quinta-feira, 22 de maio de 2008

Teorema de Pitágoras


12 horas de carro e mais kms num só dia do que aqueles que consigo fazer em dois meses. Senti-me por isso, no dia que passou, simultaneamente desportista radical e muçulmano – duas coisas que jamais imaginei ser. A primeira porque finalmente conduzi e logo no deserto (e não atasquei o carro!); a segunda porque o estado da minha ferida é tal que passo todo o tempo que posso de rabo para o ar, como quem ora a Meca. Como é a posição mais confortável para mim, julgo que tenho rezado a Alá mais vezes por dia do que os próprios indígenas.
Saímos cedinho da enorme e feia Al Ain para um último giro pela montanha Hafeet, um monstro de pedra que vem sendo progressivamente reduzido para alimentar a futura megalomania das Palm Islands. Consta que, há 2000 anos, Hafeet estava coberta de água. Hoje, ajuda alguns a cobrirem-se de ouro. Seguiu-se muito asfalto, como por exemplo uma estrada com uma recta de 120 kms que nos levou a almoçar ao oásis de Liwa. Posto isto, entrámos deserto adentro até à Duna Grande e ficámos um par de horas a brincar na areia. Já trago mais de 200 fotos na Nikon novinha em folha mas sou um mero amador, sem estaleca para a máquina. No fundo, sinto-me um mero Miguel Sousa, tristemente despojado do Tavares.
Mas a verdadeira aventura do dia foi quando o meu carro se atrasou, perdeu a restante comitiva, e falhou um desvio. Durante duas horas – e com o primeiro terço feito na reserva de combustível – 4 tugas estiveram alegremente perdidos nos Emirados. Não uso o advérbio de modo em vão. Cantámos Rui Veloso, violámos limites de velocidade, ligámos de meia em meia hora o GPS quase sem bateria, parámos para beber umas fresquinhas da cooler e, como disse o grande Gonçalo - da Newspeed, na tranquila segurança do seu sentido de orientação, interpretámos o teorema de Pitágoras: enquanto os restantes fizeram os quadrados, nós cumprimos os catetos. Com o bónus de termos chegado a Abu Dhabi uma hora antes do resto do grupo – que teve um probleminha rapidamente solucionado com a rigorosa polícia local.
Finalmente no hotel, duas coisas rebentaram: um dos Chevrolet “berrou” de vez e a minha ferida finalmente explodiu. Mas esta saga fica para amanhã. Já estou cansado de escrever em pé.

Nota: na primeira crónica desta viagem mencionei que o engraçadinho do grupo já tinha sido encontrado antes mesmo de chegarmos ao destino. Devo agora fazer-lhe justiça: o homem não merece o diminutivo – é mesmo engraçado.

quarta-feira, 21 de maio de 2008

Privilégios de Lisboa e do Porto

O Governo anunciou o congelamento dos passes sociais até ao fim do ano. Cabe perguntar se esse benefício é para valer em todo o País onde há transportes colectivos urbanos, ou se se aplica apenas a Lisboa e ao Porto, onde os transportes colectivos são do Estado, e onde o orçamento do Estado paga os seus enormes défices.
A ser assim, torna-se mais uma vez evidente que os contribuintes do resto País, muitos dos quais pagam os transportes colectivos dos seus municípios, pagam também como contribuintes os transportes de Lisboa e do Porto. Para quando a descentralização dos transportes urbanos das duas principais cidades do País para os respectivos municípios, como empresas municipais ou intermunicipais?

Má ideia

«Galp pede baixa do imposto sobre os combustíveis».
Tal proposta, compreensível do lado da Galp, não deve ser seguida. Primeiro, o imposto sobre os combustíveis é em si mesmo justo, por onerar um produto altamente poluente e por incidir sobre os contribuintes com mais posses. Segundo, não havendo espaço para redução das receitas fiscais, por causa da disciplina orçamental, a baixa desse imposto colocaria sob pressão a meta do défice orçamental para o corrente ano. Terceiro, a via para a redução da factura petrolífera é a redução do consumo, mediante medidas de eficiência, incluindo a substituição do transporte automóvel pelo transporte colectivo.
Com a perspectiva de continuação da escalada dos preços, não se pode manter a ilusão de que é possível continuar a aumentar o gasto de combustíveis. O choque dos preços do petróleo só pode ter uma resposta no choque da redução do consumo.

