segunda-feira, 2 de maio de 2011

Outras tribunas

Importei para a Aba da Causa os meus artigos semanais do Público nos últimos meses, desde "Dois equívocos", de 28 de Dezembro, sobre as eleições presidenciais, até ao artigo da semana passada, "Compromissos prematuros", sobre as próximas eleições parlamentares.

sábado, 30 de abril de 2011

Lavar as mãos

«As empresas [públicas] de transporte estão em pré-ruptura [financeira]"» -- diz o administrador de uma delas.
As perguntas que se impõem são as seguintes: E só descobriu agora? A situação não era já evidente quando aceitou o cargo? E o que fez para a corrigir? E por que é que só agora denuncia a situação, nem por acaso no "think tank" político do PSD?
Há muitos anos que aqui e noutras tribunas venho denunciando, sem nenhum eco,a insustentabilidade do "modelo de negócio" de transportes públicos urbanos de Lisboa e Porto. É evidente que a principal responsabilidade cabe aos gestores políticos (Ministros dos Transportes e Ministros das Finanças) que deixaram arrastar esta lamentável situação. Mas e os sucessivos gestores dessas empresas, que aceitaram geri-las nessas condições, que não fizeram nada para a corrigir, será que podem lavar as mãos assim?!

Adeus, David!

Colheu-me de surpresa a triste notícia da morte do David Lopes Ramos, que não via desde um grato convívio há dois anos em Coimbra (que aqui deixei registado). Para lá da sua obra de jornalista e de gastrónomo, que perdurará nos livros que deixou, fica-me dele a memória indelével de uma amizade limpa e generosa desde os tempos entusiastas de Coimbra e da "Vértice" há mais de 40 anos, para lá dos encontros e desencontros da vida.
Gratidão merecem os que de si tal registo deixam!

Um golpe frustrado

"TC «chumba» revogação da avaliação de desempenho docente".
A decisão do TC até pode não ser incontroversa, mas o resultado só pode saudar-se. Gorou-se assim um dos maiores golpes da aliança do PSD com extrema-esquerda para instrumentalizar a Assembleia da República ao serviço dos interesses privativos da secção do sindicato dos professores em cada um desses partidos.
Da extrema-esquerda nada pode surpreender. No caso do PSD, porém, supostamente um partido com vocação de governo e com vontade de o vir a ser em breve, este comprometedor episódio só confirma a cultura de oportunismo e de irresponsabilidade que nele assentou arraiais e a obsessão com que prossegue a sua agenda de enfraquecimento e descredibilização da escola pública.

Inércia e desperdício

«Função pública já não precisa de tanto espaço para trabalhar».
Há dez anos o grupo de missão do Ministério das Finanças para o controlo da despesa pública (ECORDEP), que tive a honra de integrar, propunha que todos os serviços públicos, incluindo os que ocupam imóveis pertencentes ao Estado, passassem a suportar os custos do espaço ocupado, pagando a uma agência de gestão do património público. Isso fomentaria a racionalização da ocupação dos espaços, tornando mais onerosos os excessos, ao mesmo tempo que tornaria mais transparentes os custos efectivos dos serviços públicos. Essa ideia nunca vingou.
O caso de desperdício mais flagrante é a manutenção dos serviços que deviam ser desactivados ou reduzidos depois da criação das "lojas do cidadão" ou depois de a sua serventia ter sido reduzida a pouco ou nada em virtude da prestação electrónica dos respectivos serviços. Por exemplo, alguém é capz de dizer por que é que se mantêm serviços de finanças em todos os municípios?!

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Sugestões à troika (6)

Não pode haver disciplina financeira nem consolidação financeira do sector público entre nós sem sanear a desastrosa situação dos transportes públicos ferroviários e urbanos, com défices crónicos e endividamento insustentável.
Como aqui se defendeu, é necessário sanear o passivo acumulado (mediante a privatização parcial das empresas e a entrada de capital fresco), reduzir substancialmente os encargos de exploração (incluindo a supressão de serviços sem justificação razoável e a diminuição do quadro de pessoal), elevar as tarifas e definir com estabilidade o montante das "compensações de serviço público" (que só agora começaram a ser definidas). É preciso também retirar os transportes públicos urbanos da esfera do Estado e do Governo e devolvê-los à esfera do poder local (municipal ou intermunicipal), de onde nunca deveriam ter saído.
É incompreensível como sucessivos governos ao longo dos anos deixaram criar e avolumar esta situação. A actual situação financeira dos transportes públicos hipoteca irremediavelmente qualquer programa de reajustamento orçamental.
Aqui fica a sugestão à troika...

