segunda-feira, 24 de agosto de 2015

Farisaísmo moral

A propósito do meu post contra as touradas (contra que me bato há décadas), o jornal i foi ouvir algumas personalidades com opinião diferente. O que choca nessas opiniões é absterem-se de qualquer juízo moral sobre a tortura de animais para divertimento publico e invocarem uma alegada opinião publica favorável às touradas em Portugal.
Ora, devo dizer que quase todos os avanços civilizacionais foram feitos contra a opinião pública dominante da altura ou contra atavismos culturais: o fim da escravatura, da servidão, do apartheid; o fim da pena de morte e das penas cruéis (amputação, lapidação, açoites em público); o fim de medonhas práticas étnicas, como a excisão genital feminina; o fim da criminalização da sodomia ou da apostasia; etc. etc. Algumas dessas barbaridades ainda existem em alguns países, com aprovação pública.
Na verdade, o que há de prodigioso na civilização é o progressivo triunfo sobre a barbárie, mesmo quando ela goza do apoio da população ou da complacência dos fariseus. Um dia as touradas também se tornarão apenas uma recordação do museu da indignidade humana.

Responsabilidade fiscal

Pois, eu também gostaria que Portugal fosse uma espécie de Dinamarca do sul, não somente no nível de vida e no Estado social mas também na responsabilidade cívica, incluindo no respeitante ao pagamento de impostos.
Temos porém dois pequenos handicaps: não temos quatro séculos de ética luterana nem dois séculos de educação pública...

sábado, 22 de agosto de 2015

Dúvida

Agora que, para evitar a bancarrota e a saída do euro, a Grécia optou por pedir novo resgate à malvada troika, com as inerentes condições, que o Syriza se cindiu e que Tzipras se passou, embora sem convicção, para os "austeritários" praticantes (e de que maneira!), qual vai ser a opção dos nossos syrizas domésticos, que durante seis meses cantaram hinos indistintos a Tzipras e Varoukakis, celebraram a irresponsabilidade grega, vilipendiaram a UE e injuriaram os críticos?
Vão juntar-se aos intransigentes do Syriza contra o euro, alinhar com Tzipras no cumprimento do novo memorando e da austeridade que tanto abominaram ou, simplesmente, vão meter a viola no saco e ir tocar para outra freguesia?

sexta-feira, 21 de agosto de 2015

Barbárie


Já não basta a barbárie da tortura dos animais para gáudio do sadismo público, que as touradas em geral constituem. Agora há quem queira juntar-lhe o picante do odioso atentado à dignidade humana dos anões.
Decididamente quando é que, perante a cobarde omissão do legislador, um tribunal tem a coragem de proibir estes espectáculos de degradação humana em nome da proteção constitucional da dignidade humana?

Hipóteses inéditas (3)

Salvo o critério genérico dos "resultados eleitorais", a Constituição não estabelece um critério estrito para a nomeação do Governo pelo PR após eleições. No entanto, até agora sempre foi chamado a formar governo o partido (real ou virtualmente) mais votado (que também tem sido sempre o maior partido parlamentar), mesmo em caso de vitória com escassa maioria relativa (caso do PSD em 1985).
Note-se que nos casos de vitória de uma coligação eleitoral em 1979 e 1980 não só os partidos da AD obtiveram em conjunto uma clara maioria absoluta de deputados mas também o PSD era de longe o partido virtualmente mais votado e o maior partido parlamentar (muito acima do PS), tendo por isso sido chamado a formar governo e tendo naturalmente renovado a coligação.
Nada indica que o resultado eleitoral de 4 de outubro próximo seja algo de semelhante. Mesmo que a coligação ganhasse as eleições com maioria relativa, sendo o PS o partido virtualmente mais votado e com mais deputados, do que se trata de saber é quem tem melhor título democrático para ser chamado a formar governo e submeter-se ao veredicto parlamentar.

quinta-feira, 20 de agosto de 2015

Hipóteses inéditas (2)

Deve observar-se que as coligações eleitorais não substituem os partidos que as compõem (os candidatos são sempre imputadas aos respetivos partidos proponentes) e que elas se esgotam com as eleições e com a atribuição de deputados eleitos, salvo se forem eventualmente renovadas depois das eleições, seja sob a forma de grupo parlamentar comum (o que nunca aconteceu), seja como coligações governamentais, se for caso disso (o que sucedeu em 1979 e 1980).
Além disso, como se deduz do art. 187º da CRP, quem é protagonista na formação dos governos são «os partidos representados na AR» e não as eventuais coligações pré-eleitorais, que desaparecem com as eleições. Teoricamente, aliás, nada impede um partido que concorreu em coligação com outro de entrar numa solução de governo sozinho (se tiver condições para isso) ou com um terceiro partido.

