sexta-feira, 25 de maio de 2012

Aspas a mais

O Diário de Notícias de hoje declara que José Eduardo dos Santos vai de novo ser "eleito" nas próximas eleições angolanas, colocando ostensivas aspas na palavra "eleito", para significar que ele não será propriamente eleito.
Lendo a peça percebe-se que a dúvida sobre a "eleição" do Presidente angolano se deve ao facto que, de acordo com a nova Cosantiução angolana, ele deixou de ser eleito em eleições presidenciais separadas, sendo eleito como Presidente o primeiro candidato da lista vencedora das eleições legislativas. Portanto, a escolha do presidente é uma consequência derivada das eleições dos deputados. Os eleitores têm um único voto, com o qual votam no partido e no sue candidato presidencial.
Assim é de facto. Todavia, o que vai verificar-se é que para a maior parte dos eleitores as eleições legislativas se vão transfromar verdadeiramente na eleição do presidente, tal como aliás sucede entre nós com as eleições da câmra municipal, que se transformaram também na eleição "directa" do respectivo presidente.
Por isso, na altura própria qualifiquei o novo sistema de governo angolano como um "presidencialismo superlativo", apesar de formalmente não haver eleições presidenciais propriamente ditas.
Sendo as coisas que são, as aspas do Diário de Notícias estão a mais. Quem vai a votos nas eleiçoes angolanos é antes de mais J. E. dos Santos. Os deputados é que serão eleitos "à conta dele".

quinta-feira, 24 de maio de 2012

Afinal em que ficamos?

Ou o jornal Público fez uma acusação falsa e muito grave ao Ministro Miguel Relvas: a de que este teria ameaçado revelar a vida privada de uma jornalista (informação a que teria acesso não se sabe como), caso ela insistisse em publicar uma determinada noticia (verdadeira ou não). Ou o Ministro se esqueceu muito depressa do que (supostamente) disse e nem se entende de que é que afinal se desculpou. Vi muitas vezes jornalistas distorcer a realidade ou ignorá-la, quando ela não encaixa nos seus pressupostos. Mas a luta contra o mau jornalismo não passa por retirar direitos inalienáveis aos que o fazem. Para os que forem injustamente visados, há outros meios para se defenderem, ainda que infelizmente nem sempre muito eficazes. Para os leitores, há o direito de deixar de olhar para o jornal.

A crise, a ver passar combóios...

Não tenho conseguido tempo para postar, tanto têm sido o afazer no Parlamento Europeu, incluindo participação em debates em França e no nosso país sobre para onde vai a UE, a propósito do Dia da Europa.
Nas duas ultimas semanas fiz debates em escolas em Mira Sintra, Santarém e Palmela. E sessões públicas em Aubervilliers (Paris), Braga, Porto e Loulé. E desde o principio do mês de Maio estive em missões na Libia e em Washington, além de em sessões de trabalho do PE em Bruxelas e Estrasburgo.
Não tenho andado, assim, propriamente "a ver passar combóios" sobre a evolução da crise a nível nacional e europeu. Sendo impossível dar conta de tudo, aqui deixo resumos respigados das intervenções que fui fazendo na rúbrica "Conselho Superior" da ANTENA UM.

22 de Maio
Acho curioso que tenham bastado a Passos Coelho alguns minutos na companhia de François Hollande em Chicago para, afinal, logo se dar conta de que ele é relevante para estabelecer "uma nova visão comum na Europa, mais virada para o crescimento". Devia transmitir isto ao seu ministro Gaspar, que tanto criticou a Grécia no ultimo Eurogrupo! Pelo contrário, é contra esta Alemanha de Merkel, neoliberal e reaccionária, que Portugal tem de apontar baterias. Esperemos que o Conselho Europeu de amanhã (23 de Maio) dê luz ao fundo do túnel aos gregos. Também para impedir o contágio a Portugal, Espanha, Itália. Os países em dificuldade precisam da solidariedade dos Estados-Membros com excedente orçamental, como disse o Presidente Cavaco Silva, certamente bem inspirado pelas paragens timorenses...

