sábado, 11 de dezembro de 2010

"Privilégios regionais"

"A decisão do Governo Regional dos Açores - confirmada pela assembleia regional - de compensar uma parte dos funcionários públicos da região, mediante um subsídio regional, do corte na remuneração do pessoal de todo o sector público determinado pelo Orçamento do Estado para 2011 é politicamente inaceitável. (...)"
(Do meu artigo desta semana no Público. O resto aqui.)

"Garras artificiais"

No novo plano de superausteridade da Irlanda, destinado a preparar a ajuda da UE e do FMI à sua dramática situação financeira, há de tudo, desde um corte drástico nos funcionários públicos até à redução do salário mínimo, desde a redução de remunerações até ao aumento dos principais impostos. Tudo menos uma coisa: nenhum aumento do imposto sobre os lucros das empresas, apesar de ser um dos mais baixos da UE. Porquê esta incongruência?

(Do meu artigo no Público do dia 30 de Novembro. O resto aqui.)

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

Wikileaks salerosos

Leitura obrigatória para qualquer diplomata português (incluindo reformados e aspirantes): a da abundante e bem condimentada telegrafia expedida pela Embaixada americana em Madrid, ontem tornada publica.
Um verdadeiro "treat" para as tão necessitadas Necessidades!

terça-feira, 7 de dezembro de 2010

Wikileaks - transparência é o remédio

No "Conselho Superior" da ANTENA 1, esta manhã, a partir de S. Francisco, falei sobre as implicações da divulgação de telegramas diplomáticos americanos classificados pela Wikileaks.
Procurei reflectir os debates acalorados (a par do voyeurismo deliciado) que o assunto está a suscitar nos EUA. E abordar os problemas suscitados:
- do zelo excessivo na classificação da telegrafia diplomática,`ao alargamento excessivo da sua circulação, extremamente imprudente face à generalização das novas tecnologias de informação;
- e da revelação que se justifica para expôr comportamentos governamentais imorais e violadores da lei, à que é irrelevante e pode até ser perigosa por oferecer pretextos e informações a quem tenha designios anti-democráticos ou terroristas.
Fundamental é reagir democraticamente. Ou seja, não à chinesa, com repressão e obstrução da difusão da informação. Percebendo que, com a globalização e as tecnologias da informação, cada vez menos é possível manter secreto o que respeita à governação ou à diplomacia. Integridade, coerência e transparência, são o remédio.

PS - Julian Assange entregou-se à policia britânica, entretanto. Fez bem - face aos apelos ao seu assassinato ouvidos em diversas latitudes, é prudente confiar a sua vida a protecção policial.

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

Wikileaks

Há quem ache que nada de oficial merece resguardo nem segredo (também há entre nós quem ache o mesmo das coisas privadas...).
Todavia, por mais latitudinário que possa ser, o direito à informação não desculpa pelo menos o furto de dados nem a infidelidade dos servidores públicos (que continuam a ser crimes ).

PS - A divulgação dos "lugares sensíveis" para a segurança dos Estados Unidos constitui uma excelente ajuda ao terrorismo internacional...

Um pouco mais de rigor sff

«UE contra alargamento licença maternidade para 20 semanas».
Título errado. Como resulta da própria notícia, não é a «UE» que está contra, mas sim o Conselho da UE, que representa os governos dos Estados-membros, ao passo que o Parlamento Europeu, único órgão directamente eleito da União, votou a favor.

Medo de governar

"Mesmo com maioria absoluta vamos buscar o CDS".
Decididamente, o PSD tem medo de governar. Não há melhor do que uma coligação para diluir responsabilidades. E é evidente que apontar antecipadamente para uma coligação é a melhor via para não ter maioria absoluta e portanto para tornar a coligação mais provável.

domingo, 5 de dezembro de 2010

Redimensionamento das autarquias

Quando há uns meses lancei a ideia redimensionamento das autarquias locais, reduzindo o seu número, a reacção do Governo foi a de que isso não estava na agenda.
Ainda bem que passou a estar.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Chamam-lhe estação

No verdadeiro apeadeiro ferroviário de Coimbra da linha do Norte, a que chamam estação de Coimbra B, entra-se e sai-se por uma abertura num muro e atravessando a própria linha férrea.
Para que tudo continue como no século XIX, sucede também que quem chega do Sul pode ter de esperar durante largos minutos, à chuva e ao frio, até que a outra linha fique desimpedida de algum comboio que simultaneamente tenha chegado do Norte. É que a passagem para a saída também exige mais este atravessamento de linhas férreas.
Assim vai a principal linha ferroviária do País no século XXI...

