sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Reconhecer a independência do Kosovo - VI

A minha posição é hoje, como já era em Fevereiro último, a de que Portugal deve reconhecer a independência do Kosovo e frizar que é um caso sui generis, do qual ninguém deve extrapolar precedente nenhum.
- Porque o povo kosovar, massivamente, em sucessivas eleições, disse querer a separacão da Sérvia, entidade que o massacrou e oprimiu.
- Porque é um «fact of life» que a Europa ajudou a criar, quando fez adoptar no CSNU a resolução 1244, que já admitia um estatuto futuro, separado da Sérvia, para o Kosovo - por isso posto, e deixado durante oito anos, sob protectorado da ONU.
- Porque a Europa tem a responsabilidade e a capacidade de viabilizar um Kosovo democrático e auto-sustentável economicamente (com base nos recursos humanos, minerais e outros que o Kosovo tem, mas não estão aproveitados). E a Europa tem também o dever e interesse próprio de não deixar que se consolide uma economia assente na criminalidade organizada no meio do´continente europeu.
- Porque Portugal tem o dever e o interesse de participar na construção de um Kosovo democrático e auto-sustentável e de contribuir para a integração europeia de toda a região balcãnica, Sérvia incluida – a melhor maneira de afastar o espectro da guerra. E isso não se faz apenas através dos contigentes de soldados que temos – e bem – na KFOR. Faz-se, far-se-á sobretudo, através da EULEX. E não reconhecendo a independência do Kosovo, Portugal tenderá a pôr-se de fora da EULEX – para onde devia em especial mandar mulheres (em cumprimento da resolução 1325 do CSNU). Mulheres que tem em abundância nas profissões e com as experiências mais necessárias e requisitadas pela EULEX - polícias, juízes, procuradores, juristas.....
Em resumo: sou pelo reconhecimento. Quanto antes. Julgo é que, para sermos credíveis, convem explicar o que mudou agora relativamente ao que nos impediu de reconhecer antes. Ou seja, as razões substantivas por que mudou a posição portuguesa.

quinta-feira, 2 de outubro de 2008

Via CTT e os equívocos de Pacheco Pereira

Na habitual saga contra tudo o que possa ser pensado e realizado sem a sua bênção tecnológica, Pacheco Pereira tem-se referido inúmeras vezes, de modo enganoso, ao serviço Via CTT. Aqui vão alguns esclarecimentos úteis sobre a matéria:

1 Ao contrário do que Pacheco Pereira tem repetidamente afirmado, o Via CTT nunca pretendeu “dar um e-mail a cada português”; isso seria, aliás, completamente absurdo, na medida em que o mercado oferece inúmeras soluções gratuitas para hospedagem electrónica; não é por aí que a info-exclusão se reduz nem o negócio dos CTT floresce;

2 O Via CTT pretende sim alocar a cada cidadão português uma caixa postal electrónica onde, à semelhança do correio físico, cada um pode receber e processar toda a sua correspondência transaccional (facturas, extractos, avisos e outros registos de tipo B2C e A2C) num só recipiente digital, unicamente alimentado pelos CTT – seguro, gratuito, universal e cómodo, como nenhum outro;

3 Ao contrário do que Pacheco Pereira supõe, a introdução do Via CTT, em 2006, pouco teve que ver com desígnios propagandísticos do Governo, antes constituindo um movimento estratégico por parte dos Correios – a um tempo, de ataque e de defesa perante a ameaça das plataformas digitais; o Governo limitou-se a apoiar, sem quaisquer custos para o orçamento de Estado, o seu lançamento público, enquadrando-o na matriz de concessão do serviço postal;

4 O investimento realizado no serviço Via CTT foi exíguo – na ordem do milhão de euros em custos directos de produção, fora as despesas de processamento e armazenagem, proporcionais ao número de clientes –, inteiramente auto-financiado e substancialmente inferior ao que a generalidade das grandes empresas já torraram nas suas plataformas digitais proprietárias;

5 A adesão dos consumidores ao Via CTT tem progredido lentamente (como em todas as suas concorrentes), não pela falta de atributos ou de utilidade do serviço, mas antes por razões bem mais prosaicas: desconhecimento, iliteracia informática, indiferença ou, muito simplesmente, indisponibilidade para romper com o correio físico (a razão mais poderosa);

6 Todos os portugueses são perfeitamente livres de aderir, gratuitamente, ao serviço Via CTT, se assim o desejarem e na modalidade que desejarem; há capacidade para dez milhões (o que é muito diferente da falácia pueril do “e-mail para todos os portugueses”); mas nada os obriga nem os constrange, nem sequer as efabulações de Pacheco Pereira.

quarta-feira, 1 de outubro de 2008

Barroso faz-se de lucas: os EUA que travem a crise!

