terça-feira, 12 de outubro de 2010

PCP pelo PCC (pelo capitalismo chinês)!

O PCP veio criticar o Comité Nobel pela atribuição do Prémio Nobel da Paz ao corajoso lutador pelos direitos humanos chinês Liu Xiaobo - cuja mulher acaba de ser posta em prisão domiciliária só por ter ido à prisão comunicar-lhe a noticia da atribuição do Prémio.
Já sabiamos que o PCP desdenha dos que se batem pela democracia e os direitos humanos para defender certas ditaduras: da URSS à Coreia do Norte, passando por Cuba. Por isso não espanta que assuma as dores da ditadura do PCC-Partido Comunista da China. O que importa notar é que assim também se converteu em defensor de um regime que se distingue na prática do mais selvagem e predador capitalismo.
Nada tenho a ver com o PCP. Mas, como portuguesa, democrata e respeitadora do papel que o PCP teve na Resistência Anti-fascista em Portugal, sinto-me envergonhada com este posicionamento do PCP. Sei que há militantes do PCP que me acompanham.

Em memória de Paula Escarameia


Procura-se no google uma fotografia e só sai esta, antiga e esbatida, e uma outra, ainda mais pequenina. Em contrapartida, capas de livros, artigos, intervenções sobre Timor Leste e diversos temas de Direito Internacional, em várias linguas - uma profusão.
O que diz muito sobre a Mulher - com M grande - que deixou este mundo há precisamente uma semana, no dia em que a República fez 100 anos: Paula Escarameia.
Uma Mulher que honrou a República e que prestigiou Portugal, suscitando por todos os areópagos políticos e académicos internacionais por onde passou não apenas admiração pelas suas formidáveis capacidades como jurista, como também reconhecimento pelas contribuições portuguesas que projectava, com criatividade e espírito construtivo.
Uma professora catedrática que não queria atrair atenções para si, mas era afirmativa e voluntariosa na defesa e aplicação dos principios e preceitos da lei internacional - que conhecia profundamente e que ajudou a fazer, empenhadamente. O Estatuto de Roma, do Tribunal Penal Internacional aí está, cheio de dedadas indeléveis da Doutora Paula Escarameia.
Trabalhamos anos, sem nos conhecermos pessoalmente, em sinergia pela libertação de Timor Leste, eu no MNE, ela na Plataforma de Juristas por Timor Leste, que fundou. Conhecemo-nos em Londres em 1993, numa sessão na "Bar Association" sobre Timor Leste. Reencontrámo-nos em Outubro de 1996 em Nova Iorque, na ponta final da campanha eleitoral para Portugal ter assento no Conselho de Segurança no biénio seguinte; e celebramos então conjuntamente, na nossa Missão junto da ONU, a vitória. Trabalhamos depois juntas, dois anos, na Missão em Nova Iorque - eu na nossa Delegação no Conselho de Segurança, ela representando-nos na 6a. Comissão da Assembleia Geral, a jurídica. Depois do meu regresso de Jacarta em 2003, reencontramo-nos algumas (poucas) vezes mais, em Lisboa, nos jantares da Associação Portuguesas de Mulheres Juristas e pelas causas que partilhavamos - Timor Leste, a ONU, o Direito Internacional...
Da Assembleia Geral à sua eleição para a prestigiada e prestigiosa Comissão do Direito Internacional da ONU foi um pulinho. Para ela. Porque era a Doutora Paula Escarameia - Portugal só ganhou por tabela, por ter sabido candidatar quem tinha já créditos estabelecidos nos meios jurídicos internacionais.
No passado 5 de Outubro a República ficou mais baça por ter perdido, com apenas 50 anos de idade, tão brilhante jurista, diplomata e dedicada professora.
A ONU - com os sucessos e os falhanços de sermos nós todos, de representar todos os nossos Estados - perdeu mais do que a diplomata e a jurista: perdeu uma convicta activista e advogada de defesa. Da ONU e da "rule of the law" planetariamente.
Se estivesse ainda entre nós, a Paula Escarameia hoje teria vibrado com a eleição de Portugal para o Conselho de Segurança. E, ao mesmo tempo, tal como eu, teria sentido o coração apertado pelo tremendo peso da responsabilidade e alguma incerteza.
Importaria que no MNE se dedicasse à memória de Paula Escarameia a eleição de hoje na ONU. Para que na nossa acção no Conselho de Segurança, nos próximos dois anos, nunca nos faleçam os valores, os principios e a letra do Direito Internacional, incluindo o Direito Internacional dos Direitos Humanos.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

