segunda-feira, 5 de setembro de 2005

O falhanço do "Estado mínimo"

Nada melhor para verificar o precioso valor do Estado do que as grandes catástrofes naturais. A responsabilidade pública na degradação e insuficiência das defesas de Nova Orleães contra as águas, bem como a indesculpável demora e ineficiência no socorro da cidade após a catástrofe, mostram os efeitos nefastos das políticas de desinvestimento público em infra-estruturas e no serviço público de protecção civil.
A principal tarefa de toda a colectividade política organizada -- a que chamamos Estado -- sempre foi a segurança dos seus membros. A lição do furacão Katrina é a de que o "Estado mínimo" pode ser sinónimo de segurança mínima.

Lapsos populistas

Numa tirada demagógica, o líder do PSD, Marques Mendes, acusa o Governo de se preparar para autorizar "à socapa" a venda da TVI a um grupo espanhol, afirmando que a «TVI é um bem público». Que se saiba, a estação de televisão pertence a uma empresa privada (a Média Capital), que aliás já tem há muito participação de capital estrangeiro, e o eventual negócio não precisa de autorização do Governo. De resto, uma proibição governativa, além de não ter base legal, seria contrária ao direito comunitário.
Os lapsos populistas acabam sempre no disparate.

Ordenamento florestal

Não há razão para as extrapolações que J. A. Maltez tirou aqui sobre este meu post acerca do ordenamento florestal. Não penso em nada que já não exista por exemplo no ordenamento urbanístico, como a proibição de edificação em certos tipos de terrenos, a limitação do tipo de ocupação urbanística, a obrigação de loteamento e de edificação em certos casos, o dever de obras de manutenção e de reparação, etc. Por que é que os terrenos florestais não hão-de estar sujeitos aos mesmos tipos de restrições/obrigações, se a ausência desse ordenamento tem os nefastos resultados que estão à vista de todos?

domingo, 4 de setembro de 2005

Fernando Távora

A memória do grande arquitecto vai perdurar connosco, aqui na Universidade de Coimbra, no belo auditório que ele concebeu para a vetusta Faculdade de Direito, conseguindo harmonizar a arquitectura moderna com os vizinhos arcos de pedra medievais e manuelinos.

A equação do Bloco de Esquerda

Nos últimos anos o balanço do papel desempenhado pelo Bloco de Esquerda tem sido muito positivo. No Parlamento são activos e profissionais, marcam várias vezes as agendas mediáticas e têm ideias e pessoas com energia e qualidade acima da média. Não é novidade que, apesar dessas virtualidades, tenho sido um crítico do Bloco. Em vários momentos irrito-me com a sua superioridade moral, obviamente herdada da cartilha do PCP, arrogantemente provada em várias ocasiões. Entre a classe média revoltada e bem pensante e os operários ortodoxos comunistas sempre preferi a genuidade dos segundos.
Com o crecimento do Bloco, que provavelmente não parará por aqui, coloca-se o problema do futuro. Optarão os bloquistas por continuar à margem dos compromissos e a apresentar uma agenda própria sem pensar na conquista do poder mesmo a longo prazo ou, segunda hipótese, passarão a jogar pela mesma cartilha dos partidos tradicionais podendo assim crescer e tornar-se, numa primeira fase, um partido equilibrador do sistema e depois, quem sabe, aspirar à concretização da utopia do poder? É claro que a opção inevitável pela segunda hipótese tem o risco óbvio de transformar o Bloco num partido igual aos outros e assim trair a sua base eleitoral de apoio. Uma equação difícil mas interessante.
Na minha opinião, o Bloco de Esquerda ao escolher Francisco Louçã para candidato à Presidência da República optou já pela segunda vertente.
Talvez os seus eleitores não percebam o porquê de não terem escolhido alguém independente da lógica partidária e suficientemente credível para marcar a diferença. E se Soares perder à primeira volta para Cavaco, o Bloco pagará o ónus de ter viabilizado a vitória do candidato da direita. O grande problema da extrema-esquerda é ter como principal adversário, agora como no PREC, o PCP. Um falso problema.

