como sucedeu com Guterres, com as eleições locais de Dezembro de 2001, e com Durão Barroso, com as eleições europeias de 2004.
(acrescentado)

Confortável maioria

Se alcançar dois dos quatro deputados pelos dois círculos eleitorais do exterior o PS ficará com 122 deputados, o que significa seis deputados acima da maioria absoluta. Trata-se de uma confortável maioria, que coloca o Governo a coberto de qualquer surpresa, tanto mais que retira "poder de veto" aos 6 deputados das regiões autónomas e torna irrelevantes os três deputados "democratas-cristãos" eleitos nas listas do PS. Em contrapartida os deputados da minoria resultante das eleições para a liderança do PS e do subsequente congresso assumem papel importante no grupo parlamentar.

A outra vitória

Com mais de 75% dos votos, os espanhóis aprovaram a Constituição europeia. Apesar da elevada abstenção, trata-se de um resultado notável. Uma excelente notícia para a União Europeia.

Maus perdedores

Há sempre os que não sabem perder. Na noite eleitoral evidenciaram-se por exemplo o líder regional do PSD, Alberto João Jardim, o ex-líder parlamentar do PSD, Guilherme Silva, e o Ministro Morais Sarmento. Falta de chá democrático.

O trunfo desfeiteado

Afinal, quem é que foi derrotado em Coimbra? Lembram-se de Nobre Guedes, o trunfo de ouro para ganhar um lugar em Coimbra para o CDS, com o argumento da co-incineração, tendo chegado a apelar a um levantamento popular contra a entrada de Sócrates na cidade? Pois ficou bem longe da eleição, enquanto o PS venceu com grande avanço, arrebatando 6 dos 10 deputados em disputa.
Mais uma aposta perdida de Portas, que ainda por cima viu o CDS ficar atrás do BE, o inominável partido da esquerda radical. Nem a missa da vidente Lúcia lhe valeu!

Maioria absoluta: responsabilização absoluta

Mais de 45% dos votos, 120 deputados para já, faltam os resultados da emigração.
José Sócrates sorri, com natural orgulho, da «vitória verdadeiramente histórica que o PS alcançou», mas tem o cuidado de não alardear exuberância. O que aí vem não está para celebrações, também. Lê um contido e asséptico discurso de vitória. Limpa o suor que lhe cai em bagas -- e não será só do calor dos aplausos dos notáveis no Altis e das massas militantes que o vão quase esmagar no exterior... Deixou o adjectivo "superioridade" que lhe polvilhou discursos na campanha. "Humildade e sentido de responsabilidade" -- sublinha agora, bem.
Responsabilidade, sobretudo, é o que os portugueses esperam do PS. E honestidade. E competência máxima também. Transparência, também ajuda. Tudo isso implica ter aprendido com erros do passado. Veremos a seu tempo, desde logo pela composição governamental.
A partir de agora, não há mais desculpas: o PS tem finalmente poder e legitimidade para governar. Sem arrogância, sem autismo, e sobretudo sem ficar na mão de quem quer que seja, à direita ou à esquerda. Sem ficar na mão de grupos de interesses, sejam banqueiros ou grupos corporativos. Foi para isso que os portugueses deram a maioria absoluta ao PS: responsabilização absoluta.