A República e as Mulheres

Hoje, a República Portuguesa tem mulheres profissionais, civis e militares, integradas em missões internacionais humanitárias, de manutenção da paz, de construção nacional; tem mulheres jornalistas a cobrir intrepidamente conflitos em todo o mundo; tem mulheres diplomatas nos postos mais dificeis e perigosos; tem observadoras eleitorais nos confins mais inóspitos do planeta, sem sequer o enquadramento logistico e de segurança de uma missão de paz.
As mulheres desta República Portuguesa estão fartas de dar provas de que são capazes e confiáveis em todos os desempenhos profissionais, incluindo nas Forças Armadas e de Segurança. Estão dispostas a correr riscos, tal e qual os homens, sacrificando se necessário a própria vida. Estão prontas para colocar os seus talentos, as suas qualificações, a sua coragem e a sua energia ao serviço de uma República que só se completará verdadeiramente, democraticamente, no dia em que elas exercerem, em plena igualdade com os homens, todas as responsabilidades da cidadania e da governação do pais.


Extracto de uma intervenção que fiz no dia 2, no Porto, diante da Associação de Auditores de Defesa nacional. E que pode ler-se aqui, na ABA DA CAUSA.

Esta foi a minha forma de celebrar o centenário da República.
Esta é a minha forma de exigir que se cumpra a República. Democraticamente!

Portugal e a politica de comércio internacional da UE

Sendo eu presidente da Comissão de Comércio Internacional do Parlamento Europeu, resolvi organizar em Portugal uma conferência internacional sobre política de comércio internacional da UE depois do Tratado de Lisboa, com incidência especial sobre os "instrumentos de defesa comercial" (antidumping, anti-subsídio, etc.).
A conferência realiza-se depois de amanhã no Palácio da Bolsa no Porto, com a presença do comissário europeu do comércio interncional, Karel de Gucht, do nosso Ministro da Economia, Vieira da Silva, e de vários especialistas nacionais e estrangeiros, além de representantes das associações empresariais interessadas.
A entrada é livre e todos os interessados são bem-vindos. O programa completo é o seguinte.

PROGRAMA PARA CONFERÊNCIA
Política Comercial Externa da União Europeia e
Instrumentos de Defesa Comercial (Antidumping, etc.)

Palácio da Bolsa, Porto, Portugal

8 de Outubro, 2010, 9:30-17:30

9:30 – 10:00: Sessão inaugural
·  Rui Moreira, Presidente da Associação Comercial do Porto
·  Professor Vital Moreira, Eurodeputado e Presidente da Comissão do Comércio Internacional do Parlamento Europeu
·  José António Vieira da Silva, Ministro da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento de Portugal

10:00 – 12h30: O Tratado de Lisboa e a Política Comercial Externa da UE
·  Karel De Gucht, Comissário Europeu para o Comércio Internacional
·  Liliane Bloem, Presidente do Comité sobre Política Comercial do Conselho da UE
·  Professor Vital Moreira, Eurodeputado e Presidente da Comissão do Comércio Internacional do Parlamento Europeu
·  Moderadora: Elisa Ferreira, Eurodeputada


12:45 – 14:30: Pausa para almoço


14:30 – 15:30: Aspectos políticos e económicos dos Instrumentos de Defesa Comercial (Antidumping, etc.)
·  Professor Manuel Porto, Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra
·  Stefaan Depypere, Director de Defesa Comercial na Direcção Geral do Comércio da Comissão Europeia
·  Moderador: Professor Alberto Castro, Docente e Director do Centro de Estudos de Gestão e Economia Aplicada da Universidade Católica Portuguesa


15:45 – 17:15: Utilização dos Instrumentos de Defesa Comercial - implicações práticas para as empresas
·  Armando Coutinho, Delegado Português no Comité Anti-dumping do Conselho da UE, Ministério da Economia, da Inovação e do Desenvolvimento de Portugal
·  Angeles Bosch, Vice-Directora Geral para os Instrumentos de Defesa Comercial, Ministério da Economia de Espanha
·  José António Ferreira de Barros, Presidente da Associação Empresarial de Portugal
·  Moderador: Rui Moreira, Presidente da Associação Comercial do Porto


17:15 – Sessão de encerramento
·  Pedro Lourtie, Secretário de Estado dos Assuntos Europeus de Portugal.
·  Vital Moreira, Eurodeputado e Presidente da Comissão de Comércio Internacional do Parlamento Europeu.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Viva a República!

