terça-feira, 19 de outubro de 2004

Esquerda v direita

«Compreendo a sua reinvindicação (...) de que "a distinção entre esquerda e direita continua a fazer sentido", mas a verdade é que os resultados de algumas sondagens recentes revelam um progressivo desinteresse dos portugueses acerca de uma tal distinção.
Julgo que seria oportuno tentar entender as razões que levam os portugueses a desinteressar-se por esta matéria. Uma explicação plausível será a de que os portugueses se encontram confundidos com a prática política dos partidos que habitualmente tomam conta do governo da nação, PS e PSD, o primeiro de esquerda e o segundo de direita, pelo menos de um ponto de vista formal.
Assim sendo, coloca-se uma pergunta óbvia. Na prática política, quem terá contribuído para a confusão e desinteresse dos portugueses: a direita, por adoptar atitudes de esquerda, ou a esquerda por adoptar atitudes de direita?
A resposta não parece difícil e convinha que fosse objecto de alguma meditação. Até porque, hoje em dia, se torna difícil classificar algumas das figuras políticas mais emblemáticas. (...)»

(Jorge Oliveira)

Serviços públicos e mercado

Os que se opõem à existência de um serviço público de rádio e televisão, como garantia mínima de uma esfera de pluralismo de informação, de ideias e de opinião (entre outras coisas), costumam defender também que deixe de haver escolas públicas, hospitais públicos, e outros serviços públicos que visam proporcionar acesso universal, equitativo e plural (e por vezes gratuito) a certos bens básicos (informação, educação, cuidados de saúde, etc.) que o mercado só por si não proporcionaria nessas condições. São coerentes, sempre pela mesma razão: eles não precisam desses serviços públicos para terem acesso privilegiado a esses bens e por isso também não querem pagá-los. Uma posição inquestionavelmente racional, pois claro!
É também por isso que a distinção entre esquerda e direita continua a fazer todo o sentido!

Guilhermina Suggia



Nos últimos dias tenho-me deliciado a trabalhar ao som de uma excelente interpretação de obras para violoncelo e piano de Heitor Villa-Lobos, que uma amiga minha brasileira, sabedora da minha paixão por obras de violoncelo, me trouxe do Brasil. Eis senão quando recebo um mail de Virgílio Marques, um dos autores do blogue Guilhermina Suggia, a anunciar a criação de uma associação de amigos/admiradores da grande violoncelista. Não resisto a divulgar o blogue e a apoiar a ideia da associação.

segunda-feira, 18 de outubro de 2004

O sono da razão democrática

Na Madeira, ainda não se processou, no plano dos factos, a transição da ditadura para a democracia: é uma constatação que qualquer pessoa com formação democrática mínima pode fazer. Mas é o que nunca fizeram, até hoje, os órgãos de soberania que, ao longo de décadas, têm contemporizado e sido cúmplices com uma situação de excepção que atenta contra os valores consagrados na Constituição da República.

Tudo se passa como se uma parte do território nacional pudesse subtrair-se ao regime democrático que nos rege. E como se isso não violasse o próprio conceito de Estado unitário ou alguns princípios essenciais do Estado de direito -- que asseguram o respeito pelas liberdades e garantias dos cidadãos, incluindo o pluralismo das opiniões.

A menoridade democrática da Madeira é entendida, por vezes, como uma fatalidade incontornável ou um fruto espúrio, uma consequência perversa dessa conquista democrática que são as autonomias. Mas estarão as autonomias à margem da lei fundamental do país? O preço a pagar pelas autonomias (cada vez mais alargadas ao longo de sucessivas revisões constitucionais) é a impunidade do regime jardinista? Eis uma questão a que os mais altos responsáveis políticos do Estado se têm furtado a responder.

A «obra» deixada por Alberto João Jardim parece caucionar a sua inimputabilidade política. Mesmo sem pôr em questão a importância física dessa «obra» (aliás altamente discutível em termos de desenvolvimento sustentado de uma região e com custos terríveis para as gerações vindouras), alguém admitirá, porém, a bondade de regimes autoritários ou totalitários (como os de Hitler ou Estaline) em nome da «obra» edificada pelos respectivos ditadores? A falta de alternância democrática da Madeira poderá ser evocada como normal e positiva em nome da «estabilidade», mesmo que essa estabilidade se confunda já com aquela que conhecemos durante o salazarismo?