15 de Maio
Sendo o entendimento Portugal-Espanha fundamental para nós e para a Europa, congratulo-me com a realização da cimeira luso-espanhola da ultima semana, até porque nos últimos três anos estivemos sem cimeiras, de costas voltadas entre vizinhos ibéricos. Ambos dizendo que não eram a Grécia e Espanha dizendo que não era Portugal... Mas os resultados da Cimeira são "muita parra e pouca uva": pouco ou nada se avançou em energia e transportes. Foi uma ocasião perdida para as ligações ferroviárias, para o tão apregoado MIBEL (mercado ibérico da electricidade).E sobre riscos decorrentes das centrais nucleares espanholas, algumas juntinho às nossas frontreiras, como a velhinha Almaraz? A Cimeira nada disse. Nada se aprendeu com Fukushima na Peninsula? A Portugal não interessa a prevenção e protecção do nosso território, de "maus ventos" que de repente possam vir de Espanha?
(O tempo foi mais curto que habitualmente, não deu para falar da falta de sinergia ibérica na Europa, para forçar a viragem de políticas e fazer a UE sair da crise).

9 de Maio
Em Washington, onde participei no Diálogo Transatlântico/2012 juntando políticos e empresários da UE e dos EUA, era visivel a atenção com que governo, congressistas e investidores norte-americanos acompanharam as eleições em diversos países europeus (presidenciais francesas, legislativas gregas, locais no Reino Unido e nos lannder alemães)pelo impacto que podem ter na evolução da crise do euro e, logo, da economia mundial. Sem dúvida o que mais os preocupou foi assistir à entrada de um partido neo-nazi no parlamento grego em resultado da desastrosa austeridade imposta pela Troika. A Administração Obama, que vê a UE como o projecto de paz mais bem sucedido no mundo, tem passado aos líderes europeus a mensagem de que mais do que de austeridade orçamental, são precisas políticas de apoio ao crescimento e ao emprego. Na linha do que defendeu Hollande durante a campanha eleitoral em França. E ainda antes de eleito, Hollande já estava a mudar o debate na UE. A Sra. Merkel vai ter de mudar de receita; a que impõe, destroi a economia, os empregos, as pessoas. Nos EUA percebe-se bem que a prioridade tem de ser salvar a Grécia, mantendo-a na democracia e na UE. E que salvar a Grécia é salvar o Euro! E assim impedir o caos à escala global.

24de Abril
Históricos resultados da primeira volta das presidenciais francesas, estes! Um voto contra as políticas de Sarkozy e o seu discurso xenófobo e nacionalista, mas também um "voto de crise" numa eleição muito participada. Em que uma percentagem importante do eleitorado se deixou tentar pela extrema-direita. Preocupante, mas compreensível a desorientação sentida por uma parte das classes trabalhadoras e dos jovens sem emprego, nesta Europa da dupla Merkozy e do seu Tratado Orçamental injusto e inexequível que, tal como está, será indutor de mais recessão e desemprego. É do interesse de Portugal que Hollande vença as eleições. Ele fará a diferença. Com propostas na mesma linha das apresentadas pelo PS em Portugal, o programa de Hollande aponta para o investimento na economia e no emprego e para um papel mais activo do BCE e da governacão económica da UE, nomeadamente através da criação de eurobrigações e da harmonização fiscal.

10 de Abril
Desejo o melhor para Portugal, para a Espanha, para a Europa. E não ignoro que um resgate financeiro da Espanha teria repercussões directas para a economia portuguesa. Mas dou por mim a rezar pela hora em que a Troika terá de intervir em Espanha. Porque só com o resgate de uma grande economia com a dimensão da espanhola, é que forçaremos a mudança de políticas por parte do complexo político-mediático de ideologia neoliberal que domina a Europa. Injectar doses cavalares de austeridade só agrava os problemas da economia portuguesa e europeia. Tem consequências terríveis não só para a economia, mas devastadoras para a construção europeia. Parece ser esse o objectivo: veja-se como o Sr. Draghi, governador do Banco Central Europeu, já considera que "a Europa Social está morta".

terça-feira, 22 de maio de 2012

Défices

Como explica Jorge Vasconcelos, antigo presidente da entidade reguladora do sector, o chamado "défice tarifário" na electricidade significa pagarmos mais tarde, com juros, a energia que agora consumimos abaixo do preço. Tal como todos os défices, aliás!...
Com duas agravantes: (i) não nos pediram o consentimento para esse consumo a crédito forçado; (ii) os novos consumidores futuros pagarão energia que não consumiram.

segunda-feira, 21 de maio de 2012

Antologia do dislate político

«Alberto João Jardim: Questão da zona franca justifica pensar sair da UE».

