segunda-feira, 11 de julho de 2011

Falácia

«O Presidente defendeu hoje que todos os cidadãos têm direito a cuidados de saúde de qualidade, mas considerou que o Estado deve delegá-los se não conseguir custeá-los.»
Mas então se o Estado delegar a sua prestação não tem de os pagar à entidade prestadora?! E se não tiver dinheiro para os custear no SNS, onde irá buscar o dinheiro para os custear a outras entidades prestadoras?
A afã ideológico da privatização do SNS leva a comprometedoras falácias como estas, como se os privados trabalhassem "à borla" ou fizessem "jeitos" ao Estado...

E insiste

As declarações do Presidente da República sobre o SNS -- uma sobre a delegação de tarefas às misericórdias e outra sobre pagamento diferenciado dos cuidados de saúde de acordo com os rendimentos -- não confirmam somente que ele insiste em invadir a esfera governativa, dedendendo propostas e iniciativas que só ao Governo compete fazer. Revelam também o seu total alinhamento com o projecto do Governo para esta área, abandonando qualquer preocupação de distanciamento em relação ao executivo em funções, que qualquer Presidente da República sempre deveria resguardar.

Incumprimento

Já se viu que o Governo não vai cumprir a obrigação de redução das autarquias territoriais constante do programa da ajustamento UE/FMI, que o PSD assinou.
O ponto nem sequer figura no programa do Governo. E esta estranha declaração do primeiro-ministro, sobre "incentivos à redução das freguesias" quer dizer obviamente duas coisas: (i) não haverá mexida nos municípios apesar de haver dezenas deles sem condições nem recursos mínimos; (ii) mesmo no caso das freguesias, o que vai haver são "incentivos" à sua fusão, com o problemático resultado que se adivinha.
É óbvio que o poderoso lóbi autárquico do PSD levou a melhor na oposição a qualquer mexida de tomo no mapa autárquico do País. Resta saber que justificação é que o Governo vai dar aos inspectores da troika...

sábado, 9 de julho de 2011

"Quantum mutatus ab illo"

Antes, a crise da dívida pública portuguesa era só nossa e as agências de rating eram só mensageiras de más notícias de que o único responsável era o Governo português. No discurso do Presidente da República ou do escriba de qualquer blogue de direita era como se nunca tivesse havido a grande crise económica e financeira iniciada em 2008 nem a posterior crise orçamental da Grécia e da Irlanda.
Agora que o Governo é de direita, passámos subitamente a ser vítimas da situação grega e da falta de determinação da UE em responder à crise do euro, e as agências de rating são cavilosos agentes encartados do mal, apostados em aniquilar os virtuosos esforços de Portugal!
Eis como, sem nada ter mudado, tudo afinal mudou!

Outros fóruns

Como habitualmente, importei hoje para a Aba da Causa os meus artigos no Público nas últimas semanas, desde "A exceção madeirense", de 14 de Maio, até "Depois de mim virá...", de 5 de Julho.
Dois meses de análise e reflexão política, com as eleições de 5 de Junho pelo meio.

Um pouco mais de consistência, sff

«Fernando Nobre: “Os que pensavam que [eu] estava à procura de um tacho enganaram-se”».
Se não queria um "tacho" (até porque a remuneração de deputado não é propriamente atractiva), é óbvio que pretendia um "penacho", tendo saltado fora quando o não conseguiu.
Depois de se ter lançado na corrida presidencial como independente, com um discurso demagógico anti-classe política e antipartidos, Nobre aceitou logo depois ser candidato partidário nas eleições legislativas, contra a promessa de vir a ser eleito presidente do parlamento, declarando que não permaneceria em São Bento caso o não conseguisse. Face à generalizada censura pública da sua posição, veio depois dizer que afinal não deixaria o parlamento. Foi, porém, a primeira coisa que fez, logo que derrotado na candidatura a presidente da AR.
Após ter arruinado o crédito dos independentes na política, Nobre desconsiderou o partido por que aceitou candidatar-se e desprezou o mandato para que foi eleito. Depois de tanta irresponsabilidade política ainda admite poder voltar à política. Mas para se ter credibilidade política precisa-se de um pouco mais de consistência política!

