domingo, 20 de janeiro de 2008

Remunerações no sector público

«Sócrates e Cavaco também perdem poder de compra».
Era o que faltava se não fosse assim ("ou há moralidade ou comem todos")! Na verdade, os titulares de cargos políticos até perderam relativamente mais do que a função pública. Não eram só os funcionários que tinham remunerações acima das possibilidades financeiras do Estado, depois das subidas provocadas pelo sistema de remunerações do último Governo de Cavaco Silva e das decretadas por Guterres no seu primeiro Governo.
Quando se sobre demasiado, tem de se descer...

Gratificação

Escandalosamente beneficiada pela Câmara Municipal de Lisboa no negócio dos terrenos do Parque Mayer -- negociata que valeu para já uma acusação penal contra o então presidente da CML e outros vereadores --, a Bragaparques retribuiu a gentileza com uma contribuição para o financiamento do PSD nas eleições municipais de 2005.
É evidente que se trata de "simples coincidência". Mas mesmo que o não fosse, a gratidão nunca ficou mal a ninguém. De resto, depois do caso da Somague, é evidente que há empresas que adoram o PSD.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2008

Governo autárquico (2)

Com a errada fixação na contestação da perda da proporcionalidade na composição da câmara municipal -- esquecendo que ela nunca existiu na junta de freguesia --, a oposição desvalorizou a principal objecção contra o regime em vias de aprovação, que consiste na imposição de executivos maioritários monopartidários mesmo contra uma folgada maioria da oposição na assembleia.
De facto, segundo a proposta PS-PSD a rejeição da junta ou da câmara proposta pelo presidente exige uma maioria de 3/5 na assembleia, o que lhe permite "passar" mesmo que tenha 59% de votos contra. Ora, não sendo o executivo directamente eleito (salvo o presidente), de onde virá a sua legitimidade democrática (seja a junta de freguesia, seja a câmara municipal) para se impor à maioria da assembleia autárquica, essa sim directamente eleita?
Recorde-se que no caso do sistema de governo nacional, nenhum governo pode passar na AR se tiver contra ele uma maioria absoluta...

Governo municipal (1)

Sou insuspeito de apoiar a reforma do sistema de governo autárquico acordado entre o PS e o PSD, que desde há muito critico (por último aqui), entre outros aspectos pelo superpresidencialismo autárquico que a nova lei vai consagrar.
Todavia, não sufrago a principal linha de contestação seguida pela oposição, baseada no fim da proporcionalidade na composição da câmara municipal. Pelo contrário, acho esse argumento totalmente improcedente. A meu ver, não deveria haver nenhuma coabitação forçada entre governo e oposição no executivo municipal, que é insólita no direito comparado. Tomada a opção de suprimir a eleição directa da câmara municipal -- solução perfeitamente legítima, que desde sempre valeu para as freguesias, sem nenhuma reserva --, o "poder executivo" deveria caber ao partido ou coligação maioritário/a na assembleia autárquica, como sucede no caso do Governo da República e nos governos regionais, em que não se concebe a presença da oposição dentro do governo.
O lugar da oposição é na assembleia, devendo ser reforçados e os direitos do partidos de opoisção e os meios de escrutínio e fiscalização da assembleia.

"Porton di nos ilha"

A pedido da autora incluí na Aba da Causa o texto de Maria Manuel Leitão Marques publicado esta semana no Diário Económico, com o título em epigrafe, sobre a "administração electrónica" em Cabo Verde.

"O País inclinado para Sul"

Coligi na Aba da Causa o meu artigo desta semana no Público, com o título em epígrafe, sobre a localização do novo aeroporto de Lisboa.

Discrepância

«Número de desempregados inscritos cai 13,8% em Dezembro».
Alguém consegue explicar convincentemente a discrepância entre estes dados do IEFP, que revelam uma diminuição consistente do número de pessoas à procura de emprego, e os números do INE, que asseveram uma taxa de desemprego muito superior, aliás em crescimento até há pouco tempo?

quinta-feira, 17 de janeiro de 2008

Elementos de teoria e prática democrática

«Nós não vivemos numa República que tenha deferido o poder de legislar a procuradores-gerais adjuntos. (...) Estamos a consagrar reformas que representam o ponto de vista dos eleitos e não de um determinado grupo profissional. (...) Há certas reformas que se as deixamos na dependência dos seus destinatários, corremos o risco de não as realizar». (Alberto Costa, ministro da Justiça, entrevista à revista "Visão", ed. de hoje).