Participada, animada, elevada, digna da ocasião -- a sessão evocativa do centenário da República esta manhã nos Paços do Município em Lisboa.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Memória da I República

A exposição hoje inaugurada no Ministério da Justiça (Terreiro do Paço) sobre os Ministros da Justiça na I República (começando em Afonso Costa e acabando em Catanho de Meneses) constitui um excelente exemplo de como as comemorações do centenário do 5 de Outubro podem ser aproveitadas para evocar e melhorar o nosso conhecimento sobre a atribulada história da I República. A bela exposição em si mesma, com o seu catálogo, e sobretudo a notável página electrónica sobre a justiça na I República, simultaneamente inaugurada no website do MJ, pela sua riqueza de informação, são uma boa contribuição para ajudar a preencher o défice de saber sobre a história da justiça na I República (não existe nenhum estudo monográfico sobre o tema…).
Se outros ministérios igualmente criados pela I República – Educação, Trabalho, Agricultura – fizessem outro tanto, as comemorações do Centenário teriam contribuído enormemente para inventariar a nossa história política nesses breves e agitados 15 anos, entre a instauração da República e a Ditadura.

Adenda
Entre as obras digitalizadas e incluídas na biblioteca digital contam-se o comentário de Marnoco e Sousa à  Constituição de 1911 e os estudos de Carlos de Oliveira e de Magalhães Colaço à lei da separação do Estado e das Igrjas, obras essenciais da época, que agora passam a estar disponíveis universalmente.
Obrigado José Maglhães!

Duplicidade

O PSD sempre teve a arte de ter uma cara para cada lugar e circunstância: despesista na Madeira e prosélito do corte da despesa pública no Continente, centralista em Lisboa e regionalista no resto do País, etc.
Agora, depois de o PSD ter obrigado o PS (e bem) e aplicar portagens em todas as SCUT, vem o PSD do Algarve propor uma frente de luta contra o fim da SCUT algarvia. Portgens são boas só para os outros...

Bipolarismo

Os jornais andaram meses a clamar por cortes a sério na despesa pública, a fazer coro com Passos Coelho. Agora que o novo programa de austeridade veio a público, apesar de não consistir só em corte da despesa, os mesmos jornais enchem-se de denúncias dos efeitos maléficos do corte da despesa pública!
Não há como estar sempre a favor da onda...

sábado, 2 de outubro de 2010

O outro desafio

Mais complicado do que corrigir o défice orçamental -- que se alcança em dois ou três anos com mais ou menos medidas de austeridade -- é corrigir do défice estrutural de competitividade da economia portuguesa, que está na base do défice externo e do endividamento externo da economia portuguesa e das próprias dificuldades orçamentais do país.
Sem maior competitividade não haverá melhoria das exportações, nem do investimento externo entre nós, nem do potencial de crescimento da economia, nem das perspectivas de emprego, nem aumento da receita fiscal do Estado.
Para melhorar a competitividade há que conter ou reduzir os custos de produção (crédito, trabalho, serviços), aumentar a produtividade (qualificação profissional, inovação tecnológica, organização empresarial), incentivar o investimento nos sectores de bens exportáveis, melhorar as infra-estruturas de transportes (rodoviárias, aéreas, portuárias), manter baixa a inflação interna (controlando ao aumento da procura), reduzir os custos administrativos da actividade empresarial (licenciamentos, etc.), superar as constrições do sistema judicial (cobranças, falências, etc.).