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Diogo Vasconcelos

O Diogo Vasconcelos partiu hoje antes do tempo, sabe-se lá porquê. Recordo a forma leal como me transmitiu alguns projectos em 2005, recordo as nossas conversas sobre o presente e o futuro nestes anos, na viagem de comboio entre Estocolmo e Oslo, na ida ao Café da Opera, nas Public Service Summits , na Apdc, por aí. E recordo o seu entusiasmo com novas ideias, a sua preocupação com a utilização das redes de nova geração a favor da inclusão social. Quem diria que o futuro não estava à nossa frente. Raio de vida que és tão curta. Adeus. Obrigada.

Crise: evitar que a Europa morra da cura

Procurei alertar contra a receita perversa da Comissão e Conselho, esta semana, em debate no plenário do Parlamento Europeu .
Discutiamos o importante relatório da socialista francesa Pervenche Berès, intitulado "A crise financeira, económica e social – recomendações referentes às medidas e iniciativas a tomar", que aponta caminhos e faz propostas para um NEW DEAL para salvar a Europa da crise.
O Governo português fazia bem em estudar, de fio a pavio, este fundamental relatório, ontem aprovado por larga convergência no Parlamento Europeu, para nele se amparar a fim de melhor defender os interesses portugueses e da União Europeia, face às desastrosas prescrições da Comissão Europeia e dos seus parceiros no Conselho.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

Homenagem sentida


Minha, à memória de Maria José Nogueira Pinto.
Eu podia não concordar em tudo com ela, mas concordava em muito mais do que poderia parecer. E sobretudo respeitava-a e admirava-lhe a convição, a combatividade e a dignidade.
O seu desaparecimento, tão nova, com ainda tanto para dar a Portugal, empobrece-nos a todos. Fica-nos o extraordinário exemplo de cidadania e activismo social e político, até ao último momento.
.

Bem-vindo ao clube... II

Ao PR Cavaco Silva, que hoje, finalmente, reconhece que as agëncias de rating merecem ser atacadas e reguladas, engolindo assim a indulgência que antes lhes prodigalizou.
E engolindo também as críticas injustas e paroquiais que dirigiu aos que, como o anterior governo socialista e muitas outras vozes, socialistas e não só (incluindo eu), há muito exigiam controlo e responsabilização destes abutres da especulação.

A receita neo-liberal só tem agravado a crise

Há dois dias de manhã, no Conselho Superior da ANTENA UM, expressei a esperança de que a presidência polaca da UE ajude a contrabalançar o poder do eixo franco-alemão que não tem contribuído para resolver a crise. Critiquei mais uma vez a forma como a União Europeia tem respondido à crise grega, crise a que Portugal obviamente não poderia imunizar-se, por mais que se quisesse apresentar o nosso país como "bom aluno" da receita neo-liberal - como o criminoso ataque da Moody's e outras agências contra o "rating" da Republica logo nesse mesmo dia fulminantemente demonstrou.
Igualmente concordei (com Jorge Sampaio e outras figuras europeias) que a solução para a crise europeia passa por um “New Deal” que inclua um esquema de mutualização da dívida europeia.

quarta-feira, 6 de julho de 2011

Bem-vindo ao clube...

Acabo eu de lançar ao meu colega eurodeputado Paulo Rangel, mal terminou uma intervenção no plenário do PE, hoje, incitando a nova presidêcia polaca a empenhar-se no reforço da governação económica europeia e na regulação das agências de rating que, de uma penada e irresponsavelmente, destroiem paises na mira do lucro especulativo.
Nada como uma cruel machadada, como a ontem dada pela Moody's no rating da Republica, para fazer reflectir - e espera-se - inflectir os mais fogosos impetos neo-liberais e as mais estultas veleidades lusas de demarcacao da Grecia armando-nos em "marroes" subservientes da Troika.