Cartéis

«[Autoridade da] Concorrência multa 4 [empresas] farmacêuticas em 13,4 milhões de euros».
Que a mão não doa à Autoridade da Concorrência!

Remunerações na função pública (3)

Não é preciso ser adivinho para prever para 2009 uma actualização acima da inflação prevista. Como a tradição política indica, em ano de eleições (aliás triplas: europeias, parlamentares e locais) as restrições orçamentais costumam ser atenuadas (embora seja de esperar que a disciplina orçamental não entre em "ano sabático"...).

Remunerações na função pública (2)

Outra questão é a de saber se os rendimentos dos funcionários não devem mesmo sofrer estagnação (ou mesmo alguma redução) em termos reais. Não falta quem o defenda com bons argumentos, quer em termos de sustentabilidade das finanças públicas quer em termos de equidade social.
Por um lado, sendo as despesas públicas com pessoal na Administração Pública muito superiores à média da UE e da OCDE, só há dois meios de a reduzir, ou seja, pela redução de funcionários e/ou pelo crescimento das remunerações abaixo do crescimento do PIB. Por outro lado, um tal congelamento (ou mesmo redução) pode justificar-se em termos de igualdade, considerando que as remunerações da função pública são em muitos casos superiores às do sector privado (o mesmo sucedendo com as suas pensões) e que os funcionários gozam de muitas outras vantagens (menor horário de trabalho, mais férias, menor desconto para a segurança social, um subsistema de saúde privativo que a respectiva taxa não dá para sustentar e, sobretudo, uma muito maior segurança no emprego).

Remunerações na função pública (1)

O Público de ontem destacava na 1ª página o seguinte: «Se se mantiver a tendência dos últimos anos e as previsões do Governo para a inflação falharem, os trabalhadores do Estado vão em 2008 perder poder de compra pelo nono ano consecutivo.»
Mas uma coisa é o aumento da tabela salarial e outra o aumento do rendimento, em geral maior, entrando em conta com subsídios complementares e sobretudo com as progressões. Mesmo com uma actualização da tabela abaixo da inflação o aumento do rendimento dos funcionários pode ser superior à subida dos preços. O único meio de saber é pelo cálculo do rendimento per capita, dividindo os gastos efectivos com pessoal pelo número de funcionários.
A referida perda de poder de compra só se deve ter verificado desde que Manuela Ferreira Leite decretou em 2003 o congelamento das remunerações e das progressões. Já não é seguro que se verifique em 2008, se a taxa de inflação não for muito superior à prevista e se houver descongelamento das progressões, como previsto.

Mais uma prova da cavilosa "destruição do Estado social"...

«Menos cem mil pobres».
(Ou como se desfaz a ideia de um generalizado "aumento da pobreza"...).

Reconhecimento

Sim, a recuperação do notável Mosteiro de Tibães (Braga), onde vai decorrer a cimeira luso-espanhola, deve muito ao empenho de Ademar Ferreira dos Santos. (Também andei por lá nos anos 80...)

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

"TV popular de Lisboa"

Na abertura do telejornal, a RTP, serviço público de televisão, dedicou 9-minutos-9, depois acrescentados com mais duas intervenções, com vários "directos" e tudo, ao estranho caso de um esquisito mau-cheiro numa zona de Lisboa (que inicialmente se supunha ser gás), e que não causou nenhuns danos materiais ou humanos.
Para além da manifesta desproporção, mais própria de uma "televisão tablóide", cabe perguntar se a RTP dedicaria a mesma atenção ao acontecimento se ele tivesse ocorrido noutra cidade...

