segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Contra os candidatos "paraquedistas" !

(Fonte da imagem aqui
1. «Quem é elegível tem o direito de se poder eleger», defende Luís de Sousa no Público de hoje, argumentando que, se se admite que não residentes sejam candidatos nas eleições locais (como defende o Tribunal Constitucional), então os candidatos forasteiros devem também poder ser eleitores nas mesmas autarquias.
Desde há muito que discordo quer do presuposto quer da consequência. Apesar de inicialmente a ter subscrito, já tive ocasião de criticar publicamente a infeliz doutrina do Tribunal Constitucional, que não me parece fazer sentido em termos de democracia representativa e que contradiz o sentido constitucional do poder local.
A autonomia do poder local significa por definição autogoverno das coletividades locais. Por isso, só os membros de cada coletividade local, ou seja, os cidadãos eleitores residentes, devem poder ser candidatos. De outro modo, teremos heterogoverno e não autogoverno. De resto, se as autarquias locais têm poderes normativos e poderes tributários, só os residentes, que vão ser submetidos a essas normas e a esses tributos, têm legitimidade para conferir e receber o mandato representativo.
Por maioria de razão, é absurdo admitir o direito de voto de quem não pertence à coletividade nem vai ser afetado pelos poderes da autarquia local em causa.

2. É evidente que ninguém que não seja eleitor nos Açores e na Madeira pode ser candidato nas respetivas eleições regionais. Não se vê nenhuma razão para que tal possa ser admitido nas eleições locais. Ao contrário da ideia por vezes defendida, as autarquais locais também gozam de autonomia "política" em sentido próprio, visto que lhes compete, sob responsabilidade própria, prosseguir as atribuições que lhes são confiadas pela Constituição e pela lei.
Como é evidente, não pode invocar-se um pretenso paralelismo com as eleições parlamentares, onde há muitos candidatos em círculos diferentes daqueles em que são eleitores. Só que aí os circulos eleitorais são simples segmentações administrativas do corpo eleitoral nacional, que é uno. Os deputados, onde quer que sejam eleitos, representam todo o país e não os círculos por onde são eleitos. Em todo o caso, nunca ninguém foi ao ponto de defender que os candidatos paraquedistas podem também ser eleitores no círculos por onde se candidatam.

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

Por outras palavras

«A influência da diplomacia na política é hoje um facto incontroverso [em Portugal]. (...). As razões deverão procurar-se nos meandros de uma congregação de 900 elementos que atuam em sintonia e habilmente, embora às vezes ao jeito do Sir Humphrey de “Yes Minister”. Veja-se que faria muito mais sentido a Representação Permanente em Bruxelas, REPER, ser assegurada por um político e não apenas por um diplomata, dada precisamente a relevância que assumem as relações com a União Europeia a todos os níveis do nosso quotidiano económico, político e social. A ideia, porém, nunca se concretizará. Da mesma forma que não se concretizou a criação de um ministério dos Assuntos Europeus a par de um dos Negócios Estrangeiros. No entanto, a sua existência esteve prevista no projeto de governo do PS. António Costa acabou por recuar e deixar a ideia no papel, regredindo ainda mais agora, com a saída de Margarida Marques para – enfatize-se – dar lugar a alguém vindo da diplomacia.» (E. Oliveira e Silva, no jornal I).
Concordo.
Defendi as mesmas ideias - nomeadamente a separação ministerial dos assuntos europeus e dos negócios estrangeiros, a chefia política da REPER em Bruxelas - por ocasião da constituição do atual Governo, num artigo referido aqui no Causa Nossa, mas que infelizmente já não se encontra online. E concordo com a ideia de que a recente nomeação de uma diplomata para a SEAE reforça o peso do corpo diplomático, e da sua visão própria, na política europeia do País.
[alterado o título dos post]

domingo, 30 de julho de 2017

Este país não tem emenda (11): Contra o "direito" a estacionamento gratuito

«"Está caótico [o Largo da Graça em Lisboa]. Ficou assim com estas obras. Deviam ter melhorado o Largo, mas tinham que arranjar uma alternativa para os [automóveis dos] residentes que não fosse os parques a pagar
1. Esta declaração de um morador, inserta numa peça jornalística sobre a política de estacionamento pago do município de Lisboa, traduz bem a falsa ideia de que as pessoas têm direito a estacionamento gratuito para os seus carros. Mas, como venho dizendo há decadas, tal direito não está garantido em lado nenhum, nem pode estar. Ninguém tem o direito de ocupar gratuitamente o espaço público, sobretudo o espaço público urbano. A ocupação privativa duradoura do espaço público deve ser onerosa.
Quem tem automóvel tem de assumir que não vai repassar para a coletividade os custos do estacionamento. Ou tem garagem própria ou tem de pagar uma taxa municipal pela ocupação do espaço público urbano destinado a esse fim.

2. Infelizmente em Portugal deixou criar-se a ideia de que existe um "direito universal, geral e gratuito" ao estacionamento e para isso estreitaram-se passeios e transformaram-se praças e jardins em locais de estacionamento. E quando não há espaço disponivel, então vale tudo (como mostra a imagem): ocupar placas, passeios e paragens de transportes urbanos, estacionar em segunda linha, invadir logradouros desocupados, etc.
O automóvel tomou conta das cidades, perante a complacência das autoridades municipais e a impunidade das infrações. Agora que alguns muncípios estão a levar a sério a recuperação do espaço público da invasão automóvel para fruição pública, começam os protestos de quem está mal-habituado. Mas não pode haver volta atrás.