Sugestões à troika (5)

Um dos cancros financeiros e um dos principais factores da ineficência nacional é o sistema de justiça. Temos tribunais a mais, magistrados a mais (nenhum país deve ter tantos juízes de tribunais superiores!), regalias a mais, instâncias e expedientes processuais a mais, garantias processuais a mais, advogados a mais, lentidão a mais, eficiência e produtividade a menos.
É preciso uma revolução no sector, que só pode ser imposta de fora. Aqui fica a sugestão à troika...

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Notícias que nunca são manchete

«Acidentes de trabalho mortais em Portugal diminuíram um terço na última década».
Se os factos contrariam a tese da "década perdida", não podem merecer destaque. Mas se a notícia dissesse que "acidentes de trabalho (...) aumentaram um terço na última década", obviamente já faria manchete.

Treinador de bancada (1)

No seu programa eleitoral, ontem apresentado, o PS pronuncia-se sem hesitação por uma solução de governo maioritário, alinhando portanto no consenso estabelecido nesta matéria.
Sendo certo que o PS se propõe e ambiciona ganhar as eleições, mas estando fora de causa ganhá-las com maioria absoluta (o que aliás só conseguiu uma vez), a aposta num governo maioritário só pode significar disponibilidade para um governo de coligação com outro(s) partido(s).
Sensatamente, porém, o PS abstém-se de adiantar qualquer preferência ou qualquer exclusão para um possível governo de coligação. Como escrevi aqui, essa é a única posição defensável. O PS não deve preferir nem excluir nenhuma solução governativa antes das eleições. Isso aliás deve ser uma orintação oficial de campanha. Ao contrário do que sucedeu noutras eleições, em que o PS também não antecipou cenários pós-eleitorais, desta vez os seus dirigentes e candidatos deveriam igualmente abster-se de manifestar preferências ou exclusões.
Todo o afunilamento nas possibilidades de entendimentos pós-eleitorais só desfavorece o PS. A abertura a todos os azimutes reforça a posição do PS como força charneira moderada entre o bloco da direita liberal-conservadora e o bloco dos partidos da extermna esquerda.

Sugestões à troika (4)

De um leitor do CN recebi o seguinte mail:

«[Como refere neste post, o efeito na redução da despesa privada do pagamento de remunerações complementares em títulos de dívida pública] não só não seria "despiciendo" como, na minha opinião, seria muito importante, já que o problema é, essencialmente, um de défice de poupança interna – pública e privada –, que tem como imagem ao espelho a necessidade de financiamento externo (poupança gerada no exterior e utilizada internamente).
Sugiro-lhe, para ponderar:
a) – Poupança forçada de parte dos 13º e 14º meses, em esquema progressivo (e com um nível básico de isenção), sob a forma de instrumento de dívida pública, a aplicar a todos os trabalhadores, públicos e privados.
b) – Simultaneamente, parte dos dividendos distribuídos pelas empresas serem pagos nalgum instrumento de dívida pública.
Sei bem que isto não cura a doença, mas lá que aliviava os sintomas aliviava.»

J P Barosa
O que esta sugestão traz de novo é a utilização do esquema do pagamento de rendimentos em títulos de dívida pública tanto às remunerações públicas como às privadas e também aos dividendos das empresas, alargando portanto a base da poupança forçada e introduzindo maior equidade na repartição dos sacrifícios. No caso das empresas, aliás, elas teriam de comprar ao Estado os títulos da dívida, para poderem pagar com eles as remunerações e dividendos (ou parte delas) em causa, com a correspondente entrada de receita pública.
Aqui fica mais esta sugestão à troika.