Grécia (2)

A chantagem da esquerda radical grega (ver post anterior) é evidente: "ou nos continuam a financiar, cumpramos ou não o acordo que assinámos com a troika, ou a nossa falência arrastará o naufrágio do Euro. Portanto, não têm alternativa".
É evidente que ninguém deseja a falência da Grécia, muito menos a sua saída do Euro, quanto mais não seja pelo imprevisível impacto negativo sobre terceiros países e sobre a estabilidade do própria moeda única. Todavia, com essa eventualidade a tornar-se assaz provável, se das eleições não sair um governo comprometido com o programa de consolidação orçamental, nos termos acordados, a Comissão Europeia e o BCE têm de sair rapidamente com um estudo de impacto de uma possível falência grega e da consequente saída grega do Euro. Pior que um desastre anunciado é não estarmos preparados para lhe responder...

Grécia (1)

Estas declarações do líder da esquerda radical grega revela o assustador primarismo e a irresponsabilidade do grupo de quem pode depender a sorte da Grácia depois das próximas eleições, quando sustenta que o País poderá permanecer no Euro mesmo que entre em falência, ou que pode sair do Euro sem dificuldades de maior.
É certo que, com um saldo orçamental primário já quase equilibrado -- cortesia do programa de austeridade orçamental... --, a Grécia poderia teoricamente sobreviver orçamentalmente pelos seus próprios meios, sem acesso a financiamento externo, se deixasse de cumprir o serviço da dívida. Sucede, porém, que o seu sistema bancário não poderia deixar de colapsar a breve trecho, não somente pela "corrida aos bancos" dos depositantes, mas também pelo corte do financiamento externo do BCE (por os bancos gregos deixarem de dispor de "colaterais" aceitáveis). Com o colapso da banca viria logo depois o colapso da economia e o colapso das finanças públicas, ou seja, o colapso do País...

Inadmissível

Se «Miguel Relvas ameaçou fazer um blackout noticioso do Governo contra o jornal e divulgar detalhes da vida privada d[e um]a jornalista», como acusa o Público, o Ministro está em maus lençóis. É certo que os jornais têm uma tendência para exagerar as pressões de que são alegadamente alvo. Mas se for for verdade alguma daquelas graves acusações, especialmente a segunda, a posição do Ministro torna-se politicamente muito complicada.
Independentemente da questão da ilicitude, em que surpreendentemente se refugia a direcção do Público para desvalorizar o que todavia considera «inaceitável», há coisas que numa democracia são mesmo politicamente inaceitáveis.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Finalmente

Foi finalmente tomada a decisão (que vinha do anterior Governo) de concentrar os vários hospitais militares num só, com a poupança e os ganhos de eficiência fáceis de imaginar.
Somos assim, país com escassos recursos financeiros e com crónicas dificuldades orçamentais mas com hospitais a mais, tribunais a mais, universidades a mais, autarquias locais a mais...

À custa do País

Entre as malfeitorias deste Governo avulta a do fim do programa "Novas Oportunidades", que só pode ser justificado pela vontade de desfazer o que de bom o anterior Governo fez.
Não se tratava somente de permitir a muitos portugueses adquirir novas qualificações e ganhar novas oportunidades de emprego, além de mais dignidade social e auto-estima pessoal; tratava-se também de contribuir para aquilo de a economia nacional mais precisa, a saber mais qualificação laboral, produtividade e mais competitividade. O Governo fala muito nisso, mas prefere apostar na exclusivamente na redução do nível de salários para ganhar competitividade.
Poderia ser que o programa NO necessitasse de revisão, em prol da sua eficácia e eficiência. Acabar com ele, porém, só revela o "desforrismo político" em que este Governo preferiu investir, à custa do País.

Antologia das previsões "de-acordo-com-os-desejos"

«Entretanto, [com a vitória de François Hollande em França], o tratado orçamental está arrumado, porque - para lá das cada vez maiores e decisivas reservas dos social-democratas alemães - nem a França nem a Itália o ratificarão. »
(M. M. Carrilho, Diário de Notícias de hoje).

quarta-feira, 16 de maio de 2012

Sim, mas...

