quinta-feira, 8 de fevereiro de 2007

Correio da Causa: não "sem qualquer justificação"

«Muito esclarecedora é a forma como os defensores do "não" fazem equivaler a IVG a pedido da mulher à liberalização total e ao aborto sem qualquer justificação. Ou seja, a opinião da futura mãe parece ser irrelevante para o caso. Alguns admitem (por convicção ou por estratégia) que certas circunstâncias concretas, nomeadamente as já previstas na lei (perigo para a vida ou para a integridade física da mãe, malformações graves do feto, violação) podem justificar um aborto. Outros admitem mesmo estudar outras circunstâncias objectivas passíveis de justificar uma interrupção de gravidez. Porque, nesses casos, "existe um motivo". Mas a opinião da pessoa mais afectada, que verá as suas condições e projectos de vida irremediavelmente afectados para sempre por uma gravidez que não planeou nem desejou, é motivo nenhum.
Saúdo a coerência dos que defendem a ilegitimidade da interrupção da gravidez em todas as circunstâncias. Tenho pena que, muitas vezes, não manifestem igual apego à defesa do direito à vida na oposição a todas as formas de privação da vida, como a pena de morte e a guerra. Considero porém que "vida" é muito mais do que existência biológica. É também ter projectos, sonhos, expectativas, um passado, um presente e um futuro. E isso, a mãe tem numa medida incomparável com um feto de dez semanas. Embora pareça "não ser nada" na opinião de alguns pensadores.
Passar por uma gravidez, ter um filho e educá-lo supõe, creio que estaremos todos de acordo, inúmeras cedências e sacrifícios, mesmo quando esse filho é desejado e planeado. Obrigar quem não quer a passar por isso, sob ameaça de prisão ou sequer de processo penal, representa uma crueldade e uma intromissão intolerável na autonomia de cada um. Representa também um desprezo pelo direito de cada criança a nascer e viver no seio de uma família que a deseje e a ame - espontaneamente e não por imposição da lei penal.
E obrigar as mulheres a abortar clandestinamente em condições inseguras e pouco higiénicas, longe da vista e das consciências dos que preferem assobiar para o lado, representa um problema de saúde pública a que o Estado tem a obrigação de dar resposta. Como sempre, as consequências não são exactamente as mesmas para as mulheres com maior autonomia e poder económico e para as "outras": na aldeia globalizada em que hoje vivemos, quem pode tem sempre a opção de abortar. Pode não a exercer, por sucesso dos métodos de planeamento familiar ou por imperativo de consciência - como também não terá de exercer se a IVG for despenalizada. Mas essa opção existe sempre. Basta ir a Badajoz ou, para as mais desafogadas, a Londres ou a Amesterdão.
E não se diga que as propostas de dita "despenalização da mulher sem liberalização do aborto" respondem, sequer minimamente, a este problema. Como todos sabemos, não existem mulheres presas em Portugal pela prática de aborto, apesar de se estimar em 20.000 o número de abortos praticados por ano no nosso país. Isto é revelador do ponto a que a sociedade em geral rejeita a criminalização desta prática - ninguém denuncia, as autoridades policiais não a tratam como prioridade de investigação, os juízes têm pudor em condenar as (poucas) mulheres acusadas. Mas o principal problema está lá: é que o aborto é remetido para a clandestinidade. As mulheres poderiam não ser condenadas a prisão (embora pudessem ser sujeitas a "penas alternativas", quase tão estigmatizantes como a prisão), mas os médicos e técnicos de saúde sê-lo-iam na mesma.
Por outro lado, as mulheres que viessem a ter a pouca sorte de cair nas "malhas da justiça" continuariam a ficar expostas e a ver a sua intimidade devassada por polícias ou magistrados no âmbito de um processo, apesar de tudo, penal. Numa campanha em que um dos argumentos utilizados pelo "não" foi o das consequências psicológicas que o aborto pode ter sobre as mulheres que o praticam, será interessante interrogarmo-nos sobre se a sujeição a um processo judicial, independentemente da pena concreta que venha ou não a ser aplicada, fará algo para minorar essas consequências... Ou seja, o que alguns partidários do "não" propõem para solucionar o problema do aborto em Portugal, é nada: não haveria mulheres na prisão (como já não há) e o aborto continuaria clandestino (como já é) e liberalizado na clandestinidade (como já está). Continuariam a existir processos penais e as mulheres continuariam a ter de expor perante estranhos os aspectos mais íntimos das suas vidas.
Diz-se muitas vezes que a solução para o problema do aborto passa, primeiro, pela prevenção das gravidezes indesejadas e, depois, pelas respostas sociais de apoio à maternidade. Concordo sem reservas que estas têm de ser prioridades do Estado. Não vejo porém em que medida é que conflituam com a despenalização do aborto. Pelo contrário, julgo ser claro que só o acompanhamento médico e psico-social das mulheres que desejam abortar permitirá apurar se a sua vontade é verdadeiramente livre para o fazer e encontrar soluções ao nível do planeamento familiar que evitem gravidezes indesejadas no futuro.
Por último, aplaudo a acção das muitas instituições particulares - algumas inspiradas na sua objecção de princípio ao aborto - que trabalham incansavelmente, por vezes com inúmeras dificuldades, para apoiar as mulheres que desejam ser mães. E espero que as mulheres possam continuar a contar com elas independentemente dos resultados de dia 11. É que a grande virtude do SIM é fazer com que todas as opções fiquem disponíveis, todas decisões possam ser tomadas em consciência. Pelo que o seu trabalho continuará a fazer todo o sentido.
Por tudo isto, voto SIM