Palavra de Presidente

«Cavaco Silva voltou hoje a lançar um apelo "para uma distribuição justa dos sacrifícios"».
Aposto que o Presidente da República vai vetar o diploma que cria o imposto especial sobre o rendimento, por ser um caso flagrante de imposição injusta de sacrifícios, poupando desde logo os rendimento de capital...

terça-feira, 5 de julho de 2011

À borla

«Governo aprova fim das golden shares da PT, EDP e Galp Energia».
Cheio de gente dos negócios, este Governo tem uma tendência inata para favorecer os negócios, à custa do interesse público. Mesmo que fosse obrigatório eliminar as golden shares, nada obrigava a dá-las à borla. É evidente que com o fim das restrições que elas representavam os demais accionistas ganham uma considerável valorização do seu capital, sem terem de dar nada em troca. Justificava-se plenamente o lançamento de uma taxa sobre a operação, igual à mais-valia dela resultante.

Para DSK e os TSes de cá

Quem se mete com a criada, pode cair nas suas criações.

DSK

"When a habitual predator faces off against a habitual liar, the liar will most likely lose, even if it is the rare case when she is telling the truth", escrevia a Maureen Dowd nos NYT/IHT há dias.
Mas não é irrelevante quando mente ou quando diz a verdade a mentirosa: antes quando se queixou, ou agora, que pode ter sido paga para mentir?
É inegável que o predador DSK não caça só fora de portas: em França, a jornalista Tristane Banon apresenta queixa por tentativa de violação.
E ainda há lunático/as a sustentar que um tal personagem pode ser candidato socialista a PR?

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Submarinos sem atracação

Da LUSA, há 27 minutos:
"O chefe de Estado Maior da Armada admitiu hoje que os dois submarinos adquiridos por Portugal à Alemanha, devido à sua configuração, só podem atracar na base naval do Alfeite, em Lisboa, não existindo condições nos outros portos do país.
(...)
"Os novos submarinos têm um problema", disse, argumentando que pela sua configuração, precisam de uma "proteção adicional", pelo que "só há uma possibilidade de atracarem", na base naval do Alfeite, na capital portuguesa.


Ah! então não é que os insignes crânios marinheiros que tanto porfiaram na compra dos submarinos, mais os insignes crânios políticos que tanto se empenharam em aliviar o erário público da soma farónica que eles custaram, se esqueceram deste despiciendo pormenor, o das especificidades atracantes dos submergíveis?...
Enfim, já se percebeu que não são para ir longe, nem fundo, estes submarinos. Foram ruinosamente caros, mas vão esquadrinhar-nos ao milímetro as profundezas do Tejo, ali pelas imediações do Alfeite. Se, ao menos, a crise ainda der "pró pitróleo" ...

"Bulgaridades" sobre Política Externa

Indigência - é a palavra que fica da leitura do Programa de Governo no capítulo pomposamente intitulado "POLÍTICA EXTERNA, DESENVOLVIMENTO E DEFESA NACIONAL". Pomposamente porque são apenas nove ligeirissimas páginas, da 99 à 107, preenchidas com palavras ocas, frases de duvidosa sintaxe, conceitos corriqueiros desconexos e copiosas trivialidades, a inferiorizar qualquer discípulo de M. de la Palice.
Supostamente sobre Política Externa, a "pièce de resistance" centra-se na "Marca Portugal", na CPLP e na diplomacia económica, com uma pitada de "comunidades portuguesas", um cheirinho de EUA/NATO e mais um pézinho de Magrebe.
Mas já sobre as linhas políticas com que ela se há-de cozinhar, somos brindados com abundante rama descritiva - por exemplo, sobre o papel de Portugal nas organizações multilaterais, afirma-se que:
"daremos prioridade a: - cumprir o mandato de Portugal no Conselho de Segurança nas Nacões Unidas; -preparar a candidatura de Portugal ao Conselho de Direitos Humanos 2014-17 e - valorizar o multilateralismo baseado na cultura, como plataforma para a internacionalização das empresas e comunidades portuguesas"
(o que é a internacionalização das comunidades portuguesas, alguém me explica? o que estamos a fazer no CSNU, com que linhas vai Portugal orientar-se no próximo embate na AGNU sobre o reconhecimento da Palestina, vamos para o Conselho dos Direitos Humanos para sustentar o envio de mais fragatas contra novas "women on waves"? - sobre tudo isto o Programa do Governo prefere deixar-nos... na expectativa).
Sobre a Europa, a indigência rima com flatulência: o Programa inspira-se na afirmação de que ganha:
"uma nova importância: uma política europeia competente e credível, que na situação nacional actual e num cenários de desafios comuns e de soberania partilhada, é o espaço de acção essencial".
E expele rumo estratégico na declaração de que:
"para reforçar a afirmação de Portugal no contexto europeu e no relacionamento da Europa com os seus espaços de cooperação natural, o Governo irá: - defender e restabelecer a credibilidade e a reputação de Portugal no quadro europeu"
e "assegurar a participação de Portugal na linha da frente da construção europeia e procurar que os principios da coesão e da solidariedade entre Estado-membros sejam espelhados nas políticas comunitárias".
(Vade-retro maledicentes a salivar por que o Governo se empenhasse antes em enterrar-nos a reputação e em amarrar-nos ao banco dos suplentes!...)
Não sei quem terá atamancado tantas platitudes - nos meus tempos no MNE, nem o mais diáfano dos adidos de embaixada ousaria apresentar um papel tão mal-escrito e tão recheado de lapalissadas a um qualquer chefe de serviço.
Apesar de o Governo estar agora a recorrer ao alfobre de funcionalismo público de qualidade que o MNE produz, teve azar - não terá ido a tempo de recrutar diplomáticos préstimos para lhe redigir este capítulo do Programa de Governo.
Que, claramente, não pesa sequer as 5 folhinhas de "bulgaridades" em que se espraia.