3. Pior ainda é o imaginário direito dos funcionários a estacionamento gratuito nos respetivos serviços públicos. Também aqui não existe tal direito nem pode existir. O Estado não tem nenhuma obrigação de facultar estacionamento gratuito aos seus funcionários nos locais de trabalho, em escolas, universidades, hospitais, etc., o que gera a caótica ocupação selvagem dos seus espaços (como sucede cada vez mais, por exemplo, nos Hospitais da Universidade de Coimbra) e congestiona os arruamentos envolventes, sobretudo nas horas de entrada e de saída, dificultando o trânsito.
Ao invés, o que os serviços abertos ao público deveriam garantir, isso sim, era a disponibilidade de lugares de estacionamento (pago) temporário para os utentes desses serviços, evitanto a escandalosa situação, por exemplo, dos referidos HUC, onde os utentes vindos de fora, para consulta externa e para análises clínicas, têm de procurar penosamente um estacionamento no exterior, muitas vezes a centenas de metros.
Urge pôr fim a intoleráveis situações destas. Os serviços públicos existem para servir o público, não para dar regalias aos seus funcionários.


sábado, 29 de julho de 2017

Barbárie é barbárie

1. Mais um testemunho visual da cruel barbaridade dos chamados "touros de fogo", que se pratica em alguns lugares da Península Ibérica (este em Espanha), e que consiste em atar mechas aos cornos do touro e deitar-lhe fogo e libertá-lo na arena, para gáudio de expectadores ululantes.
Alguns chamam-lhe "tradições populares" e há quem proponha mesmo protegê-las como "património cultural".
Mas o que a cruel prática configura para todos os efeitos é um crime de horríveis maus tratos a animais para divertimento público, que como tal devem ser punidos os seus autores e cúmplices.

2. A propósito, há algum tempo foi noticiado um episódio desses em Portugal (Benavente), como, aliás recorda a notícia supra. A pergunta que ocorre é a de saber que seguimento teve o caso e se houve investigação criminal, ou se o caso já morreu na "brandura dos nossos costumes" quando se trata de transigir com toda a violência  que rodeia as touradas, mesmo na sua forma mais cruel, de que tivemos exemplo no lamentável reconnhecimento dos touros de morte em Barrancos (sempre em nome das tradições populares, claro!), a que ficou lamentavelmente associado o Governo socialista de Guterres e o Presidente Jorge Sampaio.
Um imperdoável retrocesso histórico!

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Há alguma lógica nisso?

1. É evidente que a subida do IVA de um bem ou serviço essencial, cuja procura em geral é pouco elástica, prejudica mais os consumidores mais pobres do que os abastados, pelo facto de aqueles gastarem uma percentagem maior do seu rendimento na aquisição desses bens e serviços. Assim sucedeu com a brutal subida do IVA da eletricidade de 6% para 23% em 2011 (quase triplicando)!
O Governo invoca o pesado custo orçamental de uma eventual descida dessas taxas para a rejeitar. Mas, entretanto, decidiu à cabeça reduzir o IVA nos restaurantes (de 23% para 12%), que é certamente um consumo bem menos essencial (e que os pobres em geral não fazem). E, pior ainda, manteve o IVA de 6% nos hotéis!

2. Ora, a Constituição manda onerar tributariamente os consumos de luxo. Em Portugal, porém, há consumos de luxo que pagam taxas de IVA mínimas ou médias (taxa de 6% nos hotéis de luxo e 12% em restaurantes de luxo), enquanto a eletricidade e o gás natural, dois consumos essenciais, se mantêm na taxa superior, de 23%.
Há alguma lógica nessa inversão de valores? Um mínimo de equidade tributária manda inverter, ou pelo menos pôr fim, a essa discrepância. Simplesmente, há a enorme diferença entre o poderoso e coeso lóbi da restauração e da hotelaria e o grupo difuso e desorganizado dos consumidores de eletricidade menos abonados  (que não têm sindicato nem grupo parlamentar). A tarifa social minorou este impacto para os mais pobres mas não o corrige para toda a gente.
Ora, se num Governo de direita, pressionado pela disciplina orçamental e sob tutela externa, isso poderia fazer algum sentido, tal não se passa num Governo de esquerda, que deveria ser mais atento à equidade fiscal!

quinta-feira, 27 de julho de 2017

O meu mundo


A plataforma Linkedin indica as instituições a que pertencem os leitores de cada post, a sua categoria profissional e também a sua origem territorial. Considerando um dos meus últimos posts, que neste momento já leva alguns milhares de visualizações de todo o mundo, sendo por isso representativo, as principais cidades de origem estão indicados no quadro acima, disponibilizado pela própria Linkedin. A lista é naturalmente encabeçada por Lisboa e pelo Porto, mas logo seguidas de São Paulo, antes de Coimbra!
Cinco das nove cidades são estrangeiras, três europeias (Londres, Bruxelas, Genebra) e duas brasileiras (Rio, além de São Paulo). E de facto é este o mundo em que me tenho movido (só falta Veneza!). Não me posso queixar de não ser lido por esse mundo fora!

Corporativismo (4) - De novo a Ordem dos Médicos

Rechaçando as habituais reivindicações malthusianas da Ordem dos Médicos para a redução das vagas nos cursos de Medicina, só para limitar artificialmente a oferta de médicos, o ministro Manuel Heitor acrescentou que o Estado não tem de garantir emprego a todos os médicos, como foi a regra durante décadas, um privilégio que nenhuma outra profissão tem. «Não há obrigação nenhuma de que todos os graduados em Medicina tenham um emprego [público] garantido» - disse ele. Tem toda a razão! Há décadas que ando a defender o mesmo!
Também não entendo porque é que medicina é a única formação disponível somente nas universidades públicas, não havendo nenhum curso em universidades privadas. Ora, o Estado não é obrigado a proporcionar vagas a toda a gente nas universidades públicas, até pelos custos financeiros envolvidos, mas devia permitir que quem não tenha vaga possa ter uma alternativa privada em Portugal, em vez de ter de ir pagar um curso lá fora, com fazem os mais abonados, que depois vêm concorrer às vagas de estágio e de especialidade no SNS em Portugal.