A austeridade não depende do território

A ideia do governo regional dos Açores de neutralizar, mediante um subsídio, o corte de remunerações de uma parte dos funcionários regionais é altamente reprovável, porque gera uma inadmissível desigualdade na repartição dos sacrifícios da austeridade orçamental.
De resto, se o orçamento dos Açores revela tal folga, ao contrário do orçamento da República, é caso para perguntar se não será de cortar nas generosas transferências financeiras do Continente para as regiões autónomas.

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Voos da tortura - Portugal autorizou

A propósito do telegrama da Embaixada americana hoje divulgado pelo site WIKILEAKS, reproduzo passagens do Requerimento que apresentei à PGR em 8/7/2009, reclamando do Despacho de Arquivamento (DA) da investigação sobre os voos da tortura autorizados a passar por Portugal.
Os textos do DA e do meu requerimento podem ser integralmente lidos aqui.
Ofereço o merecimento dos autos.


"2.b.2.
Importa, portanto, estabelecer, perante a informação - publicamente disponível, pelo menos desde 2003 - sobre a natureza da prisão de Guantanamo, e para investigação dos crimes dos autos, em que informação e em que considerações políticas e/ou jurídicas se basearam as autoridades portuguesas para conceder autorizações diplomáticas para aterrarem em Portugal aos voos militares e de Estado, provenientes ou destinados a Guantanamo.
Esta exigência resulta particularmente reforçada pelo conteúdo do Anexo II da carta de resposta do MNE (datada de 10 de Março de 2009) aos pedidos de informação do DCIAP. Este Anexo II, intitulado “Utilização do Espaço Aéreo Nacional e sob Jurisdição Nacional por Aeronaves Estrangeiras, Civis e de Estado” explica, no capítulo II (“Aeronaves Militares e de Estado Estrangeiras”):
“A) AUTORIZAÇÕES PERMANENTES ANUAIS: Trata-se de uma Blanket Diplomatic Clearance cobrindo diversas categorias de missões pré-definidas...
As autorizações permanentes anuais concedidas por Portugal aos outros Estados caracterizam-se, em princípio, por não permitirem o transporte de material contencioso.”
[ênfase dos autores]
B) AUTORIZAÇÕES ESPECIAIS: Também na modalidade Blanket Diplomatic Clearance, estão actualmente em curso duas autorizações genéricas de sobrevoo do espaço aéreo nacional e utilização da Base das Lajes por aeronaves americanas...: São as Operações “Enduring Freedom” e “Iraqi Freedom”. (ênfase dos autores]
Estas duas autorizações são concedidas a título absolutamente excepcional aos EUA. Portugal não concede autorizações deste tipo a nenhum outro Estado. Elas permitem o transporte de material contencioso e de pessoas...”[ênfase dos autores]
Em primeiro lugar, e perante esta informação, o MP não pode deixar de indagar junto do MNE sobre a natureza concreta do “material contencioso” que estas autorizações permitem transportar.
Longe de pôr em causa a particular estreiteza dos laços bilaterais entre Portugal e os EUA, é imperativo esclarecer se esses laços, neste caso particular, implicavam autorização das autoridades portuguesas para serem levadas a cabo, em território nacional, actividades incompatíveis com o Direito Internacional, com a ordem constitucional da República Portuguesa e com o Tratado da União Europeia.
Segundo, tendo em conta a banalidade do transporte de pessoas em voos militares – especialmente no que diz respeito ao transporte de militares americanos entre os teatros de guerra do Iraque e do Afeganistão – importa esclarecer se a referência a uma permissão especial, por parte do Estado português, para o “transporte de material contencioso E PESSOAS” contempla – explícita ou implicitamente – a transferência de prisioneiros de, ou para, estabelecimentos prisionais fora da legalidade internacional. E, assim, se o Estado português participou durante vários anos, activa e conscientemente, em violações sistemáticas do Direito Internacional e do Tratado da União Europeia.
(...)
11.12.
Não deixa também de ser surpreendente esta conclusão do MP perante a extraordinária admissão do MNE de que o voo militar PAT653 [TUZLA-LAJES-GUANTÁNAMO] “não consta [dos] arquivos”, bem como a negligência do mesmo Ministério em exigir às autoridades americanas informações mínimas sobre a natureza, conteúdo, passageiros e função dos voos que têm Guantánamo como origem ou destino, e que recebem uma autorização genérica de aterragem nas Lajes no contexto da Operação Enduring Freedom [ver o Ponto 2 b) sobre os voos militares].
(...)
2.b.3.2.
Já no caso do voo RCH900Y, o DA, por omissão ou esquecimento, não menciona que este voo é feito no contexto da Operação Enduring Freedom e que, de acordo com o pedido de autorização americano, “this mission will move security forces and medical personnel... approx 95 PAX”.