A governamentalização da sociedade civil e a sua asfixia pelos poderes públicos, a desresponsabilização dos actores políticos que fazem «obra» sem assumir os compromissos devidos aos seus custos (e, ainda por cima, sufocam as liberdades) não é normal num Estado de direito democrático. Trata-se de uma efectiva monstruosidade. Mas é uma monstruosidade que não provoca grandes incómodos entre os admiradores continentais de Jardim (antes pelo contrário) nem parece ser suficiente para mobilizar de forma consequente os seus opositores.

Em relação à Madeira vivemos uma espécie de sono da razão democrática. Só que é um sono cujo vírus contamina a consciência e a vivência da democracia em Portugal. Se aceitamos como normal ou até motivo de elogios (e imitação) o que se passa na Madeira, que impede que se pense o mesmo relativamente ao resto do país?

Vicente Jorge Silva

A notícia e a não-notícia

Os Açores foram notícia no passado domingo, a Madeira não. As previsões apontavam para uma disputa de resultado muito incerto nos Açores, onde se admitia que a coligação PSD-CDS pudesse ganhar as eleições regionais. Na Madeira, pelo contrário, a única dúvida sobre o resultado eleitoral residia na maior ou menor expressão da inevitável e fatal maioria absoluta de Alberto João Jardim. Ora, numa democracia normal não há certezas absolutas sobre vencedores antecipados e, por isso, o factor surpresa faz parte da própria lógica democrática. A surpresa açoriana teve como contraponto a não-surpresa madeirense (se exceptuarmos o melhor resultado de sempre do PS). É a surpresa, a novidade, que cria a notícia, não aquilo que é previsível, velho, conhecido por antecipação. E que, como o jardinismo, cheira a mofo.

Mas a surpresa açoriana relativizou, ainda mais, a não-surpresa madeirense. Apesar de já se saber que o jardinismo estava «condenado» a obter uma oitava maioria absoluta consecutiva, ninguém se atreveu a apostar que o PS/Açores registasse uma percentagem de votos superior ao PSD/Madeira. Foi isso, porém, o que aconteceu. E assim percebe-se melhor o comportamento de Jardim na noite eleitoral. Depois do espectáculo de circo e inaugurações em que investiu mundos e fundos, não conseguiu disfarçar o inconfessável: o rancor e o ciúme por ter sido ultrapassado pelo seu congénere socialista açoriano (o qual, ainda por cima, parece ter feito uma decepcionante campanha eleitoral). Tanto circo para ficar atrás de César? Impensável. A culpa só poderia ser mesmo da imprensa do continente (os tais «patetas» que tanto o atormentam) ou dos jornalistas da Madeira que não estão comprados por ele, e que, por isso, ameaça publicamente de saneamento.

Este é certamente mais um motivo de vergonha para a Madeira, a somar aos tantos que Jardim tem protagonizado ao longo de vinte e muitos anos. Mas a Madeira tem um motivo ainda maior para continuar a sentir-se envergonhada: é por Jardim, embora em recuo, ainda tratar os madeirenses como gado eleitoral -- e esse gado eleitoral ainda gostar de sê-lo, obediente, apático e servil, às ordens de um pastor cuja boçalidade e carácter rancoroso constituem uma ofensa aos valores mais básicos da boa-educação e da civilidade. Para não falar, é claro, de valores democráticos -- que é coisa ainda muito distante da vivência quotidiana dos madeirenses.

Vicente Jorge Silva

A coligação com o PP é um mau negócio eleitoral para o PSD?