Referências

Passa hoje o aniversário da morte de Manuel da Silva Passos (16 de Janeiro de 1862), que ficou conhecido para a História por Passos Manuel, combatente liberal, democrata, proto-republicano e progressista, figura maior do "setembrismo", cujas numerosas reformas governativas (1836-37), sobretudo no campo da educação (criação dos liceus), da cultura (Academia de Belas Artes e Teatro Nacional) e da administração territorial (distritos, concentração dos municípios e descentralização municipal) marcaram decididamente o futuro de Portugal até hoje.
Uma das referências históricas da nossa modernidade política.

Não é bem assim...

Diz o Diário de Notícias de hoje sobre a retirada dos juízes e dos magistrados do Ministério Público da lei do regime do emprego público:
«O TC tinha chumbado a inclusão no diploma dos magistrados judiciais, aliás um dos aspectos que tinha suscitado reservas em Belém.
Porém, já não tinha feito o mesmo em relação ao magistrados do Ministério Público. Por outras palavras: para efeitos da lei, os procuradores continuavam a ser considerados funcionários públicos, tornando-se dependentes do poder político
A última consideração não faz sentido. Embora os magistrados do Ministério Público, diferentemente dos juízes, sejam agentes hierarquicamente subordinados e responsáveis, como é próprio dos funcionários públicos, pertencem porém a uma instituição autónoma em relação ao poder político, pelo que não dependem do Governo (mas sim do PGR). Isso não depende de eles estarem incluídos ou não na referida lei, que nunca poderia afectar nem a sua subordinação funcional nem a autonomia constitucional do Ministério Público.
Não há nenhuma relação necessária entre o estatuto de funcionário e a autonomia em relação ao Governo. Por exemplo, os professores universitários são funcionários públicos e todavia poucas pessoas são politicamente mais independentes do que eles (não é por acaso de muitos comentadores políticos são professores...), justamente por as universidades serem autónomas face ao Governo. Em contrapartida, há dirigentes e gestores públicos que, embora não sendo funcionários públicos, dependem do Governo.

Peixeirada

Quem observe a campanha eleitoral na Ordem dos Médicos -- ao nível de qualquer peixeirada no mercado da Ribeira (sem desdouro para peixeiras desavindas) -- há-de perguntar-se se tal é digno de uma instituição pública.
Simplesmente disgusting!

Cadilhe

Depois da sua pesada derrota nas eleições da administração do BCP (ficando por uns humilhantes 2%), não fica bem a Miguel Cadilhe atacar a CGD por ter participado na votação. Primeiro, cabe à CGD defender os seus interesses accionistas no BCP; segundo, mesmo que a CGD se tivesse abstido de votar, o resultado não seria diferente; terceiro, é de perguntar se a reacção teria sido a mesma se a CGD tivesse votado... nele.
O ressentimento na derrota, ainda por cima anunciada, não é próprio de pessoas do (grande) gabarito de Cadilhe.

Constâncio

Realizada a eleição da administração do BCP, não subsiste nenhuma razão para adiar a audição parlamentar do Governador do Banco de Portugal. Aliás, é do seu próprio interesse o cabal esclarecimento das questões relativas à supervisão do BCP, até para atalhar de vez à campanha de insinuação e denegrimento contra si movida pelo CDS e pelo PSD.

"Mais uma medida neoliberal contra o Estado social"

«Pré-escolar: Governo quer 100% de cobertura em 2009».

E não podem antecipar o grande momento?

«Jardim estará com madeirenses quando povo quiser independência».

terça-feira, 15 de janeiro de 2008

Visita ao Iraque - 6



Não é turismo. É a prova que já se podem fazer coisas normais, numa zona como a Provincia de Nassiria, que está hoje segura, graças ao controle das forças políticas (e das forças armadas) iraquianas.
Na foto de cima, tirada no topo do milenar zigurate sumério de Ur, que o boçal Saddam mandou "restaurar" com cimento, vê-se a Base de Talil, onde estiveram os militares portugueses da GNR em 2003 e 2004.
PS. O seu a seu dono: as fotografias com datas são tiradas com a minha máquina. As outras são de Angus Beaton.

Visita ao Iraque - 5


A beleza dos "marshes" (a ria, creio que se poderá dizer em português) em torno de Nassiria é incrível. Vi paisagens que devem estar como em tempos bíblicos. Mas só 40% da àgua voltou, despois de destruidas as barragens de Saddam. A Turquia também continua a reter água do Eufrates... Boa parte da fauna e do equilibrio ecológico poderá estar definitivamente destruido. E a pobreza e abandono das gentes é evidente e confrangedora.