Ora, esta última informação é determinante, porque revela a prática de troca de informação entre as autoridades militares americanas e o MNE português. Isto é, os EUA por vezes justificavam a razão operacional para – e o conteúdo dos – voos em causa, mesmo quando estes se inscreviam na “blanket diplomatic clearance” da Operação Enduring Freedom. E também é significativa – num voo militar proveniente de Guantanamo que aterrou nas Lajes, as autoridades portuguesas escolheram não se interessar pela identidade dos 95 passageiros(...)
2.b.6.
Neste quadro, é particularmente surpreendente a ausência de informação alegada pelos MNE e MDN sobre a natureza, missão e passageiros, da esmagadora maioria dos voos militares que têm Guantánamo como destino ou origem , nomeadamente sobre o seu contexto operacional específico.
O que revela ou uma selecção cuidadosa da informação a disponibilizar às autoridades portuguesas por parte das autoridades americanas e/ou um manifesto desinteresse por parte do MNE e MDN em garantir que o território nacional não fosse utilizado para actividades incompatíveis com o Direito Internacional, o Tratado da União e a Constituição da República Portuguesa.
Este facto é tão mais significativo quanto, como já se viu em 2.b.2. supra, em termos genéricos, as autorizações a todas estas aeronaves incluem permissão para o "transporte de material contencioso e pessoas”- o que aponta, no mínimo, para dolo eventual de quem autoriza.
(...)
2.b.7.
É particularmente significativo e suspeito, face ao objectivo desta investigação, que tal como decorre dos dados fornecidos pelo DA relativamente às 6 escalas de 5 aeronaves civis mencionadas, que tiveram autorização das autoridades portuguesas para aterrar na Base das Lajes (pag. 105 a 112 do DA), que os respectivos Formulários de Tráfego sejam totalmente omissos em relação à especificação do número dos tripulantes e passageiros.
Estamos numa Base Militar, operada conjuntamente pelas autoridades portuguesas e americanas: esperar-se-ia que o controlo de quem chega e parte fosse ainda mais rigoroso do que num aeroporto civil. Não é o caso, relativamente a estes voos civis privados!
(...)
2.b.8.
Quanto aos voos militares estrangeiros autorizados a aterrar na Base das Lajes, não há dúvidas: as autoridades portuguesas não cuidam minimamente de se assegurar de que tais voos não são utilizados para transportar presos em violação das obrigações internacionais do Estado português em matéria de direitos humanos fundamentais! Mesmo depois de terem sido lançados, em finais de 2005, diversos inquéritos internacionais – incluindo do Parlamento Europeu e do Conselho da Europa – relativamente às “extraordinary renditions” e à cumplicidade nelas de autoridades europeias.
É isso que resulta, claramente, das declarações feitas pelo actual Comandante português da Base das Lajes/Base Aérea nº 4 (desde Setembro de 2008), Tenente-Coronel Manuel Maria Mories Dionísio, declarações constantes do processo a fls. 2733:
“Quanto às aeronaves enunciadas, não existe qualquer de número e nomes de militares transportados, bem como de carga, pois aqueles não são, em princípio, fornecidos à FAP. Só quando se trata de carga perigosa é que é obrigatório dar conhecimento prévio à FAP do seu transporte”.
(...)
2.b.9
É particularmente significativo das falhas da investigação que a PGR se tenha abstido de aprofundar, junto das autoridades portuguesas e americanas, as questões relativas ao conteúdo de voos militares americanos referenciados como podendo estar envolvidos nas “extraordinary renditions” e que Portugal autorizou a aterrar na Base das Lajes. Tal significado resulta não apenas da admissão supra referida do desinteresse das autoridades militares portuguesas pelas pessoas transportadas em quaisquer aviões militares americanos.
(...)
6. Regista-se a conclusão do DA, segundo a qual “No entanto, há que referi-lo, esta investigação permitiu confirmar a passagem pelo território nacional das aeronaves mencionadas pelas assistente [Ana Gomes] e na identificação de 148 tripulantes, ou passageiros". Significa esta passagem que os dados em relação aos voos avançados pela Assistente Ana Gomes se confirmam, incluindo uma lista da NAV de 94 voos, na maioria militares, de e para Guantánamo, escalando aeroportos portugueses, autorizados por Portugal entre 12 de Janeiro de 2002 e 24 de Junho de 2006, lista que o governo português não disponibilizou ao Parlamento Europeu e à Assembleia da República, apesar das insistências da Assistente e do CTPE".