Correio dos leitores: Contas presidenciais

«(...) Mas o que é que leva o Professor a estar tão convicto de que Cavaco não ganha logo à 1ª volta, mesmo contra o conjunto das 3 candidaturas da esquerda? E se Soares perder, como é que o PS vai depois justificar a preterição de Alegre? (...)»
A. J. Marques, Lisboa

Comentário
1. Eu não dou por adquirido nenhum resultado eleitoral (longe de mim tal ideia). Ainda nem sequer há sondagens de opinião com o quadro dos candidatos mais importantes (dando por assente o avanço de Cavaco Silva). Parece-me que vai ser uma disputa renhida. É evidente que uma das possibilidades é a eleição de Cavaco Silva, e à 1ª volta. A única coisa que eu disse, e mantenho, é que as candidaturas separadas de Jerónimo de Sousa e de Francisco Louça, a par da de Mário Soares, não só não favorecem a eleição de Cavaco como a podem dificultar. Mas, claro, isso de pouco valerá se a vantagem deste for muito folgada...
2. Devo dizer que se Manuel Alegre fosse o candidato da área socialista eu votaria naturalmente nele, embora sem nenhuma ilusão sobre o resultado. Soares pode obviamente perder, mas -- para além das suas inigualáveis qualidades para o cargo, como já mostrou -- é um forte candidato à vitória, ao contrário de Alegre. Isto não pode "provar-se", mas penso que releva da evidência política...

O prédio Coutinho

O prédio Coutinho, um monstro arquitectónico na frente riberinha de Viana do Castelo, tornou-se desde há muito num ícone nacional, tanto do urbanismo assassino que muitas câmaras municipais autorizaram como da incapacidade do Estado para recorrer a medidas radicais contra essas situações. Incluída no programa Pólis de Viana a sua eliminação, o mostrengo vai finalmente ser expropriado e demolido.
Por vezes a virtude triunfa, mesmo que com custos pesados para o erário público (lucros privados, custos públicos...). Infelizmente, há muitos prédios coutinhos por esse país fora.

Jornalismo de serviço

No sábado passado o Expresso -- que treina para ser órgão oficioso da candidatura presidencial de Cavaco Silva -- anunciava em manchete de 1ª página a apoio do empresário Belmiro de Azevedo a essa candidatura. Pela sua verosimilhança e relevância, a notícia foi ecoada nos media.
Afinal, não passava de uma completa invenção (oriunda provavelmente de círculos afectos ao antigo primeiro-ministro). Na edição de hoje, na secção de "cartas do leitor" (!), é publicado um veemente desmentido do empresário, assegurando que não tomou nenhuma posição sobre o assunto e reclamando do semanário a correcção da notícia com o mesmo relevo desta e um pedido de desculpas aos leitores.
Contudo, em vez do mesmo relevo, o jornal limitou-se a uma diminuta e quase despercebida nota na 1ª página, que não vai ter um décimo do impacto da notícia desmentida. O mesmo se passará com os demais meios de comunicação que a multiplicaram. Chama-se a isto "jornalismno responsável"?

sábado, 3 de setembro de 2005

Bem os percebemos

«Por exemplo porque são negros, negros pobres, muito pobres, aqueles que vemos perdidos entre águas e ruínas [de Nova Orleães]? Ou porque não consegue a América rica, a tal que vai à Lua, alimentar, socorrer, alojar os desgraçados que se acolhem num estádio-pocilga ou vagueiam por uma auto-estrada tornada inútil?» (João Morgado Fernandes, Diário de Notícias de hoje).
É evidente que nem a solerte forma interrogativa esconde o nefando anti-americanismo que tresanda deste editorial do director interino do DN. Aqui fica a devida denúncia...

Heróis

Atrás do anonimato todos os biltres são heróis para si mesmos.