Adenda
Argumentam os restricionistas que, depois, com excesso de oferta, não há vagas para a formação da especialidade para todos. Mas onde é que está escrito que todos os médicos têm de ser especialistas? E por que carga de água é que a formação especialista tem de ser assegurada pelo SNS a toda gente? Porque é que o setor privado não forma os seus próprios médicos especialistas em centros devidamente credenciados? Francamente, é tempo de separar águas definitivamente e de o Estado deixar de ser parasitado pelo setor privado no âmbito da saúde, à custa dos contribuintes. Julgo mesmo que os médicos formados pelo SNS deveriam ficar vinculados um certo número de anos ao setor público (salvo havendo redundância) para "retribuir" os custos da sua formação, sendo obrigados a candidatar-se às vagas abertas em qualquer ponto do país. É inadmissível que fiquem desertos concursos no SNS só porque os médicos recém-formados preferem logo locais mais confortáveis e mais rendosos.

segunda-feira, 24 de julho de 2017

Vale tudo?!

O líder parlamentar do PSD veio exigir ao Governo a divulgação, em 24 horas, da lista oficial das pessoas falecidas na tragédia de Figueiró.
Sabendo-se que esta exigência não pode ser satisfeita, por não depender do Governo a publicação dos nomes, que estão em segredo de justiça, por causa do inquérito criminal aberto pelo Ministério Publico, o precipitado ultimato só pode servir para que o PSD e tutti quanti explorem e ampliem, de forma populista, as irresponsáveis suspeitas postas a correr, sem nenhum fundamento credível até agora, de que o número de mortos é muito superior ao número oficialmente anunciado (64), cuja lista, aliás, já foi publicada pelo Expresso. Alguém pode acreditar que possa haver mais vítimas desconhecidas, para além daquelas que foram reconhecidas pelos serviços médico-legais e devidamente sepultadas, sem que outros corpos tenham aparecido e sem que familiares, amigos ou conhecidos tenham reportado a falta?
O PSD está a fazer aquilo que outros partidos, que não preciso de mencionar, fariam se fosse o PSD a estar no Governo. Mas a um partido de governo exige-se que se comporte, quando está na oposição, como faria se estivesse no Governo. E se tal fosse o caso, o PSD não exploraria despudoradamente esta contabilidade mortuária, cujo apuramento nem sequer pode ser manipulado ou sonegado pelo Governo. Na oposição, pelo menos numa oposição responsável, não vale tudo, mesmo em tempos pré-eleitorais! Num partido responsável, o oportunismo político mata.

Adenda
A pronta publicação da lista oficial de vítimas pelo Ministério Público, cancelando o segredo de justiça, confirma inteiramente a inventona da história de "mais mortes", a que o PSD oportunisticamente  se agarrou para fazer uma cena política, revelando a miséria moral da polítíca no seu pior.

As viúvas de Varoufakis

Nesta entrevista, o primeiro ministro grego, Tsipras, confirma que nunca quis sair do euro e lamenta os erros do seu primeiro Governo, com Varoufakis nas Finanças, que colocaram a Grécia à beira do desastre. Entre os seus "grandes erros" Tsipras menciona a "escolha de pessoas para cargos-chave", numa óbvia referência ao seu ex-colaborador (na imagem, ainda em lua de mel).
Hoje a Grécia, mercê de novo resgate, recuperou o equilíbrio orçamental; a economia voltou a crescer (ajudada pela retoma da economia da União) e anuncia-se a saída do procedimento do défice excessivo e o regresso aos mercados da dívida. Tudo se encaminha para que a Grécia, com mais tempo e mais dificuldades, por culpa própria, se encaminha para um novo caso de sucesso nos resgate de países sobre-endividados.
Mas a Grécia pagou um preço adicional em austeridade orçamental pela irresponsabilidade do antigo ministro das Finanças. É o preço do aventureirismo daqueles que escarnecem a consolidação orçamental e as regras em que baseia o euro, que porém aceitaram.
Considerando o exército de devotos "antiausteritários" de Varoufakis neste país, num esquerdismo primário de teor pararreligioso, seria interessante saber onde param as suas viúvas, e se chegaram à mesma conclusão de Tsipras. Por mim, recordo com agrado que não perdi oportunidade para denunciar a vertigem para o abismo que ele encabeçava alegremente.

Adenda
Também verifico que os antigos devotos de Chávez - que, aliás, coincidem em grande parte com os de Varoufakis - também começam a desmobilizar, em face do desastre para que se encaminha a Venezuela. Parece que o populismo esquerdista acumula derrotas. Ainda bem! Só é pena os estragos que fazem antes de saírem de cena

sábado, 22 de julho de 2017

Geringonça (2): "Fogo amigo"

Tornado improvável e surpreendente defensor do direito de propriedade fundiária relativo aos terrenos florestais sem dono conhecido, o PCP "chumbou" a proposta de lei sobre o "banco de terras", uma das três peças da importante reforma florestal proposta pelo Governo à AR, que por isso não foi inteiramente aprovada, diminuindo significativamente o seu alcance.
Dado o notório investimento político que o Governo colocou nesta reforma, aliás com o apoio expresso do Presidente da República depois da tragédia de Figueiró dos Vinhos, trata-se de um importante revés político, por oposição de um dos parceiros da Geringonça. O habitual consenso na "reversão da austeridade" revela-se mais difícil de alcançar quando se trata de pôr no terreno outras reformas políticas do Governo. Como era de esperar, o "governo em negociação permanente" tem os seus percalços.
Resta saber se esta clivagem na maioria parlamentar se deveu à especial sensibilidade política do caso para os comunistas (o que em si mesmo não deixa de ser uma surpresa), ou se se trata de "flexibilizar os músculos" e lançar um "aviso à navegação" sobre a batalha do orçamento, que se aproxima. Mas aí o "fogo amigo" pode ser politicamente bem mais perigoso...

quinta-feira, 20 de julho de 2017

Ai, o défice! (2)

1. Estas declarações do comissário Moscovici parecem indicar que a Comissão Europeia vai fechar os olhos ao mais que provável incumprimento por parte de Portugal dos limites relativos ao "défice orçamental estrutural", cujo cálculo desconta os efeitos orçamentais do ciclo económico.
Segundo as regras, Portugal deve reduzir anualmente o défice estrutural em 0,6 pp, até atingir um saldo positivo, o que está muito longe, visto ter permanecido acima dos 2% em 2016, depois de ter caído mais de 6 pp entre 2010 e 2014. Nos dois últimos anos não houve nenhuma redução do défice estrutural.

