terça-feira, 2 de dezembro de 2008

Mistério

Não sei o que mais me espanta nesta lamentável história do Estatuto dos Açores: se a rotunda insensatez política do PS, ao insistir numa solução que antes de ser inconstitucional é politicamente insustentável, se o estranho mistério que faz com que os dois grandes partidos nacionais percam a sua independência decisória em tudo o que respeita às regiões autónomas e se tornem reféns dos seus ramos regionais, lá onde têm o poder.

Gente grada

Era fatal que, estando em risco a fortuna de tantas figuras gradas e de tantas respeitáveis instituições, o BPP "tinha" de ser salvo, apesar da sua irrelevância no sistema financeiro e na economia real (como aqui se registou)...
Para falar só nos grandes accionistas, quanto é que Rendeiro, Saviotti, Balsemão, Vaz Guedes e Cia. -- que vêem o banco e o seu próprio cabedal salvos da falência -- ficam a dever à diligência de Constâncio para encontrar uma solução e à disponibilidade do Governo para dar o aval do Estado à operação de resgate do BPP por vários bancos comerciais?
O mínimo que se pode exigir, a bem da transparência, é a divulgação de todos os pormenores da solução encontrada e, já agora, da identidade dos felizes contemplados com esta antecipada prenda natalícia...

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

Imunidade bancária

A crise financeira internacional decretou uma excepção na lei das falências: os bancos ficam excluídos. Em nome da protecção dos depositantes e da estabilidade sistémica (ou até do "bom nome financeiro do País", como alguém disse entre nós a propósito do BPP...), os Governos garantiram a estabilidade bancária, seja pela injecção de dinheiro público nos bancos ou por meio de garantias públicas. Assim salvaram não somente o dinheiro dos depositantes (que sempre teriam o seguro de depósitos, embora limitado), mas também o dos acccionistas, que o perderiam em caso de falência.
Doravante, portanto, os investimentos em bancos deixaram de estar expostos ao mais importante risco de uma economia de marcado, o risco do negócio. Quando as coisas correrem mal, o Estado vem salvar. Há assim um seguro implícito contra a falência na actividade bancária. Ao menos não seria justo que esse valioso seguro fosse compensado através de mais estrita supervisão e de maiores impostos sobre os lucros e os dividendos, do que as actividades económicas que não gozam de tal privilégio?

Inquéritos parlamentares

Tenho um entendimento restritivo sobre o âmbito dos inquéritos parlamentares, que não deveriam incidir sobre organizações nem comportamentos privados, a não ser em conexão com actos ou omissões dos poderes públicos e da Administração pública.
Os inquéritos parlamentares deveriam ser um instrumento da função política e legislativa da AR, especialmente a fiscalização política do Governo e da Administração. A Assembleia da República também não deveria duplicar a função judicial, muito menos em matéria penal.
Por isso, não concordo com algumas propostas vindas a público sobre a missão do inquérito parlamentar ao caso do BPN.

Aviso

O El País noticia que em 2002 os Estados Unidos pediram autorização ao Governo espanhol para uma eventual utilização de aeroportos espanhóis para escala no transporte de alegados prisioneiros talibans para Guantánamo.
Será que também fizeram igual pedido ao Governo português (pelo que não poderia ser invocado desconhecimento de tais voos...), ou os norte-americanos prescindiram dessa "deferência" em realação a Lisboa?

sábado, 29 de novembro de 2008

Queda livre

O "milagre económico irlandês", que tantos analistas portugueses invejavam, não resiste à crise internacional e dá mostras de acabar em desgraça. Muito dependente do investimento e das trocas comerciais com os Estados Unidos, a Irlanda foi dos primeiros países europeus a entrar em recessão. Segundo previsões do Economist um crescimento de 5% em 2007 afundou para -2% no corrente ano! No próximo ano, o défice orçamental vai subir para 7% e o desemprego pode atingir os 10%...
Aditamento
Além do milagre económico, outra vítima da crise na Irlanda pode ser o Tratado de Lisboa, se for sujeito a novo referendo no próximo ano.

Até a Suécia!

Juntando-se a vários outros países desenvolvidos, também a Suécia entrou em recessão. As previsões incluem o agravamento da recessão em 2009, com um decréscimo do produto de 1,6%, e uma taxa de desemprego de quase 10% em 2010.
A crise não escolhe as sua vítimas...