Na terra onde até a água é da cor do dinheiro


Um velho lugar comum sobre as viagens assegura que estas nos despertam vigorosamente os 5 sentidos. Ora, isto deixa de parecer romântico quando o sentido em questão é o olfacto e nos encontramos a dois metros de um camelo. Enfim, ossos do ofício. Na Arábia, sê árabe. Para mais, é very typical.
O dia começou às 4 e meia da manhã, após outra noite de apenas 3 horas nos braços de Morfeu - mas com a atenuante de ter sido passada num acampamento por nossa conta em pleno deserto. Um homem não é um homem enquanto não der um gritinho sufocado ao julgar ter visto um escorpião.
Uma hora depois estávamos com Captain Dee, um inglês com pinta de pirata cool, que há 25 anos faz do voo em balões a sua vida. O pequeno-almoço que se seguiu esteve para consistir neste vosso escriba. Após uma hora a ser cozido pelo ar quente do balão, só faltava servirem bacon para a comitiva ter um verdadeiro breakfast à inglesa. Mas, claro, é uma experiência esmagadora (e mais não digo para vos deixar roídos de inveja).
Hoje fizemos 9 horas de carro envolvendo pelo menos 3 dos emirados. E esta é a boa notícia. A má é que amanhã faremos 12. Má, claro, para todos aqueles que têm uma cicatriz palpitante a poucos centímetros daquele sítio onde o sol não brilha. Acrescento apenas que, neste preciso momento, escrevo-vos sentado sobre uma toalha molhada – e peço desde já desculpa por esta imagem que certamente vos perseguirá até ao fim da vida.
Houve surpresas: um mergulho a meio do dia que me soube a termas e meia hora de Moto 4 nas dunas. Adoro a máquina e, pelos vistos, era o único dos não profissionais com experiência. Mas, no estado em que tenho essa parte das costas, pensei: dubia ir, mas – fónix! - não dubou.
Após largas centenas de quilómetros, posso afirmar que os EAU fazem lembrar um cara-pálida a quem os índios arrancaram o escalpe. Seco, abrasivo, inóspito, cru. Parece que dizimaram as árvores e pelo menos duas camadas de epiderme da terra. Mas os nativos compensam a pobreza rija da região com carradas de luxo e mau gosto. Ainda assim, vale muito a pena estar cá. Explicarei nos próximos capítulos.

terça-feira, 20 de maio de 2008

Eu, rabo torto, me confesso




A minha carreira no todo-o-terreno acabou antes mesmo de começar. Mas antes, expliquemos o título.
Sou natural da ilha açoriana da Terceira, que mantém uma rivalidade antiga com a de São Miguel. Aos micaelenses, chamamos “coriscos mal amanhados”; eles tratam-nos por “rabos tortos”. Justificar o porquê, mais as raízes históricas, etimológicas e sociológicas seria um desperdício do vosso dia e, já agora, da minha noite (depois de 12 horas em aeroportos e aviões, para fazer 6500 kms, estou no final de um dia que mereceu 3 horas de sono como estágio). Adiante.
Creio que, em plenos Emirados Árabes Unidos, acabei por fazer jus ao epíteto do título. Sucede que tenho uma cicatriz bem razoável no fundo das costas por ter retirado um quisto há meia dúzia de anos. Ora, essas verdadeiras celas de tortura que são as aeronaves da Turkish Airlines, fizeram-me despertar os pontos da cirurgia qual Etna em erupção. Assim, após este primeiro dia de TT, não só estive incapaz de conduzir como pratiquei no lugar do morto a primeira versão conhecida de kizomba em slow-motion: rabinho para cá, meia hora depois, rabinho para lá. Loop & repeat. Uma angustiante dança para manter o cócsis do escriba o mais afastado possível do contacto com o assento. Não é fácil, mas ao menos já faz de mim uma espécie de estóico herói da expedição (pelo menos é o que tento dizer a mim próprio a ver se me sinto um pouco melhor).
Balanço do primeiro dia: 3 horas de sono, 4 de carro, 5 whiskies – o único analgésico que o orgulho me permite, 6 atascanços e mais de 100 fotos tiradas. Nada mau. Ah, e 3 avarias em 3 dos Chevrolets que compõem 50% da nossa comitiva. Um que deitou fumo devido à bomba de água, outro incapaz de fazer tracção às 4 e outro com a luz do motor acesa e pouco desenvolvimento.Contudo, há sempre um lado positivo na vida. A aventura ainda mal começou e o Dubai e companhia já nos ensinou uma grande lição, algo que nunca será esquecido e nos unirá a todos para sempre… A Chevrolet é uma m****. O que só vem demonstrar que, no tocante ao mundo árabe, com ou sem invasões ou guerras, os Estados Unidos só servem mesmo para atrapalhar.