2. Todavia, o défice estrutural é um critério bem mais adequado de medir o estado das contas públicas e a consolidação orçamental, visto que obriga a mais disciplina orçamental quando ela é mais fácil, ou seja, quando a economia estiver a crescer (e, portanto, gera naturalmente mais receita e exige menos despesa pública) do que quando está estagnada ou em recessão (baixando a receita fiscal e aumentando a despesa pública).
Ora, com economia a crescer atualmente bem acima do esperado, aquela redução do défice estrutural exigiria um défice nominal bem abaixo dos 1,5% previstos no orçamento para este ano, se não mesmo um saldo orçamental positivo. Corremos o risco de baixar (insuficientemente) o défice nominal sem melhorar, ou mesmo a aumentar, o défice estrutural!

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Portucaliptal (22) - Mais vale tarde do que nunca!

Parece que é desta que começa a reversão da eucaliptização selvagem do país, por que me bato publicamente há mais de 20 anos (como mostra esta série de posts ao longo dos anos). É um dia digno de ser celebrado e que já não tinha grande esperança de ver chegar. Chega com muito atraso e com a paisagem florestal portuguesa irremediavelmente descaracterizada (na imagem um eucaliptal ardido nos últimos dias), mas mais vale tarde do que nunca.
É de lamentar, porém,  que o PS só tenha considerado enfrentar o poderoso lóbi da fileira celulósica sob pressão dos partidos à sua esquerda e que, entretanto, a demora de um ano e meio na prometida revogação da lei de liberalização do eucalipto do anterior Governo tenha permitido aos interessados plantar à pressa mais uns milhões de pés. Só espero agora que o Governo não resolva compensar a celulose pela eventual redução dos seus pingues lucros com mais uma escandalosa dose de generosas subvenções públicas, como tem sido norma. Esta prática também tem de ser revertida...

terça-feira, 18 de julho de 2017

"Est modus in rebus"

As declarações de Gentil Martins sobre a homossexualidade são uma tonteria à luz dos conhecimentos científicos atuais e devem ser rejeitadas. Mas tranformar essas declarações num caso disciplinar é estulto. A liberdade individual inclui o direito à tonteria.
As declarações de um candidato autárquico do PSD sobre os ciganos são politicamente inadmissíveis e devem ser condenadas. Mas fazer dessas declarações um caso criminal é estúpido. A liberdade política inclui o direito ao desatino.
O zelo condenatório dos virtuosos não é menos censurável nem menos populista do que o desmando verbal dos prevaricadores.

Observatório do comércio externo

No Índice de Abertura do Mercado da International Chamber of Commerce (ICC) - que mede o grau de abertura económica externa dos países, tendo em conta o peso efetivo do comércio externo, a política comercial, a abertura ao investimento direto estrangeiro e as infraestruturas comerciais -, nada menos de quinze entre os primeiros vinte e cinco países mais abertos pertencem à União Europeia.
Apesar da melhoria nos últimos anos, Portugal ocupa um lugar intermédio na tabela, 36º entre os 75 países listados. Sendo certo que Portugal compartilha da política comercial externa da União, que é comum a todos os Estados-membros, o lugar modesto do país tem a ver com a reduzida participação efetiva, comparativamente, nos fluxos comerciais e no IDE.
Francamente negativa é a posição do Brasil (69º posição, quase no fim da tabela), o que não surpreende, tendo em conta a elevada tarifa aduaneira média e as demais barreiras ao comércio e ao investimento estrangeiro. Um ano depois da posse do Presidente Temer, o anúncio de uma maior abertura ao comércio internacional da economia brasileira não se concretizou.

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Geringonça (1): Coabitação



1. Como era de esperar, tratando-se de uma concentração de empresas, ainda por cima envolvendo capital estrangeiro, o PCP é contra a compra da Media Capital pela Altice (dona da ex-PT) e pede ao Governo que impeça a operação.
Sucede que a concentração só pode ser impedida pela ERC (se se verificasse que ela põe em causa a liberdade ou o pluralismo de informação) ou da AdC (se ela pode pusesse em causa a concorrência no setor dos média ou das telecomunicações, por criar uma posição de domínio do mercado). Ora, ambas são autoridades independentes, pelo que o Governo não pode dirigir ordens nem recomendações a nenhuma delas, nem se pode sobrepor às suas decisões de autorização de concentrações .

2. Uma proibição arbitrária da referida concentração pelo Governo não seria somente incompatível com o direito da União Europeia e as liberdades fundamentais do "mercado interno". Seria também contrária à lógica de uma economia de mercado e às exigências do Estado de direito constitucional.
Já sabíamos que no fosso que divide o PS e o PCP há desde sempre a economia de mercado. Ficamos agora a saber que também há o Estado de direito. E, no entanto, o PCP faz parte da base parlamentar da "Geringonça", que assim se revela como um espaço político de coabitação improvável de partidos político-ideologicamente inconciliáveis!