Raquel T

Correio da Causa: "Os donos do não"

«Alguns movimentos do "não" surgiram agora com a ideia de que mesmo que o "não" vença no referendo as mulheres que praticam o aborto devem ser "despenalizadas" (apesar de isto não resolver, como é óbvio, o problema dos abortos clandestinos).
Tal ideia, parece-me a mim, só pode surgir de pessoas que se acham donas do voto "não". De facto, como podem elas ter a certeza que a maioria das pessoas que votam "não" não querem efectivamente que as mulheres que praticam o aborto sejam penalizadas com penas de prisão? Serão donas do voto "não"? O que essas pessoas pretendem é interpretar abusivamente o sentido do voto das pessoas que vão votar "não" a uma pergunta deveras clara.
Como podem dizer que há chantagem por parte do governo quando este vem dizer que tudo fica na mesma se o "não" vencer? Se o "não" vencer é porque há uma maioria de pessoas que considera que deve ser mantida a penalização no nosso ordenamento jurídico. Por isso, o "sim" é o único voto que garante a efectiva despenalização das mulheres que recorrem ao aborto, ao mesmo tempo que combate o aborto clandestino.»

Pedro R.

Correio da Causa: Os contra-sensos do não

"(...) Obrigado pela sua exposição clara das contradições do não.
No ponto 5 do seu texto faz notar que: "Ao defender agora a dispensa de punição (...), os partidários do não entram em contradição com a principal razão da sua oposição à despenalização, que é a utilização da ameaça de punição penal como meio de dissuasão da decisão de abortar."
Estes desenvolvimentos recentes da posição do "não" demonstram claramente que o interesse essencial dos proponentes do "não" é a imposição de um princípio doutrinário católico (pessoa humana desde a concepção) através dos aparelhos legal e judicial do estado Português. A insensibilidade com que se pode propor uma pseudo-solução que agrava o problema do aborto clandestino mostra que o que realmente conta é a condenação simbólica de toda a infracção do indissimulável dogma. A ocorrência reiterada das infracções torna-se até uma vantagem.
(...) Presumo que seja mais fácil reagir a este problema de forma projectiva (acusando de intolerância quem faz notar a nudez do rei) do que encarar os próprios demónios.
Pôr o dedo na ferida não será politicamente aceitável em Portugal onde os brandos costumes são soberanos (só) à superfície, mas será legítimo deixar essa brandura insalubre persistir?»