Remunerações no sector público

Desde há muitos que venho defendendo a necessidade de redução do peso orçamental dos gastos de pessoal na Administração pública (bem acima da média europeia), reduzindo os efectivos e contendo o crescimento das remunerações.
O plano de austeridade orçamental agora decretado inclui pela primeira vez uma redução efectiva de remunerações dos escalões mais bem remunerados, maneira drástica de diminuir a despesa a pública. Embora se compreenda a justificação social que levou a poupar ao corte as remunerações menos elevadas, apesar serem em geral melhores do que nas actividades equivalentes no sector privado, a sobrepenalização dos remunerações mais altas (que pode chegar a 10%) vem estreitar ainda mais o leque salarial no sector público administrativo e dificultar o recrutamento de pessoal qualificado nas tarefas mais exigentes da Administração pública.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Virtude da República 2

A organização da Conferência internacional sobre o republicanismos na Universidade de Coimbra ofereceu aos conferencistas e participantes um concerto nocturno no convento de Santa Clara a Velha, com a orquestra Clássica do Centro e o Coro dos Antigos Orfeonistas de Coimbra.
Trata-se de um deslumbrante cenário, depois das grandes obras de recuperação do mosteiro dos aluviões de séculos de inundações do Mondego. Naquele grandioso local, as peças de Barber, R Strauss, Weber, Orff e Verdi, juntamente com José Afonso e José Niza soam ainda maias deslumbrantes.

Virtude da República

O colóquio de ontem sobre o republicanismos na Universidade de Coimbra abriu com um bem conseguido discurso de fundo do Presidente da República. À beira de se candidatar a novo mandato presidencial, Cavaco Silva não quer deixar os créditos republicanos por mãos alheias.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Estado de necessidade

Anteontem, na RDP, expressei o meu ponto de vista sobre o Relatório da OCDE, conhecido na véspera, e sobre as medidas de corte na despesa pública e de agravamento de impostos que o próximo Orçamento do Estado implicaria, face ao crescente endividamento do país, à mercê das altissimas taxas de juros exigidas pelos mercados financeiros.
Ontem à tarde participei na Manifestação organizada pela Confederação Europeia dos Sindicatos, em Bruxelas, contra o “colete de forças” em que a Comissão Europeia, a mando do governo alemão, procura enfiar as economias mais vulneráveis de países como Portugal, como resposta “quadrada” à crise financeira global: a desejável maior disciplina orçamental não pode fazer-se inflexivelmente, à conta do estrangulamento das economias e de quem trabalha; e uma verdadeira recuperação económica europeia só acontecerá, com sustentabilidade, se tiver a criação de emprego como objectivo (e indicador) central e se corrigir os desequilibrios estruturais entre as economias dos seus Estados Membros.
À noite, como todos os portugueses, fui surpreendida na TV com as drásticas medidas anunciadas pelo Primeiro Ministro. À primeira vista correspondem ao que eu esperava – temia, mas esperava. A ver vamos os detalhes quanto à repartição social dos sacrificios.
Hoje, perante a monstruosidade do problema, sinto que não estamos em tempos para tergiversar:
- É tempo de todos os socialistas se unirem, estoicamente, em apoio ao Primeiro Ministro, pela agrura de ter de decretar medidas durissimas e de arrostar com incompreensão e impopularidade.
Com o travo amargo da injustiça de, apesar de fundamentais reformas feitas ainda antes de todos os outros países e da crise eclodir, nos acharmos hoje neste “estado de necessidade” pela selvajaria da lei dos mercados, que esta UE dominada pela direita neo-liberal não tem querido controlar.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Austeridade III

Tendo resistido até agora, o Governo acabou por ter de seguir as pisadas da Grécia, da Irlanda, da Espanha e de outros países em dificuldades orçamentais, reduzindo a massa remuneratória da Administração pública em 5% (poupando, porém, os escalões de remunerações menos elevadas e penalizando as mais elevadas). Tratando-se da principal componente da despesa do sector público, era impossível reduzir tanto a despesa pública sem a diminuir.
Interrogo-me, no entanto, sobre se teria de ir-se tão longe, caso se tivessem evitado algumas medidas tão onerosas nesse capítulo como foi a aumento generalizado de 2,9% nas remunerações para 2009, já em plena crise, e o acordo com os professores, já depois das eleições de há um ano, cujo risco orçamental na altura assinalei aqui e aqui (sem bem me lembro, sem ser acompanhado pelos que sempre clamam pelo corte na despesa pública...).

