segunda-feira, 26 de setembro de 2005

Noite Americana

Nunca visto! Um blogue acaba de nascer! Ó júbilo, ó glória!

Falar de tudo o que rodeia o cinema e os críticos nunca lembram - com Alexandre Borges, Domingos Farinho, Luís Filipe Borges, Paulo Narigão Reis e Rui Branco.

A crítica de cinema é sempre maçadora e repetitivamente sobre os filmes, nunca sobre ir ao cinema. Ora, as cadeiras do Londres são o que me faz sair de casa para ir ao cinema. Que eu me recorde, Luís Miguel Oliveira nunca escreveu sobre as cadeiras do Londres. As cadeiras do Londres são a razão pela qual, não fosse o estúpido do KingKard, iria ao cinema sempre ao Londres, independentemente do filme. Sim, a qualquer filme, a todos os filmes. Acho que não ir ao cinema só porque não está em cartaz nenhum filme de jeito é uma estupidez. João Lopes, que uma gloriosa vez deu, acertadamente, cinco estrelas ao «In bed with Madonna», nunca abordou a temática do frio no Quarteto. O som do Quarteto justifica volumes. O Quarteto, em si, justifica um acordo com a Médis. António Cabrita nunca falou das pipocas que mais gosta. O cinema não é para comer pipocas, nem para beber refrigerantes. Se é para isso, se é para estar à vontade, então, como uma vez disse o Esteves Cardoso, que se possa fumar e beber um uísque. Cerveja, não. Por que razão Augusto M. Seabra não faz recensão de trailers? Senhores críticos, digam coisas sobre o que sentiram ao ver o filme. Falem-nos por metáforas. Digam-me que um filme vos fez sentir como quando, no final da sessão, se saía do Condes para o lado, para a rua, através das portas abertas de par em par, para a luz da rua, que eu dispenso as estrelas e o google.
Rui Branco

domingo, 25 de setembro de 2005

Óbvio

«João Cravinho: PS "nunca" poderá sancionar Manuel Alegre». Mas há alguém que pudesse pensar outra coisa? Há situações que só podem ser "julgadas" no foro político.

Lugares de encanto

Mosteiro de São Nicolau, Lido, Veneza (Sede do Instituto Inter-universitário de Direitos Humanos e Democratização).

sábado, 24 de setembro de 2005

Alegre, candidato

Ausente no estrangeiro, telefonam-me a dar a notícia da candidatura presidencial de Manuel Alegre e a pedir a minha reacção. Remeto-os para este meu post, "Que venha a candidatura". Que não haja um único eleitor à esquerda que se possa queixar de não ter o "seu" candidato!

Julgam que acreditamos em tudo...

«PS expulsa militantes que integram lista de Fátima Felgueiras». É tudo a fingir, porém. Jornais de referência (e não qualquer "24 Horas" ou "Independente") têm provado por a+b que existe um cambalacho secreto entre o PS e a sua antiga (?) militante. A nós não nos enganam nem nos comem por tolos!

Querem mesmo ser funcionários

«Greve dos juízes marcada para 26 e 27 de Outubro». Só falta fazerem uma manifestação em frente à AR e reivindicarem horário de trabalho...

Adenda
O Presidente da República vai receber os sindicatos das magistraturas. Tendo em conta os motivos da sua contestação -- a manutenção de regalias profissionais -- e as formas por eles utilizadas (incluindo a greve) -- que não deveriam ser utilizadas por titulares de cargos públicos --, o gesto de Sampaio é pelo menos equívoco. Os interessados interpretá-lo-ão certamente como um gesto de compreensão e como uma desautorização do Governo...

sexta-feira, 23 de setembro de 2005

Correio dos leitores: Fátima Felgueiras (4)

«(...) Fiquei atónito com o seu texto de hoje, sobre a Fátima Felgueiras...!
Até pode estar tudo certo nos trâmites jurídico-penais, mas discordo do seu distanciamento ético. Mas é justo e honesto que em face de um crime - a fuga - se branqueie o acto? Não é crime? Porque é uma pessoa influente?
Como querem que o "povo" acredite nas elites se elas vivem exactamente para se perpetuarem no oportunismo...? Vivemos tempos onde a honorabilidade da pessoa se mede pelo título e não pelo carácter íntegro dos seus gestos e atitudes. No fim de tudo será que as elites de direita ou de esquerda revoltam-se com tudo isto? Estou a ver que não...»