Só cá faltava mais esta demonstração do carácter do Dr. Durão Barroso.
O Presidente que há quatro anos está à frente da Comissão Europeia e, qual avestruz de cabeça enterrada na areia (vd meu post de 22.9 "CE - avestruz de cabeca enterrada no ... casino"), não a fez mexer nem um dedinho – apesar de instado/a há mais de um ano pelo Parlamento Europeu e, pelo menos, pela Senhora Merkel - para regular, supervisar, disciplinar o funcionamento da banca europeia e os produtos e métodos altamente “tóxicos” em que esta negociava e lhe grangeavam lucros faraónicos (sobretudo para os gestores de topo).
Pois o Dr. Durão Barroso, que tem estado caladinho desde que esta crise financeira global estalou, veio agora finalmente dar um ar de sua graca: não para reconhecer responsabilidades e prometer acção reparadora e disciplinadora a nível europeu (e não apenas de cada Estado Membro individualmente), relativamente os agentes e mercados financeiros.
Não, nada disso – o Presidente Barroso veio admoestar os EUA para resolverem sem demora a crise financeira mundial que criaram.
A lata é inesgotável! Já a vimos no Dr. Barroso a propósito da invasão do Iraque, de Guantanamo, da tortura e das prisões secretas: primeiro atira-se de cabeça, irreprimivel e acriticamente, atrás da mais reaccionária e demente Administração americana. Depois, quando as coisas ostensivamente dão para o torto, faz de lucas, nada era com ele: a responsabilidade é de outros, a eles cabe apanhar os cacos!....
Ninguém evidentemente contesta que cabem aos EUA, desde as teses da era Reagan, principais responsabilidades pela crise financeira global que agora estoirou.
Mas na Europa os principais reponsáveis políticos e económicos, aqueles que foram governo (incluindo gente que se dizia socialista) e foram atrás das teses neo-liberais que pregavam contra o Estado, a favor da desregulação e praticavam a supervisão ficcionada, não podem agora tirar o cavalinho da chuva e mandar as culpas só para os americanos.
Se há desregulação, comportamentos gananciosos aventureiros e criminosos da banca e de fundos de investimento europeus, a culpa não é dos americanos – mas sim dos governantes e reguladores europeus que desregularam ou deixaram desregular e que afrouxaram a supervisão, incentivando o abuso e o excesso.
O Dr. Durão Barroso, por exemplo, não só foi Primeiro Ministro de Portugal num período de privatização por tuta-e-meia de bens, serviços e empresas públicas (as OGMA, por exemplo), e de vê-se-te-avias para a desregulação e para o relaxamento da supervisao. Há quatro anos que é Presidente da Comissão Europeia e nada fez para antecipar e prevenir os perigos da ganância e da roda livre no mundo da banca e das finanças europeias e mundiais, para travar o processo de desregulação a nível europeu, para afastar as ameaças resultantes do descontrole e opacidade de “private equities”, “hedge funds”, “sovereign funds” e dos famigerados “off-shores”.
Estão enganados aqueles que pensam que o Dr. Barroso e outros com idênticas ou ainda mais responsabilidades vão escapar sem que lhes sejam pedidas contas na Europa. Além das que têm de ser pedidas aos governos que continuarem inertes a ver a crise afundar a economia europeia.

A crise, os gurus, as raposas e os galinheiros...