Trabalhos de Macron

Este quadro, retirado daqui, mostra o ranking de alguns países europeus quanto à despesa pública. Não por acaso, os países mais gastadores, com a França destacada, muito acima da média da zona euro, são também os menos dinâmicos economicamente, por efeito da elevada carga fiscal, que penaliza a economia. Sem surpresa, por isso, um dos compromissos do Presidente Macron é reduzir a carga fiscal sobre as empresas, comparativamente muito pesada.
A braços também com um défice orçamental excessivo - um dos poucos países da União ainda nessa embaraçosa situação! -, é fácil antecipar que um dos principais desafios do Governo Macron vai ser mesmo a redução da despesa pública. Como é que isso pode ser conseguido sem afetar as generosas prestações do Estado social francês e sem suscitar, consequentemente, uma grande oposição sindical e política, eis o que resta ver.

domingo, 16 de julho de 2017

Pobre língua! (11)

Neste fragmento de uma notícia do Público de ontem há dois óbvios lapsos de escrita, um no subtítulo ("forma do governo assumir" em vez de "forma de o Governo assumir") e outro no primeiro parágrafo ("àqueles" em vez de "aqueles"). É demais e é indesculpável num jornal de referência!
Já várias vezes afirmei que uma das profissões desaparecidas que faz mais falta é a de revisor de imprensa. Mas, sendo isso irreversível, os jornalistas e os editores têm de assumir a responsabilidade de velar pela correção linguística dos textos que publicam.
Para mais, sendo o Público o líder da oposição militante à ortografia oficial vigente, era bom que dedicasse uma parcela dessa militância a garantir o respeito pelas normas da gramática, que, essa, não mudou.

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Ai, o défice!

Os números do comércio externo do país nos últimos meses revelam uma degradação do défice da balança comercial de mercadorias. De facto, embora as exportações cresçam a bom ritmo, puxadas pela retoma económica europeia e mundial em geral, as importações crescem ainda mais, por efeito do disparo do consumo interno, mercê do aumento do poder de compra e do recurso ao crédito (cortesia dos juros baixos e da agressividade dos bancos na concessão de crédito). Desse modo, o défice até maio sofreu um significativo aumento homólogo, podendo vir a aproximar-se dos 20 000 milhões no final do ano!
Embora o tradicional saldo positivo da balança externa de serviços, agora baseado sobretudo na invasão turística, ainda seja superior ao défice das mercadorias, não deixa de ser preocupante o risco de voltarmos a cair no tradicional défice comercial externo, de que saímos há poucos anos, por efeito da contração da procura e redução do ritmo de aumento das importações durante a recessão (2011-2014) e com a ajuda da desvalorização do euro e do embaratecimento do petróleo. O desafio da competitividade externa da economia portuguesa continua por assegurar de forma sustentada.

O estertor

1. Neste meu post de 2010, quando estava em curso o "namoro" económico e político entre Lisboa e Caracas, tive a oportunidade de me manifestar contra o «estabelecimento de uma relação política privilegiada com o actual regime venezuelano», acrescentando que, «como todos os populismos, mesmo quando "socialistas", o "bolivarismo" de Chávez não vai acabar bem, incluindo em termos económicos».
Sabemos o que ocorreu desde então, quanto ao descalabro económico, incluindo a desesperada falta de alimentos e medicamentos, ao caos social instalado, à corrupção generalizada e à crescente repressão política e social do regime, depois de definitivamente perdido o encanto popular inicial e de esgotados os efeitos das políticas sociais para as camadas mais destituídas da população venezuelana. A última e desesperada tentativa de Maduro de se manter no poder, convocando uma fictícia "assembleia constituinte", só para se desfazer do parlamento em funções, que lhe é hostil, constitui um óbvio estertor terminal do regime.

2. Com o inexorável desastre à vista, aproxima-se o fim do pretenso "socialismo do século XXI" que Chávez proclamou ainda na fase ascendente dos regimes da esquerda populista latino-americana, que o chavismo encabeçou. Durou bem menos e foi ainda menos bem-sucedido do que o socialismo do séc. XX, caído desamparadamanete junto com o muro de Berlim em 1989. Sem o total controlo da economia e do Estado que caracterizou o comunismo soviético (e cubano), o "socialismo do século XXI" do hemisfério sul rapidamente revelou a sua congénita incapacidade para gerir a economia e para manter o Estado de pé.
O que surpreende é que a "revolução bolivariana" tenha conseguido atrair a admiração e o apoio da nova e de alguma velha esquerda europeia, como o Syriza na Grécia e o Podemos na Espanha, incluindo entre nós o PCP e o BE. Como é evidente, o iminente colapso do "socialismo" venezuelano vai ser atribuído, como é habitual, ao "cerco imperialista", à "ingerência estrangeira"  e à "sabotagem interna". É escusado, nunca vão mudar...

Adenda
Um leitor objeta, indignado, que o Bloco sempre se demarcou do regime "bolivariano". Mas até há poucos anos há vários registos de apoio e elogio político explícito, como este aqui, de 2013, onde  o Partido da Esquerda Europeia, que integra o Bloco, lembrava que, «enquanto que na Europa a democracia está a falhar [sic], na Venezuela a democracia participativa tornou-se num sinal de identidade».

Adenda 2
Como sucede com todas as revoluções falhadas, que acabam no descalabro económico e na repressão social, também na Venezuela há uma "burguesia bolivariana" bem sucedida nos negócios à sombra do Estado.

quinta-feira, 13 de julho de 2017

Greve de juízes? (VIII)

Acho bem este desafio a que o Governo se pronuncie sobre a  anunciada greve de juízes. Eu próprio já o fiz aqui várias vezes.
Todavia, as declarações do vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura não distinguem apropriadamente os vários planos em que se coloca juridicamente a questão da greve dos juízes. São as seguintes as questões que importa separar:

   a) A Constituição reconhece o direito à greve de juízes?
A resposta é obviamente negativa, pois o direito à greve na CRP só está diretamente reconhecido aos trabalhadores propriamente ditos, incluindo os funcionários públicos, não aos titulares de cargos públicos, como são os juízes. A distinção entre uns e outros é clara na Constituição.