Henrique Dias

Comentário
Não procedi a nenhum "distanciamento ético" sobre o comportamento de FF, que condenei na altura própria. Limitei-me a distanciar-me da histeria demagógica que condenou a revogação da prisão preventiva, mesmo não havendo nenhuma razão legal para a manter. Ainda que a fuga fosse crime, pelo qual não houve sequer acusação, a prisão preventiva não poderia ser instrumentalizada para o punir, sem qualquer julgamento. Mais do que o justicialismo primário, importa defender os princípios e os procedimentos próprios do Estado de Direito, a que até Saddam Hussein tem direito, quanto mais uma autarca acusada de crimes de desvio de fundos públicos...

Correio dos leitores: Fátima Felgueiras (3)

«(...) Hesitei bastante em comentar o seu post sobre Fátima Felgueiras, que li com a máxima atenção, mas acabei por me decidir a fazê-lo. Se bem entendo a sua argumentação, a resposta à sua questão é a seguinte: Não existe fundamento legal para justificar a renovação da prisão preventiva. Se me permite, e seguindo a sua linha de raciocínio, penso ser lícito concluir que a Justiça mais uma vez funcionou. É aqui que eu me sobressalto, será que o facto do "manto" da legalidade cobrir a decisão da Juíza é suficiente para contestar a indignação manifestada por vários comentadores que respeito ? por exemplo, José Manuel Fernandes, Miguel Sousa Tavares, António José Teixeira e Pedro Lomba, só para citar alguns ? e que eu subscrevo inteiramente? Não estará em causa a "bondade" da Lei ou, em alternativa, da decisão da Juíza? Não estarão casos destes a minar de forma irreversível o funcionamento da nossa jovem Democracia? Sou um leigo em matéria de Direito e apesar da clareza da sua argumentação, devo dizer que fiquei perturbado com a resposta que inferi (erradamente?) da sua questão, pois penso que com actos destes em que se mostra à evidência que "o crime compensa" estamos cada vez mais a pôr em causa a credibilidade e a confiança na Justiça com consequências difíceis de antecipar.»
Jorge Guerreiro

Comentário
A revogação da prisão preventiva não significa que "o crime compensa". FF vai ser julgada pelos crimes por que está acusada, sendo condenada se forem provados. Estar ou não presa não altera nada disso. Mesmo que tivesse sido apanhahda em flagrante delito e fose praticamente certa a condenação, mesmo assim a prisão preventiva só seria admissível nos casos previstos na lei...

Correio dos leitores: Fátima Felgueiras (2)

«(...) Não percebo por que motivo causa tão grande indignação a candidatura de Fátima Felgueiras à presidência da Câmara Municipal de Felgueiras. A candidatura autárquica é um direito que lhe assiste e a sua eleição, ou não, depende apenas da vontade dos felgueirenses. Se for eleita, é um dos preços a pagar por vivermos numa democracia (pago de bom grado). Mais: é de uma hipocrisia abissal salientar o caso de Fátima Felgueiras e esquecer os também candidatos autárquicos Isaltino Morais, Valentim Loureiro, Isabel Damasceno e Avelino Ferreira Torres. Aliás, as candidaturas de alguns dos nomes que referi, pela influência que os mesmos têm, parecem-me bem mais gravosas para o país do que a de Fátima Felgueiras.»
Carlos Azevedo