Não concordo com a tese, que vem desde as eleições europeias, de que a coligação PSD-PP seja eleitoralmente prejudicial para o PSD. É de admitir que haja uma ligeira perda de votos, quando comparada com a soma que teriam os dois partidos separadamente, mas essa desvantagem pode ser compensada com a vantagem da atribuição de mandatos, que tira proveito da concentração de votos. Além disso, pode permitir à direita ganhar ao PS, quando o PSD não o pode fazer sozinho, o que pode ser essencial para saber quem forma governo. Por isso, não creio que a coligação tenha sido responsável pela humilhante derrota de Vítor Cruz nos Açores. Basta ver o que sucedeu na Madeira, onde, concorrendo separados, tanto o PSD como o PP perderam votos, em proveito do PS. O que sucede é que a coligação governamental nacional está manifestamente em perda, pelo que os dois partidos perderão sempre votos, coligados ou não.
Mas é evidente que a ideia de que a coligação é um mau negócio permite aos próprios (sobretudo ao PSD) amenizar as derrotas, imputando-as ao parceiro de coligação, e à oposição semear a cizânia nas hostes governamentais.

O mundo de Bush

«Muitos dos suspeitos de terrorismo detidos na base americana de Guantanamo foram sujeitos de forma regular e continuada a tratamentos coercivos passíveis de serem considerados tortura» - conta hoje o Público, referindo uma investigação do New York Times. Os pormenores são de estarrecer. Eis a (in)cultura de direitos humanos e o "rule of law" (Estado-de-Direito) à maneira de Bush!

«Bush is the Problem»

«América yes, Bush no» - é assim que o vespertino francês Le Monde sintetiza o resultado do inquérito de opinião realizado em dez países sobre os Estados Unidos, cuja análise pode ser vista neste site do Guardian de Londres. Na verdade, são três os principais resultados a registar:
a) Existe uma enorme rejeição de George Bush e uma correspondente preferência por John Kerry na disputa presidencial norte-americana; Bush sofreria derrotas humilhantes em vários deles (apenas 13% em Espanha, 16% na França, cerca de 20% no Canadá e no México, 22% no Reino Unido...).
b) Mantém-se porém uma apreciação muito positiva em relação aos Estados Unidos em todos os países, com taxas relativamente elevadas em vários deles;
c) No entanto, a imagem dos Estados Unidos degradou-se nos últimos anos por causa de Bush e em especial da guerra do Iraque, fortemente condenada em quase todos os países.
Isto permite tirar especialmente duas conclusões:
a) O sentimento dominante anti-Bush não decorre de nenhum "anti-americanismo", como defendem os partidários daquele;
b) Pelo contrário, é a política de Bush que arruina o retrato da América no Mundo e amplia o sentimento anti-americano.
O ainda presidente dos Estados Unidos é o principal factor do anti-americanismo. Uma reeleição de Bush para novo mandato só pode piorar a imagem e o crédito dos Estados Unidos no mundo. Como titulava um jornal sul-coreano sobre o inquérito, «Bush is the problem».

Soma e segue

Nas eleições regionais dos Açores o PS ganhou folgadamente à coligação de direita, reforçando mesmo a maioria absoluta, com cerca de 20% de diferença na votação, esmagando as veleidades do PSD de recuperar o poder. Na Madeira, como era previsível, Jardim voltou a ganhar confortavelmente mas em nítida perda (com a menor maioria de sempre e com votação inferior à de César nos Açores), tal como o PP, ao mesmo tempo que o PS obteve uma notável subida, encurtando significativamente o enorme fosso que o separava do PSD. Quem sabe, o princípio do fim do jardinismo...
Resultado: uma jornada fagueira para o PS e claramente negativa para a direita em geral e para o PSD em especial. Na estreia eleitoral de Sócrates e de Santana Lopes à frente dos respectivos partidos (pese embora a dimensão essencialmente regional destas eleições), é evidente que, depois do triunfo nas eleições europeias em Junho passado, o PS ganhou igualmente o segundo "round" do ciclo de eleições que termina daqui a dois anos com as eleições parlamentares, no fim da presente legislatura (se não for antes...).

domingo, 17 de outubro de 2004

Previsões à moda de Zandinga

Custa dizer que a culpa do que se passou nos últimos dias, em matéria de previsões sobre as eleições regionais nos Açores, foi da comunicação social. Não sei, não estive lá para saber se o que as televisões relatavam correspondia ou não ao que viam no local. Mas a sensação que ficava em quem as ouvia, aqui no continente, era a de que o lugar de Carlos César estava em perigo. Basta lembrar a importância que foi dada às declarações de Marcelo de Rebelo de Sousa. Que o tipo de intervenções do partido socialista, dizia o comentador em tom convicto e supostamente fundamentado, era um sinal indiscutível de que se sentiam perdedores.
Lição a tirar depois dos resultados: um esforço acrescido de isenção e objectividade aconselha-se para as próximas campanhas eleitorais. A bem do prestígio da comunicação social, muito em especial da que é paga por todos nós.