Maiorias

Penso que J. Pacheco Pereira não tem razão nesta defesa da maioria relativa em eleições partidárias directas. Primeiro, parece incontestável que em termos de força e legitimidade política não é o mesmo ter menos ou mais de metade dos votos; segundo, a regra geral, embora não obrigatória, nas eleições directas em regimes presidencialistas e semipresidencialistas é a maioria absoluta.
Não sou um apoiante do presidencialismo partidário nem de eleições directas. Mas sendo esse o sistema de governo vigente nos nossos principais partidos, penso que deveriam adoptar a regra da maioria absoluta na eleição dos seus líderes (com uma segunda volta, caso nenhum candidato seja eleito na primeira), em prol de uma maior legitimidade e estabilidade das direcções partidárias.

segunda-feira, 19 de maio de 2008

Não é bem assim

Na notícia sobre a comissão nacional do Centenário da República (ver posts anteriores) o seu autor diz que a Comissão de Projectos para as comemorações, à qual presidi, propunha que «as celebrações do centenário deveriam constituir também "um impulso para reformas legislativas" como por exemplo a legalização dos casamentos gay». Mas isso não é bem assim, não tendo a Comissão feito tal proposta. A Comissão limitou-se a preconizar uma modernização da legislação da família, tendo em conta a revolução da I República nessa área, deixando porém as reformas concretas à liberdade política do legislador, sem mencionar nenhuma em concreto. Recorde-se que ainda recentemente a memória justificativa da nova lei do divórcio invoca expressamente a herança republicana nesta esfera.
Obviamente, todos podem, a começar pelos autores do Relatório, especular livremente sobre as diversas formas possíveis de concretizar a orientação genérica proposta pela Comissão, de acordo com as suas preferências, mas convém pelo menos não as imputar especificadamente à Comissão. O seu a seu dono, incluindo as ideias e propostas.

Centenário da República (2)

Segundo o DN (cfr. post antecedente) o Grande Oriente Lusitano quer estar representado nas estruturas oficiais das comemorações do Centenário da República, especificamente na Comissão consultiva. Tendo em conta o papel da maçonaria na preparação e condução revolução republicana e no desenvolvimento da cultura republicana entre nós ao longo do tempo, essa pretensão parece-me elementarmente justa.

Centenário da República (1)

Está finalmente escolhida a comissão nacional para as comemorações do Centenário da República, que hoje o Diário de Notícias divulga. Presidida por Artur Santos Silva, um gestor consagrado e multifacetado, e uma feliz escolha, a composição da Comissão oferece todas as garantias de convicção, saber, isenção e pluralismo na celebração republicana.
Prouvera que a Comissão possa recuperar o relativo atraso da sua nomeação com uma rápida elaboração do programa dos eventos de 2010.