A Goldman Sachs não tem só Presidentes.
Tem dezenas de Vice-Presidentes. Fora os que já teve.
Um deles foi o inefável Dr. António Borges, guru do PSD para a economia e finanças.
Que hoje é membro da European Corporate Governance Forum, um organismo - vejam lá - estabelecido pela Comissão do Dr. Barroso supostamente para zelar pelas boas práticas financeiras nos Estados membros da UE!!!... (lá sentido de humor têm eles, esta de porem raposas a guardar os galinheiros, dá no que deu - toparam eles que a crise vinha lá? actuaram eles para prevenir, para a travar? ....) .
Já se percebeu: o Dr. António Borges deixou a Goldman Sachs, à semelhança dos seus patrões americanos, e trata agora de influir mais na governação em que pode influir – a portuguesa, concretamente.
Recorde-se a ajuda que este guru da finança terá prestado à Dra. Manuela Ferreira Leite, quando era Ministra das Finanças do governo Durão Barroso-Portas, a inventar a a solução de vender por conta os créditos fiscais do Estado ao CityGroup. Uma solução desastrosa para o erário público – isto é, para os contribuintes portugueses, que mesmo sem o saber, estão ainda hoje a pagá-la com língua de palmo.
Não espantaria, assim, se tivesse sido o guru Borges de novo a inspirar a líder do PSD a vir ontem espadeirar contra o Primeiro Ministro por tentar tranquilizar os portugueses quanto às suas poupanças, garantindo a “boa resistência” da banca portuguesa (bem pode, bem pode garantir, que a malta tende a acreditar pouco...).
Quanto ao fundo da questão, as razões da crise, a Dra. Manuela nada disse – pudera, pois se o tempo dela no governo foi um ver-se-te-avias na desregulação e no afrouxamento da supervisão do Estado sobre a banca e não só. Por inspiração de gurus como o Dr. Borges e não só...
Quanto a soluções para a crise, a líder do PSD entrou muda e saiu calada: pois se a sua sabedoria financeira, como se viu quando estava no governo e sob a inspiração iluminada da Goldman Sachs via Dr. Borges, se confina a determinar a que prego se hão de ir empenhar os anéis. E de anéis estão os pregos cheios, nos dias de crise que correm....

Quem governa afinal? A Goldman Sachs...

O Congressista Dennis Kucinich (Democrata), que vota contra o pacote de salvação Bush-Paulson, disse à jornalista Amy Goodman (nossa conhecida pelo que se bateu para denunciar o massacre de Santa Cruz em Timor Leste) para o programa “Democracy Now!”:
«Nós somos o Congresso dos Estados Unidos da América. Nós não somos o Conselho de Administração da Goldman Sachs. A Goldman Sachs está a lutar para sobreviver. E sabem, o seu antigo patrão é agora o Secretário do Tesouro dos EUA. Ele está em posição de direccionar os fundos de modo a ajudar a reforçar a sua própria situação financeira. Isto é, estamos perante um claro conflito de interesses. Isto é qualquer coisa que precisa de ser dita».
De facto Hank Paulson foi até há dois anos, antes de assumir a pasta de Secretário de Tesouro da Administração Bush, o Presidente-Executivo da Goldman Sachs. E vários dos seus antecessores naquele cargo governamental também vinham – adivinhem lá! ... de big bosses da Goldman Sachs...
Segundo a notava BBC World Service ontem, é política da Goldman Sachs pôr os seus homens que rapidamente enriqueceram a passar a outra actividade, ao fim de algns anos: a infiltrar-se na governação para mais influenciar e prosseguir a defesa dos interesses da liberalização financeira e da ...Goldman Sachs, evidentemente.

terça-feira, 30 de setembro de 2008

"Social-democracia" à portuguesa (2)

Ao ver filiadas no PSD a defender no programa Pros & Contras as posições mais retrógradas sobre a família, o casamento e o divórcio, é caso para dizer que a referência da social-democracia no nome do partido constitui um inaceitável abuso de semântica política.
Depois queixem-se de que não saem dos 30% de intenções de voto...

"Social-democracia" à portuguesa (1)

O nosso PSD apoia oficialmente a candidatura Republicana à Casa Branca.
Mas existe algo no reaccionarismo ideológico do Partido Republicano, incluindo Sarah Palin, que não envergonhe um partido que se reclama da social-democracia europeia, por mais afastado que esteja das suas origens?!

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

EUA: uma Administração "lame rat"