São animadores os dados que permitem antecipar uma recessão abaixo do que estava previsto para este ano --, o que contraria a tese tremendista  da "espiral recessiva" (austeridade-recessão, mais austeridade-mais recessão...), com que o esquerdismo indígena (e não só) fulminou desde o início o programa de consolidação orçamental e a "receita da troika".
Todavia, sem esquecer os custos sociais da austeridade (ainda por cima socialmente muito  assimétricos na fórmula adoptada por este Governo...), convém não esquecer também o impacto que factores externos podem ter entre nós, nomeadamente um possível agravamento da situação económica espanhola (mais recessão do que a prevista) e especialmente o quase certo naufrágio da Grécia, se as próximas eleições não produzirem um governo capaz de implementar o acordo de ajuste orçamental e económico com a troika.
O motivo para relativo alívio interno é obnubilado por acrescidos factores externos de incerteza.

terça-feira, 15 de maio de 2012

Respeitar os eleitores gregos

Não falta quem apele ao "respeito" pelos resultados eleitorais gregos. Eu também acho que sim!
Nesta eleições uma maioria dos eleitores manifestou-se contra o programa de consolidação orçamental grego, sabendo que é a condição "sine qua non" de continuar a beneficiar de assistência financeira e de a Grécia não ter de cessar pagamentos e declarar insolvência.
Se havia alguma dúvida sobre isso, elas foram dissipadas pela UE depois das eleições. Se nas novas eleições dentro de algumas semanas, não podendo ignorar o sentido do seu voto, os gregos repetirem a mesma escolha (oxalá que não!), anão há outra alternativa se não a de respeitar a sua decisão de não cumprirem os termos do acordo e de arcarem com as respectivas consequências.
Além de uma catástrofe para a Grécia, isso será também uma enorme perda para o euro  (com efeitos colaterais difíceis de antecipar sobre a estabilidade da zona euro e sobre outros países vulneráveis). Todavia, mesmo se não está prevista expressamente a possibilidade de saída do euro, ninguém pode obrigar a Grécia a permanecer, se os eleitores gregos deliberadamente tornarem impossível a sua permanência.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Antologia da falsificação histórica

Na entrevista ao Diário de Notícias de ontem, Francisco Louçã declara que a «troika tomou conta do país com o apoio do PS, do PSD e do CDS».
Mas não é preciso grande exercício de memória para recordar que o que desencadeou a vinda da troika foi o chumbo do PEC IV às mãos do PSD, com o apoio do CDS e ... do PCP e do BE!

quarta-feira, 9 de maio de 2012

Romper com a troika?

Há três razões que desaconselham decididamente uma ruptura do PS com o acordo com a troika.
Primeiro, o acordo foi negociado e assinado pelo PS em nome do Governo português. O PS não pode desvincular-se só porque está agora na oposição. É uma questão de responsabilidade política.
Segundo, se fosse Governo, o PS mão romperia o acordo. O PS pode e deve opor-se ao modo como o Governo (des)aplica o acordo (nomeadamente onde o Governo vai deliberadamente além do acordo e quanto à iníqua repartição social dos sacrifícios da austeridade). Não pode, porém, demarcar-se do próprio acordo. Mesmo na oposição, o PS deve continuar a actuar como um partido de governo. É uma questão de coerência.
Terceiro, no momento em que o terramoto das eleições gregas pode prenunciar a falência da Grécia e a saída do Euro, com um inevitável abalo nos países mais vulneráveis, como Portugal, o PS não pode romper a frente nacional da consolidação orçamental, como condição de permanência no Euro e de crescimento económico sustentado no futuro. É uma questão de defesa do interesse nacional.

Nem poderia fazer outra coisa

«PS demarca-se de declarações de Soares sobre troika».

segunda-feira, 7 de maio de 2012

Ingovernabilidade

Muito preocupantes os resultados das eleições gregas, com afundamento dos tradicionais partidos do poder e emergência dos partidos anti-europeístas, tanto na extrema-direita como, sobretudo, da extrema-esquerda.
Em tempos de crise aguda e de prolongada instabilidade económica e social, a principal ameaça das democracias parlamentares, particularmente com sistemas de eleição proporcional, é o triunfo do voto de protesto, da fragmentação e volatilidade da representação parlamentar e da ingovernabilidade.
Quem pode esquecer, por exemplo, I República portuguesa, a República de Weimar e a IV República francesa?

Antologia do dislate intelectual

«Desde que os judeus saíram da Alemanha que aquele País perdeu a sua capacidade de produção intelectual» (V. Soromenho Marques, segundo a Visão).