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Salsicharia europeia

Na semana passada, na rúbrica “Conselho Superior” da Antena Um, sublinhei que o Governo deveria usar os eurodeputados portugueses para concertar em Bruxelas uma estratégia europeia contra a crise.
No “Conselho Superior” de hoje lamentei que Portugal não tenha neste momento política externa e muito menos política europeia.
Devíamos meter ombros à prioridade de promover uma frente de países ditos periféricos, em situação de ataque e aperto semelhante à nossa, para fazer compreender à Sra. D. Merkel que esta Europa, assim, sem solidariedade e sem visão estratégica, entrincheirada na defesa do graal/Euro não vai a parte nenhuma – e, que com o Euro, vai acabar por enterrar também a UE. E, mais prosaicamente para alcance merkeliano, que, quando o fogo pegar em Espanha, os bancos alemães também vão começar a arder....
É desesperante que tenhamos a Europa entregue à gestão quadrada dos ministros das Finanças e do BCE - uma espécie de raposas velhas e relhas, a tentar tomar conta de uma capoeeira esburacada, que repetidamente deixaram assaltar...
É enfurecedor que tenhamos uma Comissão Europeia com a consistência barrosa da plasticina e um comissário da Economia e Finanças afoito apenas a calcar quem faz por se levantar do chão.
É trágico que não haja hoje na Europa um só Chefe de Estado ou de Governo com sentido estratégico, determinação europeista e capacidade de liderança para fazer a UE tirar finalmente as lições da crise e tomar as medidas que se impõem ( e várias o PE tem sugerido) para corrigir os desequilibrios estruturais, retomar o crescimento e a criação de emprego.
A demissão é colectiva - a quem restar honestidade, não sobra rasgo para ir além do rasteiro "sound-bite".
Precisavamos de mais Europa - a da convergência, da coesão, da solidariedade, pré-federal.
Sai-nos uma salsichada franco-alemã, mistela de sabor rançoso e digestão funesta.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

sábado, 27 de novembro de 2010

Viagens na minha Terra











O encanto de Budapeste sob a neve...

"Economia social de mercado"

«O Tratado de Lisboa não mudou somente a estrutura institucional da União Europeia. Mexeu também nos objetivos e nas políticas. Neste aspeto, uma das alterações mais significativas foi a introdução da noção de "economia social de mercado", para caracterizar a ordem económica da União. Ora, as mudanças conceptuais podem ser mais importantes do que as alterações institucionais.»
(Do meu artigo desta semana no Público, agora no Aba da Causa)

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

Escutas - reagir ou ignorar?

Fernanda Câncio replicou ao meu post "Bonomia e poderes ocultos" de 21/11.

1. FC questiona a legitimidade de determinadas escutas estarem num determinado processo judicial - questão a que nem eu, nem ela, poderemos responder sem ter acesso ao processo, e que, em última análise, só poderá ser esclarecida e derimida em sede judicial.
Sustenta FC que eu devia ralar-me "em saber como é que o jornalista teve acesso as ditas conversas, e, estando gravadas, quem as teria e com que legitimidade gravado e transcrito e colocado num sitio em que estivessem acessíveis a jornalistas". Para FC o essencial é, portanto, se o jornalista praticou um crime ao aceder ou divulgar conversas gravadas no âmbito de um processo judicial (logo, judicialmente validadas). Se sim, segundo FC, a reacção adequada será... não reagir. E sobretudo não rir.
Havendo crime no acesso e divulgação de escutas legalmente operadas e mantidas num processo, cabe ao MP e aos escutados processar em justiça os criminosos. Mas essa actuação, necessariamente a posteriori, não impede a produção de efeitos da divulgação das escutas: e o seu conteúdo pode ser relevante, ou não, do ponto de vista do interesse público, além dos interesses pessoais eventualmente afectados.
É por isso que os escutados podem/devem reagir, desde logo desmentindo a transcrição, se a conversa não existiu ou foi reproduzida com distorções.
E porque deverão terceiros eventualmente afectados, de algum modo, pelas escutas publicadas, ficar mudos e quedos? Será que se forem publicadas ilegalmente transcrições de conversas escutadas no âmbito de um processo judicial onde, por hipótese, alguém maldosamente atribua a FC ignomínias diversas, poderemos esperar dela o mais olímpico silêncio?
Eu, perante um conversa escutada no âmbito do processo "Face Oculta" e publicada, optei por desvalorizar o seu teor, rindo. Ri do conteúdo de uma conversa que não foi desmentida. E não estava desprevenida quando disse a jornalistas que reagira à gargalhada. Nem os questionei sobre como tinham obtido a transcrição, pois presumi que sabiam dela tal como eu - fora publicada num jornal.
Rir do teor da conversa não significa, sublinho, que eu menospreze a ilegalidade da publicação.