Miguel M.

quarta-feira, 7 de fevereiro de 2007

Gentilezas do «não»

Mandem mais o Prof. Gentil Martins para a frente com a bandeira do "não", por favor!
Acabo de assistir à exibição do respeitável cirurgião na SIC-Notícias (conseguiu mesmo embaraçar o Mário Crespo!...), pejada de argumentos fundamentalistas e estatisticas erróneas (as do «aumento» dos abortos em Espanha, por exemplo).
Mas, sobretudo, importa agradecer as «gentilezas» dedicadas pelo gentil professor às mulheres portuguesas - essas levianas, «que enganam os maridos» e por isso nunca irão aos hospitais, preferindo a clandestinidade do vão-de-escada para abortar; essas que "abortam porque lhes apetece" e até vêm para a televisão apregoá-lo...
Pessoal do "não" - esmerem-se em mais "gentilezas" destas, por favor!
Toda a gente do SIM agradece. Gentilmente.

terça-feira, 6 de fevereiro de 2007

Gostaria de ter escrito isto

«A primeira confusão [dos adeptos do não] é de fundo, é voluntária e tem sido explorada na propaganda. O "não" apresenta-se como se fosse o "não ao aborto" e como se os outros fossem seus apoiantes. Mas o referendo, como tem sido dito até à exaustão, é apenas sobre a despenalização e apenas em certas circunstâncias. Ninguém pretende uma promoção do aborto. É má-fé sugerir o contrário. Mesmo que o "não" ganhasse por cem por cento no dia 11 não haveria por isso um aborto a menos do que há hoje. O "não" no referendo não é um "não ao aborto".»
[José Vítor Malheiros, Público de hoje; link só para ssinantes]

Correio da Causa: Parcialidade da RDP

«A RDP (rádio) parece-me que também anda a fazer campanha pelo Não. Ontem, no noticiário das 19 horas, e hoje no das 8 horas, falaram exclusivamente e em detalhe de iniciativas de campanha do Não. Então ontem, às 19 horas, parecia um tempo de antena: dois oradores do Não, entrevistados, a explanarem em detalhe os seus pontos de vista.
Depois, no noticiário das 20 horas, em compensação, puseram só a campanha do Sim, mas com muito menos detalhe.
Não sei bem quais são os critérios da RDP mas, claramente, o ouvinte não fica com uma visão balanceada daquilo que ambos os lados andam a fazer na campanha.»

Luís L.

Os poderes ocultos na RTP

«Alegre questiona critérios da RTP na cobertura da campanha [do referendo]».

Correio da Causa: A pergunta do referendo

«Interrogo-me porque é que a pergunta do referendo sobre a despenalização do aborto tem levantado tanta celeuma entre os partidários do não e os abstencionistas. Que pergunta poderia substituir a presente (confesso que ainda não vi nenhuma alternativa)?
Creio que, a partir de outra qualquer questão que nos toque podemos reflectir por analogia. Poderíamos ter sido consultados sobre o envio de soldados portugueses para o Iraque. Nessas circunstâncias, a questão colocada poderia ser: "concorda com o envio de tropas portuguesas para o Iraque integradas numa coligação internacional para ajudar a implantar um regime democrático, derrubando o regime actual, julgando os seus responsáveis e erradicando o terrorismo internacional que ele suporta?" Contudo, a pergunta não especifica quantos soldados se enviam, quanto tempo permanecem, que tipo de missões devem realizar, etc, etc, etc., Nem poderia especificar, porque não faz sentido criar o contingente, as missões, etc, antes de existir uma decisão popular. A pergunta a fazer até poderia ser: "Concorda com o envio de tropas portuguesas para o Iraque?" De facto, tudo o que se lhe sucede será concretizado pelos nossos deputados e governantes que legitimamente foram eleitos para as respectivas funções.
Pelo exposto, não entendo como é que os vários partidos representados na Assembleia e os movimentos de cidadãos que se formaram para reflectir sobre a questão da despenalização do aborto não hão-de manter o seu envolvimento e, por essa via, fazerem ouvir as suas mais válidas dúvidas e prerrogativas contribuindo para ajudar a construir um edifício que seguramente não aparecerá como que por milagre no dia seguinte ao referendo.»