O próximo desafio

Com uma vitória convincente mas menos expressiva do que o esperado, Hollande tem de esperar pelas eleições legislativas de Junho, pois sem uma maioria parlamentar o seu papel de Presidente fica amputado de boa parte do poder governativo.
Até à conclusão do ciclo eleitoral, nada está definitivamente ganho.

Adenda
No entanto, a vitória eleitoral da esquerda nas legislativas só estaria em risco se houvesse algum acordo entre a direita (UMP) e a Frente Nacional para a 2ª volta, onde tudo se decide, o que parece excluído à partida, apesar do namoro que Sarkozy ensaiou na 2ª volta das presidenciais.

domingo, 6 de maio de 2012

Hollande

Também não penso que a esperada vitória de Hollande represente só por si o início de uma viragem política a favor da esquerda na Europa e o princípio do fim da actual hegemonia da direita nos governos nacionais e nas instituições da União Europeia.
Primeiro, a derrota da direita em França  inscreve-se na regra geral da derrota dos governos em funções como vítimas da crise, qualquer que seja a sua orientação política; segundo, mesmo que na Itália as próximas eleições castiguem igualmente a direita, nada porém aponta para uma vitória do SPD na Alemanha no próximo ano, justamente porque aí não se faz sentir nenhuma crise e Merkel pode bem manter-se no poder.
Seja como for, a provável vitória de Hollande abre pelo menos uma importante brecha no predomínio da direita liberal na Europa, trazendo novas ideias ao discurso político e propostas alternativas à agenda política. O que já não é pouco...

Ilusões

Não acompanho as grandes esperanças dos socialistas europeus na esperada vitória de François Hollande hoje em França, especialmente numa mudança de orientação da União Europeia, desde logo no que respeita à resposta à crise.
Primeiro, não é a mudança de Governo num Estado-membro, mesmo que se chame França, que pode alterar significativamente a política da UE.
Segundo, a França já não tem a influência de outrora, desde logo pelas dificuldades económicas e financeiras por que passa.
Terceiro, não há alternativa, nem Hollande a apresentou, à politica de disciplina e de consolidação orçamental, incluindo em França.
Algo vai mudar sem dúvida na Europa com a eleição de Hollande, mas de forma bem menos profunda e bem menos rápida do que muita gente à esquerda espera. Um provável "Pacto de crescimento", com alguns compromissos políticos, poderá ser alcançado num dos próximos conselhos europeus, mas sem pôr em causa o Tratado Orçamental nem as políticas de austeridade orçamental em curso.

sábado, 5 de maio de 2012

Abuso de poder

Sou desde há muitos anos associado do Automóvel Clube de Portugal, tendo por isso legitimidade para colocar as seguintes questões:
a) onde é que os estatutos da instituição conferem ao presidente competência para fazer queixas penais contra ex-governantes por alegada má gestão financeira, por factos que aliás não têm a mínima relevância penal?
b) a que propósito é que a instituição é instrumentalizada politicamente para servir as posições político-partidárias do seu presidente?
O abuso de poder no exercício de funções associativas ao serviço de sectários interesses pessoais deveria ser, esse sim, devidamente sancionado!

Adenda
A reacção de A. J. Seguro perante esta aleivosia de Carlos Barbosa deveria ter sido menos complacente. O PS não pode continuar a assistir sem reagir a estas tentativas de julgamento populista do anterior Governo socialista.

LIPP

Bom pontapé de saída o do "Laboratório de Ideias e Propostas para Poertugal" (LIPP), o novo think tank oficial do PS, com uma participada e viva sessão pública em Lisboa, para pré-apresentação de um estudo em preparação sobre a crise europeia e os cenários do futuro da União Europeia, sob a égide da Fundação Friedrich Ebert.

Consenso unilateral

O Diário de Notícias publica na primeira pagina uma foto com Durão Barroso, Cavaco Silva e Passos Coelho, uma verdadeira cimeira "laranja", legendando a imagem com o seguinte: «Durão, Cavaco e Passos com discurso de consenso nacional».
Compreende-se  a mensagem, que tem por destinatário o PS. Importa porém observar o seguinte, pelo menos em relação ao chefe do Governo:
a) não era esse o seu discurso quando estava na oposição, pelo contrário, entre a sua tomada de posse como líder do PSD em 2010 e o momento em que escolheu derrubar o Governo PS, em 2011, com graves prejuízos para o País, incluindo o recurso à ajuda externa;
b)  o consenso político entre o Governo e o PS supõe um esforço de convergência das duas partes, especialmente da parte do primeiro, principal interessado no dito, o que é incompatível com a desconsideração reiterada do PS, como ocorreu recentemente com a apresentação do "Documento de Estratégia Orçamental".
O Governo tem maioria parlamentar e pode governar sozinho, sem concessões. Mas se quer um consenso nacional, especialmente na política europeia, tem de fazer algo por ele. Se prefere alienar o PS, como parece, deve assumir as responsabilidades. Consenso nacional não é propriamente um diktat unilateral.

