«(...) A FCG tem uma identidade própria, associada ao título de "Ministério da Cultura português" até muito recentemente. Tal perfil só foi possível por conciliar duas filosofias de intervenção: uma directa, com serviços próprios, outra indirecta, com subsídios e apoios vários. Foram e/ou ainda são serviços directos alguns dos organismos mais emblemáticos da FCG: as bibliotecas itinerantes e fixas, o Ballet Gulbenkian, a Orquestra Gulbenkian, o ACARTE, etc. Há argumentos que revelam uma estratégia deliberada dos administradores ideologicamente mais liberais no sentido de acabar com os serviços directos (...).
Aqui surge um problema: se numa visão liberal faz sentido exigir uma menor presença do Estado na sociedade civil, já um menor peso da sociedade civil nela mesma é um contra-senso. Porém, é nisso que se traduz o esvaziamento do papel da FCG na oferta e na concorrência culturais, ambas cruciais para o desenvolvimento da sociedade portuguesa. (...)
A extinção do Ballet Gulbenkian foi nefasta, dada a sua intempestividade (a renovação artística fora almejada e a programação de 2005/6 já fora aprovada), o momento escolhido (celebração dos seus 40 anos), o valor do grupo de bailado (prestigiado internacionalmente, à custa de muito investimento e árduo labor) e, como vimos, por comprometer definitivamente a própria filosofia mista de intervenção sócio-cultural da FCG ao longo da sua existência.
(...) Cabe à opinião pública debater estas questões, pois a FCG é uma das instituições mais importantes da nossa sociedade civil, e por isso deve ser alvo de escrutínio público. Uma petição com 20 mil assinaturas vai nesse sentido (vd. http://www.petitiononline.com/bg05ext/petition.html). Para o bem do interesse comum, da nossa democracia.»
Daniel Melo, historiador