Mais quatro anos, não!

Sem surpresa, o prestigiado New York Times apoia expressamente John Kerry na corrida à presidência dos Estados Unidos. Mesmo se esperado, o editorial que justifica o «apoio entusiástico» ao senador merece uma leitura, quanto mais não seja pelo fundamentado requisitório contra Bush. Mais um «mandato desastroso», não!

O Inverno



Aproxima-se o Inverno, os dias pequenos e de luz coada. O sol é menos quente e menos frequente. Desaparecem as esplanadas dos cafés. Nas ruas, anda menos gente. As janelas fecham-se nas casas.
Poderíamos fazer contra-corrente. Guardar a cor e a luz no que vestimos. Deixar a loucura criativa de Galliano inspirar as nossas opções. Mas não. No Inverno, domina o preto ou o cinzento, nas roupas e nos sapatos. As montras tornam-se mais tristes. Só nos resta esperar que o Verão regresse. E depressa, por favor.

Afinal, este Governo é igual aos outros?

Em aparente tentativa de apaziguar as pouco discretas provocações de Santana Lopes, o Presidente da República declarou, em entrevista à Antena 1 (muito fala agora o Presidente!...), que o actual governo "não está em diferentes condições do que outros no que respeita à sua apreciação [pelo Presidente]". Ora, para além de não ter havido nenhum governo acerca de cuja nomeação o Presidente tivesse hesitado tanto tempo, também foi a primeira vez que ele achou necessário estabelecer publicamente exigências de continuidade de políticas essenciais em relação ao governo anterior, o que obviamente aumenta a necessidade de escrutínio presidencial.
Com esta declaração do PR, em que ficamos? Belém acha afinal que este governo é igual a qualquer outro saído directamente de eleições parlamentares?

Os argumentos discutem-se, as pessoas não

Ao contrário do que acusa Gabriel Silva no Blasfémias, eu não chamo nomes às pessoas. Posso desqualificar (por vezes indevidamente...) ideias, posições e argumentos, mas não desconsidero os autores.

Confederação sindical europeia pela Constituição

Qualificando-a como um «claro progresso em relação aos actuais tratados da UE», a Confederação Europeia de Sindicatos manifestou o seu apoio à Constituição Europeia. A decisão foi aprovada por grande maioria, somente com um voto contra (a FO francesa, tradicionalmente hostil à integração europeia) e algumas abstenções, entre as quais a CGT francesa e a CGTP portuguesa.
Sabendo-se que a força política mais influente na central sindical nacional, o PCP, é militantemente contra o novo tratado constitucional (o mesmo sucedendo com o BE), a abstenção adoptada em Bruxelas não deixa de ser uma posição prudente. Resta saber que atitude é que a organização presidida por Carvalho da Silva vai tomar no debate interno sobre o assunto, designadamente no previsto referendo.

sábado, 16 de outubro de 2004

Portucaliptal


Citado pelo Expresso de hoje, com base num jornal regional de Aveiro, o secretário de Estado das Florestas, Luís Pinheiro (que deve mudar o nome para Luís Eucalipto...), anunciou uma política de apoio à expansão do eucaliptal em Portugal, tendo em conta o abastecimento de matéria prima da indústria de celuloses. Ou seja: a política florestal hipotecada aos interesses particualres de uma indústria, apesar dos enormes prejuízos para o património florestal e o ambiente, sem esquecer a devastação dos fogos florestais! O que é bom para a Portucel é bom para o País...
Por que é que em Portugal o secretário de Estado das Florestas há-de aparecer sempre como comissário das empresas da pasta de papel? E os movimentos ecologistas, ficam silenciosos, porquê?