A lição

A crise financeira e bancária mostrou quão essencial é haver um banco público como CGD, não só como esteio do sistema bancário, mas também como instrumento de socorro dos bancos em dificuldades (incluindo os bancos dos ricos...).
Seguramente que nos próximos anos os nossos liberais dogmáticos (incluindo António Borges, Pedro Passos Coelho e outros, no PSD) vão esquecer a sua defesa da privatização da CGD. É a lição mínima a retirar da crise em Portugal...

Eloquente silêncio

Os que andaram vinte anos numa cruzada contra intervenção do Estado na economia ("o Estado é o problema, não a solução" -- pregava Reagan) assistem sem protestos à heresia da salvação do sistema bancário pelo Estado.
Resta saber quantos têm a coragem de Alan Greenspan, para confessarem que se enganaram...

sexta-feira, 28 de novembro de 2008

Reorganizar a Esquerda

A perguntas da jornalista Hermana Cruz, do JN, sobre o tema "reorganizacao da Esquerda", eu respondi assim:

1 - Parece-lhe que está para breve uma reorganização da Esquerda? Parece-lhe inevitável?
Não sei, mas se fosse a reorganização da Esquerda dentro do PS para combater o "centrão dos interesses", eu apoiava.
Não.
2 - Que tipo de organização prevê? O surgimento de um novo partido? Composto por quem? Por dissidentes do PS, BE e PCP?
Não prevejo. Nem acredito em nenhum novo partido...
3 - Que efeitos um cenário desses poderia ter no PS e até nas pretensões do Centro-Direita regressar ao poder?
Um novo partido que retirasse votos ao PS contribuiria certamente para entregar o poder à direita do PSD e CDS-PP. E o "centrão dos interesses" continuaria de vento em popa.
4 - Quem poderia ser o rosto dessa nova Esquerda? Manuel Alegre? Carvalho da Silva?
Não vejo nesses nomes uma nova Esquerda. Só a velha - e por ela os respeito.

quinta-feira, 27 de novembro de 2008

Resguardar o Presidente

Estou de acordo com a necessidade de resguardar o Presidente da República do lodaçal do BPN. Mas, como já escrevi, essa preocupação deve começar pelo próprio Cavaco Silva, que deve evitar a sua exposição pública às armadilhas que lhe têm lançado, como a de Dias Loureiro.

Esquerdas

Eis por que me parece um tanto fútil o tema da "reorganização da Esquerda".

Serviços públicos

Um dos temas de abertura do Fórum da Fundação Res Publica versa sobre a provisão pública de serviços públicos, com contribuições iniciais de A. Correia de Campos e de mim próprio. Qual é o fundamento e qual deve ser a extensão da provisão pública?
Dada a sua actualidade e importância política do tema, é bem-vinda a participação dos interessados.

Sem emenda

Na sua obsessão contra o investimento público, mesmo na actual fase recessiva da economia, em que ele é decisivo, a líder do PSD veio insistir no seu combate aos projectos de obras públicas, embora, mais uma vez, sem discriminar quais deveriam ser suspensos.
Ora, uma das medidas do "Plano de recuperação económica" anunciado pela Comissão Europeia recomenda justamente o investimento em infra-estruturas, nomeadamente nas redes transeuropeias (de que faz parte o nosso TGV), ao mesmo tempo que antecipa a libertação das respectivas comparticipações comunitárias, pelo que esta vantagem se perderia, se não se avançasse a todo o vapor com esses projectos.
Decididamente, Manuela Ferreira Leite coloca os seus preconceitos acima dos interesses do País.

quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Mumbai

São agora 7 da manhã deste outro lado do mundo, em Port Moresby, Papua Nova Guiné - (uma espécie de Timor na paisagem, para pior - suspeito - na vida das gentes, horas de voo para lá de Dili), onde uma Assembleia Parlamentar UE-ACP nos fez aterrar.
Os sonos trocados facilitaram que, há duas horas, as imagens dramáticas de Bombaim na CNN me tenham subitamente despertado.
Impossível voltar a adormecer: recordações ao galope dos atentados terroristas que vivi em Jacarta, vendo células locais da Al Qaeda afinarem a táctica do ataque a "soft targets", em especial shoppings e hoteis cheios de estrangeiros.
Impossível voltar a adormecer: os atacantes de Mumbai ainda não foram controlados, a acção terrorista continua, não se sabe quantos mortos e feridos, admite-se que haja reféns, o pânico paraliza a cidade...
Impossível voltar a adormecer: ligam jornalistas de Portugal a tentar apurar se há portugueses numa delegação do PE que estará na Índia...
Impossível voltar a adormecer: a gaveta do fundo reaberta - impossível deixar de pensar como um horror destes seria "canja" no nosso jardim à beira-mar plantado...
Impossível voltar a adormecer: a lição de Jacarta faz subir a adrenalina - sobretudo não fazer o jogo dos terroristas, deixando de fazer a vida normal.
Oiço o meu colega catalão Ignacio Guardans Cambó na CNN, confinado num dos hoteis atacados em Mumbai: afinal está lá mesmo uma delegação do PE. Força, pessoal!

BCE

Depois das consistentes previsões de inflação bem abaixo dos 2%, e mesmo de deflação em algumas economias, em consequência do clima económico recessivo, de que está à espera o BCE para cortar substancialmente na taxa de referência, como aliás já deveria ter feito, de modo a contribuir para a reanimação da economia?

Irresponsabilidade

Considero excessiva, desde o início, a proposta de aumento remuneratório da função pública, de 2,9%, bem superior à inflação que o Orçamento estimava para 2009 (2,5%).
Mas agora que as previsões da OCDE apontam para uma inflação muito inferior (1,3%), em consonância com a recessão económica prevista, o aumento real dos salários públicos (1,6%) será um dos maiores de sempre. Neste sentido, a reivindicação sindical de uma subida de 3,5% ou mais revela novamente a irresponsabilidade política e social destes sindicatos.

terça-feira, 25 de novembro de 2008

Coisas mundanas

Penso que, com a multiplicidade de declarações públicas sobre o caso Dias Loureiro, o Presidente da República se está a deixar enredar desnecessariamente no caso BPN. Devia ter ficado pela nota à imprensa, sem mais comentários, cortando cerce a especulação nascente.
A meu ver, o PR deve preservar uma prudente distância em relação às coisas mundanas que os media adoram. O papel de supervisão do sistema político que lhe cabe só ganha em acentuar as facetas da discrição e da autoridade prudente, se não mesmo de alguma "majestade"!

Governar compromete

«Concelhia do BE propõe fim do "entendimento" com Sá Fernandes».
Como já se sabia, o BE é incompatível com a função de governo. No seu ADN político só cabe a função de protestar. Governar suja as mãos...
Mas ainda há quem pense num "governo de esquerda plural" com o BE. Quanto tempo duraria tal governo?!

"Outubro"

A partir de agora assumirei também uma colaboração bloguística no blogue "Outubro", publicado pela novel Fundação Res Publica.

"Não há dinheiro para nada"

Com esta frase assassina pronunciada há poucos meses, a líder do PSD pretendeu liquidar os projectos de obras públicas desde há muito anunciados, apesar de na sua maior parte não dependerem de investimento público. Como, entretanto, todos eles têm vindo a ser concretizados e como, também, o agravamento da crise económica tornou lugar-comum a absoluta necessidade de investimento, a autora "meteu a viola no saco".
No entanto, importa recordar aquela posição, para mostrar a imprevidência e a irresponsabilidade política do PSD naquela demagógica tentativa de parar os referidos investimentos.

Rever a situação

O orçamento para 2009 vai ser aprovado dentro em breve mantendo os parâmetros fundamentais com que foi inicialmente apresentado, incluindo a previsão de receitas e despesas e do défice orçamental, bem como de crescimento e de desemprego. Entretanto, porém, a situação internacional degradou-se acentuadamente, não sendo realista prever que Portugal escapará à recessão nos próximos meses. Resta saber com que intensidade e duração.
Por isso, o orçamento sai antecipadamente enfraquecido com a forte probabilidade de divergência com realidade financeira que há-de vir. Mas dada a grande incerteza e volatilidade da evolução no próximo futuro, faria algum sentido mexer nos dados orçamentais, apesar de claramente desactualizados?
Aditamento
Uma oportuna alteração orçamental permite aumentar o endividamento público, bem como o défice, até 2,7%. Com isso, o orçamento ganha margem para acomodar um esforço adicional do Estado no combate à possível recessão.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Apoiado