Vasco Luis T.

segunda-feira, 5 de fevereiro de 2007

IVG: SIM, pela vida

"É o sofrimento atroz, irreparável, de milhares de portuguesas e portugueses o que está em causa. Não podemos permitir que continue. Porque o que vai ser referendado no dia 11 de Fevereiro não é, de facto, o aborto. É o Código Penal. O aborto, esse vai continuar a fazer-se. A questão é como, quando e quanto."

O extracto é de um artigo meu, hoje publicado no PÚBLICO. Pode ler-se também na ABA DA CAUSA .

Correio da Causa: A "despenalização" à moda do "não"

«"d) Como justificar a manutenção do aborto na clandestinidade (pois ele continua a ser crime), se acham agora que ele não deve ser punido?"
A única coisa que se manteria, portanto, era: quem tem dinheiro vai ao estrangeiro, quem não tem vai para o vão de escada, com o "enorme conforto" de saber que não irá para a prisão. Esta "despenalização" fictícia só serve para que continue a não ser possível fazê-lo em estabelecimento de saúde próprio. Ou estou enganado? (...).»

Henrique J.

Comentário
Não, o leitor não está enganado. Mantendo-se o aborto previsto e punido no Código Penal como crime, ele não poderia ser realizado nos estabelecimentos de saúde legalmente reconhecidos, continuando à margem do sistema de saúde. Por outro lado, manter-se-ia para as mulheres o estigma do crime e da condenação penal.

Correio da Causa: O PSD e o referendo

«Temos vindo a assistir, na minha opinião, a uma campanha encapotada do PSD pelo "não" no referendo à despenalização do aborto.
Não falo da posição pessoal do Dr. Marques Mendes, mas dos tempos televisivos de antena oficiais do partido. Sob o pretexto de "informar os portugueses", o PSD tem vindo a lançar ainda mais a confusão.
No primeiro tempo de antena, os portugueses foram esclarecidos que a pergunta que se nos coloca é sobre uma «liberalização total» do aborto.
No segundo tempo de antena, ficou bem claro que os cientistas e médicos estão «unanimemente» na defesa da vida humana desde a sua concepção, pois "não se trata de uma questão ética ou filosófica".
Que mais se seguirá?
É lamentável tamanha incoerência e desonestidade. (...) Porque não terão assumido, como deviam, o lado do "não"? (...)»

João T.

Comentário
De facto, a duplicidade do PSD nesta referendo é flagrante. Por um lado, faz "flirt" com os sectores laicos do partido, declarando que não tem posição oficial sobre o referendo; por outro lado, faz campanha efectiva contra a despenalização, ficando de bem com os sectores mais conservadores e com a Igreja Católica. Ou seja: "a tocar dois carrinhos".
No entanto, penso que a posição oficial sempre permitiu o empenhamento de muitos dirigentes e militantes do PSD do lado do sim, o que não teria ocorrido, pelo menos com a mesma dimensão, caso o partido tivesse optado oficialmente pelo não.

Condecorações II

Ninguém explica aos funcionários da Presidência da República que não se deixa nenhum condecorado civil sair de Belém de faixa traçada? ou seja, que há regras que disciplinam o uso das condecorações...

Correio da Causa: "Fretes da RTP"

«Acho que não tem razão no seu ataque à RTP, pelo menos no que respeita à "segunda volta" do Prós e Contras. O assunto é suficientemente importante para merecer dois programas e só se pode ganhar com mais discussão. E se os do "não" avançarem com as suas novas propostas hoje, cabe aos do "sim" desmascará-las. Não vejo motivo para o receio que parece manifestar. E também me parece despropositada a acusação implícita que faz à responsável pelo programa».
Fernando S.