Sugestões à troika (3)

Também nunca percebi nem encontrei nenhuma justificação razoável para o regalia de algumas carreiras do sector público (como na justiça e na carreira diplomática), que sobraram da "limpeza" efectuada em 2005-2006 nos privilégios sectoriais e profissionais, e que consiste no chamado regime de "jubilação", de acordo com o qual os aposentados dessas carreiras não estão sujeitos ao normal regime de pensões do sector público, antes mantendo todos os direitos do activo (incluindo o subsídio de residência no caso dos juízes e magistrados do Ministério Público!), nomeadamente uma pensão igual ao vencimento no activo (independementre da carreira contributiva), actualizável juntamente com este.
Além da relevância orçamental, trata-se obviamente de uma questão de equidade no sector público. Ora, equidade é o que mais se impõe quando se trata de impor sarifícios.
Aqui fica a sugestão à troika...

Sugestões à troika (2)

Como fui dando conta ao longo destes anos, nunca percebi nem encontrei nenhuma justificação razoável para o tratamento fiscal mais favorável das pensões em relação às remunerações e outros rendimentos, tanto mais que entre nós, mercê do generoso sistema de cálculo até há pouco em vigor, o valor das pensões está em geral muito acima da capitalização do valor acumulado das contribuições ao longo da vida activa.
Por isso, não posso deixar de considerar como injusto que o corte imposto no orçamento deste ano às remunerações do sector público não tenha sido acompanhado de um corte equivalente, por via fiscal, nas pensões do sector público nos mesmos termos das remunerações.
Além da importância financeira, trata-se de uma questão de equidade social.
Aqui fica a sugestão à troika...

Sugestão à troika

Mais justo e mais eficaz financeiramente do que o sugerido (e desmentido) pagamento em títulos da dívida pública do 13º e do 14º meses no sector público seria reter, a título de imposto excepcional transitório, uma parte dessas remunerações complementares aciam de certo montante, tanto no sector público como no privado, de forma progressiva, conforme o valor dessas remunerações.
Seria mais justo, porque não atingiria somente os funcionários públicos mas sim toda a gente; e mais eficaz, porque geraria efectiva receita orçamental, em vez de aumentar o endividamento público.
Aqui fica a sugestão à troika...

quarta-feira, 27 de abril de 2011

O diabo está nos títulos

«OCDE: 16,6% das crianças portuguesas são pobres».
Mas o título da notícia sobre este relatório da OCDE também poderia ser "Pobreza infantil diminui em Portugal" ou ainda "Portugal com a descida mais acentuada da mortalidade infantil".
A selecção dos títulos constitui o meio mais fácil de manipulação política da informação. Uma das regras entre nós é escolher sempre o aspecto mais negativo para o País, mesmo quando isso esconda uma evolução positiva. O nosso jornalismo adora afundar Portugal.

Coerência

"PCP não reconhece “legitimidade” ao FMI".
Para ser coerente, o PCP também não deveria "reconhecer" a ajuda financeira do FMI -- de onde saírá também o subsídio do Estado aos partidos políticos -- e recusar o "dinheiro sujo do imperialismo" (para parafrasear um antigo slogan comunista contra o Plano Marshall)...

Notícias que nunca serão manchete

«Trabalho: Portugal é exemplo na integração de imigrantes».

Desmentido

A ter por bom este desmentido sobre o "pagamento" do 13º e/ou 14º mês com títulos da dívida pública, a primeira observação consiste em assinalar a ligeireza com que a imprensa, mesmo a mais responsável, inventa notícias ou dá crédito a invenções.
Quanto ao fundo, é evidente que "pagar" despesa com títulos de dívida é o mesmo que recorrer a dívida para pagar despesa, não contribuindo para a consolidação das contas públicas, como se pretende. O único efeito seria uma poupança forçada e uma redução da despesa privada, o que aliás não seria despiciendo.
[revisto]

Santo farisaísmo

Há dias num fórum público numa rádio um ouvinte identificado com o PCP ou o BE (não cheguei a apurar) rebelava-se contra a ideia de o PEC IV servir de base ao programa de ajustamento da UE e do FMI, com o argumento de que isso seria "antidemocrático", por tal programa ter sido rejeitado por larga maioria na AR.
Santa ingenuidade!
Primeiro, as razões por que o PEC foi rejeitado foram muito diferentes, pois enquanto o PCP e o BE não queriam austeridade nenhuma, já o PSD rejeitou-o por ele não ser "suficientemente exigente", como explicou logo depois. Ora, como o PSD tem mais deputados do que as duas esquerdas radicais, é evidente que o PEC foi rejeitado justamente para ser substituído por outro mais duro. Segundo, o PCP e o BE não podiam ignorar que o chumbo do PEC, além de abrir uma crise política, imporia o recurso à ajuda externa sob a égide da UE e do FMI, como o PSD desde há muito ambicionava.
Depois de terem servido de "idiotas úteis" na estratégia do PSD de chamar o FMI, o PCP e o BE não podem agora queixar-se daquilo que eles mesmos ajudaram a decidir...