Correio dos leitores: Fátima Felgueiras

«(...) Para cúmulo, as leis deste país permitem que quem esteja indiciado de crimes graves praticados no exercício de um cargo público se possa candidatar novamente a cargos públicos. Ninguém se atreve a dizer que a civilizada França é um país mais atrasado que Portugal, mas na pátria das liberdades ninguém indiciado em crimes de peculato se pode candidatar a lugares públicos antes de proferida a sentença. Por cá favorecem-se os infractores, com o argumento da sacrossanta presunção de inocência. Graças à conhecida lentidão da justiça, quando se trata figuras públicas, Fátima Felgueiras vai poder cumprir pelo menos mais um mandato na presidência da Câmara de Felgueiras. Assim, ela aproveita a oportunidade que a lei lhe dá para a tomar a Câmara de assalto (com a ajuda dos seus apaniguados) e assim poder voltar a abotoar-se com os dinheiros de todos nós que, adiante-se, muita falta lhe fazem para pagar as dívidas contraídas durante a sua estada no Brasil e os avultados honorários dos advogados. É um fartar vilanagem!
Portugal, Portugalinho, quem te acode?»

Isabel Silva

Conspiração

A crer no Público de hoje, o regresso de Fátima Felgueiras teria sido orquestrado com a direcção do PS, incluindo provavelmente a própria juíza que a libertou! Neste quadro conspirativo, é evidente que FF ainda deve ser filiada clandestina do PS, a candidatura do PS à CM de Felgueiras é a fingir e deve existir uma ordem secreta para que os militantes do PS votem em FF...

quinta-feira, 22 de setembro de 2005

Perturbador

Tão perturbadora como a festiva recepção a Fátima Felgueiras no regresso ao seu município, depois da sua prolongada fuga à justiça, foi o escândalo suscitado por esse país fora pela revogação judicial da prisão preventiva que lhe tinha sido aplicada e de que ela escapara. Na verdade, se já não subsistem as razões que poderiam ter justificado anteriormente a prisão preventiva - nem o perigo de continuar a actividade criminosa (visto que já não é presidente da Câmara), nem a perturbação do inquérito (pois que este já foi concluído), nem o pergio de fuga (pois foi ela que voluntariamente regressou) --, que fundamento legal é que restava para justificar a renovação da prisão preventiva e para a impedir de aguardar em liberdade, como é a regara, o julgamento pelos crimes de que está acusada??

Situações diversas

José Sócrates voltou a mencionar o caso dos juízes do Tribunal Constitucional, para defender a escolha do presidente do Tribunal de Contas, a qual está sob crítica das oposições (e não só...), apesar do indiscutível mérito do indigitado.
Mas o paralelismo entre os dois tribunais não procede. Desde logo, no primeiro caso os juízes não são escolhidos e propostos pelo Governo, como sucede no caso em questão; segundo, os juízes do Constitucional (com excepção dos três cooptados) são eleitos directamente pela Assembleia da República por maioria de 2/3, o que garante um compromisso necessário entre o Governo e a oposição e um equilíbrio entre várias "sensibilidades" constitucionais; terceiro, o presidente do Tribunal Constitucional é escolhido pelos seus próprios juízes, não sendo escolhido por uma entidade externa, muito menos pelo Governo.

Prémio de consolação

As sondagens dizem que na Polónia a direita vai obter uma enorme vitória eleitoral. Depois do desapontamento alemão, nos próximos tempos a direita europeia, incluindo a nossa, vai ser... polaca!

Assimetria

Quando a direita perde, os comentadores de direita acham que quem perdeu foi o País, e é uma pena; e quando é a esquerda que perde, acham que quem perdeu foi a esquerda, e foi bem feito...