A Europa é pequena

Hoje numa fila da cantina do Parlamento Europeu em Estrasburgo fui inesperadamente saudado com um "Hello Professor" por uma jovem que não pude reconhecer imediatamente. Logo soube que se tratava de uma estudante dinamarquesa do mestrado europeu de direitos humanos, de que sou director nacional desde a origem, tendo estado em Coimbra no segundo semestre lectivo do ano passado. Agora encontra-se a estagiar junto de uma deputada dinamarquesa no PE.
Realmente a Europa é pequena!...

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Um pouco mais de isenção, sff.

Se este imposto extraordinário tivesse sido decidido por Sócrates, por mais que justificado fosse, cairia o Carmo e a Trindade, sendo crucificado pelos comentadores da nossa praça.
Agora que foi criado pelo governo de direita, que antes das eleições nunca fez sequer menção de tal eventualidade e sem sequer estar previsto no exigente programa de ajustamento da UE e do FMI, os mandarins e valetes que tomaram conta do comentário político-económico entre nós -- e que em geral alinhavam com a teoria do saneamento das contas públicas por via do corte na despesa e não por via de receitas fiscais adicionais -- manifestam a maior compreensão, se não mesmo aplauso.
Uma vergonha, tanta incoerência e parcialidade política!

A factura

«Passos Coelho anuncia imposto de 50% no Subsídio de Natal».
Quatro observações:
1ª - Esta medida não se encontrava prevista no PEC IV, que o PSD rejeitou, nem se encontra incluída no programa de ajustamento UE-FMI, que o PSD subscreveu. E na campanha eleitoral Passos Coelho não fez a mínima menção à possibilidade de um imposto extraordinário.
2ª - Desta notícia não se percebe bem sobre que rendimentos vai incidir o imposto nem como será calculado. De facto, só os rendimentos do trabalho têm em regra subsídio de Natal e nem todos os rendimentos são de englobamento obrigatório no IRS, estando dispensados os rendimentos de capital, cuja isenção seria íníqua.
3ª - Tratando-se de uma sobretaxa IRS, o novo imposto deveria ser de incidência progressiva, para cumprir os ditames constitucionais. Ora, se vai ser equivalente a metade da subsídio de Natal, estamos perante um imposto proporcional. A isenção na base do equivalente ao salário mínimo confere-lhe alguma progressividade, mas uma progressividade que é tanto menor quanto maiores forem os rendimentos, quando deveria ser o contrário.
4ª - Não podendo haver impostos retroactivos, este imposto extraordinário sobre os rendimentos só pode incidir sobre rendimentos futuros, ou seja sobre os recebidos entre a aplicação do imposto e o final do ano, o que deixará de fora os milhões de rendimento em dividendos, que ja foram pagos este ano. Uma iniquidade. Por mais justificado que possa ser o imposto -- mas ainda não o foi --, exige-se um mínimo de equidade na sua definição.
Seja como for, o Governo PSD-CDS começa a apresentar a sua factura. E, como se vê, à bruta...
[revisto]