O direito à saúde, à maneira do PSD

A história real veio no Diário de Notícias: uma prestigiada jurista atingida por um cancro resolveu recorrer a quimioterapia numa clínica privada, julgando que o seu seguro de saúde cobria tais despesas, Quando lhe apresentaram a conta da primeira série de tratamentos (20 000 euros!), decidiu acabar o tratamento num hospital do SNS, pagando somente a respectiva taxa moderadora. Como seriam as coisas se se levasse a cabo a reforma do sistema de saúde do PSD ?
Embora sem conhecer os pormenores, conhecem-se os princípios dessa reforma: 1º- os cuidados de saúde passariam a ser pagos, ou pelo menos co-pagos, por quem tem rendimentos para o fazer; 2º - passa a haver liberdade de escolha entre o SNS e o sector privado, em igualdade de circunstâncias.
Aplicada ao caso concreto, esta política daria o seguinte: como se trata de uma pessoa de razoáveis rendimentos, ela deve pagar pelo menos uma parte dos custos no SNS; caso ela escolha o sector privado, terá de pagar apenas o mesmo que no sector público, ficando o resto à conta do Estado. Concretamente, a senhora da história teria de pagar suponhamos 5 000 euros em qualquer caso (ninguém a mandou ter um cancro!...). Se optasse pelo sector privado, independentemente da capacidade de oferta do SNS, o Estado teria de suportar os restantes 15 000 euros da factura (ou a diferença para o preço indicado numa tabela pré-estabelecida), desse modo agravando a factura da saúde no orçamento e alimentando os lucros da indústria de saúde privada à custa do SNS.
Já se imaginou os encargos acrescidos que o SNS suportaria se tivesse de pagar os gastos de saúde no sector privado pelos muitas pessoas que, pelas mais variadas razões (pressa, hotelaria, simples capricho), já hoje recorrem ao sector privado?

terça-feira, 26 de abril de 2011

Redução da despesa

Espero que entre as medidas impostas pela UE e pelo FMI para reduzir a despesa pública constem as que há uns meses indiquei aqui, aliás recapitulando propostas antigas.
Se já não nos livramos da humilhação da sua tutela financeira, ao menos que não desperdicem a oportunidade!...

Despesa estrutural

Tem-se por adquirido que a disciplina da despesa pública passa somente por cortes no investimento público, nas remunerações e pensões do sector público, nas transferências sociais e prestações dos serviços públicos, nas despesas de funcionamento dos serviços.
Também passará por aí, sem dúvida. Mas alguma da mais significativa poupança nos gastos públicos poderia e deveria vir da extinção ou fusão de entidades ou serviços públicos supérfluos ou redundantes. Há cinco anos o PRACE procedeu à extinção de dezenas de institutos e outras entidades públicas da Administração central do Estado. Depois, Maria de Lourdes Rodrigues provou como se podem suprimir centenas de escolas com poucos alunos, com vantagens para estes. Também Correia de Campos mostrou que se podia racionalizar a rede de maternidades e de cuidados primários, de novo com melhoria do serviço para os utentes.
Infelizmente, contra o que aqui venho defendendo ao longo destes anos (ver por exemplo aqui quanto às autarquias locais), não se seguiu a mesma via lá onde os ganhos em despesa e em qualidade do serviço público seriam maiores, como na redução, por agregação ou fusão, de autarquias locais (freguesias e municípios) e de empresas municipais, de tribunais, de hospitais (desde logo os hospitais militares), de escolas politécnicas (se não mesmo de universidades...), entre outras estruturas públicas.
Tendo em conta a nossa dimensão terriorial, a população e a distribuição populacional, temos de tudo isso a mais.
E o excesso custa um ror de dinheiro.