Fátima Felgueiras e o PS

Eu não conheço pessoalmente Fátima Felgueiras. Não estava no PS no tempo em que ela se afirmou como autarca socialista. Não sei se foi ou não uma boa Presidente de Câmara. Se cometeu ou não irregularidades na gestão da Câmara, dolosamente ou por negligência, ignorância ou ingenuidade. Se foi ou não vítima de conspiração vingativa ou apenas bode expiatório à mão de semear e fácil, por ser mulher, logo tida por mais vulnerável.... E não concordei, nem concordo, que ela tenha fugido à Justiça.
Mas rechoneço sem dificuldade algumas coisas:
Primeiro, a mulher é forte e desafiadora. Remoçada, resplandece no desafio.
Segundo, a sua força transmite a convicção de quem se sente injustamente acossada, de quem se sente injustiçada - que diferença das isaltinações sonoras de outros titeriteiros de reluzentes apitos. E a verdade é que a Justiça que a mandou prender tardou a acusá-la para além do razoável. E agora, afinal, já não vê justificação para a deter preventivamente.
Em terceiro lugar, Fátima Felgueiras foi objectivamente deixada cair pelo PS. Em parte com razão - e ela ofereceu muita ao fugir à Justiça. Noutra parte, talvez sim ou talvez não - esperemos que a Justiça funcione.
Mas na verdade, subjectivamente também, Fátima Felgueiras foi deixada cair pelo PS - pela parte do PS que se assusta às primeiras com investidas maldosas da direita ou da acefalia ululante de muitos contratados dos media. Um PS que sabe ou suspeita que tem telhados de vidro (como todos os Partidos têm - e quem eventualmente os tenha erguido é lesto a proteger-se de pedradas....). Um PS com pouco cimento fraternal e ideológico - a solidariedade depende sobretudo da sinergia de interesses, actuais ou futuros. Um PS que, em reflexo acéfalo de auto-defesa, deixa cair quem for preciso, independentemente de cuidar se está ou não injustamente acusado. Um PS que se agachou quando um decentíssimo líder e outro alto dirigente foram ferozmente atacados: um líder a quem o PS devia ter-lhe evitado uma humilhante derrota no pior momento e que lhe legou no final uma decisiva vitória, apesar da continuada vil calúnia.
Fátima Felgueiras talvez se console por quem não a sustentou ter mais tarde também sido largado às feras. Mas atenção: o líder não estava só e não decidiu sozinho. Diz quem também estava na direcção do Partido e assume a sua quota-parte de responsabilidade: eu.
Se Fátima Felgueiras age realmente movida pela força desafiadora da inocência, o melhor serviço que pode prestar a si própria, a Felgueiras, ao país, à democracia portuguesa - e portanto também ao PS - é expor em tribunal tudo o que saiba sobre irregularidades, delitos e corrupção praticados e favorecidos pelo sistema da gestão autárquica, a pretexto ou sob a cobertura de interesses partidários.

quarta-feira, 21 de setembro de 2005

Vaticano protege criminoso de guerra?

Lê-se, vê-se, ouve-se - e não se acredita!
Carla del Ponte, a Procuradora-chefe do Tribunal Internacional Criminal para a Ex-Jugoslávia acusa a Igreja Católica e a hierarquia do Vaticano de não colaborarem na entrega do acusado de crimes de guerra e violações dos direitos humanos General Ante Gotovina, protegido num mosteiro franciscano algures na sua terra natal, a Croácia. País, cuja abertura de negociações de eventual adesão à UE está dependente da entrega daquele homem pelas suas autoridades ao Tribunal Internacional.
Instado o Vaticano - incluindo por apelo directo da Procuradora ao Papa Bento XVI - deparou-se um comprometido silêncio. A ponto da católica romana Sra. Del Ponte decidir rebentar as pontes e vir queixar-se publicamente:«Eu levei o assunto junto do Vaticano, mas o Vaticano recusa totalmente co-operar connosco».
O actual Secretário de Estado da Santa Sé, Monsenhor Lajolo, alega que o Vaticano não tem autoridade directa sobre bispos individualmente, para se furtar a repudiar declarações do Bispo croata Mile Bogovic, de Gospic e Senj, que considerou o tribunal como «político» e determinado a distorcer o passado da Croácia e se referiu ao General Gotovina como um «símbolo de vitória».
Depois da sanha cruzada contra os muçulmanos, da Inquisição contra os judeus, depois da escravatura e do colonialismo instigados, justificados ou pelo menos tolerados, depois do Holocausto a principio silenciado e dos nazis depois ajudados a fugir e esconder por paragens latino-americanas, depois dos padres pedófilos encobertos e protegidos por várias partes do mundo... só faltava mais esta, agora!
Parece impossível! Que certos senhores e instituições nada tenham aprendido - comento eu, que não sou católica. E que, por isso, da descrença passo rapidamente à verberação.
Mas temo pelo efeito em muitos amigos, católicos sinceros e dedicados, ainda mais atónitos e indignados do que eu.