Condição

Confesso que não consigo entender o argumento dos que à esquerda rejeitam a austeridade necessária para sanear as contas públicas e responder à crise da dívida pública e que alternativamente clamam por medidas que favoreçam a retoma económica.
A verdade é que se todos os recursos são poucos para sanear as contas públicas, não se vê onde ir buscar os recursos para o investimento público. Além disso, e mais importante, sem a superação da crise das finanças públicas não é possível assegurar nenhuma retoma. Numa situação de incerteza e de insegurança, os capitais estrangeiros fogem, os investidores não investem, as empresas não empregam, os consumidores adiam os gastos. O resultado só pode ser a persistência ou agravamento da recessão, por mais que o Estado tentasse compensar com medidas keynesianas.
Por conseguinte, a primeira condição da retoma e do crescimento é o sanemento das finanças públicas, com o necessário programa de austeridade. Quanto mais depressa, melhor.

"Voyeurismo"

Um diário de ontem fazia manchete com a denuncia acusadora de que o anterior governo fez limpar o correio electrónico e os ficheiros dos computadores dos ministérios. A acusação é uma tonteria, que só a demagogia e o voyeurismo dos media pode explicar. É evidente que não teria nenhum sentido deixar os computadores cheios de correio electrónico, que não poderia deixar de ter comunicações pessoais, e de outro material que necessariamente teria documentos partidariamente sensíveis.
O que, ao invés, me parece injustificado e prejudicial é o usual apagamento dos websites oficiais das instituições e dos serviços públicos, quando há substituição dos seus titulares ou dirigentes. Uma boa parte da nossa história política está aí. Lamento profundamente, por exemplo, que não tenham continuado disponíveis os websites dos anteriores presidentes da República.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Impressões de Varsóvia (3)

Após dois dias de encontros com os responsáveis governamentais, com organizações empresariais e com think tanks, não posso deixar de ficar com expectativas muito positivas da presidência polaca do Conselho da União, que agora mesmo se inicia. Cuidada preparação, elevada mobilização de recursos financeiros e humanos, prioridades claras, motivação europeísta – eis os ingredientes para o sucesso. De resto, o espírito reinante na capital polaca é francamente positivo, o que aliás não é para admirar, tendo em conta que a Polónia é o maior beneficiário dos fundos da União e está passar por um período de sólido crescimento económico e de progresso social. No clima de preocupação que reina no flanco sul e ocidental da União, apraz verificar que há outras geografias onde a Europa encara o futuro com optimismo.
Visivelmente, sendo o maior Estado-membro do Leste da Europa, a Polónia quer fazer desta presidência um teste às suas capacidades e ao seu poder de afirmação na União.

Quem deve pagar a crise?

A SIC NOTÍCIAS noticiava ontem que a Comissão Europeia propõe um novo imposto europeu sobre "transações entre os 27 Estados Membros".
Mas esquece-se de acrescentar uma palavrinha fundamental: "financeiras".
Sim, porque é de cobrar impostos sobre as transações financeiras que estamos a falar. De fazer os bancos, seguradoras, "hedge funds" e outros fundos, com mais ou menos fundo, e todos os que ganham dinheiro à conta de terem dinheiro, pagar uma percentagem ínfima do que ganham para ajudar a UE a ajudar os Estados que mais precisam - como Portugal - a recuperar da crise, relançando o crescimento económico e gerando emprego.
Trata-se de uma proposta há muito apoiada no Parlamento Europeu e em particular pela família socialista.
É deprimente ver a SIC NOTÍCIAS e outros media portugueses embarcarem imediatamente numa campanha para indispor os cidadãos contra a Europa, sugerindo que a proposta da Comissão vai sobrecarregá-los com mais um imposto, em tempos de tão dura crise.
Porque não é nada disso, muito pelo contrário.
Trata-se de fazer pagar pela crise os seus principais causadores.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Libertar Agostinho Chicaia