Requiem pelos governos minoritários?

Ficou a saber-se pela boca do PR ontem: o próximo governo terá de ter apoio maioritário na AR. Como nenhum partido parece estar próximo de obter uma maioria absoluta, teremos um governo de coligação.
É verdade que na nossa história democrática, com uma excepção, nenhum dos governos minoritários chegou ao fim. Mas o mesmo sucedeu, sem excepção porém, com os governos de coligação, que não se revelam mais duradouros entre nós.
Portanto, se se quer ter mais estabilidade governativa, de duas uma: ou se dá melhores condições de sobrevivência aos governos minoritários (o que não é fácil) ou se facilita a criação de maiorias monopartidárias, alterando a lei eleitoral (círculos eleitorais mais pequenos, redução do número de deputados, criação de um círculo nacional sobreposto aos círculos territoriais). Estão as condições políticas maduras para uma das duas coisas, ou ambas?

Autocrítica

«Os portugueses não se reconhecem num estilo agressivo de intervenção política» -- Cavaco Silva, hoje na sessão comemorativa do 25 de Abril.
Infelizmente a autocrítica presidencial não desfaz os malefícios políticos das suas agressivíssimas intervenções na noite eleitoral e na tomada de posse, nomeadamente o envenamento da clima político e a "luz verde" para a crise política...

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Coligações (2)

Aparentemente Mário Soares gostaria de ver repetido o compromisso pré-eleitoral de 1983 entre o PS e o PSD, de acordo com o qual o próprio Mário Soares e Mota Pinto se comprometeram antecipadamente numa coligação pós-eleitoral de ambos os partidos, quem quer que as ganhasse.
As condições são porém muito diferentes. Primeiro, tratou-se então de formar um governo de largo suporte político e parlamentar para negociar e implementar o futuro acordo de saneamento financeiro com o FMI. Agora, o acordo já estará concluído e politicamente assumido pelos dois partidos antes das próximas eleições. Segundo, ao contrário do que se pensa, as clivagens políticas entre os dois partidos são hoje mais fundas do que eram então, não se afigurando que o PSD esteja disponível para abdicar da sua nova agenda liberal do "Estado mínimo". Terceiro, nem Sócrates nem Passos Coelho são Soares e Mota Pinto, que se estimavam mutuamente (Mota Pinto tinha mesmo sido ministro independente de um governo de Soares), ao contrário do que sucede agora, como revela o inaceitável veto do líder do PSD ao líder do PS.
Governos de grande coligação ao centro, cancelando a natural dialéctica alternativa entre os dois partidos de governo do nosso sistema político, favorecendo uma lógica de "loteamento" do aparelho de Estado entre ambos e deixando a oposição nas mãos dos partidos mais radicais, só podem ser defendidas como soluções excepcionais e transitórias, com um mandato muito claro, seja para responder a um situação de emergência, seja para superar os bloqueamentos estruturais no nosso sistema político (justiça, sistema eleitoral, administração territorial, etc.).

Coligações

Há já muita gente a trabalhar, de ambos os lados, por um entendimento de governo entre o PSD e o PS (ou vice-versa). Penso que, a mais de um mês das eleições, se está a pôr o carro à frente dos bois.
Quanto ao PSD, na falta de uma vitória por maioria absoluta (que neste momento parece uma miragem), convém-lhe obviamente manter o PS como alternativa (ou como "aditivo") ao CDS, com quem já tem um acordo pré-eleitoral, até porque pode não fazer maioria só com este. Mas, em qualquer caso, que razão há para que o PS dê de bandeja antecipadamente a sua disponibilidade para um tal casamento?
Quanto ao PS, que não se pode dar obviamente por vencido, tampouco deve assumir antecipadamente que a sua única hipótese de governo, caso ganhe as eleições, é uma coligação com o PSD. Tal como em anteriores eleições, o PS deve abster-se estritamente de especular sobre hipóteses pós-eleitorais de governo. Dada a situação do País e amarga experiência do actual governo minoritário, se ganhar deve procurar formar uma coligação maioritária sob sua égide, mas sem excluir à partida nenhuma possibilidade -- , nem mesmo um acordo político com o PCP e/ou o BE, pois embora estes não tenham nenhuma disponibilidade nem preparação para assumir responsabilidades de governo, não deve ser o PS a marginalizá-los antecipadamente, devendo deixar que sejam eles a auto-excluir-se.
Para o PS, assumir desde já a inevitabilidade de uma coligação com o PSD só contribui para facilitar a vitória eleitoral deste.