Hipóteses inéditas (1)

Até agora, ao longo de quatro décadas de regime constitucional democrático, as eleições parlamentares sempre tiveram um inequívoco partido vencedor (PS ou PSD), mesmo quando ele integrava coligações pré-eleitorais em lista comum com outros partidos (como sucedeu com a AD em 1979 e 1980).
Nas próximas eleições as coisas podem não ser tão claras se se confirmarem as previsões de que elas vão se decididas por pequena margem entre o PS e a coligação PSD-CDS. Pode de facto suceder que o PS ganhe as eleições (mais votos) mas consiga menos deputados do que os partidos da coligação (dada a vantagem de concentração eleitoral que a coligação proporciona aos partidos coligados). Pode também suceder que a coligação ganhe as eleições (em votos e nos deputados somados) por escassa margem mas que o PS tenha mais deputados do que o PSD (e ser virtualmente também o partido singularmente mais votado).
Nesses casos, quem é o verdadeiro vencedor das eleições? E quem deve ser chamado a formar Governo: o maior partido parlamentar (em ambas as hipóteses, o PS) ou o maior partido da coligação eventualmente vencedora (o PSD), apesar de ter menor grupo parlamentar do que o PS?

Treinador de bancada

Em campanhas eleitorais os partidos deviam limitar-se a prometer medidas políticas concretas, não resultados precisos (em matéria de crescimento, de emprego. etc.), os quais dependem sempre de muitas variáveis.

Adenda
O PS fez bem em esclarecer que o anunciado número de criação de empregos é uma estimativa do resultado das prometidas medidas de política económica, tributária, etc. constantes do programa eleitoral do PS e não um compromisso direto de resultados. Como se diz em linguagem jurídica, trata-se de uma "obrigação de meios" e não de resultados. Em todo o caso, teria sido preferível e mais prudente evitar mencionar números precisos. A comunicação eleitoral não prima pela sofisticação...

terça-feira, 18 de agosto de 2015

Mais integração da zona euro

Muitas da propostas do PSOE para dar maior coesão à zona euro fazem sentido: mais integração financeira e orçamental, recursos fiscais próprios, mais integração das políticas sociais.
Há, porém, uma medida que não faz sentido (abandonar os limites ao défice e ao endividamento de cada país) e há uma evidente lacuna nas proposta mencionadas: mais integração tributária, reduzindo a atual competição fiscal, especialmente nos impostos sobre os lucros das empresas.

Eleição do PR

Ciclicamente, a cada eleição presidencial, aparece alguém a defender o abandono da eleição direta do PR. Apesar de, por formação, eu ser a favor de um sistema parlamentar mais depurado do que o que temos, continuo a discordar dessa tese.
Primeiro, a eleição indireta por um colégio eleitoral reduziria a legitimidade política do PR sem a despartidarizar -- pelo contrário. Segundo, só a eleição direta legitima os poderes presidenciais autónomos de supervisão do sistema politico, desde o veto legislativo à dissolução parlamentar por iniciativa própria, não fazendo sentido nem constitucional nem político a afirmação de que o PR não dispõe de poderes que justifiquem a eleição direta. Terceiro, não é verdade que a eleição direta seja uma exceção nas repúblicas europeias --, pelo contrário (numa breve contagem cheguei a treze países!)
Embora não seja um limite material de revisão, a eleição direta do PR faz parte do compromisso constitucional originário e é requisito essencial do seu papel constitucional como "quarto poder", dotado de poderes constitucionais próprios.

quarta-feira, 29 de julho de 2015

"Salvaram" o Estado Social atacando-o?

