terça-feira, 28 de novembro de 2023

Eleições parlamentares 2024 (8): Atribulações do PS

1. Num sistema de governo de base parlamentar como o nosso, em que a legitimidade política do Governo decorre das eleições parlamentares, estas são, antes de mais, um julgamento do Governo cessante, e o critério decisivo deve ser naturalmente o seu desempenho.

Ora, quanto a este Governo, e apesar das minhas várias críticas quanto a várias políticas concretas e das dificuldades em algumas áreas (como a saúde e a habitação, embora centradas na capital), entendo que o saldo é globalmente muito positivo: combate eficaz às sequelas da pandemia, especialmente a inflação, crescimento económico acima da média da UE, aumento do emprego e dos rendimentos (pensões, salário mínimo, remunerações em geral), reforço do Estado social (prestações sociais, creches gratuitas, reforma decretada do SNS), excedente orçamental e redução do peso da dívida pública (com melhoria geral do rating externo), reforma das ordens profissionais (uma "reforma estrutural" há muito devida), avanço nos processos de localização do novo aeroporto e de arranque do TGV, descentralização territorial, novo programa Simplex de desburocratização da Administração, prestígio do País nas instituições da UE, etc.

A meu ver, só o mais acrítico sectarismo político pode desqualificar o desempenho geral deste III Governo de António Costa, cujo mandato foi insensatamente interrompido pelo PR.

2. Em condições normais, o PS deveria ganhar folgadamente estas eleições.

Sucede, porém, que, a fazer fé nas sondagens, não é bem esse o juízo da maioria dos cidadãos nesta fase, visto que mais de um quarto dos eleitores que há dois anos deram uma inesperada maioria parlamentar absoluta ao PS não parecem disponíveis para renovar esse mandato de confiança política.

Há três factores que podem explicar essa perda de apoio eleitoral: (i) a inesperada demissão do Governo, na sequência de uma investigação penal  - incluindo dois ministros, um dos quais já se demitiu, embora protestando a sua inocência -, a qual, apesar de essencialmente esvaziada pela decisão do juiz de instrução, continuará a afetar negativamente a confiança no partido, enquanto não for encerrada; (ii) a saída de António Costa da liderança do PS, e estar ainda em aberto a sua sucessão e a escolha do aspirante a primeiro-ministro socialista; (iii) a incerteza quanto à política de alianças pós-eleitorais do partido, designadamente quanto à eventual repristinação da chamada "Geringonça" com os partidos à esquerda do PS.

Os três meses e meio que faltam até às eleições podem afastar ou, pelo menos, atenuar o impacto destes fatores negativos, mas dificilmente o PS pode fazer incidir o juizo eleitoral somente sobre o seu desempenho governativo.
[Mudada a rubrica]

Adenda
Com este acordo com os médicos do SNS, há menos um "irritante" nas perspetivas eleitorais do PS.