Destino Dubai




O capitalismo é tão contraditório como imagino que o Dubai seja. Por exemplo, quer-nos magricelas nos aviões e enfarta-brutos nos restaurantes. Ocorre-me este pensamento algures sobre a Turquia, entalado entre um russo ressonante à frente e um bife bêbado atrás. Assim, o laptop não consegue fazer jus ao nome – está de pé. Com a naturalidade, acrescente-se, de uma foca no deserto. Os portugueses já foram pejorativamente conhecidos como “o povo das sardinhas” e hoje aqui está um grupo deles dando razão ao cliché: verdadeiras sardinhas em lata num voo sobrelotado da Turkish Airlines.
Ainda faltam horas para o objectivo mas a viagem já merece alguns comentários. Provavelmente partilharei apenas um par deles convosco, uma vez que já me doem os dedos e os bíceps do hercúleo esforço para conseguir teclar num pc equilibrista. Com que então os escribas não são homens de acção?! Think again.
Esperem. Acabam de chegar avelãs e uma cola. Vou ser obrigado a testar os meus dotes de malabarista.

Uma camisa manchada e dois compatriotas molhados depois, eis-me de volta à escrita contorcionista.

A primeira parte do dia foi preenchida com um voo entre a Portela e o Ataturk. Dir-se-ia que 4 horas e meia de voo passadas, aterrámos no Colombo. A única diferença gritante entre o aeroporto de Istambul e o “maior centro comercial da península ibérica” é que o primeiro trocou os gangues por hordas de adeptos do Galatasaray ainda eufóricos com o título conquistado ontem.
Mas não foi tempo perdido. Como é sabido, o tuga é danado para a brincadeira. Daí que, nem meia hora a bordo tinha decorrido, e já o engraçadinho do grupo estava encontrado. Quarentão, bigode, lascivo. O sonho de qualquer sogra. A hospedeira turca sofreu com os avanços galantes e os seus colegas masculinos olharam para o portuga com ar de quem poderia ter ressuscitado logo ali a fúria do império otomano. Do mal o menos, agora que a escala está feita e trocámos de avião, o nosso amigo dorme. Aumenta a esperança de chegarmos ao Dubai sem provocar nenhum incidente diplomático.Por hoje é tudo, caros amigos. Conto enviar-vos em anexo a primeira fotografia tirada no destino mas não prometo nada. Como já tenho os braços dormentes, temo que não consiga sequer erguer a máquina fotográfica.

Não há contadores grátis

Desde o início pronunciei-me contra o fundamentalismo da nova lei dos serviços públicos básicos (água, electricidade, gás, etc.), que acabou com as taxas de contadores, e outras semelhantes.
De facto, parece evidente que, na falta dessa receita, os fornecedores de tais serviços teriam de aumentar as tarifas dos serviços para toda a gente, pelo que no final o custo ficaria globalmente equivalente. Só seriam beneficiados os proprietários de segunda residência, que ficariam desonerados de pagar essa taxa, limitando-se a pagar os consumos do reduzido tempo de uso da habitação.
A alternativa à subida generalizada das tarifas era a criação de uma nova taxa, agora sobre a "disponibilidade do serviço", destinada a remunerar a manutenção da rede e do equipamento (incluindo dos contadores), que aliás faz todo o sentido.