"Presunção e desplante não faltam a um Passos  Coelho que quis ir além da troika e  nos fica na memória pela brutal receita de empobrecimento que aplicou. Nem a um Paulo Portas que dizia ser do Partido do Contribuinte mas foi cúmplice do maior aumento de impostos de que há memória, do roubo das pensões dos reformados e de tantas mais malfeitorias que arrasaram os recursos nacionais e a moral dos portugueses.
 Ouvi-los  dizer que "salvaram o estado social" (sic) é insulto à nossa inteligencia. "Salvaram " fomentando a miséria, pondo 2 milhões e 700 mil pessoas a viver abaixo do limiar de pobreza, incluindo 1 em cada 3 crianças , segundo dados da Caritas e OCDE)? retirando o subsídio de desemprego a centenas de milhares de pessoas, e cortando o seu valor e duração? retirando o Rendimento Social de insercao  (96 euros/mês, em 2014) a centenas de milhares de portugueses, 80 % deles sem qualquer fonte de rendimento? cortando o Complemento Solidário a centenas de milhar de idosos?
"Salvaram" a educação, despedindo 30 mil professores e milhares de funcionários das escolas, cortando 40 por cento nas actividades circum-escolares, aumentando o número de alunos por turma, desinvestindo totalmente na recuperação de escolas e de equipamentos, na ciência, na investigação?. 
"Salvaram a saúde" através do fecho de unidades, de cortes brutais nas equipas de médicos e enfermeiros, que levaram à rutura de serviços nas urgências, e da maior saída de profissionais de saúde de que há memória em quase 40 anos de SNS?"

(Extracto da minha ultima crónica no Conselho Superior, ontem na ANTENA UM, que pode ler-se na íntegra aqui http://aba-da-causa.blogspot.com/2015/07/vamos-votar-para-mudar.html)

sexta-feira, 24 de julho de 2015

Treinador de bancada

Parece clara a estratégia da direita para a pugna eleitoral de 4 de outubro: puxar pelos alegados "sucessos" recentes da sua governação e agitar o suposto perigo de um governo do PS fazer descarrrilar de novo as contas públicas.
O PS tem-se concentrado mais em denunciar o saldo negativo da legislatura do que em exorcizar o fantasma do laxismo orçamental. Penso, porém, que o PS corre sérios riscos eleitorais se deixar criar na opinião pública, sem contestação convincente, a ideia de que não leva a peito a disciplina orçamental e o equilíbrio das contas públicas.

quinta-feira, 23 de julho de 2015

Privacidade e segurança coletiva

Concedo que no mundo de hoje, com ameaças novas à segurança (nomeadamente o terrorismo internacional), é preciso dar aos respetivos serviços os necessários meios de ação, incluindo a monitorização de comunicações privadas (naturalmente com os necessários meios de controlo para prevenir abusos, incluindo autorização judicial). Por isso, concordo com a proposta de lei agora aprovada de facultar aos serviços de informações o acesso aos chamados metadados das comunicações (identidade, localização e duração), que aliás não incluem o acesso ao respetivo conteúdo.
Todavia, resta saber se essa solução é possível sem revisão constitucional. De facto, nem tudo o que parece razoável sob o ponto de vista da segurança tem cobertura constitucional. Sucede que a Lei Fundamental só admite a ingerência nas comunicações privadas em caso de investigação criminal, o que não é o caso. Ora, parece evidente que, mesmo sem acesso ao conteúdo das conversas e mensagens, os tais metadados fornecem uma informação altamente sensível sobre as comunicações das pessoas. Por isso, é de esperar que o Presidente da República suscite a fiscalização preventiva da constitucionalidade da norma em causa.

quarta-feira, 22 de julho de 2015

Pressão eleitoral

O Presidente da República reiterou enfaticamente a sua convicção no sistema de governo parlamentar (recusando soluções fora do quadro parlamentar e partidário) mas também a sua posição de que o próximo Governo deve ter apoio parlamentar maioritário, pelo que na falta de uma maioria eleitoral devem ser negociadas as necessárias coligações pós-eleitorais.
Cavaco Silva não esclareceu que instrumentos vai usar para "forçar" tal solução e se se recusará a nomear um governo minoritário, caso não consiga levar a sua posição avante. Todavia, a posição do PR vai ter dois efeitos políticos óbvios: (i) as duas forças candidatas à vitória eleitoral (PS e coligação PSD-CDS) vão redobrar a sua postura bipolarizadora ("ou nós ou eles"); (ii) ambos vão ser sujeitos a maior pressão para declararem antecipadamente se estão disponíveis para coligações no caso  de ganharem sem maioria absoluta (como é o mais provável).