Austeridade II

Entre as medidas anunciadas conta-se o aumento das contribuições  dos beneficiários para a ADSE, o sistema de saúde privativo do pessoal da Administração pública.
É uma medida positiva, sem dúvida, na medida em que reduz a pesada dependência orçamental do serviço. Mas é pena que não se tenha aproveitado a oportunidade para extinguir a ADSE ou para a transformar num subsistema facultativo inteiramente financiado pelos beneficiários, sem encarfos orçamentais, como desde há muito defendo.

Austeridade

Com vista a aliviar a crescente pressão dos mercados internacionais sobre a dívida pública portuguesa, o Governo resolveu antecipar o anúncio público das medidas de austeridade necessárias para cumprir a exigente meta da redução do défice orçamental para 2011.
Corrigindo a insuficiência das medidas do PEC I e do PEC II, desta vez o Governo seguiu a clarividente máxima politica de que os sacrifícios devem ser anunciados todos de uma vez e com margem de folga suficiente para não ter de haver um agravamento posterior dos mesmos.
Embora sem prescindir de aumento da receita fiscal (redução das deduções fiscais e subida do IVA), como era inevitável, a maior parte do esforço de reequilíbrio orçamental consiste numa forte redução da despesa pública, incluindo a despesa com pessoal da Administração pública, indo assim ao encontro das exigências do PSD.
Dada a dimensão do corte na despesa, seria imperdoável que o PSD insistisse no seu radicalismo sobre "nem um cêntimo de corte nas deduções fiscais", "nem um cêntimo de aumento de impostos" e continuasse a alimentar irresponsavelmente a incerteza sobre a viabilização do orçamento, que seria devastadora para as finanças públicas e para a capacidade da economia de se financiar no exterior.

Não existe uma receita única para a consolidação orçamental

O Prof Avelino de Jesus entendeu seleccionar-me como exemplo da "esquerda convertida" às virtudes disciplina orçamental.
Erra, porém, o alvo. Em matéria de disciplina orçamental e de controlo da despesa pública não sou propriamente um recém-converso. Em 2001 fiz parte da ECORDEP, nomeada pelo então ministro das finanças J. Pina Moura, que apresentou um pacote estruturado de disciplina da despesa pública. Em 2003, governando a coligação PSD-CDS e estando em descontrolo as finanças públicas, apoiei uma iniciativa que propunha um pacto entre o Governo e o PS para a consolidação orçamental. Há muito que me venho batendo pela sustentabilidade financeira do Estado social. Nunca condenei o PEC da UE nem defendi o seu incumprimento, pelo contrário. Tenho proposto ao longo dos anos uma série de medidas concretas para redução estrutural da despesa pública.
Dito isto, o que também sempre sustentei e continuo a sustentar é que não há apenas a cartilha da direita para a disciplina orçamental, que a consolidação orçamental não pode ser instrumentalizada para justificar a manutenção dos privilegios fiscais dos ricos, muito menos para impor a asfixia financeira do Estado social.
Ao contrário do que pensa a direita liberal, não existe uma receita única para a consolidação orçamental, baseada exclusivamente no corte da despesa, especialmente na despesa social, e na desarticulação dos serviços públicos. Foi isso que mais uma vez disse aqui.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Pocock

Esta manhã, no hotel da Quinta das Lágrimas em Coimbra tive o prazer de conhecer pessoalmente e de dar as boas-vindas ao Professor John G A Pocock, que vem participar no colóquio internacional sobre o republicanismo, organizado pela Universidade de Coimbra no âmbito das comemorações do Centenário da República, que decorre na próxima quinta feira (programa aqui), recebendo também amanhã o doutoramento honoris causa, pela sua enorme obra académica.
A contribuição de Pocock para a história e teoria do republicanismo tem o seu ponto alto na obra seminal The Machiavellian Moment: Florentine Political Thought and the Atlantic Republican Tradition (Princeton: 1975), que lançou os fundamentos para a revisitação do pensamento republicano desde as origens da época moderna e da sua influência na pensamento politico norte-americano.
Sem exagero, pode dizer-se que Pocock está na origem do notável renovamento do republicanismo nas últimas décadas, especialmente no mundo anglo-saxónico, mas não só.