Comentário
Tem razão o leitor. A minha nota foi precipitada no que respeita ao Prós & Contras e involuntariamente injusta no que respeita a Fátima Campos Ferreira. Aqui fica a correcção.

Condecorações

Sinto-me em desconfortável companhia, com o Dr. Souto Moura condecorado hoje com a Grã-Cruz de Cristo.
Ninguém explica ao Presidente Cavaco Silva que a Ordem Militar de Cristo, a mais prestigiada e a mais preservada condecoração portuguesa, não se entrega a ninguém por exercício de ofício?

Ainda os fretes da RTP

E o tempo desmesurado e desequilibrado que a RTP concedeu à propaganda do «não» no Telejornal das 20.00 horas de ontem?

Os fretes da RTP

Não pode ser mais escamoteada a parcialidade da RTP neste referendo, em favor do "não".
Como se não bastasse a tribuna privilegiada proporcionada a Marcelo Rebelo de Sousa, nem a sistemática utilização tendenciosa da expressão "referendo do aborto" em vez de "referendo da despenalização do aborto" (onde estão o Provedor do tele-expectador e a ERC na condenação desta manifesta falta de rigor informativo?) vem agora o "frete" da oferta de uma segunda volta do "Prós & Contras", hoje, para permitir aos partidários do não difundirem a grande manobra de mistificação que eles inventaram à última da hora (ver posts precendetes).

O oportunismo paga-se

É evidente que tanto Matilde Sousa Franco como Rosário Carneiro abusam da sua posição de deputadas "independentes" do PS para militarem na oposição à despenalização do aborto, contra a posição oficial do Partido de que são deputadas, com uma visibilidade que nunca teriam se não tivessem essa qualidade.
Mas é evidente que isso nunca poderia suceder, se não fosse o oportunismo político do PS (primeiro em 1995, depois em 2005) em integrar no seu grupo parlamentar personalidades ostensivamente de direita, que nada compartilham com o património político e cultural do PS, como é o caso das duas referidas deputadas. O oportunismo político paga-se, cedo ou tarde. E ainda bem!

domingo, 4 de fevereiro de 2007

A grande manobra (2)

A manobra de mistificação de última hora dos opositores ds despenalização do aborto (ver post precedente) revela duas coisas: (i) que eles já não a acreditam na repressão penal como meio de impedir o aborto; (ii) que eles estão disponíveis para trocar a "defesa da vida", com que até agora tinham enchido o seu discurso, por uma operação do mais cínico oportunismo.
Na iminência de perderem o referendo, estão dispostos a tudo, desde que salvem o seu sectarismo moral. Coerência e escrúpulos, eis o que não abunda na hostes do "não".

A grande manobra

É oficial. Numa operação concertada, a frente comum dos movimentos do "não" e os dirigentes políticos com eles alinhados (incluindo Marques Mendes) vieram lançar uma grande manobra de mistificação do referendo, afirmado-se agora também a favor da "despenalização" do aborto. Ou seja, votar contra a despenalização seria, afinal, votar na despenalização!?
O aborto continuaria a ser crime, previsto e punido no Código Penal, como hoje. Só que, defendem agora, não haveria punição.
O que não dizem é o seguinte:
a) Como compatibilizar essa "despenalização" com o resultado do referendo, se o "não" vencesse (pois o que está em causa é mesmo a despenalização)?
b) Como explicar a ideia de um crime sem punição?
c) Como impedir as mulheres de "abusarem" do aborto (como dizem pretender), se deixar de haver a ameaça de punição?
d) Como justificar a manutenção do aborto na clandestinidade (pois ele continua a ser crime), se acham agora que ele não deve ser punido?