Reciprocidade

Sou desafiado aqui a dizer o que achariam os apoiantes da recandidatura de Mário Soares, se fosse Cavaco Silva a candidatar-se a um terceiro mandato presidencial. Respondo por mim. Seguramente que lutaria contra a sua reeleição, mas não vejo nenhum motivo para lhe contestar a mesma legitimidade jurídica e política que reconheço a Soares. A Constituição só proíbe a acumulação de mais do que dois mandatos presidenciais consecutivos, mas não de interpolados.
A razão de ser da proibição da acumulação de mandatos consecutivos não consiste somente em proporcionar a renovação de titulares, mas também (se não principalmente) em impedir que um Presidente se perpetue no cargo explorando as vantagens do exercício do cargo (visibilidade, conhecimentos, dependências alheias, inércia, etc.) para se fazer reeleger. Porventura, sem a proibição de reeleição consecutiva, Mário Soares ainda hoje seria presidente da República, quem sabe se a caminho de um 5º mandato... Essa lógica não se aplica, porém, à reeleição interpolada, a partir de fora do exercício do cargo, onde já não existem vantagens de partida.
Mas a pergunta pode ser devolvida. Os que, em nome da "renovação", censuram a disponibilidade de Soares para um terceiro mandato (apesar de passados 10 anos sobre os dois anteriores), manteriam essa atitude crítica, se se tratasse de Cavaco Silva?

Sectarismo

Há pessoas que passaram estas semanas a catar todas as oportunidades, ou mesmo sem elas, para condenar as falhas (as reais e as imaginárias) da luta contra os fogos florestais em Portugal, mas quando alguém, ecoando aliás os media norte-americanos, critica entre nós as monumentais falhas da entidades responsáveis em relação ao furação Katrina, logo surge a inevitável acusação de "antiamericanismo"! Haja paciência para tanta duplicidade...

sexta-feira, 2 de setembro de 2005

"Para além de Gaza"

O meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe, está agora também na Aba da Causa.

Duas Américas

Como sempre, as principais vítimas das grandes catástrofes naturais, seja na Indonésia seja nos Estados Unidos, são os pobres. Sucede que no Sul dos Estados Unidos dizer pobres significa dizer negros. A enorme tragédia do furacão Katrina veio confirmá-lo dramaticamente. Há quem gostasse piamente de escondê-lo. Mas nos Estados Unidos a miséria tem cor.

Contas presidenciais

Não percebo o argumento de Ricardo Costa hoje no Diário Económico sobre a desvantagen de haver três candidatos de esquerda, o que aumentaria o risco de Cavaco Silva ser eleito à 1ª volta.
É evidente que Cavaco só ganhará na 1ª volta se tiver mais de metade dos votos (ou seja, mais votos do que todos os demais candidatos somados). Todavia, essa possibilidade só será potenciada pelas candidaturas separadas à esquerda, se os três candidatos das esquerdas tiverem menos votos em conjunto do que teria Mário Soares como candiato único à esquerda. Ora, não vejo nenhuma razão para isso suceder. Pelo contrário, estou convicto de que a separação de candidaturas na 1ª volta pode ser mais abrangente -- tanto à esquerda (para os candidatos do PCP e do BE) como ao centro (para Mário Soares) -- do que sucederia com uma única candidatura deste. Se tal ocorrer, então as candidaturas separadas à esquerda não facilitarão, antes dificultarão as hipóteses de Cavaco Silva.

Correio dos leitores: Diferenças

«Desde sempre me pareceu que aos olhos do votante distanciado que no fundo constitui o voto que fará a diferença nas urnas, o que distingue verdadeiramente Mário Soares de Cavaco Silva é que o primeiro sente-se plenamente à vontade e feliz no seu próprio corpo, enquanto que este dá a entender um permanente desconforto, como se tivesse vestido um fato de número abaixo.
Julgo que mais que as ideias, as concepções, a vivência e os objectivos, a "exploração" desta diferença será decisiva para a escolha.»