2. Pergunta FC: "O que é que tanto a revoltou na utilização das escutas contra a direcção Ferro Rodrigues? o principio da coisa, a violação do estado de direito, o crime, a compressão dos direitos fundamentais, o jornalismo de sarjeta?"
Tudo isso, mais o facto dos acusados na praça pública não poderem defender-se, por nem sequer conhecerem que eventuais acusações a justiça tinha contra eles - e, afinal, não tinha.
No caso concreto das escutas do processo Casa Pia publicadas em 2003 e 2004, foi orquestrada uma manobra para difamar dirigentes do PS - e o PS - implicando magistrados e agentes da justiça, incluindo um director da PJ, que passavam a jornalistas informação em segredo de justiça que, veio a verificar-se, não ter relevância para efeitos criminais.
Independentemente da revolta (que partilhei) com ilegalidade da publicação de escutas de conversas, os visados não se escusaram a desmentir as fabricações e as interpretações tendenciosas e malévolas que os media veiculavam, protestando repetidamente a sua inocência. O facto de o acesso às escutas e a sua reprodução pública ser ilegal não os demoveu de se pronunciarem sobre o seu conteúdo.

3. FC incita-me a identificar os protagonistas das escutas a que me refiro no final do meu post: são Rui Pereira, Ministro da Administração Interna, e Abel Pinheiro, arguido no processo "Portucale". (Curioso que, depois de tantos anos, o processo "Portucale" ainda não tenha sequer chegado a julgamento, não é?....)
Diz, a propósito, FC que eu procurei justificar "ter legitimado publicamente a devassa de uma conversa sem qualquer interesse criminal ou informativo". Não, eu não justifiquei, nem legitimo nenhuma devassa. Mas isso não me impede de apreciar o impacto da mesma, se o resultado é tornado público, legal ou ilegalmente.
E no caso concreto, a publicação das escutas de conversas entre aqueles dois personagens que tratavam de se aproveitar do Estado para engendrar nomeações e traficar favores políticos ou pessoais (que podiam até frustrar o curso da justiça), elucidou os portugueses sobre a sua ética e as relações ocultas que mantinham.
Os ditos personagens não contestaram publicamente a veracidade das conversas transcritas. Do meu ponto de vista, o interesse público acabou por ser servido pela publicação, ainda que à partida esta tenha violado a letra da lei. Tanto mais que um dos intervenientes se tornara entretanto ministro (e mantém-se...).

4. Eu não defendo que "em certas circunstâncias, o jornalismo pode e deve infringir a lei e divulgar escutas", como me imputa FC.
Mas é inegável que o interesse público pode ser causa de exclusão da ilicitude da divulgação de conversas privadas. Se um interesse público maior que a defesa da privacidade estiver em causa - por exemplo, para desmascarar um corrupto, um traficante de influências, um ladrão - ainda que os factos expostos só por si não constituam crime. E não é esse o B-A-BA do jornalismo, a equação deontológica que os jornalistas têm que fazer quase diariamente, pergunto eu a FC que é jornalista?

5. É grotesco o paralelismo que FC faz com a justificação da tortura: a publicação de escutas pode envolver crime, mas nem sempre; e pode ter justificação no interesse público. A segunda constitui sempre crime e nunca é justificável por qualquer interesse publico ou privado, até por não ser eficaz - quem é torturado pode "confessar" o que for preciso, mesmo sem nenhuma sustentação. As transcrições de conversas gravadas no âmbito de uma investigação judicial, ainda que legal ou ilegalmente mantidas no processo ou divulgadas, têm de ter suporte da sua fidedignidade.