O Plano Paulson, apresentado pela Administração Bush, acaba de ser derrotado na Câmara dos Representantes do Congresso americano e as consequências já estão a sentir-se devastadoramente na bolsa de NY e restantes pelo mundo fora.
141 democratas votaram a favor (94 contra) - mais uns tantos do que os 125 que os negociadores democratas haviam prometido ao governo e seus contrapartes republicanos. E votaram por compreender a magnitude da crise económica que o Plano se propunha alcançar e não querer ser acusados de inviabilizar o suster da crise. Votaram a favor apesar de saberem que boa parte do povo americano não aceita, nem compreende, o "bailout" que o Plano Paulson implica: não aceita que se salvem os bancos, fundos e seguradoras que criaram a crise, atirando-lhes mais dinheiro dos contribuintes, ao mesmo tempo que muitos cidadãos continuam a perder as suas casas e empregos e muitas pequenas e médias empresas a fechar portas.
Quem roeu a corda foram os Representantes republicanos e praticamente na proporção de 2 para 1 (66 a favor e 132 contra), votaram contra o "deal"bi-partidário, ontem re-anunciado, de um plano dito de salvação da economia suplicado de joelhos pela Administração Bush-Cheney.
Uma Administração que só tornou o mundo mais perigoso e injusto e que só arruinou e descredibilizou os EUA globalmente.
Uma Administração que já não consegue sequer obter a lealdade dos congressistas do seu próprio partido face a uma emergência desesperada, apresentada como crucial para a salvação da economia nacional.
Uma Administração"lame duck" dizem muitos, apontando para grave crise de liderança que este episódio ilustra. "Lame rat" seria terminologia mais apropriada.

1º debate: Obama/McCain

"Ambos os candidatos concordaram, no entanto, que os EUA precisam de recuperar credibilidade no mundo e para isso é fundamental acabar com a tortura em que Bush os enlameou (chato, muito chato para o embaixador americano em Portugal, que acha que é tudo invenção....)."
É um extracto de um artigo que escrevi para o "Jornal de Notícias" sobre o primeiro debate Obama/McCain e que já pode ser lido integralmente na ABA DA CAUSA.

Inquietação

Os resultados das eleições parlamentares austríacas são preocupantes. O Partido Social Democrata ganha com menos de 30%, mercê de uma queda ainda maior do Partido Popular, ao passo que dois partidos da extrema direita somas quase 30% dos votos.
Já se sabia que os tempos de crise favorecem o extremismo político. No caso da Áustria, porém, trata-se sempre da extrema-direita...

Impunidade

Ficou-se a saber agora que, durante anos e anos, o município de Lisboa oferecia discricionariamente casas municipais a beneficiários avulsos, com rendas de favor.
O problema é que a arbitrariedade acaba normalmente premiada com a impunidade.

Crítica assimétrica

Sim, esta minha ideia não é imune à crítica.
Em todo o caso, embora controversa, a ideia de bonificar transitoriamente os juros dos empréstimos à habitação das famílias com menos rendimentos é seguramente mais justa do que a bonificação socialmente indiferenciada que vigorou durante muitos anos para o crédito à habitação dos jovens, ou do que as auto-estradas isentas de portagem (SCUT), ou do que a quase gratuitidade do ensino superior independentemente dos rendimentos, ou do que estacionamento gratuito de automóveis particulares em lugares públicos.
E quanto a esses casos de subsídio aos que não precisam não vejo os liberais rebelarem-se...

sábado, 27 de setembro de 2008

Parabéns, Catarina!


Parabéns Catarina Albuquerque, a brilhante jurista da PGR e negociadora internacional portuguesa que acaba de ser nomeada Relatora para a Água do Conselho dos Direitos Humanos da ONU!
Um lugar da maior importância e sensibilidade política que Catarina vai desempenhar tão brilhantemente quanto conduziu as dificeis e prolongadas negociações que levaram à conclusão do Protocolo ao Pacto Internacional dos Direitos Económicos, Sociais e Culturais.
A água, ou a falta dela, como sabemos mas não ligamos muito, cada vez mais vai estar no cerne da conflitualidade no mundo e logo de graves violações de direitos humanos.
É fantástico que seja uma mulher e portuguesa quem agora é encarregue de estudar as implicações das disputas sobre água nas situações de direitos humanos já identificadas e a identificar.
É fantástico, mas não cai do céu, nem do voluntarismo pontual de qualquer governo para repentinamente promover no sistema da ONU uma candidatura portuguesa: é sobretudo o resultado das extraordinárias qualidades profissionais, da longa experiência diplomática (que não é apanágio só de diplomatas de carreira) e da brilhante capacidade de operar e criar consensos em negociações internacionais de Catarina de Albuquerque.
O mérito de sucessivos governos (através do MNE, M. Justiça e PGR), foi sobretudo o de sempre deixarem ir Catarina para a frente, mesmo sem a apoiar muito, substantivamente, mesmo sem perceberem o que ela fazia e como tinha potencial para ir longe (umas cartinhas aqui e ali, são o mínimo). Sem perceberem que não se colocam peças no topo da ONU (ou da UE) sem se investir de baixo, de longe, persistentemente, na promoção de profissionais capazes, para serem testados e reconhecidos dentro do sistema .
No MNE, o mérito foi saber chamar peritos de fora para investir nas delegações a organismos especializados, como a Comissão dos Direitos Humanos. O mérito cabe sobretudo a uma pessoa, que concebeu essa estratégia, nos anos 80 : o Embaixador Costa Lobo. Fez-nos descobrir e revelar ao mundo a excepcional Marta Santos Pais, que hoje dirige o Instituto Inocenti da UNICEF, em Florença. Fez-nos descobrir e revelar ao mundo esta determinada, divertida e aguerrida Catarina Albuquerque.