Maioria absoluta PS: Direita absolutamente derrotada

Ao entrar para o avião, um último SMS de amiga descrente para quem, apesar de tudo, o PS é o último, o único, recurso útil: "Esquece e vota PS".
Aterrei em Bruxelas às 10 da noite, 9 em Portugal. Um telefonema para casa: maioria absoluta garantida!
Primeiro: - uff, que alívio! Portugal pode ser governável. (Flash de alerta: e o PS tem de estar à altura).
Segundo: - contentamento! Esta direita execrável, que nos desgovernou, fragorosamente derrotada. O principal derrotado já está a milhas, mas hão-de estar a arder-lhe bem as orelhas: chama-se Durão Barroso. Os portugueses provaram-lhe/lhes, pela segunda vez (a primeira foi nas eleições europeias de 2004), que não são parvos, nem masoquistas, nem suicidas...(Flash de alerta: e o PS mais tem de estar à altura!)
Chegada a casa, a TV brinda-me em directo com a declaração de Paulo Portas, beicinho tremelicante mas esforçadamente repuxado, carão pior do que nas cerimónias fúnebres de Maggiolo Gouveia e da Irmã Lúcia. Gozo duplo: pela humilhação do que há de mais oportunista e reaccionário à direita; e de admiração por mais uma magistral exibição deste grande artista português - assume a derrota e sai o mais por cima que pode, demitindo-se de líder do CDS/PP. Como se alguém acreditasse que volte costas à política: ou volta em ombros no Congresso, ou demora mais algum tempo por uma questão de oportunidade, aproveitando para fazer uma daquelas rentáveis travessias no deserto que o "amigo" Rummy gostosamente patrocinará em qualquer Georgetown, com a vantagem de lhe sobrar tempo para manipular o Indy e a imprensa que vier à rede... (Flash de alerta: o PS que se cuide ... e sobretudo que esteja à altura!)
Lopes é igual ao Lopes de sempre. "Nonchalant", enaltece Portas por se demitir -- mas atitudes dessas não se lhe aplicam ("ele não foge à luta", dirá para fora e para os seus botões). Há muito que sabia o que o esperava. Sorriso no fundo aliviado, faca na liga -- esta farsa chegou ao fim, está pronto para a refrega contra os que o anavalharam pela frente e pelas costas no PSD. Que alternativa lhe resta? A travessia do túnel das Amoreiras empancado? Dartacão MMendes já passou ao ataque, vem aí a guerra ppdista. Por aqui, o PS pode esperar...

Derrotados (7): Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã

Ambos, com destaque para o segundo, conseguiram o notável feito de disputarem ao PS os despojos da derrota da direita. Mas foi evidente, sobretudo na segunda fase da campanha eleitoral, que para ambos tão importante como a sua própria subida eleitoral era impedir a maioria absoluta do PS. Nisso revelaram-se tão acirrados como a direita. O BE chegou a erigir em objectivo essencial o "voto útil contra a maioria do PS". Ambos falharam nesse objectivo de condicionar a formação e as políticas do novo Governo. Com isso a sua influência política reduz-se drasticamente (mesmo que o PS não deva de modo algum desconsiderar o seu peso). É um importante revés.

Derrotados (6): Marcelo Rebelo de Sousa

Apareceu várias vezes na campanha eleitoral do PSD ao lado de figuras como L. Filipe Menezes e não se inibiu de tentar desqualificar o líder do PS e de considerar que a maioria absoluta por ele pedida seria uma "ironia absoluta". Não pode portanto sacudir do seu capote a água da derrota. Depois disso não teve pejo em aparecer como "comentador" na RTP, como se nada tivesse a ver com as eleições e com os seus resultados.

Derrotados (5): A. João Jardim

A estrela do líder regional do PSD da Madeira continua a empalidecer. Depois das perdas nas eleições regionais, em que viu encurtar a sua vantagem sobre o PS, é agora a primeira vez que o PS iguala o PSD no número de deputados eleitos no arquipélago nas eleições para a AR, dado que a vitória eleitoral "laranja" foi muito menos expressiva do que habitualmente. Ao ser um dos poucos apoios de Lopes entre os dirigentes tradicionais do Partido, compartilha com ele a histórica derrota.
Para agravar as coisas, desta vez não tem em Lisboa nem um governo de correligionários nem um governo minoritário do PS que precise dos "seus" deputados.

Derrotados (4): A direita

Somados os votos PSD e do CDS (somente cerca de 36%!), é este provavelmente o pior resultado de sempre da direita entre nós, com poucos casos semelhantes por essa Europa fora. Também é difícil imaginar tamanho desastre governativo...

Derrotados (3): Paulo Portas e CDS

Sendo uma e a mesma coisa, a derrota de um é a derrota do outro. Portas pagou o desastre da coligação, de que nem a oportunista tentativa de demarcação o salvou. Falhou todas as apostas. Recuou em vez de subir, perdeu quota eleitoral e deputados, não impediu a maioria absoluta do PS, não assegurou o terceiro lugar, não estancou a subida do PCP nem da "esquerda radical". A sua ideia de "roubar" deputados ao PS foi uma das anedotas políticas da campanha eleitoral. Apesar de ter uma derrota menos escandalosa do que a do seu parceiro de coligação, foi ele quem colocou a fasquia mais alta. A sua demissão é a consequência do naufrágio do excesso de ambição.