«O caso do Banco Privado Português é muito diferente do Banco Português de Negócios. Usar o dinheiro dos contribuintes para salvar o banco gerido por João Rendeiro, uma instituição de gestão de fortunas e sem risco para o sector financeiro, seria efectivamente socializar prejuízos. Os accionistas do banco têm de suportar as perdas tal como no passado ficaram com os ganhos. O mercado é isso mesmo.» (Editorial do Jornal de Negócios de hoje)

Conflito de interesses

«Confrontado pela SIC com a compatibilidade das duas funções [membro da direcção da Ordem dos Economistas e presidente da Autoridade da Concorrência] Manuel Sebastião disse que no seu caso não vê qualquer incompatibilidade.»
Independentemente da questão da incompatibilidade legal, o problema é que sob o ponto de vista do direito da concorrência as ordens profissionais são equiparadas a "associações de empresas", estando portanto sujeitas à jurisdição da AdC. E o facto de algumas ordens terem sido punidas (e bem!) por práticas restritivas da concorrência mostra a relevância da questão...
Aditamento (25 Nov.)
«Manuel Sebastião pediu suspensão do cargo de direcção da Ordem dos Economistas».
Fez bem.

Há lugar para alguma dúvida séria?!

«Dias Loureiro admite renunciar [ao Conselho de Estado] se situação incomodar PR».
Será precisa alguma explicação do próprio para tornar evidente o incómodo do Presidente?!

Unicidade

No PCP os princípios leninistas do "centralismo democrático" continuam firmes. O próprio comité central cessante aprova, sob proposta da direcção, a lista para o novo comité central (ou seja votam a sua própria continuidade...), bem como a proposta das "teses" a submeter ao congresso. No congresso não há alternativas. Os delegados -- em geral também propostos por cima, sem alternativa -- limitam-se a ratificar as propostas oficiais. Normalmente, por unanimidade ou quase.
Lá "centralismo", é seguramente; "democrático", é que se não vê como possa ser...

"Smearing"

«BPN: Cavaco Silva contra "tentativas de associar" o seu nome ao banco».
Fez bem. Já lhe basta o incómodo de ver seus antigos colaboradores e amigos envolvidos na comprometedora história. Os titulares de cargos políticos, a começar pelo Presidente da República, também têm o direito de defender o seu bom nome e reputação contra as acções de "smearing" que muita imprensa pratica. Ao contrário do que pretende uma visão absolutista da liberdade de imprensa, os políticos não perdem o direito à honra só pelo facto de o serem.

sábado, 22 de novembro de 2008

No lugar próprio

Ao contrário do que muitos defenderam, não havia nenhum cabimento para deixar falar Dias Loureiro na AR. Não existe nenhum direito individual de audição parlamentar, nem havia nenhum processo parlamentar em que a audição se pudesse enquadrar. A AR não pode ser instrumentalizada ao serviço de interesses individuais.
Tal como os demais protagonistas, Dias Loureiro deve ser ouvido, sim, no âmbito do inquérito parlamentar que acaba de ser aprovado sobre a gestão do escabroso dossier da SLN e do BPN pelas autoridades públicas competentes, a começar pelo Banco de Portugal. Mas aí vai responder a tudo o que tiver de esclarecer, face aos dados que o inquérito proporcionará, e não somente ao que ele queria dizer.
A adivinhar pelo que ficou por dizer na entrevista soft que a RTP lhe prodigalizou, há muita coisa que ele vai ter de explicar...

Apoiado

«Juízes rejeitam participação em órgãos desportivos e cargos de confiança política».
Há muito tempo que sou dessa opinião.

Cinco anos

Tantos perfaz hoje o Causa Nossa, nascido de uma contingente tertúlia de amigos, inconformados com a situação política nacional e internacional dessa época. Em 2003 Durão Barroso era primeiro-ministro e G. W. Bush estava no seu primeiro mandato na Casa Branca, tendo lançado nesse mesmo ano a Guerra do Iraque.
Em cinco anos muita coisa mudou, tanto em Portugal como no mundo. Mas há coisas que permanecem. Por nossa parte, julgamos não ter defraudado os propósitos enunciados no nosso estatuto editorial de 22 de Novembro de 2003.
Assim continuaremos.