PS - E quantas mais mulheres portuguesas de grande qualidade profissional - diplomatas, juristas, policias, militares, cientistas, etc... -não enxameariam hoje essas organizações internacionais, se houvesse a política de as lançar e nelas investir para as promover no sistema!Se Portugal aplicasse devidamente a resolução 1325 do Conselho de Segurança da ONU. Se já tivesse a funcionar um Plano Nacional de Acção para a aplicar.

Afeganistão: levantando o véu

É o nome de uma extraordinária reportagem da CNN - Special Investigations Unit (Lifting the Veil), conduzida por Sharmeen Obaid Chimoy, que recomendo vivamente.
Cobre muito do que vi e senti quando visitei o Afeganistão em Maio passado.
Documenta a brutal opressão das mulheres no Afeganistão de hoje, apesar de ligeiras melhorias em relação ao tempo dos Talibans.
Um devastador veredicto sobre tudo o que tem estado errado na operação NATO/EUA! E a raiva é que ela poderia dar certo se proteger e melhorar as condições de vida da população civil - e das mulheres e crianças em particular - fosse o objectivo das forças estrangeiras, em vez de uma derrota militar machista sobre os Taliban/Al Qaeda. Que cada dia se reforçam, como vemos, beneficiando dos erros NATO/EUA.

O debate aconteceu e Obama venceu

O debate aconteceu:
Mc Cain reconheceu que estava a derrapar na opinião pública e acabou por dar uma cambalhota, aparecendo afinal, apesar de ainda não haver "deal" sobre o "pacote de salvação" dos 700 mil milhões.
O debate esclareceu:
na economia e na política externa ficaram claras as diferenças que separam os dois candidatos -menos na forma enfrentar a crise financeira, mas claramente quanto aos impostos, nas prioridades orçamentais, no sistema de saúde, no investimento na educação, nos desafios energéticos, nos gastos na defesa; no Iraque, no Irão, no Afeganistão, na luta contra o terrorismo, na atitude face à Russia e na recuperação do papel dos EUA no mundo. A escolha ficou mais acessível para quem hesita ainda: quem quiser mais de Bush, em versão primeiro mandato, vota McCain. Quem quiser mudar de políticas e procurar melhorar a economia da America e a sua posição no mundo, vota Obama.
O debate produziu um ganhador: Barack Obama. Calmo, conhecedor, ofensivo q.b. sem ser agressivo.
O debate produziu um perdedor: JohnMc Cain. Que era quem precisava de ganhar com vantagem para compensar uma semana desastrosa e não ganhou nada (segundo as sondagens de várias cadeias de televisão, claramente perdeu). Além de surgir agressivo, paternalista, desfocado, agarrado ao passado.

PS 1 - Viram como Mc Cain embuchou com a do Zapatero que o Obama lhe enfiou? Qual retaliar pela retirada de Iraque, qual carapuça: o homem julgou que lhe estavam a falar nalgum sul-americano pouco recomendável!...

PS 2 - O Biden já comentou o debate. A Palin está aferrolhada, não vá meter mais água e afundar ainda mais a campanha de McCain. Esse pratinho não perco eu: o debate entre candidatos a vice-presidentes que se segue.

Descentralização regional

Juntamente com João Cravinho, participei anteontem à noite num colóquio sobre a regionalização, na série organizada pela Câmara Municipal do Porto. Algumas das ideias que defendi encontram-se referidas nesta notícia e nesta.

Dilema

A última reunião do Ecofin deu explicitamente luz verde aos Estados-membros para utilizarem a política orçamental como instrumento de ajuda à economia. Nesse sentido, a França acaba de anunciar o deslizamento do calendário de redução do défice nos próximos dois anos.
E Portugal? Vai manter as metas de redução do défice estabelecidas em 2005, que fixaram em 1,5% o limite do défice do próximo ano (o que retira margem para qualquer alívio fiscal ou para aumento da despesa pública), ou vai abandonar esse objectivo, a fim de expandir o investimento público e as despesas sociais, de modo a ajudar a economia e a atender às dificuldades sociais que a crise agrava?