Adenda
A presença de Pocock entre nós assume ainda mais importância depois de sabermos que infelizmente o outro grande convidado, Jurgen Habermas, não pode vir, por inesperados motivos de saúde.

Assimetria

Poucas vezes se terá evidenciado uma assimetria tão grande no acesso ao espaço mediático como no caso das deduções fiscais.
Enquanto os beneficiários destas -- os contribuintes com elevados rendimentos e os negócios que delas tiram proveito, como as clínicas e escolas privadas -- podem desenvolver livremente uma vozearia concertada em defesa dos seus privilégios, onde está a voz daqueles que, por terem baixos rendimentos e não pagarem IRS, nem sequer podem descontar fiscalmente a consulta num dentista ou a sua parte nos medicamentos de que necessitam?

Fazer o mal e a caramunha

É evidente que, enquanto se mantiver a dúvida sobre a aprovação de um orçamento credível que garanta a exigente redução do défice orçamental prevista para o próximo ano, vai manter-se, se não aumentar, a pressão dos mercados da dívida pública sobre Portugal. E é evidente que -- como mostra o relatório da OCDE -- ninguém acreditaria num orçamento que prometesse um corte impossível na despesa, sem um contribuição equilibrada do aumento da receita.
Os que alimentam a dúvida sobre o orçamento e depois denunciam o crescimento dos juros da dívida pública portuguesa fazem o mal e a caramunha...

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

O que diz a OCDE (7)

Pela profundidade da sua análise e pela pertinência das suas propostas, o Relatório da OCDE deveria constituir leitura obrigatória para políticos, empresários e dirigentes sindicais, comentadores e jornalistas. Não obviamente para seguir acriticamente o que nele se diz, mas sim para fundamentar um debate racional -- em vez da prevalecente crispação politicamente sectária -- sobre os problemas do país e os meios para lhes responder.

O que diz a OCDE (6)

O Relatório confirma a natureza dualista do mercado de trabalho em Portugal, com excessiva protecção dos trabalhadores a tempo indeterminado à custa da excessiva precariedade dos trabalhadores temporários. Apesar da melhoria trazida pela recente revisão do Código do Trabalho, muito resta por fazer para aumentar o equilíbrio nas relações de trabalho entre nós.

O que a OCDE diz (5)

Sem surpresas, o relatório da OCDE confirma que entre as causas da baixa competitividade da economia nacional -- que alimenta o défice da balança comercial e gera o endividamento externo da economia -- está a baixa produtividade, os elevados custos unitários do trabalho e os altos encargos dos serviços para a indústria (non tradeables to tradeables).
Manifestamente este é o problema mais grave do País, bem mais difícil de resolver do que o actual desequilíbrio orçamental, que pode ser resolvido, com mais ou menos austeridade, num par de anos.

O que diz a OCDE (4)

O relatório da OCDE considera essencial, para um país periférico como Portugal o investimento em infra-estruturas de transportes, incluindo o novo aeroporto de Lisboa e o projecto de alta velocidade ferroviária, aconselhando a sua retoma, logo que as condições financeiras do País o permitam.
Aposto que a fronda política e mediática que em Portugal se criou contra "os grandes investimentos públicos" -- mesmo quando os encargos para o orçamento do Estado são nulos ou relativamente reduzidos -- não vai sequer ler esta passagem do relatório...

O que diz a OCDE (3)

O relatório da OCDE diz que as deduções fiscais com base na despesa (saúde, educação, etc.), bem como com o crédito à habitação, são fiscalmente regressivos e injustos, além de diminuírem enormemente a receita fiscal, devendo por isso ser reduzidos ou eliminados.
Como defendo há muito, para ira dos beneficiários, nunca assumidos...
Apoiando também as posições que desde há muito defendo, o relatório sustenta igualmente a equiparação das pensões aos salários para efeito de IRS e uma efectiva tributação dos rendimentos dos profissionais independentes, pondo termo à escandalosa evasão fiscal de gozam esses rendimentos.
O mesmo se diga sobre a redução das deduções fiscais em matéria de IRC, que reduzem enormemente a eficiência do imposto.