Em conclusão: porque se incomoda tanto FC com uma gargalhada, vinda de uma das pessoas que é afectada pela divulgação duma escuta em particular?

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Jornalismo sectário

O que é que leva o diretor do Expresso a apontar-me na sua coluna como alvo selectivo da sua ira contra os que contestam uma coligação de governo entre o PS e o PSD no quadro da atual legislatura, quando tantos outros comentadores tomaram a mesma posição, incluindo vários dos colunistas daquele semanário na mesma edição de sábado passado?
Sucede que defendi essa opinião com vários argumentos que, mal ou bem, deviam ser contestados antes da condenação daquela. Pelos vistos, há quem pense que opiniões "más" nunca podem ser sustentadas com bons argumentos.
Desconsiderando o tom pessoalmente ofensivo (não ofende quem quer…), o diretor do Expresso parece entender que quem, como eu, perdeu as eleições europeias há dois anos, deixa de ter legitimidade ou autoridade para emitir opiniões políticas. Não sei se pensa o mesmo de todos os políticos que perderam eleições por números expressivos, como por exemplo, Mario Soares há cinco anos.
Seja como for, pertenço a uma escola que pensa que os argumentos devem ser avaliados, não em função de quem os produz mas em função do seu mérito ou demérito próprio. Há quem entenda, porém, que o que deve valer são os argumentos “ad hominem”…

domingo, 21 de novembro de 2010

Gostaria de ter dito isto

«A mim, o que me choca, é que representa da parte da Assembleia da República uma grande irresponsabilidade, na perspectiva da solidariedade nacional”, disse o constitucionalista, referindo-se ao facto de as alterações à lei que regula o financiamento partidário incluírem uma norma interpretativa e com efeitos retroactivos. Devido à existência dessa norma, os cerca de 24 milhões de euros que a Assembleia Legislativa madeirense deveria devolver ao Estado português serão esquecidos.»
(Jorge Miranda, aqui)

Amado ...ma non troppo

Estou enternecida com tanto encómio da direita ao MENE Luis Amado, que muito se tem esfalfado pela projecção internacional do país - na semana passada, na reunião do Grupo Socialista do PE em Budapeste, não sei quanta gente me veio perguntar que história era essa de Portugal ir sair do Euro, invocando declarações do Ministro...
Só não compreendo é que haja quem empreste a Luis Amado o desígnio de vir a chefiar a tal grande coligação de salvação nacional que ele preconiza. No MNE sabe-se como se especializou em tomar aviões para não ter de tomar decisões. E o próprio confessa estar "saturado" e disponível para ceder o seu lugar no Governo. Só por maldade, alguém o quererá empurrar para as rédeas do poder em S. Bento.

Cimeira da NATO - blindagem organizativa

A Cimeira da NATO correu impecavelmente.
O país mostrou, mais uma vez, que sabe organizar. Como alguém disse, falta mostrar que se sabe organizar.
Fez bem o Primeiro Ministro em correr a agradecer à PSP o esforço organizativo que garantiu a segurança da Cimeira. Ainda mais notável quanto falharam os esperados blindados - que afinal não fizeram falta nenhuma.
Mostrar que o país se sabe organizar implica agora não passar uma esponja pelo que falhou.
Convem que se apure quem foi responsável pelo falhanço dos blindados: quem decidiu encomendar, quando, como, porquê, havendo a possibilidade de os pedir emprestados à GNR. Como os vamos pagar e a quem, através de que engenharia financeira?
Mostrar que o país se sabe organizar implica que alguém assuma responsabilidades no MAI.
Implica não continuarmos a blindar a irresponsabilidade.