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

Quem tem culpa da crise?

Chegam-me de Portugal ecos de que os teóricos e práticos do capitalismo de casino versão lusa (os “fat cats” da banca, seguradoras e outros nebulsosos negócios, mai-los economistas e comentadores que eles pagam para lhes propagandearem as teses) se atiram ao PM José Sócrates por ter apontado como causas da crise financeira a desregulação desenfreada e a falta de supervisão e controlo do Estado advogadas e praticadas pelas correntes neo-liberais.
Dizem-me que os “fat cats” nacionais e seus felinos amestrados subitamente argumentam que a culpa da crise está nas políticas “socialistas” americanas de dar às estatizadas Fannie Mae e à Freddie Mac roda livre para fazer empréstimos «tóxicos» para compra de casa a cidadãos que não os podiam suportar.
O saco de gatos não descobriu a pólvora: artigos na sua bíblia quotidiana, o “Wall Street Journal” esmifram-se a mostrar como vários congressistas, entre os quais o democrata Chris Dodd, são há muito avençados da Freddie Mac e Fannie Mae para lhes facilitar a vida na legislação.
Mas o esforço do saco de gatos luso é patético e pouco sério, porque o próprio «Wall Street Journal» e os mais conservadores analistas da política económica dos EUA não poupam, em dezenas de outros artigos e comentários, o fogo sobre as causas da crise que identificam com a ganância, o descontrolo fiscal e financeiro, o falhanço da supervisão estatal e a criminalidade dos comportamentos tolerados e de facto incentivados pela Administração Bush – que todos sabem sustentar e ser sustentada por teses e pessoal neo-liberal.
Culpar por esta crise políticas “socialistas” de estimular a propriedade de casas por todos os americanos – que ninguém nega - é tão desonesto e absurdo como atribuir as culpas do BCP ter concedido empréstimos à borla ao filho Jardim, ao facto de Jardim ter, anos antes, feito ... filhos.

Afinal, há ou não há "bail out"?

O “deal” para o «bail out» que fora ontem acordado no Congresso pela liderança de ambos os partidos, ruiu numa dramática reunião na Casa Branca ao fim da tarde, presidida por Bush e com McCain e Obama presentes.
Uma reunião em que McCain pouco falou, mas um outro congressista republicano fez o papel de “spoiler”, questionando tanto o “bail-out”, como o “deal” sobre o “bail-out”. Com questões aparentemente pertinentes:
1) - quais os controles sobre Paulson e Bush na utilização dos 700 mil milhões,
2)- a impossibilidade da Administração ultrapassar o que o Congresso determinar no faseamento das tranches e
3)- limites às compensações a obter pelos administradores dos bancos e companhias intervencionadas
A última é a que mais diz aos americanos comuns: Bush aparentemente quer que os “fat cats” administradores dos bancos e seguradoras falidos ou intervencionados continuem a levar para casa milhões em «compensação»....Sem contemplações pelos americanos de classe média e baixa que continuam a ter de entregar as casas em resultado de não conseguirem pagar os empréstimos “tóxicos” que lhes foram concedidos por esses mesmos “fat cats”.
Claro que no cerne deste drama sobre o acordo do Congresso para o “bail out” está a questão de fundo, que preocupa milhões de americanos. Questão a que a Administração republicana de Bush ainda não respondeu: porquê, como e para quê o «bail out» dos gananciosos, à conta dos contribuintes americanos?
As televisões passam as intervenções alarmadas de Bush a justificar a urgência do “bail out” com a necessidade de evitar o pânico na “main street”, em contraponto com reiteradas garantias de Bush, McCain e outros republicanos, até há dias, de que os “fundamentals” da economia americana estavam de boa saúde.
Entretanto faliu mais um banco comercial, por falta de liquidez. O de maior rede espalhada pela América, o Washington Mutual.
“Isto é obsceno!” indigna-se Lou Dobbs na CNN, insurgindo-se contra o excesso, a ganância e a irrelevância dos interesses públicos que marcou a actuação da Administração Bush e conduziu a esta crise. E contra a solução de apressado “bail-out” dos “gananciosos e criminosos” que subitamente a Administração saca da cartola.