Acumulações

O que o Diário Económico ontem revelou sobre a acumulação de professores do ensino superior é simplesmente escandaloso, revelando extensa violação da lei e falta de fiscalização e punição dos prevaricadores. Por exemplo, os professores do ensino superior público em tempo integral só podem dar aulas em mais uma escola, com tempo limitado. Ora, são várias as situações de infracção desta norma. As escolas do sector privado têm de possuir um mínimo de professores em tempo integral, que naturalmente não podem estar no mesmo regime noutra escola. Ora são dezenas os casos de violação desta regra.
Para um Governo que tem apostado na moralização da vida pública e na extinção de privilégios sectoriais ilegítimos --, eis um sector que está a precisar de uma boa vassourada.

Mas o propósito escondido não era mesmo esse?

«Os reitores acusam o Governo de estar a beneficiar o ensino superior privado. Em causa está o congelamento de vagas nas universidades do litoral [decidido pelo ex-ministro Pedro Lynce], com o objectivo político de desviar alunos para as instituições do interior. A prática está a demonstrar que, em vez de se deslocarem, os candidatos preferem ficar nas grandes cidades, optando pelas instituições privadas. As universidades mais frequentadas, impedidas de receber mais alunos, são ainda prejudicadas na divisão do bolo orçamental, devido ao critério de coesão entre instituições. Quem tem mais alunos acaba, no fim, por perder dinheiro.» (Diário de Notícias)

terça-feira, 20 de setembro de 2005

"Os negócios da Católica"

A escabrosa história vem contada aqui, no Diário das Beiras. Parecendo de veracidade inatacável, baseada em documentos, o que ela revela são as formas ínvias de financiamento da Universidade Católica à custa do património público, mediante "cambalachos" comprometedores com o poder local e com o Governo.
Perante os factos, há duas perguntas que carecem de resposta: (i) por que é que o Governo prescindiu da cláusula de reversão dos terrenos em causa, permitindo a realização de um pingue enriquecimento sem justa causa da UC? (ii) por que é que o município da Figueira da Foz resolveu viabilizar um hotel num terreno que era público e que foi alienado a preço de favor para a construção de instalações universitárias?
Que país, este!

Correio dos leitores: Municipalização de centros de saúde

«Sob o título "Fatal", no dia 16 de Setembro, foi publicado por V. Exa. um comentário, com base em notícia do Jornal Público, sobre a oposição de uma associação nacional de médicos à ideia de confiar a gestão de centros de saúde aos municípios. Dada a não identificação da associação visada e, principalmente, dada a possibilidade de generalização da ideia de oposição, tomo a liberdade de esclarecer que o Sindicato Independente dos Médicos nunca se opôs à entrada dos municípios na gestão participada da saúde.
(...) Esta não oposição, mesmo o incentivo à gestão descentralizada, foi comunicada oficialmente a Sua Excelência o Ministro da Saúde em reunião de 20 de Julho de 2005. Não é certamente pelo SIM que a "descentralização territorial" não se concretiza.»

Carlos Arroz (Secretário-Geral do SIM)

Esclarecimento
De facto, foi a Federação Nacional dos Médicos (Fnam), que segundo o Públivo de 15 de Setembro passado declarou que a participação das autarquias na prestação de cuidados primários de saúde seria uma "medida perigosa", dado que esta "não é a sua vocação" e que não existe "qualquer tradição e experiência das autarquias nesta área" em Portugal.

