terça-feira, 21 de agosto de 2007

Um pouco mais de rigor sff

«PIB decresce no segundo trimestre de 2007» - diz o Sol. O disparate é tão indesculpável quanto evidente. O que decresceu não foi o PIB (o que seria um recessão, da qual estamos felizmente livres), mas sim a taxa de crescimento do PIB.
Assim se faz jornalismo entre nós -- levianamente...

Desigualdade de armas

Enquanto o mundo dos negócios puder continuar a financiar ilicitamente -- e impunemente! -- os "seus" partidos, há sempre uma desigualdade de armas na luta política.
E os partidos que aceitam receber dinheiro de empresas privadas, como podem deixar de defender os interesses privativos dos seus financiadores!?

"Double standards"

O Presidente da República foi lesto e enfático a exigir a garantia de cumprimento da lei por parte das autoridades no caso de invasão e destruição de bens privados por um grupo ambientalista radical, um caso trivial de responsabilidade penal e civil. Que diferença em relação à sua frustrante reacção quanto à recusa do Governo regional da Madeira -- uma autoridade pública -- em cumprir uma lei da República, em que o Presidente não teve mais para dizer do que remeter a questão para os tribunais!

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

"Liberdade de profissão"

«Existe em Portugal uma tradição corporativa de malthusianismo profissional, que tem produzido restrições excessivas da liberdade profissional. Provavelmente, em nenhum outro país existem tantas profissões que exigem um grau académico de nível superior, como entre nós. Num país onde as taxas de ensino secundário completo são das mais baixas da Europa, a exigência de níveis académicos elevados para o exercício de profissões constitui um factor de exclusão de muita gente.» -- excerto do meu artigo da semana passada no Diário Económico, agora também na Aba da Causa.

Mandarinatos

Quando a autonomia universitária medra em ambientes nocivos e é instrumentalizada por medíocres actores, geram-se estes mandarinatos universitários, autoritários, ressentidos, censórios e irresponsáveis.
A minha solidariedade com J. Adelino Maltez, cuja obra académica honra a escola que tão mal o merece.

"Resistência civil"

Não pode aceitar-se a justificação da destruição de uma plantação de milho transgénico no Algarve em nome da "resistência civil" ou "desobediência civil".
Trata-se de abuso puro e simples de nobres conceitos, que designam a desobediência ou resistência colectiva a uma ordem ou operação dos poderes públicos, ou a uma situação política, lesiva dos direitos ou interesses legítimos dos resistentes, ou do interesse geral. Fora de situações de anormalidade institucional (revoluções, insurreições), isso não inclui o ataque, mesmo que a título simplesmente "demonstrativo", à propriedade alheia (privada ou pública) nem outros meios de "acção directa".

Deficiências

Toda a gente sabe que há abuso de declarações de deficiência para efeitos fiscais. Conta-se até, caricaturalmente, que entre os que declaram deficiência visual se contam... cirurgiões!
Infelizmente não basta verificar se as declarações fiscais se encontram documentadas. O problema é sempre o mesmo: a facilidade (e a impunidade) com que em Portugal se fazem falsas certificações médicas de doença, de deficiência, de incapacidade, etc. Por isso, um pouco mais de rigor, precisa-se. Para que só beneficie das regalias e isenções legais quem realmente preencha os respectivos requisitos.

Direito de réplica

É evidente que não compartilho do radicalismo de J. M. Correia Pinto (Público de sábado passado) sobre o controlo judicial da actividade administrativa e, ainda menos, da actividade governativa, mesmo se a diferença surge acentuada na sua exposição por efeito da caricatura que ele faz das minhas posições (que são conhecidas e estão expostas nas minhas lições universitárias, pelo que em dispenso de me alargar sobre o tema).
Mas o que me causou verdadeira surpresa foi a sua acusação (não consubstanciada, aliás) de que eu teria ultimamente defendido a limitação da liberdade dos jornalistas, da autonomia universitária e da democracia participativa. Nada disso é verdadeiro, porém.
Em relação à liberdade dos jornalistas, a acusação só pode referir-se à defesa que tenho feito da vinculação dos jornalistas ao segredo de justiça (reduzindo este ao mínimo) e de um mecanismo de (auto)disciplina profissional. Sucede que defendo ambas as coisas há muitos anos (a segunda há mais de uma década!) e que não há liberdade sem responsabilidade. De resto, em nenhum dos casos existe qualquer interferência governamental ou administrativa.
Em relação à autonomia universitária, a acusação só pode ter por objecto a minha defesa do recente regime jurídico do ensino superior (concordância em geral, pois discordo de algumas soluções, incluindo quanto ao sistema de governo). Mas esse diploma não implica nenhuma restrição da autonomia universitária; pelo contrário, aumenta-a.
Em relação à democracia participativa, a acusação tem a ver provavelmente com a minha manifestada preocupação (sob o ponto de vista da democracia representativa de base partidária) pelo considerável apoio eleitoral das candidaturas independentes nas recentes eleições municipais de Lisboa. Mas há aqui uma manifesta confusão. A democracia participativa nada tem a ver com as candidaturas independentes (ou pseudo-independentes) na democracia eleitoral em competição com as candidaturas partidárias, que muitas vezes não passam de expressão e veículo da mais pedestre demagogia.
Rejeito portanto, as referidas acusações, inteiramente injustificadas. Quando se fazem críticas desta gravidade, exige-se ao menos que o "corpo de delito" seja consubstanciado.