   b) A Constituição admite que a lei estenda o direito às greve aos juízes?
A resposta não é unânime. A Constituição admite a extensão do âmbito dos direitos fundamentais por via de lei, restando saber porém se o direito à greve faz sentido fora de uma relação de trabalho subordinado e se é compatível com a titularidade de órgãos de soberania e com o princípio da continuidade da soberania. Por mim, tendo a responder que não.

   c) Em qualquer caso, a lei reconhece aos juízes o direito à greve?
A resposta é obviamente negativa. Nenhuma lei existe nesse sentido. Tal como a Constituição, a  lei da greve só cobre os trabalhadores subordinados, sem abranger outras funções públicas ou privadas.

   d) O facto de não haver proibição legal explícita não indica que a greve não é ilícita?
Não, porque sem reconhecimento legal da greve o incumprimento das obrigações funcionais do cargo implica diretamente responsabilidade disciplinar. Só o direito à greve constitui imunidade.

  e) O facto de no passado ter havido duas greves de juízes que não deram lugar a sanções não quer dizer que a greve de juízes é aceita?
Não, porque a impunidade não equivale a licitude. Não é por todos os dias haver milhares de baixas por falsa doença impunes que elas deixam de ser ilícitas.

quarta-feira, 12 de julho de 2017

Papéis trocados

1. Não havendo a mínima indicação de que a tragédia de Pedrógão e a comédia de Tancos tenham sido devidas a insuficiência orçamental, presente ou passada, dos serviços públicos envolvidos, é tão infundada a acusação do BE e do PCP de que foram causadas pela assumida austeridade orçamental do anterior Governo como a acusação do PSD e do CDS de que resultaram da escondida austeridade do atual Governo.
A duplicidade dos primeiros, ao tentarem culpar o anterior Governo para pouparem o atual (que apoiam), é igual à dos segundos, ao tentarem responsabilizar o atual Governo para desculparem o seu. Estão bem uns para os outros!

2. Só que, se do BE e do PCP não há a esperar nenhuma coerência política depois de terem deixado apressadamente de ser partidos de protesto para passarem a ser partidos de poder, já do PSD há que esperar mais, não podendo mimetizar o comportamento político daqueles. Depois de ter sido afastado do poder em 2015, o PSD continua sem definir claramente o seu papel político: se deve assumir-se responsavelmente como um partido de governo na oposição (como quando condena a greve de juízes) ou se prefere comportar-se levianamente como um partido de protesto (como neste episódio das "cativações" orçamentais), ocupando o espaço deixado vazio pela entrada da extrema-esquerda parlamentar na esfera do poder.
Costumo dizer que tanto o PS como o PSD são partidos de governo mesmo quanto estão, alternadamente, na oposição, devendo adotar nesta condição as mesmas posições políticas que defenderiam se estivessem no governo. Decididamente, o PSD precisa de definir sem equívocos o estatuto que quer assumir. Enquanto se sentir tentado a comportar-se como partido de protesto, escusa de pensar em voltar a ser governo.

terça-feira, 11 de julho de 2017

Não, não é a mesma coisa


1. Não tem razão João Rodrigues quando persiste em considerar o "ordoliberalismo" como uma simples "versão alemã do neoliberalismo", compartilhando por isso os seus traços essenciais.
Para quem não se fique, porém, pela rama dos slogans, trata-se de uma equiparação teoricamente infundada e politicamente enganadora, quer quanto às suas origens históricas, quer quanto ao seu conteúdo doutrinário, nomeadamente quanto ao papel do Estado na economia.

2.três diferenças essenciais entre o ordoliberalismo e o radicalismo neoliberal, como se pode ver em qualquer enciclopédia.
Primeiro, enquanto o ordoliberalismo nasce na Alemanha ainda nos anos 30 do século passado (Escola de Freiburg) em oposição ao intervencionismo do Estado na economia então vigente (levado ao paroxismo durante o nazismo) e se impõe na Alemanha logo depois da II Guerra Mundial, tendo depois influenciado decisivamente a "constituição económica" da integração europeia, o neoliberalismo propriamente dito nasce depois da II GG (Escola de Chicago) em oposição ao "Estado regulador" herdado de Roosevelt e só vem a vingar politicamente a partir dos anos 80, com Reagan, nos Estados Unidos, e Thatcher, no Reino Unido.
Segundo, enquanto o ordoliberalismo pretende criar um "novo liberalismo", distinto do liberalismo clássico, despojado da crença na ordem natural do mercado e apostando numa "ordem económica" assente na defesa do mercado pelo Estado (através de uma defesa ativa da concorrência contra os cartéis e abusos de poder de mercado), o neoliberalismo retoma a ideia do "autorregulação do mercado" como ordem natural, contra a ingerência do Estado, e desvaloriza o papel das leis antitrust, de que aliás os Estados Unidos tinham sido pioneiros desde o final do séc. XIX. Não é por acaso que as punições históricas da Comissão Europeia contra a Microsoft e agora contra a Google não tiveram equivalente nos Estados Unidos.
Por último, enquanto o ordoliberalismo deu origem à noção de "economia social de mercado" (incluindo a cogestão empresarial) e coabitou pacificamente com a criação do Estado social na Alemanha, o neoliberalismo de extração norte-americana nunca escondeu a sua hostilidade ao Estado social, aos serviços públicos e à intervenção dos trabalhadores nas empresas. Por isso, enquanto a social-democracia europeia acabou por adotar expressamente a referida noção de economia social de mercado (que hoje figura no Tratado de UE), manteve sempre uma explícita rejeição do neoliberalismo doutrinário.

3. Sim, o ordoliberalismo constitui um tipo de liberalismo económico e de economia de mercado, mas não é uma simples variante do neoliberalismo em sentido próprio. Constituem estirpes assaz diferentes e não podem ser metidas no mesmo saco.
Não faz sentido, portanto, confundir o ultraliberalismo de Chicago com o liberalismo "ordenado" de Freiburg.