Público ou privado?


Abertura da minha coluna semanal de hoje no Diário Económico. Se se tivesse seguido a minha proposta de há dez anos, quantos milhões não se teriam poupado ao orçamento e aos contribuintes?

Adenda
Há quem me acuse de "traidor" dos interesses comuns dos funcionários públicos. A diferença está em que enquanto muitos só veem os seus interesses próprios eu combato os privilégios de grupo, mesmo quando sou beneficiário deles.

Voltar ao mesmo?

A crise financeira de 2008 -- que desencadeou depois a crise do euro e das dívidas soberanas -- foi em grande parte provocada por falta ou défice de regulação e/ou supervisão do sistema financeiro. Por isso, tanto nos Estados Unidos como na Europa, a resposta à crise incluiu um reforço da regulação e da supervisão.
Parece, porém, que a maré está de novo a mudar. No Reino Unido o presidente da Autoridade de Supervisão Comportamental, que defende os interesses dos consumidores e dos clientes de produtos financeiros, acaba de se demitir (depois de saber que não verá o seu mandato renovado). O Financial Times refere que nem o Governo nem a City gostavam da sua atitude firme e severa contra as prevaricações do operadores. Será que vamos voltar à era da light-handed regulation, de tão má memória e tão nefastas consequências?

terça-feira, 21 de julho de 2015

Apóstolos


Paul Krugman, grande apoiante do Syriza na sua guerra contra Bruxelas, diz agora que pode ter «sobrestimado a competência do Governo grego».
Quando até os apóstolos começam a duvidar da competência dos profetas, as coisas podem começar a descarrilar!

segunda-feira, 20 de julho de 2015

Sondagens



Desde o princípio que questiono se o PS deve dar apoio a Sampaio da Nóvoa na corrida presidencial. Esta sondagem vai ao encontro da minha tese. Para já, o assunto está adiado (e deve continua a estar) até às eleições parlamentares.

A ler


Desde que conheci esta economista, vai para 15 anos, na ECORDEP -- que elaborou uma proposta de reforma da despesa pública em Portugal (e cujas propostas, a terem sido seguidas, teriam poupado muitos amargos de boca orçamentais) -- nunca mais deixei de apreciar a sua discreta sabedoria e prudência. Mais uma vez, vale a pena ler esta oportuna entrevista no Diário Económico.

sábado, 18 de julho de 2015

Balanço da legislatura


O Jornal de Negócios examinou a veracidade das afirmações do Primeiro-Ministro na recente entrevista televisiva. O resultado não é propriamente positivo em vários pontos e põe em causa a credibilidade do discurso ensaiado pelo chefe do Governo sobre o "processo de recuperação em curso".
Independentemente disso, Passos Coelho tem um problema insolúvel: mesmo que a evolução recente da economia, do consumo privado, do emprego, etc. seja positiva, a verdade é que a comparação tenderá sempre a ser feita com o início do seu Governo em 2011, ou seja, o balanço da legislatura (pelo menos enquanto permanecer a memória dos anos mais duros da austeridade, 2011-2013). E o saldo continua a ser negativo em muitos aspetos (PIB, rendimento das pessoas, emprego, etc.).
Tentar martelar os números e as comparações só agrava as coisas.

ADSE

1. O relatório do Tribunal de Contas sobre a ADSE veio confirmar que para equilibrar as contas do sistema não era necessária uma subida da quotização dos beneficiários para 3,5% da remuneração. Resta saber se o excedente excecional assim criado, após décadas de défices cobertos pelos impostos de todos (que chegaram perto de 50%!), não é transitório face aos riscos de sustentabilidade que o relatório também identifica.