Bonomia e poderes ocultos

No DN e no “Jugular” de anteontem, a jornalista Fernanda Câncio acusa-me de “bonomia” assistindo à edificação de um “totalitarismo que estabelece o sistema judicial como centro do poder - um poder insindicado e insindicável, que recusa qualquer questionamento como "interferência" e "pressão" - e o jornalismo como o seu braço armado” a propósito de uma “escuta sem critério e a reprodução mercantil de conversas privadas”.
Isto porque respondi a jornalistas ter reagido “à gargalhada” à transcrição de uma conversa telefónica entre Edite Estrela e Armando Vara que se encontrará no processo «Face Oculta» e que o “CM” divulgou.
Não sei porque Fernanda Câncio toma a nuvem por Juno: eu não ri da transcrição da escuta – não tive acesso ao processo, não sei se a escuta se justifica no quadro da investigação, não sei se estamos perante uma “reprodução mercantil” e sobretudo não julgo que a divulgação daquela conversa tenha interesse informativo para o público – pelo menos eu não fiquei a saber nada de novo. Eu ri, evidentemente, do conteúdo da transcrição - que, em parte, me dizia respeito.
Fernanda Câncio não tem razão quando me acusa de “bonomia” face à aliança de poderes judiciais com jornalistas para intrumentalizar a transcrição de conversas privadas registadas em escutas judiciais. Esquece que eu pertenci à direcção do PS - a de Ferro Rodrigues - que foi miseravelmente atacada pela orquestração perversa de instâncias judiciais com jornalismo de sarjeta (e não era só nos tabloides). E que protestei o mais que pude – quando muitos e muitas, cautelosa e calculisticamente, calaram...
Não me calei então, nem me calo hoje. Mas sei distinguir entre o que é fabricação caluniosa – e deve ser desmentido e desmascarado como tal. E o que, sendo abusivo e porventura até criminososo na divulgação, não é desmentido ... porque não é desmentível.
Lembra-me a revelação de outras escutas num outro processo judicial, sobre as diligências empreendidas por um próximo do PS, em 2005, junto de responsáveis do CDS-PP, para conseguir trepar a uma magistratura de topo, e dos favores de vasculhagem policial que se prestava a fazer em troca. Afirmei publicamente a minha incredulidade, pedi que tão graves acusações fossem desmentidas. Qual quê? Até hoje... e o homem lá está, em magistratura de topo, ao lado. Não sei se a escuta judicial foi feita com critério, nem se o processo já estava fora do segredo de justiça quando as conversas foram divulgadas, nem se a transcrição na imprensa poderia ser sindicada como violadora da privacidade. Sei que nunca foi desmentida. E que, graças à publicação, ficamos elucidados sobre o carácter do político e seus ocultos concluios. E de quem lhos apara. O jornalismo, neste caso, cumpriu a sua função.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

Lucubrações funestas

Depois de o PSD ter anunciado repetidamente a sua intenção de abrir uma crise política algures no próximo ano, com o objectivo de derrubar o governo do PS e interromper a actual legislatura, não têm faltado as mais imaginosas ideias por parte de outros quadrantes políticos, incluindo dentro do PS, para alterar a actual fórmula governativa, sem recurso a eleições antecipadas e sem afastar o PS do Governo. Sendo todas manifestamente irrealistas ou descabidas no actual quadro político, todas contribuem porém para alimentar um clima de incerteza e instabilidade política, que só pode perturbar a consolidação orçamental em curso e os interesses financeiros do país.

[Continua aqui]

Estão a mangar connosco

«Madeira reclama mais 44 milhões de euros do OE 2011)».
Tendo já um rendimento per capita superior à média nacional, a Madeira deveria ser contribuinte líquido do orçamento nacional. Pelo contrário, além de nem sequer contribuir para as despesas gerais da República -- que correm exclusivamente à conta dos contribuintes do Continente -, ainda beneficia de chorudas transferências do orçamento do Estado, a vários títulos. Agora, apesar das dificuldades orçamentais do País, continua a querer mais e mais dinheiro.
Uma verdadeira provocação!

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O diabo está nos títulos

O Público titula que «Um quarto dos consumidores espera estar pior em 2011 do que 2010».
Isso que dizer que três quartos dos consumidores portugueses não têm essa opinião. Então, não seria mais curial titular a peça da seguinte forma: «um quarto dos consumidores espera estar pior em 2011 do que 2010»?
Imagine-se que o resultado do inquérito era o inverso. Alguém duvida de que o título da notícia não seria «Um quarto dos consumidores não espera estar pior em 2011 do que em 2010»?

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Externalidades positivas

O fim das auto-estradas SCUT não trouxe somente o fim de um privilégio territorial, bem como a sustentabilidade financeira do sistema rodoviário nacional. Pelos vistos, trouxe também um desvio de utentes para os transportes públicos, como o metro do Porto -- que bem precisa de mais procura para minorar o seu grave défice financeiro --, com a inerente diminuição da pressão automóvel nos acessos urbanos. Embora possa ser um efeito passageiro, não é desprezível.