JCB

Correio dos leitores: Desprezo

«A má-criação é uma constante no nosso dia-a-dia e um atavio dos portugueses. As pessoas insultam-se e berram em qualquer circunstância independentemente da gravidade do facto, do lugar em que se encontram ou da pessoa a atingir. Porque alguém teve uma condução menos correcta o(a) outro(a) abre o vidro e lança obscenidades ao(à) faltoso(a). Porque a polícia se sente lesada nos seus privilégios, chama "gatuno" a um ministro. Porque os universitários não querem pagar as propinas, chamam "ladrão" ao reitor. Porque há uma arruaça as televisões estão lá e transmitem os palavrões dos arruaceiros. Porque o árbitro decidiu mal, insultam-no à exaustão. O palavrão e o insulto são usados por pais em frente às crianças, por "cavalheiros" a senhoras, por polícias a ministros, pelo presidente da região autónoma da Madeira a quem o incomode. A provocação ou a arruaça surgem por "dá cá aquela palha".
A minha visceral repulsa ao palavrão cedeu lugar, ao longo da minha vida, a uma atitude racional de que de tanto ser dito e repetido por qualquer um, não importa o posto, o palavrão já não tem significado nem produz efeito.
Nos meus 12, 13 anos, recordo-me de ir a correr com os meus irmãos à janela para ouvir os impropérios que lançava à sua volta uma pobre mulher demente e alcoólica que subia diariamente a minha rua por volta do meio-dia.
- Vem aí a Amelinha, dizíamos uns aos outros.
(...) De facto os impropérios eram inócuos: a mulher disparava-os sem direcção. Até que um dia, um cãozito num portal, assustado talvez com a algazarra, ladrou-lhe. No seu desbragamento grita-lhe a desgraçada com o dedo em riste: "E bocê?! O qué que bocê quer também?". Lembro-me que o bicharoco não meteu o rabo entre as pernas nem sequer ripostou: quedou-se a olhar espantado.
Transpondo a história, há por aí muitas "Amelinhas" que vociferam obscenidades para o ar e o melhor é de facto não fazer como o cão: responder ao insulto nivela humanos e animais.»

Maria José Miranda

quinta-feira, 1 de setembro de 2005

A primeira fila

Soares, na apresentação da sua candidatura, esteve acompanhado de uma parte significativa dos amigos de sempre. Teve algo de tocante assistir ao regresso do velho general e ao reencontro com a maioria dos seus lugares-tenente. Também eles mais velhos, aparentemente sem força para mais uma batalha, mas dizendo presente contra a lógica. No entanto, aquilo que é bonito pode tornar-se num problema delicado.
Mário Soares sabe que só poderá ter uma hipótese de ganhar, e é o único candidato à esquerda que a tem, se tiver nas suas mãos as mãos do futuro. Se os seus fiéis soldados de sempre insistirem em estar na primeira fila, em nome de uma amizade de sempre, Soares perderá sem resistência para Cavaco Silva.
Mas se ele descer às ruas na companhia de um exército jovem e optimista então o resultado das eleições poderá ser imprevisível para Cavaco Silva.

Correio dos Leitores: O Alento e o Futuro

«O rigor orçamental é a sombra da política. A política é o corpo e nunca a sombra. Se rigor for um elemento da solução para Portugal, só a política o poderá enobrecer e fazer com que o rigor seja abraçado pelas pessoas. Mas envolto num desígnio, em algo muito maior do que cada um de nós e do que próprio rigor. Algo que queremos pelo sonho, pelos nossos filhos, isso a que chamamos o futuro.
A economia real não fará a mudança sem paixão, sem novos comportamentos, sem novas e renovadas esperanças, sem novas gerações a irromper de detrás da cena. E a vida não pulsa pelo rigor. A vida pulsa pelo alento, pela criatividade e pela paixão.
É a paixão de Soares por Portugal que o país vai reconhecer e abraçar. Sim, é no braço de um sonhador que Portugal se vai levantar. Só os sonhadores amam em simultâneo a vida e os segredos da vida. O alento e o futuro começam sempre com uma ajuda. Cada um de nós começou com a ajuda. De alguém.
O nome do Presente será, para Portugal, Cavaco.
O Alento e o Futuro chamam-se Soares. »