Agostinho Chicaia, ex-presidente da extinta Associação Cívica de Cabinda MPALABANDA, que conheci em 2008 em Cabinda, foi preso a 20 de Junho no Aeroporto de Kinshasa, na RDC, por onde se deslocava em actividade profissional, como engenheiro ao serviço da ONU.
A detenção foi alegadamente feita com base numa lista negra produzida pelas autoridades angolanas em 2010, no contexto da onda de repressão política contra defensores de direitos humanos cabindenses que se seguiu ao ataque contra a equipa do Togo, durante o CAN...
Uma lista que, para além de ser um atentado contra a justiça e os direitos humanos em Angola, já caducou ... pois baseia-se num artigo sobre "outros crimes contra a segurança do Estado" de uma lei já revogada!
Num ping-pong kafkiano, fontes da Embaixada de Angola na capital congolesa estarão a alegar que só poderão reagir depois de uma notificação em que Kinshasa admitiria ter sob detenção... um "terrorista angolano"!
Agostinho Chicaia vai começar uma greve de fome a 30 de Junho.
Já enviei perguntas sobre este caso deprimente, em que Kinshasa exibe grotescamente a sua subserviência a Luanda, às principais autoridades congolesas e a várias entidades europeias, incluindo o Comissário Piebalgs, a Alta Representante Ashton e o Presidente Barroso. É que o Acordo de Cotonou vincula Angola, a RDC e a UE ao respeito pelos direitos humanos. E fez-se para ser usado.
E já assinei esta petição pela libertação imediata de Agostinho Chicaia..
Faça-o também, ajudando a libertar este respeitado e corajoso activista de Cabinda!

Questionando os Presidentes da UE

"Presidente Van Rompuy,
Como disse, a crise da divida soberana demonstra a interdependência de todas as nossas economias.
Mas há outra lição a reter: a de que a receita de austeridade, sózinha, não funciona. Pelo contrário, como a Grécia demonstra, essa receita só enterra mais a economia grega, portuguesa, irlandesa, italiana, espanhola, etc... e expoe o Euro à especulação nos mercados.
O que espera o Conselho para adoptar medidas verdadeiramente europeias e solidárias? como os eurobonds, para mutualizar a divida soberana; um imposto sobre as transacções financeiras, para financiar a recuperação económica e o emprego na Europa; e avançar na governação económica europeia, com harmonização de politicas fiscais, industriais e comerciais para travar os desiquilibrios macro-económicos entre os membros da UE?
O que espera o Conselho para obrigar os bancos europeus a comunicar ao governo grego todos os haveres gregos que ajudaram a desviar para paraisos fiscais no ultimo ano, ajudando assim a frustrar o "plano de ajuda" europeu?
Presidente Barroso -
O que farão Conselho e Comissão se o Parlamento grego amanhã não aprovar o plano do Conselho Europeu? Qual é o plano B do Conselho?
Será que o Conselho realiza que, com o impacto estupido e doloroso da sua receita neo-liberal sobre os cidadãos, não está apenas a enterrar a Grécia, mas o Euro, a construção europeia e a própria democracia na Europa, além de desencadear uma crise global pior que a resultante da queda do Lehman Brothers, como avisam os nossos aliados americanos?"

Dirigi-as esta tarde aos Presidentes van Rompuy e Barroso, em Conferência de Presidentes aberta, no PE.
Ambos se mostraram muito confiantes em que o Parlamento grego aprove o novo pacote de medidas de austeridade.
Barroso negou, por isso, que houvesse Plano B...(se o parlamento grego chumbar as medidas, deixa-se a Grécia cair na bancarrota?).
Barroso admitiu, no entanto, que o dinheiro dos gregos está de facto a ser desviado para o exterior. Com visível exasperação, proporcional à incapacidade da UE para o impedir.
O que, só por si, diz tudo sobre a eficácia da receita até aqui aplicada pelo Conselho Europeu!

