Quando Ricardo Pais Mamede escreve que «a deriva liberal da UE (...) está antes gravada no seu quadro institucional», não precisamos de mais explicações para perceber por que é que a esquerda radical é, e só pode ser, contra a UE como tal, independentemente das concretas políticas europeias, mais liberais ou mais sociais, de acordo com as maiorias políticas de cada momento.
A tese é, porém, factualmente improcedente, como é fácil demonstrar. O quadro institucional da UE, desde a CEE originária, de 1957, visou sempre a integração europeia na base da síntese da economia de mercado com o Estado social, aliás sem necessidade de grandes proclamações sociais no texto do Tratado de Roma. Ora, os tratados subsequentes não só não desvalorizaram mas antes reforçaram a componente social da UE, bastando referir os enormes avanços sociais do Tratado de Amesterdão e do próprio Tratado de Lisboa (como mostrei aqui).
A tese da natureza intrinsecamente (neo)liberal da UE é uma conveniente invenção da esquerda radical para justificar a sua visceral hostilidade à integração europeia tal como nasceu e se desenvolveu, baseada na "economia social de mercado" -- conceito agora introduzido no Tratado de Lisboa, que nada tem a ver com o neoliberalismo nem com o "capitalismo laisser-faire" --, em nome de uma imaginária "integração alternativa", cuja natureza aliás não definem. Mas não custa adivinhar que o verdadeiro busílis está na "economia de mercado", qualquer que ela seja...