O que eles não percebem

Procurando uma explicação para o insucesso eleitoral da direita alemã, o Financial Times Deutschland diz que «os alemães gostam do seu Estado Social e não querem abandonar um modelo de sociedade que vem desde os tempos de Bismarck».
O que até um órgão dos meios financeiros percebe não o percebem os neo(ultra)liberais. Depois admiram-se que o sufrágio popular rejeite as suas propostas radicais.
(revisto)

Rejeição

«Economists have already interpreted the outcome of the poll [na Alemanha] as a clear rejection of Ms Merkel's reform programme». (Finantial Times)
Há situações em que os economistas fazem melhores deduções políticas do que os políticos...

Manifestações militares

Não caindo na tentação de proibir a manifestação convocada pelas mulheres dos militares -- logo arranjariam outro estratagema para tentar mais uma e outra vez...--, o Governo preferiu ir "directo ao assunto", ou seja, proibir a participação de militares na dita manifestção, invocando os pertinentes preceitos da Lei de Defesa Nacional e advertindo para as consequências disciplinares do eventual desrespeito desta proibição. No clima de inaceitável complacência em que tem decorrido a agitação militar, é de esperar que o Governo e as chefias militares tenham conseguido passar claramente a mensagem de que desta vez estão a falar mesmo a sério...

A democratização da Constituição

1. Notável a quantidade de pessoas sem formação jurídica que entenderam tomar posição sobre a árida, e controversa, questão constitucional de saber se, afinal, o recomeço do ano parlamentar no dia 15 de Setembro iniciou ou não uma nova sessão legislativa (condição para a validade do novo requerimento do PS a convocar o referendo da despenalização do aborto).
Embora muitas vezes sem uma adequada separação entre os argumentos políticos e a leitura constitucional, é bem-vinda esta "democratização" da Constituição e dos problemas constitucionais. Fomenta a formação constitucional e obriga os constitucionalistas profissionais a apurarem os seus argumentos e contra-argumentos.
2. No Quarta República (um blog sereno da área do PSD), David Justino coloca-me uma dúvida sobre o assunto. Se, como eu defendo, a AR pode ter cinco sessões legislativas no caso de eleições antecipadas, então como é que isso é compatível com o art. 171º-1 da CRP, que diz que "a legislatura tem a duração de quatro sessões legislativas"?
Já expliquei isso aqui, mas não quero fugir a voltar à questão. A razão é simples: o nº 2 do mesmo artigo estabelece uma excepção à regra do quadriénio, quando diz que, em caso de eleições antecipadas, a legislatura da AR então eleita é acrescida da parte da sessão legislativa que estava em curso à data da eleição. Portanto, nesse caso a legislatura comporta mais de 4 anos, pelo que às 4 sessões legislativas normais soma-se o período de tempo que restava da sessão legislativa interrompida pela antecipação de eleições.
É como dizer estas duas coisas: "1. O mês de Fevereiro tem 28 dias. 2. Nos anos bissextos, [porém,] o mês de Fevereiro tem 29 dias". Ou seja, uma regra e uma excepção. Na linguagem legislativa os "porém" e os "contudo" são quase sempre implíticos.
De resto, aquela regra do quadriénio tem uma outra óbvia excepção implícita: quando a AR é dissolvida, a sua legislatura também não comporta 4 sessões legislativas, agora por defeito, podendo ficar reduzida a 3, duas ou uma! Elementar, não é? Os preceitos das leis, mesmo os mais rotundos, não podem ser lidos isoladamente...
3. David Justino pergunta também por que é que no passado, em situações semelhantes, a própria AR considerou que a parte sobrante da sessão legislativa à data da eleição se integrava, sem descontinuidade, na primeira sessão legislativa ordinária da nova AR? A minha resposta também é simples: por inadvertência ou ignorância. Mas nem uma nem outra são modos legítimos de revisão da Constituição.
Aliás, não é esse o único caso, longe disso, em que subsistem durante muito tempo rotinas contrárias à Constituição, sem que os protagonistas se dêem conta disso. Por exemplo, durante muitos anos, a promulgação presidencial dos decretos-leis não era referendada pelo primeiro-ministro, por se entender, erradamente, que bastava a assinatura deste que já constava no diploma quando era enviado para Belém.
4. Invocando uma suposta "golpaça" de Jaime Gama -- que, a meu ver (e de vários outros constitucionalistas, como bem se sabe...), se limitou a cumprir a Constituição e não podia deixar de aceitar o requerimento --, David Justino termina com um rotundo "referendo assim, não!". Sucede que essa matéria vai ser necessariamente apreciada pelo Tribunal Constitucional, quando for chamado a verificar a licitude do referendo. Se o TC concluir que não houve nenhuma ilicitude na convocação do referendo, manterá DJ a sua radical, e temperamental, oposição ao mesmo?