Chapeau!

Magistral a iniciativa de Cavaco Silva para fazer hoje em Belém a comemoração oficial do 25 de Abril!
Primeiro, por causa da dissolução da AR, aproveita para chamar a si o crédito da celebração da Revolução, ainda por cima conseguindo juntar todos os anteriores presidentes da República bem como o Governo demitido e a oposição que o demitiu. Segundo, não deixará de tentar corrigir a infeliz imagem que até agora projectou neste segundo mandato, substituindo o discurso divisionista e catastrofista da sua tomada de posse e o seu ruidoso silêncio durante a crise política por um discurso positivo de apelo ao entendimento entre as formações políticas para bem do País.
Qualquer que seja o nosso juízo sobre tudo isto, homenageemos as coisas bem feitas!

sábado, 23 de abril de 2011

Coligação a três, porquê?

Corre por aí, como se fora evidente, que a única solução para um governo forte depois das eleições seria um tripé CDS-PSD-PS.
Mesmo sem contestar a busca "a outrance" de coligações para governos de maioria absoluta, vejamos, porém, as duas hipóteses em abstracto possíveis.
Se a direita, ou seja o PSD e o CDS, que já têm um pré-acordo de governo, obtiverem em conjunto uma maioria absoluta, por que bula é que o PS há-de ser chamado a juntar também os seus trapinhos ao arranjo?
Se porventura isso não suceder e se uma solução de maioria absoluta exigir uma "grande coligação" PS-PSD, ou vice-versa, a que propósito é que se lhes há-de juntar o CDS?
Tão importante como a dimensão da maioria é a coerência mínima dos programas e a eficiência governativa. Se até agora nenhuma coligação foi duradoura, o que esperar de uma coligação a três, com tantas diferenças entre eles?
É evidente que o denominador comum a três partidos é seguramente menor do que a dois partidos adjacentes no espectro político. Dois no governo já é muito, três é demais.

Politica e interesses

Qaundo se ouve falar os dirigentes do PSD ligados ao mundo dos negócios (e muitos são!) fica sempre a dúvida de saber se quem fala é o político exprimindo as suas ideias sobre o interesse geral ou se é o banqueiro, o gestor, o empresário, o consultor que procuram fazer passar os seus interesses privativos como soluções de validade geral...

quinta-feira, 21 de abril de 2011

Um pouco mais de decoro, sff

Compreende-se que os dirigentes do PSD tenham ficado à beira de um ataque de nervos com uma sondagem eleitoral destas.
Mas atribuir esse mau resultado à "máquina de propaganda" do PS, como eles se apressaram a justificar-se, revela um enorme despudor político, quando é evidente que actualmente o PSD domina avassaladoramente a comunicação social, a começar pelas televisões, que alimentam uma sistemática campanha de hostilidade contra o PS (como mostrou a miserável cobertura mediática do seu recente Congresso). O que os devia preocupar justamente é que eles não conseguem descolar nas sondagens apesar da sua própria "máquina de propaganda" tentacular...

Merecidamente (2)

«Popularidade de Passos Coelho cai a pique e Sócrates recupera».
Merecido juízo público! A rejeitar o PEC "porque sim!", sem aceitar nenhuma negociação nem apresentar nenhuma alternativa, apenas para derrubar o Governo e provocar eleições, sabendo que o resultado só podia ser lançar o País para osbraços da ajuda e do controlo externo, o líder do PSD mostrou falta de responsabilidade e de sentido de Estado e que é capaz de sacrificar os interesses do País aos conjunturais interesses partidários.
Depois, a sua falta de consistência e de convicção política e o aventureirismo das poucas propostas políticas que vai revelando (como a privatização parcial da CGD ou a "castração" financeira do sistema público de pensões) não podem deixar de causar perplexidade e receio nos eleitores.
Passos Coelho vai ter de fazer muito melhor para ganhar convincentemente as eleições.