O que diz a OCDE (2)

O relatório da OCDE defende que nos impostos sobre a propriedade imobiliária deve ser aumentado o IMI (e suprimidas as numerosas isenções), para elevar a receita fiscal, e reduzido ou suprimido o IMT, que constitui um desincentivo à mobilidade territorial (tal como eu próprio defendi recentemente).

O que diz a OCDE

O relatório da OCDE sobre Portugal que acaba de sair constitui uma severa bofetada no fundamentalismo da oposição indígena, e da generalidade dos media, quanto ao modo de encarar a necessária consolidação orçamental. O relatório apoia em geral a estratégia governamental, incluindo a redução das deduções fiscais nos impostos directos, e diz que o Governo deve estar preparado para aumentar a receita fiscal em relação ao previsto, se tal for necessário para cumprir as metas de redução do défice.

O coro (2)

A propósito do imprescindível aumento da receita fiscal para cumprir o programa de consolidação orçamental no próximo ano, aliás como previsto no programa de medidas apresentado a Bruxelas, vai por aí uma enorme gritaria contra o aumento de impostos, como se estivéssemos à beira de uma verdadeira asfixia fiscal.
Sucede, porém, que a carga fiscal entre nós (medida pela percentagem da receita fiscal e equiparada no PIB) está longe de ser elevada (cerca de 38%), continuando abaixo da média da zona euro (cerca de 40%). Alem disso, tendo natureza transitória algumas das medidas tomadas, até ao reequilíbrio das contas públicas, é mais do que justo que a consolidação orçamental se faça também por via do aumento da receita e não exclusivamente por via do corte na despesa, como defendem os novos cruzados do emagrecimento do Estado.

Adenda
É evidente que, a ter em conta apenas os meus interesses pessoais, eu também deveria estar a engrossar o coro dos inimigos dos impostos...

O coro

É evidente, a todas as luzes, que o volume de corte no défice orçamental para cumprir a meta da consolidação orçamental para o próximo ano (cerca de 4500 milhões de euros) nunca poderia ser conseguida por nenhum governo só com redução da despesa pública, sob pena de cortes brutais nas despesas de saúde e de protecção social e de ruptura dos serviços públicos em geral. Por isso, além de uma forte contracção da despesa, aliás prevista, onde é possível, é mais do que razoável contar também com o aumento da receita fiscal, tal como previsto nos compromissos de estabilidade orçamental apresentados a Bruxelas, todos com apoio do PSD, incluindo nomeadamente a redução da despesa fiscal com deduções no IRS.
Por isso só pode estranhar-se o coro dos jornais económicos e dos editorialistas em geral no seu alinhamento com o fundamentalismo de Passos Coelho, na sua nova cruzada para asfixiar o Estado social por via dos cortes impossíveis na despesa pública. Era de esperar uma imprensa mais equilibrada e mais pluralista nos seus juízos...

Inverdade e inconsequência

O líder do Bloco de Esquerda resolveu desembestar contra mim. Com base em falsidades, como é usual nele.
Primeiro, eu nunca disse que não votaria em Durão Barroso para Presidente da Comissão Europeia, pelo contrário. O que disse, sim, foi que não o apoiaria caso o Partido Socialista Europeu vencesse as eleições europeias, devendo ser este então a indigitar o Presidente da Comissão. Como isso não sucedeu, senti-me livre para votar em Durão Barroso, como dissera antecipadamente. Segundo, o "visto prévio" da UE sobre os planos orçamentais nacionais constitui uma obrigação elementar do cumprimento pelos Estados-membros dos seus compromissos para com a União Europeia inscritos no PEC e não é obviamente somente uma imposição da Comissão Europeia, mas sim também do Conselho da União e de todos os Estados-membros.
Muitas vezes, o Bloco de Esquerda quer fazer-nos crer que, ao contrário do PCP, não é anti-europeísta e até quer "mais Europa". Mas quando se trata de votar no Parlamento Europeu as medidas que se traduzem realmente em mais Europa, como sucedeu esta semana com o pacote da supervisão financeira a nível europeu, o BE recusa o seu apoio, acompanhando mais uma vez a posição anti-UE dos comunistas e da extrema-direita nacionalista europeia.
Em vez de atacar sem nenhuma razão quem, como eu, é coerente com as suas posições europeístas, Louçã deveria cuidar de mostrar um mínimo de consistência política na posição do BE em relação à UE.