sexta-feira, 16 de maio de 2008

Acordo ortográfico

«"Este acordo põe em lei que três países podem tomar uma decisão em nome de oito. É um disparate. As decisões devem ser tomadas por consenso", disse, ao JN, o socialista Luís Fagundes Duarte, autor do Manifesto pela Língua Portuguesa e Contra o Acordo Ortográfico (...)».
Há porém um grande equívoco nessa tese. O "protocolo modificativo" de 2004 só vincula quem o ratificar, estabelecendo que o Acordo Ortográfico de 1990 entra em vigor em relação aos países que o desejarem (se num mínimo de três), sem terem de esperar pelos demais países. Por isso, a ratificação desse protocolo complementar por parte de Portugal, que já tinha ratificado o próprio Acordo Ortográfico logo em 1991, só vincula o nosso País (e os outros três países que já ratificaram os dois instrumentos), não afectando os países em falta, enquanto não os ratificarem também.
O que não era justo é que os países que ratificaram o Acordo e que desejam a sua implementação continuassem indefinidamente sujeitos ao "veto" de uma parte deles, por ausência de ratificação, apesar de todos terem aprovado o Acordo em 1990. Sucede, aliás, que a regra agora adoptada -- bastar a ratificação de três países para uma convenção entrar em vigor (em relação a eles, claro) -- é a norma na prática da CPLP. Se evidentemente nenhum País ou grupo de países da CPLP pode impor a sua vontade aos demais, também nenhum País ou grupo de países pode impedir os outros de adoptarem uma "cooperação reforçada" entre eles, desde que aberta a todos, como é o caso.

quinta-feira, 15 de maio de 2008

For the record

Por incúria não transpus para o Aba da Causa nas últimas semanas os meus artigos do Público. Acabo de os arquivar todos, just for the record.

Aditamento
O artigo desta semana, intitulado "adeus socialismo"?, que comentava um texto de João Cardoso Rosas, foi hoje objecto de réplica pelo mesmo autor. Provavelmente não vamos ficar por aqui na troca de argumentos.

Livro de reclamações (2)

Mais uma reclamação contra a PT!
Viajo sempre munido do computador portátil, acompanhado do conveniente dispositivo de acesso à Internet. Numa recente viagem a Moçambique, verifiquei previamente que a TMN assegurava "roaming" de dados com um operador local, a mCel, o que ainda nem todos os países disponibilizam. Uma enorme desilusão, porém. Na maior parte do tempo, o tráfego disponível era nulo; no resto do tempo, a velocidade era de menos de 10kb/s! Ao fim de meia hora nem um megabyte se obtinha!
Os operadores de telecomunicações móveis deveriam certificar-se da qualidade mínima dos serviços que contratam com operadores externos, até pelo seu elevado preço. Anunciar serviços de Internet móvel nas circunstâncias descritas é uma pura fraude!

Livro de reclamações

Por pura inércia, tenho mantido a subscrição do serviço fixo de telefone da PT, apesar de quase nunca a usar. Subitamente, na factura deste mês, além da usual taxa de assinatura de 14,15 euros, fui surpreendido com o débito de 10,52 euros de um tal "plano de preços". Isto sem ter realizado uma única chamada!
Reclamei naturalmente da factura, utilizando o número de telefone de "apoio ao cliente".
1º surpresa desagradável: após três reenvios ordenados por uma mensagem gravada, tive de esperar 9-minutos-9 para ser atendido!
2ª surpresa inacreditável: o misterioso débito tinha a ver com um plano de utilização que alegadamente tinha sido proposto pela PT aos seus clientes, o qual eu não teria declinado!
Assim mesmo, o PT decidiu abusivamente, sem qualquer pré-aviso sequer, debitar-me encargos que eu não contratei. Um puro assalto furtivo ao bolso dos seus clientes!
Desnecessário é dizer que há males que vêm por bem. Acabou definitivamente a assinatura do tal serviço telefónico fixo e a respectiva assinatura. Adeus PT!
Todavia, há duas coisas intoleráveis nesta lamentável história. Primeiro, é inadmissível o vergonhoso serviço de reclamações da PT. Os operadores de serviços deveriam ser obrigados a ter uma linha directa de reclamações, com um limite de demora no atendimento. Segundo, situações destas de abuso qualificado na cobrança de serviços não prestados deveriam ser exemplarmente punidas.
O regulador deveria monitorizar regularmente o comportamento dos operadores. A ANACOM existe sobretudo para defender os interesses legítimos dos utentes. Aqui fica, publicamente, a reclamação!