"Ocupação selvagem"

«Não existe expropriação mais intolerável do que a feita por alguns daquilo que é (e deve continuar a ser) de todos» -- do meu artigo da semana passada no Público, agora coligido na Aba da Causa.

domingo, 12 de agosto de 2007

E bem !

«Torga: Ausência do Governo fortemente criticada».

O veto (2)

Qualquer semelhança entre o que eu escrevi sobre o veto presidencial (ver post anterior) e o que o editorialista do Expresso de sábado passado diz que eu disse é pura coincidência.
Entre outras tonterias, o editorialista diz que eu sou "especial apoiante" de Augusto Santos Silva. Ora, no que respeita ao Estatuto dos Jornalistas eu só me pronunciei sobre um dos seus aspectos, a saber, a competência disciplinar da Comissão da Carteira Profissional, ideia que defendo há mais de dez anos, e que portanto não podia deixar de aplaudir. Quanto ao mais, até manifestei a minha concordância com as objecções do Presidente da República!
Por que é que os jornalistas, quando se trata de questões do seu interesse profissional são mais corporativistas do que qualquer outra profissão?

"O veto"

Importei para a Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, sobre o veto presidencial ao Estatuto dos Jornalistas.

Imagens estivais


sábado, 11 de agosto de 2007

Notícias do SNS

«Há doentes com cancro à espera mais de um ano».
Eis notícias que não podem deixar de preocupar. É certo que os números das listas de espera de cirurgia mostram melhorias significativas, em grande parte devido à subcontratação a estabelecimentos privados ("vales-cirurgia"), mas a situação ainda é inadmissível. Por outro lado, a subcontratação não pode ser um meio de desresponsabilização dos hospitais públicos e de enriquecimento dos privados à custa do orçamento do SNS. Há que estabelecer estritas regras de conflitos de interesses. Quem tem responsabilidades no (mau) desempenho das unidades de saúde públicas não pode participar depois na sua recuperação no sector privado. Isto aplica-se tanto a dirigentes como a profissionais.

Imagens estivais


terça-feira, 7 de agosto de 2007

Ao Provedor de Justiça...

..não basta ser isento; é preciso parecê-lo.
Nascimento Rodrigues não deve desbaratar agora, na fase final do seu mandato, o capital de objectividade e prudência que proficientemente criou ao longo do tempo.

Ainda dizem que não há pluralismo

«Presidente do IDT assina artigo contra Governo».
Acusam o Governo de querer controlar toda a Administração Pública. Pelos vistos, porém, se este senhor, depois de assinar um manifesto do PCP contra o Governo -- mostrando que a solidariedade partidária é maior do que a lealdade funcional para com o Governo cujas políticas tem o dever de implementar --, se mantiver à frente do referido instituto público, isso quer dizer que nem sequer controla a máquina governamental.

Imagens estivais


segunda-feira, 6 de agosto de 2007

Outros lugares

Acabo de enviar o meu artigo para a edição de amanhã no Público (sobre o veto presidencial ao Estatuto dos Jornalistas). Entretanto, dei-me conta de que ainda não tinha importado para a Aba da Causa o artigo da semana passada, "Dois Países" (sobre a recusa do Governo regional da Madeira em cumprir a lei do aborto).

Distinção

Há quem insista em confundir os cargos públicos de live nomeação (e livremente exoneráveis), que sempre implicam uma relação de confiaça política e uma margem de discricionariedade política no exercício de funções, e a função pública propriamente dita, constituída por funcionários de carreira, que não são livremente seleccionados nem são livremente exoneráveis e cujas funções decorrem da lei.
No dia em que os ministros pudessem demitir os segundos por razões políticas, deixaria de haver Estado de direito e função pública independente. No dia em que os ministros não pudessem demitir livremente os primeiros por razões políticas, deixaria de haver governos capazes de levar a cabo as suas políticas.
Será tão difícil compreeender esta distinção elementar? Que a directora de um museu não o entenda, é mau; que analistas e comentadores o ignorem, é pior.

domingo, 5 de agosto de 2007

Coerência e bom-senso

Os que defendem que um director de um museu do Estado tem direito de criticar a política de museus do Ministério da tutela sem se demitir (como se fosse possível executar lealmente uma política de que se discorda...) ainda hão-de defender que um chefe de esquadra pode criticar a política de segurança ou que o chefe de uma unidade militar pode criticar a política de defesa.
Haja coerência, senhores! E já agora, bom senso...