Fanatismo de mercado

Se se quiser uma amostra de fundamentalismo liberal em matéria económica, a posição de João Miranda sobre o limite do número de operadores de televisão de sinal aberto é exemplar. O dogma reza: não deve haver barreiras artificiais à entrada de novos "players" no mercado; logo, todo a limitação é sempre má por definição, mesmo que, como ocorre no caso, esteja em causa a utilização de um bem do domínio público, que só pode ser usado mediante licença pública, precedida de concurso, não podendo haver por definição liberdade de acesso nessa esfera e podendo haver razões assaz compreensíveis para limitar o número de operadores e para assegurar a estabilidade do quadro televisivo (desde logo, por exemplo, para não estar a repetir concursos para as vagas resultantes da falência recorrente de operadores excedentários...).

PS
- Eu não disse nada contra as estações regionais de televisão. Só defendi que o pluralismo "externo" delas resultante não poderia servir de "compensação" para a eventual falta de pluralismo "interno" a nível das estações de âmbito nacional.

Buttiglione

Ao contrário de José Manuel Fernandes, que ontem subscreveu no Público um editorial de apoio a Rocco Buttiglione, o polémico comissário europeu designado, entendo que faz sentido a posição da comissão de liberdades do Parlamento Europeu, que o reprovou. O problema não é a personalidade do comissário que Barroso escolheu para a pasta da justiça nem os valores morais/religiosos que ele defende. O problema é a inadequação entre eles e a pasta para que foi designado. Nenhum problema se levantaria se se tratasse do pelouro da agricultura e das pescas, por exemplo. Mas provavelmente nem no Governo de Berlusconi, a que ele ainda pertence (Assuntos Europeus), seria pacificamente aceito na pasta da justiça.
De facto, Buttiglione é um fundamentalista religioso com opiniões fortemente reaccionárias em matéria de casamento, contracepção, homossexualidade, aborto, etc., o que seria o menos. Mas os fundamentalistas religiosos tendem geralmente a impor os seus valores religiosos a todos por via de lei (como é fácil ver no caso da punição penal do aborto), pelo que as declarações em contrário de Buttiglione são tudo menos tranquilizadoras. De facto, na Convenção Europeia já se opôs ao princípio da não discriminação por razões de orientação sexual. Para além disso, como amigo e ministro de Berlusconi, Buttiglione também não dá nenhumas garantias de fazer avançar a cooperação judiciária a nível da UE, que Berlusconi tem torpedeado sistematicamente, por razões pessoais, estando a Itália em falta na implementação de várias medidas comunitárias nesta área. Buttiglione não está, portanto, à altura de suceder a António Vitorino nessa sensível pasta. Por isso parece-me que Barroso faria bem em mudá-lo de pelouro.

PS. Como efeito fácil, JMF apoda de modernos "torquemadas" os críticos de Buttiglione. É uma evocação infeliz. Torquemada foi sim um antepassado da família religiosa de Butiglione. Ao contrário, os seus críticos de hoje não pretendem fazê-lo abjurar das suas "heresias", muito menos queimá-lo vivo...

sexta-feira, 15 de outubro de 2004

O "derby"

Quem ouvir o relato do que se passou hoje com jogo entre o Benfica e o FCP acreditará que organizámos o Euro, há tão poucos meses, com indiscutível e reconhecido sucesso?
Parece que só nos excitam os grandes desafios. Ganhamos à Rússia mas não ao Liechtenstein. Fazemos o Euro, mas corremos o risco de falhar num mero jogo da Liga!

Os da Causa, fora dela

Notícia de textos publicados por autores do Causa Nossa noutros média:
- Luís Nazaré no Jornal de Negócios de ontem, sobre o regresso do tema do papel do Estado nas sociedades contemporâneas;
- Vicente Jorge Silva no Diário Económico de hoje sobre o caudilhismo jardinista na Madeira.
Ambos vão ser coligidos no Aba da Causa (link aqui ao lado, na coluna da direita).