Realismo

Como aqui se tinha previsto, era inevitável o corte nas previsões de crescimento económico, que o Governo vinha adiando à espera de dados fidedignos. Agora, face aos dados económicos do 1º trimestre divulgados pelo INE, francamente negativos, tornou-se inadiável rever em forte baixa as estimativas oficiais do crescimento para o corrente ano. Com esta revisão, ficam também comprometidas naturalmente as metas de crescimento para 2009. Resta saber qual o impacto sobre o programa de disciplina financeira e de redução do défice orçamental.
É um duro golpe nas perspectivas governamentais. O impacto económico da crise financeira internacional, do aumento contínuo dos preços do petróleo, da imparável valorização do euro e da degradação da situação económica espanhola, tudo se conjugou para tramar a economia nacional.

Regular a globalização

«We need more severe and efficient regulation, higher capital requirements to underpin financial trades, more transparency and a global institution to independently oversee the stability of the international financial system. I have already suggested that the IMF assume this role.». Palavras do Presidente da Alemanha, antigo presidente do FMI, à revista Stern, segundo o Financial Times.
Nada mais certeiro, por quem sabe do que fala.

quarta-feira, 14 de maio de 2008

O agitador

Não tem nenhum fundamento a rotunda afirmação do Procurador-Geral da República de que a reforma da organização territorial dos tribunais constitui um «grave atentado ao Estado de Direito». Nem a Constituição nem os princípios do Estado de direito requerem o "paralelismo" dos juízes e do Ministério Público ou impedem o exercício de funções de gestão judicial pelos juízes.
O PGR faria bem em temperar com alguma contenção e gravidade institucional a sua fácil vocação de agitador pró-sindical.

Angola

São manifestamente malévolas e sectárias muitas das apreciações que correm entre nós sobre a situação política angolana.
Desde o fim da guerra civil tem havido notórios progressos na institucionalização democrática. Existe um parlamento pluripartidário, um estatuto de protecção da oposição, liberdade de imprensa, liberdade de religião, liberdade partidária, liberdade de deslocação e de residência, etc. Não existem presos políticos. Estão previstas para breve eleições legislativas e presidenciais, instaurando a normalidade democrática no País. A própria situação económica e social melhora de dia para dia, pese embora a escandalosa ostentação da riqueza do mundo dos negócios e da elite de Estado e a extrema pobreza dos bairros periféricos de Luanda. Seja como for, em termos africanos, Angola exibe uma estabilidade e uma abertura política invejáveis.
Apesar dos seus apoios nos media, nem tudo o que interessa ao tradicional lobby anti-MPLA entre nós (com raízes na descolonização...) tem a ver com os interesses de Angola nem com os de Portugal.

Responsabilidade civil

Justifica-se alguma preocupação dos dirigentes e funcionários públicos por causa da nova lei da responsabilidade civil extracontratual da Administração Pública, na medida em que ela os responsabiliza directamente não somente em caso de dolo, como anteriormente, mas também em caso de "culpa grave", o que amplia a possibilidade de serem pessoalmente accionados pelos lesados (reais ou supostos), embora estes também possam (e tenham conveniência em) accionar o Estado conjuntamente.
Apesar disso, porém, não se entende bem a ideia de o Estado contratar e pagar um seguro para cobrir as indemnizações em que incorram os seus funcionários nas circunstâncias descritas. Para além de não se enxergar fundamento legal para essa benesse e para a respectiva despesa, o Estado não devia assumir a cobertura de actuações dolosas ou grosseiramente culposas dos seus funcionários, as quais pelo contrário deveriam ser objecto de procedimento disciplinar, pelo menos no caso de dolo.
De resto, embora na legislação anterior os dirigentes e funcionários não pudessem ser directamente accionados em caso de culpa grave, eles já então acabavam por ser responsáveis por esses danos, tendo de repor ao Estado as indemnizações pagas por este aos lesados ("direito de regresso").

terça-feira, 13 de maio de 2008

Insuficiente

O Presidente da República requereu ao Tribunal Constitucional a apreciação da constitucionalidade de normas do estatuto da Polícia Judiciária, mas continua a não disponibilizar publicamente os fundamentos dos seus pedidos de fiscalização da constitucionalidade. Devia corrigir essa prática. Sem o conhecimento do texto do requerimento, é impossível apreciar o pedido presidencial.