segunda-feira, 19 de setembro de 2005

Correio dos leitores: Contra a municipalização dos centros de saúde

«A propósito do seu post "Fatal" de 16/9 pergunto-lhe se acha descabido que se desconfie da entrega da gestão dos Centros de Saúde (e até, como aqui ou ali se diz, das escolas do ensino básico e secundário) a autarcas como Ferreira Torres e muitos outros como ele, ou quase... Ver a gestão da nossa saúde nessas mãos faz-me arrepiar. De uma forma geral não vislumbro hoje nas autarquias capacidade bastante para, de uma forma honesta (com tudo o que esta palavra implica), gerirem sector tão essencial. Como é que, em tal caso, se faria a ligação necessária com os cuidados de saúde diferenciados ou hospitalares? Seria pacífica essa interligação? Julgo sinceramente que não. É só imaginar-se a conflitualidade, mesmo que artificial, que se criaria entre os dois sectores de saúde se isso servisse mesquinhos interesses eleitoralistas.»
Fernando Barros

Comentário

O poder local não pode ser julgado pelo exemplo que dá, tal como a autonomia regional não pode ser aferida pelo governo da Madeira. Por essa ordem de ideias deveria acaber-se com o poder local e regional e reconcentrar tudo nas mãos do Governo e da administração central. A solução está, porém, em melhorar a governação do poder local, sobretudo quanto à "accountability" e transparência.
Não tenho poupado críticas ao poder local, mas não vejo razão para a demonização que hoje parece estar em moda. A descentralização territorial constitui a base da democracia. Não há razão nenhuma para continuarmos a ser o Estado mais centralizado da Europa ocidental.

Lições alemãs (3)

Uma das conclusões destas eleições alemãs é que o sistema eleitoral germânico -- que combina o apuramento proporcional com a eleição de metade dos deputados em círculos uninominais -- não conduz à bipolarização do sistema partidário. Embora os resultados dos círculos uninominais favoreçam claramente os dois grandes partidos -- apenas 4 dos 299 círculos não foram ganhos por eles (todos em Berlim...) --, já o 2º voto, que determina a distribuição proporcional dos deputados, é muito menos concentrado. Aliás, nestas eleições a soma dos votos SPD+CDU/CSU é uma das mais baixas de sempre (se não a mais baixa), sendo em contrapartida maior a presença dos pequenos partidos no Bundestag. Se não fosse a cláusula-barreira dos 5%, o parlamento teria ainda maior número de partidos representados.
Estes dados são importantes para nós, visto que existe um projecto do PS (no essencial apoiado pelo PSD) de reformar o nosso sistema eleitoral no sentido do alemão. Ora a oposição dos demais partidos a essa reforma baseia-se essencialmente na objecção de que essa reforma fomentará uma bipolarização favorável ao PS e ao PSD. Os resultados destas eleições alemãs mostram que esse argumento precisa de ser reconsiderado.