quinta-feira, 3 de maio de 2012

Entrevista (3)

Recusando-se como sempre a condenar o programa de austeridade e os seus objectivos, o que seria demagógico e irresponsável, A. J. Seguro voltou porém a demarcar-se da «paixão pela austeridade» e da dose e do ritmo impostos pelo Governo.
No entanto, a principal diferença entre a política de austeridade em curso e uma política socialista de austeridade estaria seguramente na diferente respartição social dos sacrifícios. Para ser politicamente legítima, a austeridade não pode ser socialmente selectiva, muito menos socialmente iníqua.

Entrevista (2)

Sobre as relações com o PCP e o BE,  A. J. Seguro declarou que há «divergências importantes e que limitam um diálogo frutífero», dando como exemplo as diferenças em relação à Europa e nas questões de segurança a defesa. Poderia ter referido igualmente a diferença quanto à disciplina orçamental, bem como obviamente quanto ao modelo de economia, de sociedade e de Estado.
Nenhuma diferença impede convergências pontuais à esquerda. Qualquer delas é bastante para excluir qualquer perspectiva de aliança eleitoral ou de governo. Há um fosso intransponível entre a esquerda de governo e a esquerda de protesto.

Entrevista

É bem conseguida a entrevista de A. J.  Seguro à Visão de hoje. Quatro pontos fortes:
-- o tom sereno, contido, emocionalmente despojado;
-- a teoria de uma «oposição responsável, construtiva e séria»;
-- o sentido do seu "tempo político", tendo como horizonte 2015;
-- a compreensão da incontornável dimensão europeia das políticas nacionais e da necessidade de uma posição comum socialista a nível europeu, pela qual tem trabalhado.
Seguro parece ter encontrado o "registo" político adequado ao seu temperamento e às suas convicções.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

Fernando Lopes 1935-2012

Descrição e qualidade
Uma imagem da Abelha na Chuva, 1972, o primeiro filme que eu vi dele.

Justiça e endividamento

O juiz de Portalegre já ganhou a partida. Para além da sentença e do caso particular que decidiu, trouxe para agenda ums alteração importante no crédito à habitação, no sentido de uma repartição do risco mais justa entre credor (a banca) e devedores (cidadãos em estado de insolvência e ousem rendimento que lhes permita liquidar as prestações).

Falsa narrativa

A narrativa política deste Governo assenta em três mistificações factuais:
    -- primeiro, a ideia de que a crise orçamental por que passamos se deve ao desvario do PS na gestão das contas públicas, escondendo que, tal como noutros países, ela foi desencadeada e fomentada pela crise económica iniciada em 2008, que reduziu consideravelmente a receita pública e fez aumentar a despesa (subsídio de desemprego e gastos sociais, apoio às empresas e ao emprego, etc);
-- segundo, a ideia de que a programa de austeridade em curso não passa de fiel aplicação do acordo com a troika negociado e assinado há um ano pelo governo do PS, quando a verdade é que o Governo decidiu deliberadamente ir muito além desse programa, intensificando e apressando o programa de austeridade, de modo a encurtar o ciclo da consolidação orçamental, por óbvias razões de estratégia eleitoral;
  -- terceiro, a ideia de que se algumas coisas estão a correr bem, ou até melhor do que o esperado, como o aumento das exportações e a redução do desequilíbrio das contas externas, isso se deve somente às medidas tomadas por este Governo, como se fosse possível obter resultados significativos nessa área em menos de um ano e como se muito se não devesse às políticas anteriores de redução da importação de energia (aposta nas energias renováveis) e de fomento da competitividade externa do país (política de educação, de formação profissional, de diminuição dos custos administrativos das empresas, de flexibilização do mercado de trabalho, etc.).
Em vez de diabolizar "a outrance" a herança socialista, o Governo deveria reconhecer o quanto lhe deve. E o PS também poderia fazer muito mais no combate à falsa narrativa governamental...

[revisto]