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Greve de juízes ? (VII)

Pela segunda vez, o sindicato dos juízes anuncia uma greve, com data e tudo. Pela segunda vez, o Governo, que tem estado a negociar com o sindicato o estatuto dos juízes (como se ele fosse minimamente representativo), e o Presidente da República, a quem compete assegurar o regular funcionamento das instituições, mantêm um comprometedor silêncio sobre o assunto, como se não rejeitassem a rotunda ilegitimidade de uma greve de juízes, ainda por cima deliberadamente marcada para prejudicar o apuramento das eleições locais em outubro próximo.
Aparentemente, nem o Governo nem o Presidente desejam perturbar o clima de "afeto presidencial" e de "governo amistoso" em que temos vivido. O problema é quando se torna necessária a firmeza do Estado para travar o abuso de poder das corporações dentro do Estado.
[Revisto, incluindo mudança do título]

Adenda
Registe-se e aplauda-se a posição frontal do líder da oposição. Há momentos em que se justifica assumir as responsabilidades de estadista. Nem tudo o que é contra o Governo pode merecer apoio da oposição.

Maré de azar

1. Fadado por todos os deuses da fortuna política até agora, o Governo parece ter entrado numa maré de azar.
Como se não bastasse a tragédia do fogo assassino de Pedrógão e a "bronca" do furto de armas de Tancos, vem agora a demissão forçada de três secretários de Estado, constituídos arguidos no caso das viagens ao Euro de futebol no ano passado à conta da Galp (que era patrocinadora da seleção nacional), entre os quais o competentíssimo e influente SE dos Assuntos Fiscais, Rocha Andrade, que se revelou uma peça-chave na gestão financeira do Governo.

2. É uma perda realmente importante. Custa ver um jovem político deste gabarito, de uma probidade política à prova de bala, ser ingloriamente sacrificado por um momento de incúria inconsequente, obviamente não doloso, pelo qual aliás logo se penitenciou publicamente e de que não tirou nenhum proveito pessoal, assumindo prontamente o pagamento de referida viagem (e pelo qual muito provavelmente nem sequer virá a ser condenado).
Decididamente, hoje, com a opinião pública cada vez mais severa para com os políticos e com um Ministério Público com o freio nos dentes, os governantes não têm direito a distrações na aceitação de benesses privadas, por mais inocentes que pareçam (como era o caso).

domingo, 9 de julho de 2017

Generais a mais

Segundo esta fonte, Portugal é o terceiro país na UE com mais militares em relação à população (depois da Grécia e da Bulgária), com uma média muito superior à dos países da União. Além disso, devemos estar no topo quanto ao número relativo de generais, com os inerentes custos financeiros (remunerações e pensões). Mesmo que os referidos números estejam desatualizados, a relação não deve ter mudado muito.
Por isso, a autodemissão de alguns generais por estes dias, em desacordo com o CEME, deve ser aproveitada para reduzir esse excesso, não devendo dar-se a sua substituição. Com a poupança advinda da redução do número de generais talvez se pudesse equipar melhor a segurança dos paióis militares, poupando às Forças Armadas e as chefias militares à humilhação por que há pouco passaram...

Adenda (11/7)
Quanto ao número de generais do Exército, recebi a seguinte informação de um leitor:
  «Relativamente ao “exagerado” número de generais nas FA’s que o senhor utiliza, retirada do CM, pelo menos no que ao Exército respeita, não é bem assim.
  O Exército tem vagas aprovadas para 33 oficiais e possui presentemente 45 generais, distribuídos da seguinte forma: 33 no Exército, 9 desempenham funções na GNR, o CEMGFA é do Exército atualmente, um oficial desempenha um cargo internacional e um outro desempenha funções como assessor do MDN. Assim, em boa verdade, não se podem considerar os militares da GNR como sendo generais do Exército, pelo que existem apenas 3 supranumerários, e apenas isso.
  Mas considerando, ainda que erradamente, os tais 12 oficiais generais supranumerários no Exército, dos 54 enunciados pelo CM e sendo o Exército o ramo que tem maior número de efetivos seria honesto que as suas fontes justificassem na Força Aérea e na Marinha os restantes 42 que excedem o Dec-Lei em anexo, uma vez que no Exército os valores são exatos. Duvido que o atual, e os anteriores Ministros da Defesa, permitissem um número tão elevado de promoções nestes dois ramos, com exclusão do Exército.
  Sobre aproveitar as demissões para reduzir o número de oficiais no Exército, tal é impossível sem alterar a estrutura orgânica do Exército, pelo que a sua proposta não poderia ser assim realizada de imediato.»

3 000 000 !


O Causa Nossa passou ontem os três milhões de visualizações na contagem oficial do Blogger! Fundado em novembro de 2003, isso dá uma média de quase 20 000 visitas por mês (neste momento, bem acima dos 60 000, como se vê no quadro).
Um feito para um blogue de opinião, quer quanto à longevidade quer quanto à audiência.

sexta-feira, 7 de julho de 2017

Falsas taxas (2) - A ficção da "taxa turística"

1. Depois da Lisboa é a vez do Porto de anunciar o lançamento de uma "taxa turística". Só que, num caso e noutro, nem é "turística" nem é "taxa".
Não é turística porque, em primeiro lugar, sendo aplicada sobre todas as dormidas nos hotéis, não é paga por todos os turistas (os que não pernoitam na cidade) nem somente por turistas (os que estão em negócios ou por motivo pessoal); e, em segundo lugar, porque a tal "taxa" não tem a ver com, nem se destina a financiar, nenhum específico serviço municipal de turismo.
Também não se trata de uma verdadeira taxa porque, como mostrámos em post anterior, a referida obrigação tributária não constitui uma tributo bilateral, destinado a retribuir a prestação de um serviço municipal individualizado aos que pernoitam nos hotéis da cidade. Sendo paga por todos, não há nada que o contribuinte individualmente receba por pagar a suposta "taxa", ou deixe de receber por não a pagar.
Além disso, nem sequer se vislumbra que serviço concreto é que a "taxa" financia, bastando referir que, na proposta anunciada no Porto, o produto da sua cobrança se destina a financiar a aquisição de habitação!