Espaço de manobra... perigosa

No passado dia 11 de Janeiro, a China lançou um míssil de médio alcance contra um seu satélite obsoleto. (...) Pequim agiu por razões estratégicas ligadas à crescente rivalidade com os EUA (...) Mas a verdade é que o teste chinês representa uma escalada perigosa e ameaçadora para todo o mundo(...) Todos os países dependem hoje do uso pacífico do espaço, enquanto só algumas potências têm a capacidade de militarizá-lo. Tal como na proliferação nuclear, será apenas uma questão de tempo até que outras lhes sigam o (mau) exemplo, com riscos catastróficos para todo o mundo.

Estes são extractos de um artigo meu publicado no COURRIER INTERNACIONAL em 2.2.2007. Pode também já ser lido na ABA DA CAUSA.

sábado, 3 de fevereiro de 2007

Estratégia da confusão

Em desespero de causa, os opositores à despenalização do aborto - que é o que está em causa no referendo -- também se dizem agora pela... "despenalização", à sua maneira, claro, ou seja, mantendo o aborto como crime! É isso que explico no meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe, agora disponível na Aba da Causa.

sexta-feira, 2 de fevereiro de 2007

Negócios da China II

Em 30 de Novembro de 2005 escrevi aqui, a propósito da visita do Primeiro-Ministro chinês a Lisboa e do embargo de armas da União Europeia sobre a China:
"a firme oposição do PE ao levantamento do embargo (e eu não me arrependo de ter trabalhado nesse sentido). Pelo menos enquanto não houver avanços significativos na protecção dos Direitos Humanos naquele país e um esclarecimento sobre a sorte das vítimas que sobreviveram ao massacre de Tien An Men, muitas até hoje desaparecidas, outras presas. (...)Os governantes chineses, com proverbial paciência, aguardam presidências [da União Europeia] mais favoráveis, disponíveis para a vergar numa questão que envolve ... negócios da China. Com os olhos em Portugal, que em 2007 assumirá a presidência da UE."
Depois de o MENE ter considerado os Direitos Humanos uma questão marginal nas relações com a China, o próprio Primeiro Ministro declarou que "há pontos que estão a ser trabalhados há muito tempo (...) esses pontos exigem negociação", como é o caso "do embargo da venda de armas."
Lembro que a presidência luxemburguesa em 2005 teve que pôr travões a fundo à ânsia de convencer os outros parceiros da UE a levantar o embargo de armas à China, por causa da pressão combinada dos EUA, do Parlamento Europeu e de dezenas de ONGs de Direitos Humanos.
Lembro que a situação dos Direitos Humanos na China continua desastrosa, com a Amnistia Internacional a assinalar a execução de quase 1.800 pessoas naquele país só em 2006, revoltas rurais a serem reprimidas de forma sangrenta e a censura do regime a asfixiar a livre troca de ideias até na internet. Mas acima de tudo, Pequim não dá sinais de querer revelar o que verdadeiramente aconteceu a centenas de mortos e desaparecidos na sequência do massacre de Tian An Men, nem de levar a cabo reformas políticas para pôr fim à ditadura que, apesar de alguns progressos no plano económico, continua de ferro no campo das liberdades civis e políticas.
Lembro que, quando o PM e o MENE afirmam que a posição de Portugal a este respeito "é a mesma da União Europeia", estão a omitir o facto de o Conselho Europeu estar profundamente dividido em relação ao levantamento do embargo.
Se estas declarações do PM e MENE indicam, como parecem, que a Presidência portuguesa da UE vai levar a cabo uma ofensiva diplomática a favor do levantamento do embargo de armas sobre a China, devem estar preparados para uma confrontação com o Parlamento Europeu, com ONGs de todo o mundo e... com os Estados Unidos. (E aí, mais com o Congresso, do que com a Administração).
Se, por outro lado, estas declarações não passarem de uma ofensiva de charme para chinês ver, então tudo isto é triste e pouco digno - e diz muito sobre uma visão de curto prazo e sem princípios da política externa.
Mas nada disto surpreende, sabendo-se como estão a ser geridos outros dossiers internacionais. E sabendo-se também que acaba de ser eliminada a Divisão de Direitos Humanos do MNE...
Não é preciso muito mais para demonstrar como o Primeiro Ministro está mal aconselhado em matéria de política externa.