Afinal, há ou não há debate?

É o “buzz” dos noticiários na América, muitos a passar reacções de republicanos do Mississipi (uma universidade local gastou milhões a organizar o debate) zangados com McCain por ameaçar estragar-lhes a festa.
As especulações simplistas de que McCain estragou o acordosobre o pacote Paulson só para evitar o debate (ele tinha dito na véspera que sem «deal» não haveria debate) fervilham nas discussões na TV.
Obama diz que vai lá estar no debate, mesmo sem McCain. E avança que a economia também deve poder lá ser discutida.
Ao mesmo tempo, inteligentemente, Obama mantem que o acordo sobre o "bail out" está ao alcance dos dois partidos e abstem-se de atirar culpas para McCain.

Qual é a do Bill?

Já ter convidado McCain para falar ontem na sua «Global Initiative» em NY era suspeito, a pisar o risco: o candidato republicano nunca se destacou pelo entusiasmo na defesa do ambiente ou do desenvolvimento sustentável, antes pelo contrário ("drill, baby, drill" era a sua receita...).
Mas os comentários elogiosos que Bill Clinton anda a fazer a McCain e sobretudo a Sarah Palin (incluindo numa entrevista a Larry King), apesar de explicitar que discorda do que ela defende, estão para lá do risco.
Mas qual é a do Bill?
Não se conforma e aposta numa derrota de Obama para a Hillary voltar em 2012?
Hipoteca os americanos, a América e o mundo a mais uns anos de mais do mesmo ou pior ? (ou alguém tem dúvidas que a Palin girl seria joguete pior que Bush nas unhas dos Cheney, Rove e outros conselheiros neo-cons?).
Hipoteca tudo para satisfazer o clintoniano ego e a esperança de manter o “family business”?
Não sou só eu que estou a ficar inquieta com as variações andropausicas do Bill. Uma amiga americana, chegada apoiante de Hillary que só perante a derrota se passou para Obama, confiou-me: “acho que o problema dele – e nosso - é que ela já não o consegue “rein him in” (submetê-lo à rédea...)”

A lasca do Alasca começa a derreter...

Está a confirmar-se o que eu previa: uma vez deixada por sua conta, Sarah Palin começa a escorregar na transparência da sua falta de credenciais vice-presidenciáveis.
Os neo-cons que controlam a campanha de McCain decidiram ontem deixá-la aventurar, confiantes em que uns cursos acelerados de política externa, reforçados por umas “photo-ops” na ONU com Karzai, Talebani, Sakashvili, Yutchenko e Ali Zardari, lhe dessem uma basesinha para não meter demasiada água.
Mas nem assim: vejam o que Governadora do Alasca disse a Katie Couric, da CBS, sobre a Russia, reiterando que tinha experiência da relação com a Russia porque a podia ver lá do Alasca. Como dizia um comentador: “mas que é isto, eu vejo a lua do meu jardim e isso torna-me num astro-físico?”
E atentem no que a Governadora expendeu sobre Israel e o Irão, em especial a profunda elocubração sobre quem são “good guys” e os “bad guys”.
Como avisou o comentador da CNN Anderson Cooper: ”You ‘ve got kind of see it to believe it!”.

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

Ainda as eleições em Angola

Já está disponível na Aba da Causa o meu artigo sobre as eleições em Angola - publicado há dias no Jornal de Leiria.

John McCain: o "running mate" de Sarah Palin

Acordei cedo esta manhã em Nova Iorque.
Uma ronda breve pelas cadeias de televisão e dá para ver a América a discutir, sob pano de fundo da crise financeira e económica, se amanhã há ou não há debate entre os candidatos presidenciais, depois de McCain ter ontem dito que o cancelava para ir para Washington ajudar a aprovar o Pacote Paulson no Congresso.
Dá para distinguir duas Américas:
- a que acusa McCain de ter medo do debate por impreparação e agarrar este pretexto para tambem se armar em salvador da pátria;
- a que defende McCain por "agir presidencialmente" e acusa Obama de alheamento dos problemas que preocupam os americanos (o debate devia centrar-se na política externa e não na economia).
Quanto a impulsos patrióticos, há quem faça ver que foi Obama quem ontem teve a iniciativa de telefonar a McCain propondo-lhe agirem conjuntamente para ajudarem a negociar e aprovar o pacote de medidas de emergência para mitigar o impacte da crise financeira. Antes de McCain ter vindo a publico tentar capitalizar o seu súbito ardor regulador do mundo da finança.
Sondagens invocadas nos noticiários dizem que 95% dos inquiridos querem que haja debate amanhã.
Talvez o subito desinteresse de Mc Cain pelo debate tenha a ver também com o facto de as sondagens o darem em declínio, à conta da grave crise financeira. A ponto de no seu "show" televisivo de ontem à noite, David Letterman ter gozado com a última definição de John Mc Cain: "the running mate of Sarah Palin".