Visita ao Iraque- 4

Ouvindo as queixas dos líderes tribais dos "marsh people" - eu, o governador da provincia de Nassiria e os ministros que acompanhavam. Chegou o tempo de falar e exigir, para populações terrivelmente brutalizadas pelo regime de Saddam.

Visita ao Iraque -3


O que é que querem ser quando forem grandes? A maioria das raparigas queria ser "doktor"...
Visitando escolas nas aldeias, muito, muito pobres, de Al Islah e Al Fuhud, na ria, nos arredores de Nassiria. Meninos e meninas filhos de gente que sofreu a mais sinistra repressão por parte do regime de Saddam Hussein, incluindo o "refinamento" de construir de barragens para secar a ria, extinguindo os "marsh people" através da extinção do seu "habitat" natural.

Visita ao Iraque -2

Com o Primeiro-Ministro Al Maliki, dia 11 de Janeiro.
Comigo na foto, a minha colega Baronesa Emma Nicholson (Liberal-Democrata, Grã-Bretanha), o Ministro e porta voz do governo iraquiano Ali Al Dabagh, e o Representante da Comissão Europeia em Bagdad, Embaixador Ilkka Usitallo (todos essenciais para organizar o programa de contactos durante a estadia).

Visita ao Iraque -1

Acabo de regressar de cinco dias passados em visita ao Iraque, repartidos entre Bagdad e Nassiria e arredores, entre 10 e 14 de Janeiro. Fui recolher dados para escrever um relatório sobre o papel da Europa no Iraque, relatório de que fui encarregue no Parlamento Europeu. Como é óbvio, recuso-me a escrever "relatórios de sofá": por isso fui ao terreno, falar com quem devia - autoridades iraquianas, parlamentares, ONGs, representações diplomáticas da UE e simples elementos do povo. E não descurei, evidentemente, a ONU e a chefia militar americana no terreno.
A recepção pelos interlocutores iraquianos não podia ter sido mais calorosa e desejosa de reforço da presença europeia no Iraque em todos os campos.
Escreverei aqui sobre o que vi e descobri. Mas, para já, deixo uma curta reportagem fotográfica.


No Parlamento iraquiano, dia 12 - foi-me dado o privilégio de falar ao Plenário. E de assistir à votação, entrecortada por vivas intervenções, da Lei de Verdade e Reconciliação (também chamada de des-bathificação).


Com membros da Comissão das Mulheres e Crianças do Parlamento Iraquiano, 12 Janeiro.

Sofisma

«(...) 80 por cento [dos proprietários de estabelecimentos de diversão nocturna] disseram que não concordam com a lei [do tabaco] e afirmaram que, se pudessem, optavam por manter o fumo de cigarro livre nos seus estabelecimentos
Mas o que é que os proíbe de optarem por espaços separados para fumadores? De resto, os bares que tenham menos de 100 m2 podem ser integralmente destinados a fumadores. Basta-lhes cumprir os requisitos da lei, designadamente quanto à sinalização e à ventilação apropriada.

Referendo

Mesmo na Irlanda não existe propriamente um referendo obrigatório dos Tratados da UE. O que sucede é que, como a Constituição irlandesa não tem uma cláusula geral sobre a UE -- como a Constituição Portuguesa --, sempre que há um novo Tratado é necessário alterar a Constituição para permitir especificamente a sua ratificação, como tem sucedido com todos os tratados de revisão, desde a adesão da Irlanda à então CEE. Ora na Irlanda as revisões constitucionais têm de ser aprovadas por referendo.
O que há portanto é um referendo constitucional obrigatório, sendo a ratificação dos tratados depois feita por via parlamentar, como sucede nos outros países. Mas é claro que sem esse referendo constitucional prévio não pode haver ratificação do Tratado. É evidente que substancialmente o referendo acaba por versar sobre autorizar, ou não, a ratificação do Tratado. Porém, formalmente, o referendo não tem por objecto directo o próprio Tratado mas sim a alteração do art. 29º, nº 4, da Constituição Irlandesa.