Os Oliveilas das Figueilas

Está tudo incomodado com as "bocas foleiras" do ministro que foi para Pequim como para o pinhal da Azambuja, vender-nos a preço de saldo e dizer mal dos sindicatos (os "comunistas" chineses concorrem....)
E já não bastava a visita do nosso Primeiro Ministro à China se fazer com o Presidente e vários governantes chineses por fora, a viajar por África (e a abraçar sujeitos como o Presidente do Sudão, um dos responsáveis pela tragédia no Darfur ... fica tudo em família!).
Ainda tinham de vir alguns dos nossos pacóvios salivar, delirantes, por uns jeitos e negócios a facilitar a Pequim em terras africanas...
Como se os chineses não estivessem já de banca montada em África... e não se dessem por mais do que esclarecidos sobre os Oliveilas das Figueilas que passaram 500 anos na China a fazer negócios da treta, sem saber lá deixar posições económicas que se vissem, nesta era da globalização.

quinta-feira, 1 de fevereiro de 2007

Correio da Causa: Aborto

«É decisivo insistir na necessidade de uma clarificação da posição do PS relativamente ao problema da previsão, ou não, de uma consulta de aconselhamento prévio e/ou período (curto) de reflexão.
Esse ponto faz toda a diferença: nele se distinguem, por um lado, os "sins" que querem defender a vida, mas consideram a protecção penal ineficaz e inadequada e, por outro lado, os "sins" que não se preocupam com a defesa da vida e, portando, acham indiferente que a mesma fique inteiramente desprotegida durante 10 semanas (para já não falar daqueles "sins" que acham que o que está em causa é só o direito da mulher a dispor do seu próprio corpo).
Disso depende o meu voto - que até agora é "não" - e o de muitas outras pessoas.
Receio bem, no entanto, que esse esclarecimento não venha a acontecer, porque o "sim" maioritário no PS não vai no sentido da adopção desses mecanismos preventivos de protecção da vida e está convencido que pode ganhar o referendo sem fazer essa "concessão" aos adeptos do não.
Em conclusão: se ganhar o não, vamos continuar a ter uma lei que protege mal a vida e que usa a tutela penal sem ser "ultima ratio"; se ganhar o sim, vamos ter uma lei ainda pior, porque não protege de toda a vida durante as primeiras 10 semanas.
É pena ter de optar entre o mau e o ainda pior, quando entre o "sim" e o "não" existe um ponto de equilíbrio bastante aceitável.»

Jorge P. S:

Why on earth!?

«Cavaco condecora Souto Moura» (Público de hoje).

quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

Ainda bem!

A dirigente parlamentar do PS, Ana Catarina Mendes, veio garantir que, se a despenalização do aborto vencer no referendo, a lei regulamentadora a aprovar pela AR deverá estabelecer um mecanismo de decisão informada e ponderadapor parte das mulheres que desejem abortar.
Só posso saudar esta decisão (que defendi no Programa "Prós e Contras"), esperando que ela venha a ser oficialmente confirmada pela direcção do PS e pelo Primeiro-Ministro. Assim se contraria de forma eficaz a acusação de "aborto a pedido" e de "aborto livre" que os adversários da despenalização têm brandido.

segunda-feira, 29 de janeiro de 2007

Correio da Causa: "O meu voto"