Resposta a uma crítica improcedente

Esta crítica de Camilo Lourenço ao meu artigo do Público desta semana, sobre o voto dos residentes no estrangeiro, só pode impressionar quem não tenha lido o meu artigo (entretanto disponível na Aba da Causa).
Primeiro, limitei-me a enunciar os argumentos contra e a favor do voto por correspondência, sem sequer tomar uma posição definitiva, muito menos militante, a favor da supressão dessa forma de voto. Só fui taxativo, e sou, na rejeição da ideia de que a mudança para o voto presencial prejudica ou beneficia algum partido.
Segundo, contra o demagógico argumento dos "portugueses de segunda", chamo a atenção para o facto de que os residentes no território nacional, quando ausentes do seu local de recenseamento no dia das eleições (e há cada vez mais pessoas a viajar), também não podem votar por correspondência.
Em vez de uma sumária e despropositada censura pessoal, CL faria melhor em discutir o mérito dos argumentos em confronto.

Colectânea

Transportei para a Aba da Causa os meus últimos artigos no Público e no Diário Económico, que entretanto se tinham acumulado há algumas semanas.
Just for the record.

quarta-feira, 24 de setembro de 2008

O farsante

O Presidente dos Estados Unidos pediu «mais ONU», depois de há dias ter acusado a Rússia de ter intervindo na Geórgia «à margem da ONU».
Será este Presidente o mesmo que tudo fez para amesquinhar a ONU e que invadiu o Iraque sem nenhum mandato da mesma? E qual é sua credibilidade, ao invocar a ONU quando lhe convém?

Francamente

A novela relativamente ao Estatuto regional dos Açores promete continuar. É evidente que esta proposta do PS não é satisfatória, deixando sem alteração a questão crucial, que é obrigar o PR a ouvir previamente os órgãos de governo regional, incluindo a própria assembleia regional, antes de dissolver esta (e antes de outras decisões). Esta exigência é constitucionalmente infundada e politicamente indefensável.
Francamente, não vejo como é que o PR pode "assobiar para o ar" e promulgar o diploma...

Pressão social

Neste momento, o grupo social sujeito a maior pressão financeira é provavelmente o dos devedores de empréstimos para habitação com menores rendimentos, por efeito da contínua subida das taxas de juro.
Embora se traduza num significativo alívio, o aumento das deduções fiscais das despesas com tais empréstimos, já aprovado na AR, só terá efeitos no IRS do próximo ano. Por isso, se houvesse folga orçamental, não se deveria excluir a possibilidade de bonificar transitoriamente os juros das famílias em maiores dificuldades.
Comentários
«O primeiro problema é que as bonificações "transitórias" têm tendência a tornar-se definitivas.
O segundo problema é que não há quaisquer indicações de que os juros voltem, no futuro, a descer. Por uma variedade de razões imponderáveis, os juros poderão permanecer altos, ou até subir mais, e então, que se faria?
O terceiro problema é que é socialmente injusto em relação a tantas famílias, também elas pobres, que prescindiram de comprar casa, por exemplo permanecendo nas casas dos seus pais, com eles idosos. É também socialmente injusto para com aqueles, cada vez mais, que optam por viver numa casa arrendada, e a quem ninguém bonifica a renda que pagam. É também socialmente injusto em relação àqueles que se precaveram e que negociaram um empréstimo com taxa de juro fixa, como é prática geral no resto da Europa.
As pessoas fazem as suas opções e devem ser responsáveis por elas.»
Luís L.

Trocar propinas por bolsas

«OCDE considera inevitável subida das propinas nas universidades».
Defendo a elevação das propinas no ensino superior desde há vinte anos. Desde logo, para dispor de mais recursos financeiros para aumentar as bolsas de estudo e os empréstimos bonificados, em número e valor. Trata-se de aumentar a justiça social no acesso ao ensino superior, diminuindo o actual subsídio aos ricos e aumentando a ajuda a quem precisa.