J. Elias de Freitas

Desprezo

Há para aí, na blogosfera, uns mabecos (como diria o saudoso Joaquim Namorado), por vezes anónimos, que se dedicam regularmente a tentar morder-me as canelas. Em vez de criticarem ideias e refutarem argumentos (para o que lhes falta estofo), chamam nomes feios aos adversários. Como não recorro aos mesmos métodos, ignoro-os. Voto-os ao desprezo que eles merecem.

As diferenças

«O dr. Soares já avisou que não quer uma batalha ideológica. Prefere uma simples comparação de personalidades. Confia que a sua descontracção, previsibilidade e disposição para falar com toda a gente prevaleçam sobre a crispação, os "tabus" e a reserva do seu adversário.» (Rui Ramos, no Diário Económico de ontem).
Não acho nada que Soares queira restringir a disputa presidencial com Cavaco Silva a uma simples "comparação de personalidades", visto que na agenda vai estar pelo menos a questão das funções e do papel do Presidente. Mas também penso que a comparação de personalidades vai pesar consideravelmente, a meu ver em favor de Soares. De facto, se às suas apontadas qualidades (descontracção, previsibilidade e simpatia), contra as enunciadas características de Cavaco Silva (crispação, tabus e reserva), juntarmos o cosmopolitismo, a cultura e o espírito humanista para o primeiro, contra a falta de dimensão internacional, a estreiteza cultural e o espírito economicista do segundo, então teremos um desenho assaz aproximado do diferente perfil dos candidatos.

E o candidato que falta é...

Já existe uma sugestão para o papel de "candidato-fantasma" da direita à direita de Cavaco Silva; é Paulo Portas, diz um comentador preocupado com a falta de comparência do CDS nas presidenciais.
Acho pouco provável, porém. Primeiro, porque quem deixou a política daquela maneira há seis meses não pode regressar assim; depois, porque não é fácil ver Portas no papel de "batedor" do seu eleitorado para a rede de Cavaco Silva...

Correio dos leitores: Eleições presidenciais

«No texto «Apoios» que publicou no «Causa Nossa», refere os apoios já anunciados às eventuais candidaturas presidenciais de Cavaco Silva e de Mário Soares, estabelecendo uma comparação entre os mesmos. Tal exercício, apesar de redutor (nesta fase), é perfeitamente legítimo, e percebo o objectivo.
Contudo, recorda-se certamente dos inúmeros intelectuais e artistas que apoiaram Maria de Lourdes Pintasilgo em 1985/86 e da percentagem de votos que a sua candidatura (infelizmente) obteve. Dito isto, não quero deixar de referir que sou de esquerda, que sentiria um enorme orgulho em ver um homem como Manuel Alegre na Presidência da República e que, com a sua desistência de Manuel Alegre (...), provavelmente votarei em Mário Soares (que, em minha opinião, foi um excelente Presidente da Republica).»

Carlos Azevedo

Comentário
O problema não é a falta de pessoas à esquerda que dariam excelentes presidentes da República. Há várias. O problema está em conseguirem ser eleitas (o que não seria seguramente o caso de Manuel Alegre). Se Soares o consegue ou não, quem o pode assegurar? Oferece pelo menos boas perspectivas de o ser...

quarta-feira, 31 de agosto de 2005

O regresso

Soares é fixe!

Lugares de encanto

«Anywhere on the coasts of Asia, America and Africa you can find a fort, a church, a geographical name or a family name, that come from Portugal». Assim começa a introdução a um website sobre a história colonial holandesa e portuguesa, com muita informação histórica (cuja qualidade não sou competente para avaliar) e muitas ilustrações dos monumentos e dos vestígios da presença colonial portuguesa.
Quem se sente atraído pelo Brasil colonial ou pelo antigo Oriente português -- como é o meu caso --, dará por bem empregue a visita a este site.