Lições alemãs (2)

Compreende-se a satisfação pós-eleitoral do líder do SPD. Contra todas as previsões, a coligação SPD-Verdes não perdeu eleitorado para a direita (pelo contrário, talvez tenha até obtido ganhos marginais). O SPD perdeu somente para o partido da Esquerda (pós-comunistas mais dissidentes do SPD), mas as perdas são relativamente moderadas (pouco mais de 4%), o que permite considerar sufragadas à esquerda as reformas económicas e sociais desencadeadas por Schroeder. A mensagem do chanceler -- pela reforma do Estado social e da "economia social de mercado", como condição da sua defesa contra os projectos ultraliberais de direita -- encontrou nos alemães um inesperado apoio.
Os que se preparavam para rezar o requiem pelo modelo social europeu têm de adiar as suas exéquias. Mas os que defendem que é possível salvá-lo sem o reformar também levaram uma lição.
(revisto)

Lições alemãs

Provavelmente nunca uma vitória eleitoral teve tanto sabor a derrota; e nunca uma derrota deu tanto a sensação de vitória. A inicial vantagem de 20 pontos percentuais da CDU sobre o SPD esfumaram-se no dia das eleições. Segundo as últimas projecções, Angela Merkel consegue menos de 1 ponto de vantagem nos votos e somente uns 3 ou 4 deputados a mais do que Schroeder (as eleições em Dresden, adiadas para daqui a duas semanas, ainda podem alterar o balanço dos deputados).
Em vez da esperada vitória em toda a linha, a coligação de direita (CDU/CSU mais liberais) é claramente superada pela esquerda, perde terreno em relação a 2002 e fica longe da maioria absoluta, pelo que não conseguirá formar governo (a não ser que -- hipótese pouco provável -- consiga a tolerância de algum outro partido para um governo minoritário). Mesmo que venha a formar-se um governo de "grande coligação", compreeendendo os dois grandes partidos, não será certamente com as políticas da direita, nem com Merkel, rejeitada à partida pelo SPD. A "salvadora" da direita europeia termina a carreira antes de a começar.
Com o "desaire" de Merkel e da CDU saem também derrotadas as ideias-base da sua proposta política, designadamente a visão neoliberal na política social, o "partido" norte-americano na política externa (o insucesso de Merkel é também a derrota de Bush), a ideia de taxa única no imposto de rendimento, a substituição do eixo Paris-Berlim pelo eixo Londres-Berlim como espinha dorsal da UE, o veto da entrada da Turquia na UE.

domingo, 18 de setembro de 2005

A Europa e a «responsabilidade de proteger»

Em artigo publicado pelo EXPRESSO em 6.8.05. sob o título "A EUROPA DA DEFESA" - e que se pode ler também na ABA da CAUSA - defendi a necessidade de investir na Europa da Defesa, considerando, entre outros aspectos,que «a intervenção militar é também uma ferramenta, de último recurso, que deve ser posta ao serviço do direito internacional e do multilateralismo. Ao serviço da «responsabilidade de proteger» que Kofi Annan vem promovendo como principio estruturante de uma ONU reformada, consequência dos direitos humanos e do objectivo da Paz. Principio que decorre do conceito de «segurança humana» e pode assim sobrepor-se à velha «soberania dos Estados».
O conceito da «responsabilidade de proteger» foi, aparentemente, o principal resultado da Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da ONU da passada semana, que tinha desígnios muito mais ambiciosos, incluindo a reforma estrutural da organização. Que ficou no tinteiro, como está a ficar na prática o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, que os ditos Chefes subscreveram solenemente há 5 anos.
Mas a aquisição do principio da «responsabilidade de proteger» como estruturante das relações internacionais e do Direito internacional é, de facto, muito importante - opera uma verdadeira viragem em relação à sacrossanta «soberania nacional», em muitos aspectos desfasada da realidade - da globalização à importância que ganhou a protecção dos direitos humanos. Embora tudo vá agora depender de como o novo princípio venha - ou não - a ser aplicado. E isso depende muito da Europa.