Corrigenda

A imprensa continua imputar-me eu ter defendido a saída de Teixeira dos Santos. Mas não é bem assim. Defendi, sim (primeiro aqui, depois aqui), uma mexida no Governo, logo depois da aprovação do orçamento, por razões essencialmente políticas. Não mencionei, porém, nenhum ministro nem nenhum departamento ministerial.
Houve quem entendesse ver aí alvos precisos (aliás diferentes, consoante a especulação), mas por sua conta e risco. Tenho obviamente uma ideia sobre o que deveria ser tal remodelação, mas não tive a estultícia de a exprimir publicamente. Cabe ao primeiro-ministro escolher a sua equipa...

Do "milagre" à humilhação

Pode estar iminente o recurso da Irlanda ao mecanismo de resgate financeiro da UE.
Sendo, de longe (depois a Grécia), o país da UE em maiores dificuldades orçamentais, a Irlanda tem ainda um gravíssimo problema com a debilidade do sistema bancário nacional, que o Estado teve de apoiar maciçamente agravando o défice orçamental.
De modelo que era para os economistas neoliberais -- que incensavam o milagre económico irlandês, baseado no investimento estrangeiro e em baixos impostos sobre os negócios --, a Irlanda vê-se à beira da humilhação de pedir ajuda financeira externa.

Mega-imposturas

«No passado dia 6, uma multidão de manifestantes convocados pela Frente Comum de Sindicatos da Administração Pública desfilou em Lisboa, entre o Marquês de Pombal e os Restauradores, em protesto contra os cortes salariais e outras medidas de austeridade anunciadas pelo Governo e apoiadas pelo principal partido da oposição. E que multidão foi essa? 100.000 pessoas, disseram os organizadores, e repetiu grande parte da comunicação social, participaram na marcha, descrita como uma espécie de ensaio de mobilização para a greve geral marcada para o próximo dia 24.

Ao contrário do que aconteceu em ocasiões semelhantes, desta vez não se conheceram estimativas da polícia. Em contrapartida, uma equipa dirigida por Steve Doig, professor da Universidade do Arizona actualmente a leccionar um mestrado de Jornalismo na Universidade Nova de Lisboa, saiu para o terreno para fazer o que nenhum jornal fizera antes: contar os manifestantes. Não mobilizou para isso grandes meios: alguns dos seus alunos fizeram contagens ao longo do percurso da marcha, algumas fotografias foram feitas a partir de um ponto elevado na zona dos Restauradores e foi medido o espaço em que decorreu o comício final. Resultado: uma estimativa de 8000 a 10.000 participantes no desfile, e cerca de 5000 concentrados nos Restauradores.»
(Da crónica do Provedor do Leitor do Público, de ontem)
Já se sabia que os números de manifestantes fornecidos pelos próprios são sempre empolados, Só não se sabia que não tinham nada a ver com a realidade. Agora ficamos a saber que temos de dividir os números por 10 ou 20 para alcançar os números reais.
Afinal, as "megamanifestações" não passam de mega-imposturas. Quase sempre com a cumplicidade da imprensa...

sábado, 13 de novembro de 2010

Outras paragens

Como habitualmente, coligi na Aba da Causa os meus artigos das últimas semanas no Público, incluindo o desta semana sobre a "ameaça da crise", que inclui a defesa de uma remodelação governamntal logo após a aprovação do orçamento, sendo todavia de sublinhar que eu não mencionei nenhum ministério em especial, sendo a especulação sobre isso da exclusiva responsabilidade dos comentadores.

Coligação

O Ministro dos Negócios Estrangeiros, Luís Amado, veio defender a solução de um governo de coligação -- que na nossa geografia política só poderia ser entre o PS e o PSD --, de modo a enfrentar os graves problemas orçamentais e económicos que a crise internacional trouxe ao País. Não há surpresa nesta posição, tendo em conta as posições do autor a este respeito desde há muito. Todavia, uma coligação de governo entre o PS e o PSD é tão improvável e tão problemática hoje como era antes da crise.
Primeiro, a deriva neoliberal do PSD de Passos Coelho dificulta enormemente qualquer entendimento sobre o modo como resolver as dificuldades orçamentais e económicas do País. Segundo, uma coligação de governo entre os dois partidos centrais do espectro partidário só alimentaria a contestação social e política das medidas de austeridade por parte da esquerda radical. Terceiro, não se vê como poderia haver uma tal coligação sem novas eleições e sem mudança de liderança num dos partidos em causa (ou em ambos). Quarto, como mostrou a experiência de governo de bloco central de 1983-85, quem depois paga politicamente o seu preço político é o PS...