Maltratar a Grécia afunda a UE

A crise das dividas soberanas resulta da falta de governação económica na UE e consequente falta de sustentabilidade do Euro.
Por isso, Portugal poderá ser tremendamente afectado (e será certamente o primeiro país da zona Euro a ser afectado), se se deixar a Grécia entrar em incumprimento (default) - o que pode resultar de eventual votação amanhã no Parlamento grego, tendo o Conselho Europeu feito depender dela a libertação de uma tranche do empréstimo acordado em 2010 e a concessão de eventual novo empréstimo. E não se sabe se o governo socialista grego consegue essa aprovação, não só porque o povo protesta vivamente nas ruas influenciando deputados do PASOK, como porque o maior partido à direita - cujo lider fez ouvidos moucos às admoestações da Sra. Merkel - se recusa a aprovar as novas e durissimas condições exigidas à Grécia em troca da "assistência".
Em Portugal não devemos alimentar ilusões, como as semeadas por aqueles que acham que bastou Pedro Passos Coelho apresentar-se no Conselho Europeu de baraço ao pescoço, por todos nós, e agradecer muito o empréstimo nas condições determinadas pela Troika, repetindo o mantra "nós não somos a Grécia".
Por mais que cumpramos com rigor o acordo com a ‘troika’, se a Grécia se afundar, nós afundamo-nos a seguir. E é toda a Europa que se afunda.
Por isso, teve razão Mário Soares ao fazer notar como é vergonhosa a forma como os lideres da União Europeia estão a tratar a Grécia.
E teve razão António José Seguro quando advertiu o Governo para não se exceder no zelo neo-liberal de ultrapassar o que a Troika nos impõe em medidas de austeridade, antes se aplique a investir o que for possível em crescimento económico e emprego. Porque é sobretudo à conta da receita de austeridade punitiva, sem condições para relançar o crescimento económico, que hoje a Grécia se acha ainda mais endividada e desesperada.
Foi disto que falei esta manhã na Conselho Superior Antena UM.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Notas de Varsóvia (2)


Os polacos desejam fazer do seu primeiro semestre na presidência rotativa do Conselho da União Europeia uma manifestação de afirmação do seu empenho europeísta e das suas capacidades e recursos.
Por toda a cidade de Varsóvia estão amplamente assinalados os festejos da inauguração da sua presidência no próximo dia 1 de Julho, com um enorme espectáculo de som e luz, a realizar no conspícuo Palácio da Cultura e da Ciência, o edifício mais vasto e mais alto da cidade.
Não deixa de ser irónico que a celebração da presidência da UE ocorra no mais emblemático símbolo da era comunista, um verdadeiro ícone da megalomania arquitectónica Estalinista, aliás uma oferta do próprio Estáline à cidade. A verdade é que ele se tornou num ícone popular da própria Varsóvia...

Notas de Varsóvia (1)

Não regressava a Varsóvia há mais de trinta anos, onde vim pela primeira vez numa delegação parlamentar oficial, tal como agora (então pela AR, agora pelo Parlamento Europeu). É a única capital do antigo mundo comunista que conheci antes do fim deste e que portanto posso comparar.
Reencontrei a mesma cidade cuidada e acolhedora, com o seu centro histórico já nessa altura meticulosamente reerguido da bárbara destruição nazi, as suas artérias repletas de arquitetura maneirisra, barroca e neoclássica, as suas numerosas igrejas dos mesmos estilos, os seus palácios áulicos no meio de enormes parques com fontes e lagos, mas também a pesada arquitectura do período comunista, a começar pelo indescritível Palácio da Cultura e da Ciência, em genuíno monumentalismo estalinista, edificado nos anos 50.
Mas as diferenças destas três décadas são enormes e não se limitam aos automóveias e painéis publicitários, aos restaurantes, cafés e esplanadas, aos hotéis das cadeias internacionais e aos numerosos bancos, aos estabelecimemtos comercias das marcas de luxo italianas e francesas, aos arrnaha-céus que no centro da cidade desafiam em altura a referida torre da era comunista.
O que impressiona é o ritmo esfusiante da cidade, a pujança económica que o sucesso da transição para a economia de mercado e a adesão à UE proporcionaram e o cosmopolitismo que se detecta no turismo, nos negócios e na vida política e cultural.
Decididamente, um outro país no espaço de uma geração.