Cada um no seu papel

É bem-vinda a anunciada revisão da política de imigração, atenuando o excessivo restritivismo das opções tomadas no Governo anterior, que o PS censurou na altura própria. Mas será que cabe ao director-geral do serviço de Estrangeiros e Fronteiras "anunciar" essa importante mudança de políticas? Ou é ao Governo, e ao ministro competente, que incumbe esse papel?

Uma revolução improvável

Acabo de ler Gente do Milénio, de J. G. Ballard, livro que recomendo com entusiasmo. O que aconteceria se, de repente, a classe média resolvesse fazer uma revolução para pôr em causa o equilíbrio estabelecido e a sua vida de aparente comodidade? Uma viagem ao nascimento de uma conciência de classe e de uma revolta improvável. Um aviso: se a ficção se transformasse em realidade eu estaria ao lado dos contra-revolucionários.

A desistência de Alegre

O discurso de Manuel Alegre foi uma traição ao seu passado. O que disse de Soares, e a forma como o disse, é reveladora de um autismo agudo. Perturbante, sem dúvida, mas revelador. Tudo o que disse sobre o passado de Soares, directa e indirectamente, disse-o também sobre si próprio. Aparentemente não o terá percebido. E ainda com uma agravante. É que Soares está afastado da vida partidária, que Alegre responsabizou pela decadência da República, há vinte anos e o poeta continua embrenhado nas questões dos partidos e da política que diz execrar.
Hoje Soares terá o seu primeiro banho de multidão. Em casa, já mais calmo, Alegre deverá meditar sobre o que disse e a forma como o disse. Ontem à hora dos telejornais mais pareceu um amante despeitado pela traição a confessar os seus psicodramas num qualquer reality show.

"Distinguo"

Não, Paulo Gorjão, eu não condenei a campanha para exigir a publicação, para além dos já conhecidos, dos estudos que fundamentam os investimentos no novo aeroporto internacional de Lisboa e do TGV (eu próprio critiquei aqui o inexplicado adiamento da sua divulgação). (Julgo, aliás, que não são questionáveis as minhas credenciais pessoais em questões de exigência de transparência e "accountability" do poder político...). O que eu censurei foi a condenação liminar desses mesmos investimentos por parte de muitos dos que integraram essa campanha (nem todos, valha a verdade), mesmo sem conhecimento dos estudos que eles próprios reclamam. É completamente diferente.
Se, desde então, tenho vindo a apontar casos de grandes investimentos públicos em infra-estruturas que não têm levantado a oposição nem suscitado a reclamação do mesmo escrutínio por parte das mesmas pessoas, tal visa obviamente pôr em relevo a inconsistência e o uso de "double standards" por banda de muitos dos militantes anti-Ota e anti-TGV. Do que se tratou não foi de um caso de "vigilância aleatória", mas sim de "vigilância selectiva", o que, de novo, não é a mesma coisa.

Isolamento

Entre os argumentos para a sua desistência Manuel Alegre mencionou o de não querer provocar uma "fractura no PS" (consequência que também eu admiti há dias, como razão para ele não se candidatar). Contudo, à vista dos escassíssimos apoios que ele encontrou no PS desde o seu "apelo" de Faro, mesmo no sector minoritário que ele representou na luta pela liderança interna do partido (só Maria de Belém e José Leitão apareceram em Viseu, e não se sabe se o acompanhariam na sua aventura...), parece evidente que a consequência mais provável de uma hipotética candidatura seria o seu confrangedor isolamento.
É mesmo muito provável que tenha sido essa constatação de desamparo a razão decisiva para o seu recuo, o que aliás lhe retira a dimensão "sacrificial" e a grandeza que o próprio lhe quis emprestar. E o ressentimento que trasnpareceu nas suas referências a Soares só o apoucam a si próprio, culminando sem elevação nem brilho este malogrado episódio da sua vida política.
(revisto)