Falta de médicos

Numa entrevista ao Público de hoje, o Ministro da Saúde revela que o SNS vai importar médicos do Uruguai e que o numerus clausus das faculdades de Medicina continua a ser inferior às necessidades.
Ocorrem-me três notas:
a) Ainda está por fazer o julgamento político dos ministros da saúde e da educação que, juntamente com a Ordem dos Médicos, conspiraram para reduzir criminosamente o número de vagas em Medicina durante os anos 80 e primeira metade dos anos 90;
b) O problema do acesso a Medicina não é somente o da carência de médicos nos serviços de saúde, mas também o direito das pessoas a escolherem a sua profissão;
c) Continuo sem perceber por que é que pode haver escolas de ensino superior privadas em todas as áreas excepto em Medicina.

sábado, 4 de agosto de 2007

Imagens estivais


O veto (3)

No seu editorial de hoje no Público, José Manuel Fernandes insiste em contestar o regime de disciplina profissional previsto no novo Estatuto do Jornalista (que o veto presidencial não contesta em si mesmo), afirmando que se trata de um regime insólito, na medida em que dá força de lei aos deveres deontológicos da profissão e institui sanções para a sua violação.
Não tem razão, porém. O mesmo sucede na generalidade das profissões reguladas, nomeadamente as organizadas em ordens profisionais, que também estabelecem esquemas oficiais de (auto-)disciplna profissional, incluindo sanções pela violação de deveres deontológicos, que têm força de lei. O facto de o código deontológico da Ordem dos Médicos continuar a considerar o aborto como falta deontológica grave em todas as circunstâncias só quer dizer que essa norma é ilegal (como procurei provar em artigo no Público, há alguns meses).

O veto (2)

Os partidos da oposição e os grupos profissionais que se opuseram à lei saudaram todos o veto presidencial do Esatuto do Jornalista.
A meu ver, sem razão o fazem, pois o PR ficou longe de lhes dar razão. Não põe em causa a quebra do sigilo das fontes (mas somente os termos relativamente indefinidos em que o diploma a admite), não questiona de modo algum a alegada violação dos direitos de autor dos jornalistas, não impugna também o novo regime de disciplina profisional, porventura a grande inovação da lei (discordando somente da medida das sanções previstas).

O veto

O Presidente da República resolveu vetar o Estatuto do Jornalista. Nada a objectar quanto ao veto em si mesmo, considerando o objecto do diploma e as controvérsias que suscitou.
No entanto, analisadas as razões do veto presidencial (com as quais estou em geral de acordo...), verifica-se que estão em causa pontos relativamente secundários da lei, sem põr em causa a sua filosofia e as suas principais inovações. A questão que se coloca é a de saber se o Presidente deve "gastar" vetos para efeitos de "microcontrolo legislativo", quando a sua discordância é de pequena ou média intensidade, sobretudo se isso pode ser lido como uma satisfação dada aos grupos contestários da lei (que chegaram a organizar uma manifestação junto ao Palácio de Belém), com os riscos de precedente que isso pode criar.

quarta-feira, 1 de agosto de 2007

É pena! (2)

Na mesma entrevista Fernando Teixeira Santos exclui também a hipótese de extinção da ADSE, argumentando que se trata de um «subsistema de saúde importante para a função pública».
Por minha parte, continuo a pensar que a ADSE não se justifica tal como está. Primeiro, não faz sentido que, sustentando o Estado o SNS como "serviço universal", mantenha depois um subsistema de saúde privativo para os seus funcionários. Segundo, não se compreende que os contribuintes paguem cumulativamente o SNS para toda a gente e um subsistema próprio dos funcionários públicos.
Resta esperar que o Governo assegure a "(auto)sustentabilidade financeira" da ADSE, como promete o Ministro das Finanças, o que só pode ser alcançado com o aumento das contribuições. Tal como sucede no sector privado, devem ser os beneficiários a sustentar financeiramene os subsistemas de saúde de que usufruem. É uma questão de equidade social e fiscal.

É pena!

Perguntado pelo Diário Económico sobre se está a considerar reduzir as deduções fiscais com despesas de saúde, o ministro das Finanças declarou que «essa matéria não está sobre a mesa [e que] não há intenção de mudar nada».
É pena, como já escrevi várias vezes. Primeiro, as referidas deduções ficais representam uma pesada despesa orçamental. Segundo, elas beneficiam sobretudo as camadas socias mais abastadas, que recorrem a serviços de saúde privados. Terceiro, elas disrtorcem a proporcionalidade do IRS a favor de quem mais ganha. Quarto, elas constituem um meio de "opting out" furtivo do SNS. Quinto, a redução ou eliminação dessas deduções permitiria baixar as taxas de IRS sem perda de receita fiscal
O mesmo se diga aliás das deduções relativas às despesas de educação.
Não é compreensível esse conservadorismo fiscal de um Governo socialista. Cada vez mais, a política fiscal é um dos padrões decisivos da distinção entre a esquerda e a direita.