«Em 1998, apesar de não ter podido votar, enverguei t-shirts com letras garrafais apelando ao voto Não. Passaram 9 anos. Mudei de opinião. Dia 11 de Fevereiro votarei SIM.
O meu voto é um voto sem militância religiosa ou partidária. É um voto sem ideologias. É um voto sem certezas absolutas. Resulta da ponderação dos vários factores, tantas vezes antagónicos, que estão em jogo neste referendo.
O meu voto pretende responsabilizar as mulheres, dando-lhes a oportunidade de tomar um decisão livre e consciente. Abortar diz, fundamentalmente, respeito à mulher. Porque é a mulher que é acusada por esta lei feita por homens. Porque é a mulher que tem que se sujeitar à gravidez. Porque os homens não têm qualquer dever perante a gravidez. Porque os homens, muitas vezes, não querem saber.
O meu voto pretende acabar com a clandestinidade. Não vale a pena continuarmos a enfiar a cabeça na areia: quem quer abortar e tem dinheiro vai a Espanha. Quem não tem dinheiro vai à clandestinidade comprar uma complicação que lhe pode amputar definitivamente a capacidade reprodutiva ou mesmo a vida.
O meu voto é pela coerência. Quando abandonamos as populações à sua sorte, não apostando em verdadeiras políticas de Educação Sexual e Planeamento Familiar, não temos legitimidade para castigar a mulher. E, mesmo que possamos, em consciência, condenar o acto da mulher que abortou, o que é que resolve submeter as mulheres à humilhação pública de um julgamento? Porque é que é entre os apoiantes do Não que encontramos as maiores resistências à implementação da Educação Sexual nas escolas?
O meu voto pretende criar mais justiça social. Não é raro depararmo-nos com terríveis histórias de vida a que a lei actual é completamente insensível e que o Código Penal continua a penalizar. Devemos respeitar o sofrimento do outro como o sofrimento do outro. Não vale a pena dizermos "o que faríamos se...". É que o "se..." faz toda a diferença.
O meu voto é pela tolerância. Este é inegavelmente um assunto sensível que divide a sociedade portuguesa. Não há certezas absolutas. Votar SIM abre uma janela de esperança e liberdade para todos. Votar Não é a manutenção da imposição de uma visão que não é nada consensual na sociedade portuguesa.
Dia 11 de Fevereiro, votarei SIM. (...)»

Pedro M.

12 razões pela despenalização

Embora com atraso, já consta da Aba da Causa o meu artigo da semana passada no Público.
Amanhã há mais, nas mesmas páginas, sobre o mesmo tema.

Correio da Causa: Barragem do Côa

«(...)Mas o projecto do Côa nunca foi abandonado! Teve seguramente altos e baixos e a sua "provocação" é seguramente um sintoma disso mesmo. Se é para nos incentivar a bem realizar um grande Museu de Arte e Arqueologia do Vale do Côa que honre o país e a região e cuja "primeira pedra" acabámos agora de inumar, pode ter a certeza que tudo faremos para que o projecto do Côa não caia no buraco rasgado por uma barragem inacabada e cuja ferida é preciso tratar! Qualquer país europeu que possua no seu território arte rupestre da pré-história antiga, em gruta ou fora dela, orgulha-se disso mesmo, classifica-a e protege-a. Em Portugal, depois do Côa se ter tornado um caso exemplar de protecção desse tipo de património pela decisão política que sobre ele foi tomada, hoje parece ter-se transformado num empecilho para alguns fazedores de opinião que teimam continuar a não entender porque se abandonou aquela barragem!»
António M. B.

domingo, 28 de janeiro de 2007

Roma, por exemplo (2)

Quando ouço os protestos lisboetas contra a localização do novo aeroporto da capital, acusado de ser um grande incómodo para os locais e de trazer prejuízos para o turisno de Lisboa, lembro-me sempre, entre outros casos, do aeroporto de Roma-Fiumicino. A 30 km da capital, a viagem ferroviária até à estação central da cidade (Roma-Termini) demora uns 30 e poucos minutos. Não consta que o turismo romano se queixe...
No caso de Lisboa e da Ota, mesmo que mais distante, uma ligação ferroviária expresso pode proporcionar uma ligação tão rápida, ou mais, do que na capital italiana. E o que conta é o tempo, e não a distância.