2. A criação de impostos municipais sob falsa qualificação de taxas visa obviamente contornar abusivamente dois obstáculos constitucionais. Primeiro, a reserva de lei (melhor, de ato legislativo) e a reserva de decisão parlamentar para a criação de impostos. Segundo, o respeito pelos princípios constitucionais substantivos dos impostos, nomeadamente o princípio da igualdade, da capacidade tributária e da justiça fiscal.
Ora, além de violar a reserva de lei e de decisão parlamentar, a referida "taxa" lesa manifestamente o princípio da justiça fiscal, ao aplicar o mesma montante (2 euros no caso do Porto), qualquer que seja o valor do serviço de hotelaria, seja 50 euros seja 500, podendo variar portanto entre 4% e 0,4% do valor do serviço!
Também não se vê como é que os municípios podem, sem credencial legislativa, impor aos hotéis uma obrigação pública de cobrança da pseudotaxa turística em seu benefício.

3. Acabando por ser um imposto especial sobre serviços de hotelaria, a alegada "taxa turística" vem acrescer ao IVA respetivo. Sob este ponto de vista, ressalvada a referida iniquidade fiscal, esse imposto adicional não suscitaria nenhuma objeção, uma vez que a hotelaria goza do privilégio de pagar uma taxa ínfima de IVA, de 6%!
Tecnicamente, nada impede que a AR admita a criação de um adicional ao IVA da hotelaria, com receita destinada aos municípios, seja ou não afetada a certos fim. O que não pode é haver um novo imposto municipal (mesmo que travestido de "taxa") sem específica base legal.

Adenda
Se o objetivo da "taxa" é moderar a invasão turística, como declarou o Presidente da CM do Porto, então o melhor mesmo seria subir a taxa de IVA sobre a hotelaria e a restauração para 23%, acabando com o tratamento privilegiado de que gozam.

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Atavismo centralista

Com os votos da protocoligação de esquerda, a Assembleia da República ratificou a transferência da Carris de Lisboa e da STCP do Porto respetivamente para o município da capital e para a Área Metropolitana do Porto, mas proibiu os novos titulares de concessionarem a gestão dessas empresas a entidades privadas, o que obviamente limita as opções de gestão disponíveis.
Como se não bastasse que o Estado, violando flagrantemente os princípios constitucionais da descentralização e da subsidiaridade, tenha mantido nas suas mãos, durante estas quatro décadas, os transportes locais de Lisboa e do Porto, depois da sua estatização em 1975, permite-se agora coartar a liberdade de gestão municipal depois da sua devida remunicipalização. Trata-se de uma restrição injustificável da autonomia municipal ou intermunicipal, que não deve prevalecer, até porque discrimina os municípios de Lisboa e da área metropolitana do Porto em relação aos demais municípios, que decidem livremente o modo de gestão dos seus transportes coletivos.
O Presidente da República, que já tinha vetado politicamente o diploma relativo aos STCP, deve agora pedir ao Tribunal Constitucional que se pronuncie sobre a conformidade dessa restrição com os referidos princípios constitucionais.

quarta-feira, 5 de julho de 2017

Viver acima das possibilidades


O quadro junto, tirado do Expresso da semana passada, revela que, pelo segundo ano consecutivo e de forma agravada, os portugueses em geral gastam mais do que o que ganham, à custa de poupanças acumuladas ou do crédito, voltando este a bater records.
O curioso é notar que nas últimas duas décadas, enquanto o Estado gastava excessivamente, aumentando a dívida pública, os particulares conseguiram realizar alguma poupança. mesmo durante a crise, quando os rendimentos diminuíram (por causa do aumento de desemprego e do corte de rendimentos). Agora que a economia e o fim das medidas de austeridade fazem aumentar o rendimento pessoal, os portugueses desataram a gastar o que ganham e o que não ganham! Verdadeira bipolaridade!
A recuperação da confiança na economia e os juros baixos justificam o disparo do consumo. Mas num país que não tem capital e precisa de investir, uma taxa de poupança negativa não é bom augúrio. E a era dos juros baixos não dura sempre!

terça-feira, 4 de julho de 2017

Corporativismo (3): Ordem ou sindicato oficial?


A Ordem dos Enfermeiros já tinha ultrapassado as marcas da legalidade ao apoiar ativamente a greve dos "enfermeiros especialistas", o que não cabe nas suas atribuições. Mas a acusação desta entrevista do presidente da Associação dos Administradores Hospitalares, hoje no Público, segundo a qual houve elementos da Ordem a "assumir piquetes de greve" e a ameaçar com "procedimentos internos da Ordem a quem não fizesse greve", é de uma gravidade inaudita na tentação das ordens profissionais para se intrometerem nos conflitos profissionais e para assumirem funções sindicais, que não têm nem podem ter.
A gravidade desta acusação exige que o Ministro da Saúde requeira imediatamente à OE que investigue e proceda disciplinarmente contra os autores deste abuso qualificado, sob pena de recurso aos poderes de tutela de que o Governo legalmente dispõe e, em última instância, de ameaça de... extinção da Ordem. O Estado não pode persistir na sua atitude de complacência em relação aos reiterados e despudorados abusos de poder das ordens profissionais.

Adenda
Entre as imponderadas tomadas de posição públicas da bastonária da Ordem dos Enfermeiros registe-se uma de março passado, em que se rebela contra o "boicote" de que a OE estaria a ser objeto, para a impedir de participar na negociação das condições laborais dos enfermeiros, a que supostamente teria direito. Ora, não só não tem direito nenhum como nem sequer pode intervir nem tomar posição sobre tais negociações. Por definição e por impedimento constitucional e legal, as relações laborais estão fora do mandato das ordens profissionais.