Pedido de desculpas

(com publicidade subliminar)

Tenho andado arredio da postagem aqui no Causa. Tenho pena mas ando atarefado com diversas porcarias e alguns prazeres trabalhosos como este. A estreia é hoje às 21h30. Todos os meus companheiros de blogue estão convidados - é só mandar um mail a este que vos pede desculpa e promete voltar às responsabilidades brevemente. Um abraço, e não se esqueçam de passar no vizinho do lado. As URGÊNCIAS estão aí.

clube do pulmão

Duas da manhã, num extra. Tenho o tabaco mas falta-me o fogo. Desespero. Só existem isqueiros azuis com o símbolo do Futebol Clube do Porto. Hesito. Pergunto por fósforos. Por seixos. Por paus secos. Não há nada, só pequenos acendedores com o FCP carimbado. Pago 90 cêntimos para possuir o fogo e acendo o cigarro mais envergonhado de sempre. Afinal, não sou do Benfica. O meu clube é o tabaco.

E a Madeira, não tem direito também?

Tal como já tinha sucedido com M. Rebelo de Sousa e com Santana Lopes em anteriores visitas, também Morais Sarmento foi aos Açores defender a vitória da coligação de direita nas eleições regionais em nome da alternância democrática, vistos os 8 anos de governo que leva o PS na Região. Será que não lhes ocorre ir a correr à Madeira defender, por maioria de razão, a vitória do PS, para realizar a mesma alternância democrática na Região onde o PSD governa ininterrupta e hegemonicamente há quase 30 anos (o que é um pouco mais de 8...), sem paralelo em regimes democráticos?

Referendos e demagogia

«Quando diz -- "Por natureza, há sempre um risco de instrumentalização demagógica dos referendos. Os referendos com objecto demasiado amplo ou indefinido só potenciam esse risco" --, isto não será verdade apenas pela forma e pelo método que os políticos nos habituaram, ao longo destes anos de democracia(?), a debater as questões? Ou melhor dizendo, a não debater as questões. Ou porque não lhes interessa, ou porque pensam que o povo coitadinho (meros mortais) não consegue perceber o porquê das coisas!
Basta ver, olhar para trás neste último ano, que campanha (estou a falar de campanha a sério: nas escolas, nas universidades, nos municípios, pelo país fora, etc.) foi feita para apresentar e discutir em detalhe a questão da constituição [europeia], sequer a sua conveniência ou não? Não considera que a "instrumentalização demagógica" de que fala é esta precisamente: falar do referendo precisamente quando a maioria da população, como é óbvio, não sabe nada do conteúdo em causa; para depois com base nesta desculpa de que os "meros mortais" nada sabem vir questionar o seu futuro "sim" ou o seu "não" e condicionar assim a(s) própria(s) questões?»

(João Carvalho)

Pluralismo de opinião e regulação

Respondendo a João Miranda no Blasfémias:
1. O "numerus clausus" de estações de televisão por via hertziana têm a ver, segundo creio, não somente com os limites do espaço radioeléctrico mas também com a insustentabilidade comercial de mais canais. A futura televisão digital não supera esta segunda limitação.
2. Os canais regionais não são alternativa aos canais nacionais em termos de pluralismo de opinião. Este deve aferir-se face aos mesmos auditórios. Uma rádio de Alguidares de Baixo não concorre com a TSF.
3. O pluralismo de opinião deve ser assegurado ao nível de cada meio ou plataforma, especialmente na televisão, e não entre plataformas diferentes, permitindo monopólios de opinião em cada plataforma.
4. A televisão de sinal aberto continua a ser, por enquanto, o meio mais universal de acesso à opinião. Não temos 100 nem 200 canais: temos quatro, dois públicos e dois privados. Se fosse livre o domínio dos dois canais privados por uma corrente de opinião, isso significaria uma severa limitação do pluralismo de opinião.
5. Não está provado que os órgãos de comunicação privados tendam a ser «antipoder». O contrário é que é verdade. O caso do despedimento de MRS pela TVI aí está para provar o seguidismo dos privados em relação ao poder do momento. Isso seria impossível numa estação pública (só que nesta ele não estaria sozinho...)
6. Uma das justificações fundamentais para o serviço público de rádio e televisão é justamente assegurar um mínimo básico de pluralismo de opinião face ao perigo de captura dos órgãos privados pelas opiniões favoráveis ao poder económicoe e ao poder político do momento.
7. Já existe actualmente regulação e regulador dos media, incluindo a televisão. O novo regulador não tem funções essencialmente distintas do que já existe. As diferenças dizem respeito ao formato orgânico e aos seus poderes. Um das suas funções é garantir o pluralismo lá onde ele deve existir constitucionalmente e legalmente. O regulador implementa o regime constitucional ou legal, não o cria.
8. Mesmo que o pluralismo de opiniões das estações públicas tendesse a limitar-se ao espectro político-ideológico "oficial" da AR, é preciso lembrar que é nos partidos nela representados que se revê a opinião pública que vota. O pluralismo de opinião faz parte da igualdade de oportunidades das forças políticas.
9. Nem as estações públicas nem a regulação limitam a participação de comentadores independentes, alheios ao arco partidário. Todos os nomes citados tiveram ou têm acesso frequente ou permanente às estações de televisão públicas ou privadas.
10. Dizer que se as estações privadas de sinal aberto tiverem de ser minimamente plurais por efeito da regulação, o pluralismo diminui, isso é um óbvio contra-senso.
11. Não existe nenhum país, incluindo os Estados Unidos, onde não haja regulação dos meios de comunicação, a começar pela televisão. Tal como o mercado em geral, não há "mercado livre de opiniões" sem regulação que assegure um mínimo de iguladade no acesso a esse mercado. Só defende o contrário quem beneficia de posições dominantes no mercado desregulado.
12. É preferível mais pluralismo de opinião do que menos.