Combustíveis

Mas como é? Então os preços dos combustíveis vão subir à mesma hora na mesma importância em todas as redes? Se isso fosse assim, não estaríamos perante um caso flagrante de "práticas concertadas" contra a concorrência?!

Dívidas fiscais

Concordo com este texto. O novo Director-Geral dos Impostos tem andado a dar tiros nas próprias tropas.

Mau exemplo

«Sócrates e Pinho violaram proibição de fumar a bordo do voo de Lisboa para Caracas».
As normas valem para todos.

segunda-feira, 12 de maio de 2008

Desacordo

«Frente Comum e Fesap sem acordo no contrato de trabalho da função pública».
Se os sindicatos acabam por não assinar nenhum acordo, o Governo deveria retirar todas as propostas de alteração que fez com o objectivo de conseguir um compromisso (salvo as que considere boas independentemente desse objectivo). Os sindicatos deveriam habituar-se à ideia de que os acordos supõem cedências mútuas e que sem acordos não há cedências unilaterais.

Duplicidade

«Cinco ministros dos Negócios Estrangeiros da União Europeia exprimiram hoje em Tbilissi o seu apoio à soberania da Geórgia e à sua integridade territorial (...)».
Não consta que a soberania da Georgia esteja em perigo. Já quanto à sua "integridade territorial", posta em causa pela autodeclaração de independência da Abkázia e da Ossétia do Sul, os países da UE não estão nas melhores condições para a defender, face ao apoio dado à declaração unilateral de independência do Kosovo face à Sérvia. Se quer ser eficaz na cena internacional, a UE não pode ter dois pesos e duas medidas para situações idênticas.

sábado, 10 de maio de 2008

Privacidade

A liberdade de imprensa não pode prevalecer contra tudo...

USA 2008

Decididamente, Barack Obama tem a vitória assegurada como candidato presidencial do Partido Democrata. À sua vantagem nos delegados eleitos soma-se agora a vantagem nos "superdelegados" (delegados por inerência). A notável resistência de Hillary Clinton, que dependia da esperança na preferência dos superdelegados, é doravante inglória.

quinta-feira, 8 de maio de 2008

Socialismo polissémico

Discordo desta análise de João Cardoso Rosas (com o qual, de resto, concordo muitas vezes).
Primeiro, já há muito -- a começar com o SPD alemão, no célebre congresso de Bad Godesberg de 1959 -- que os partidos socialistas e social-democratas abandonaram a ideia originária de "economia socialista", enquanto sistema económico alternativo ao capitalismo, baseado na "socialização" dos meios de produção, tendo-se rendido à economia de mercado. Aliás, isso mesmo resulta da adesão de todos eles à UE, desde o início baseada numa "economia de mercado assente na livre concorrência" (como estabelece o Tratado de Roma, de 1957). Por isso, hoje ninguém espera, ou teme, que um Governo socialista desate a fazer nacionalizações. Portanto, não há nenhum engano ou equívoco quanto a esse ponto.
Segundo, apesar desse abandono da "economia socialista", não é ilegítimo que os partidos socialistas conservem a antiga denominação, dado que continuam a lutar pelas suas principais bandeiras na esfera social, designadamente direitos sociais, inclusão social, coesão social, Estado social, enfim, justiça social.
Em suma, os partidos socialistas há muito disseram adeus ao "socialismo económico", mas os ideiais socialistas nunca se limitaram a isso. Por isso, dizer "adeus ao socialismo", como quer JCR, é por um lado redundante e por outro lado indevido.

ADSE

A Ministra da Saúde bem pode lamentar o "negócio" da ADSE com o Hospital da Luz, mas é evidente que o subsistema de saúde dos funcionários públicos, que não faz parte do SNS, tem todo o direito de comprar serviços a hospitais privados, desde que estes adiram às condições gerais definidas por aquele. O único problema é saber se os hospitais públicos podem competir com os privados nesse mercado.
[Corrigido]