A favor do referendo directo da Constituição europeia

«(...) Não estou completamente de acordo consigo em relação a um tema específico: o do referendo à Constituição Europeia. (...) Nunca concordei com a proibição constitucional de referendar [directamente] leis ou tratados internacionais. É verdade que estes têm frequentemente elementos técnicos específicos que escapam à generalidade dos eleitores. Contudo, parece-me exagerado crer que, por exemplo, um deputado à Assembleia da República, quando vota uma determinada lei na generalidade, compreenda totalmente o conteúdo técnico do texto legislativo que aprova ou reprova. (...) No fundo, mesmo ao votar o respectivo diploma, estará a votar aquilo que interpreta serem as grandes opções do diploma: a escolha das grandes opções do diploma não deverão ser restringidas desde logo na pergunta do referendo, mas sim escolhidas pelo próprio eleitor consoante um debate de razão pública.
O elemento democrático do nosso regime misto monárquico-presidencial-aristocrático-democrático (é assim que o interpreto) deve ser também um misto de democracia representativa e democracia directa. Não há que ter medo das votações populares aos diplomas, mas sim da manipulação do debate público: o coarctar do poder decisório livre de cada um é sim o grande problema a combater.»

(André dos Santos Campos)

quinta-feira, 14 de outubro de 2004

Ensaio Geral

Amanhã, toda a gente às Urgências.

Bush v Kerry

Dos três debates públicos entre Kerry e Bush, este não ganhou nenhum e perdeu inequivocamente dois deles (o primeiro, sobre política externa, e o terceiro, realizado ontem, sobre política interna), em que Kerry triunfou em toda a linha. Perante a patente superioridade do candidato democrata, os eleitores norte-americanos serão estúpidos?

Até quando?

A passividade passada, se não compreensão implícita, em relação às formas violentas de protesto estudantil em Coimbra (incluindo frequentes encerramentos da Porta Férrea a cadeado, impossibilitando a entrada nas instalações a estudantes, professores e funcionários) culminou ontem com a invasão da sala grande dos actos da Universidade, por um pequeno grupo de estudantes, interrompendo tumultuosamente a cerimónia solene de abertura de aulas. O clima de impunidade em relação à violência de minorias extremistas só favorece mais violência.
Tendo considerado "muito grave e condenável" a invasão, seria desejável que a Reitoria passasse aos actos, promovendo a respectiva condenação e punição. Ou será que na UC continua a haver estudantes que, só por o serem, gozam de um estatuto de total imunidade disciplinar e penal?
(revisto)

Acima da lei

Seguindo o triste exemplo dos seus colegas de Coimbra nos últimos anos, os estudantes de Évora fecharam a sua Universidade a cadeado. Uns heróis! Imagine-se que eram trabalhadores a encerrarem à força a sua empresa, para impedirem outros de entrar nas instalações: alguém toleraria?
Por que é que há grupos sociais privilegiados que pensam que estão acima da lei..., e estão mesmo!?