2. O relatório do TdC informa também do calote das regiões autónomas (de muitas autarquias locais) à ADSE. É um escândalo que não pode continuar. Se as duas regiões autónomas retêm as quotas dos beneficiários da ADSE, a solução é obviamente  interromper a sua cobertura. Não há razão nenhuma para que os beneficiários do Continente financiem os beneficios dos funcionários dos Açores e da Madeira, cujas contribuições não chegam à ADSE.

3. O TdC considera que, depois de suprimidos algumas responsabilidades do SNS que ainda estão a cargo da ADSE, esta passa a prosseguir exclusivamente "fins privados, alheios ao Estado", sendo financiada por "fundos privados". Mas sendo assim, não se compreende que ela continue na esfera pública e a ser gerida pelo Estado. O solução está obviamente em privatizar o sistema, retirá-lo das contas públicas e entregar a sua gestão aos interessados, em auto-gestão mutualista ou noutro sistema concertado com os beneficiários.

sexta-feira, 17 de julho de 2015

Sectarismo

Ao decidir alterar a lei da IVG no final da legislatura, colocando um obstáculo psicológico adicional às mulheres, a coligação governamental reabre levianamente uma questão sensível, que pura e simplesmente tinha desaparecido da agenda política e social.
Resta saber se, para ir ao encontro da sua ala "pró-vida" mais reacionária, a coligação de direita não aliena o eleitorado centrista, que abomina o sacrifício da liberdade e da dignidade das pessoas nas aras do fundamentalismo religioso e do sectarismo ideológico.

Voltar ao mesmo?


Não param de se acumular os indicadores de disparo do consumo entre nós, com as pessoas a "vingarem-se" do aperto do cinto dos anos anteriores. Como o aumento de rendimento disponível é marginal, o crescimento do consumo só poder estar a ser feito à custa da poupança e do endividamento das pessoas. O pior é que há quem pense que o consumo deve ser ainda mais estimulado por via orçamental...
Além do risco de aumento do endividamento externo do País, a subida excessiva do consumo arrasta também ao aumento das importações e o risco de degradação da balança comercial externa. Voltamos ao mesmo?

quinta-feira, 16 de julho de 2015

Insustentabilidade orçamental





Estes quatro gráficos, retirados de um estudo recente sobre a Grécia, mostram o enorme aumento dos encargos financeiros com o sistema de pensões desde 2000 em comparação com a média da UE.
O 1º gráfico, em cima à esquerda, compara a evolução da idade efetiva da aposentação, que diminui na Grécia enquanto subiu na UE. O 2º gráfico compara a taxa de atividade da população entre os 55 e os 64 anos; uma diferença enorme. O 3º quadro mostra a evolução dos encargos financeiros com as pensões, com a Grécia a crescer muito mais do que a UE. E a mesma enorme disparidade se nota no último quadro, relativo à percentagem da verba das pensões na despesa pública.
Só há uma conclusão a tirar: o sistema de pensões grego tornou-se financeiramente insustentável. Justificam-se plenamente as reformas exigidas pelos credores.

Não é acordo. É ultimato.


"Não admira que não haja sentido de "ownership" por parte do Sr. Tsipras ou do Sr. Schäuble relativamente ao acordo. É que não é acordo nenhum: é um ultimato. Na base de um programa económico absurdo, injusto, cruel, inexequível. Uma vergonha, incompatível com os principios fundadores da UE".
Pior ainda, é um ultimato feito sob ameaça humilhante de expulsão da Grécia do Euro. Ora, a saída da Grécia do Euro não tem base legal. A sugestão de "Grexit" feita pelo Ministro alemão Schäuble é monstruosa: além da "mudança de governo" que visa na Grécia, representa uma tentativa  de "regime change" na UE.
Cabe a este Parlamento - com especial responsabilidade para esta Comissão ECON - defender a democracia. Isso implica fazê-la valer, não apenas na monitorização do processo de reformas a empreender pela Grécia, mas na modificação do programa para que seja viável e efectivamente ajude a Grécia a sair da calamitosa situação em que se encontra - isso requer por a reestruturação da dívida no centro do programa. Como se admite que a Comissão Europeia tenha escondido o relatório que confirma a insustentabilidade da dívida grega e que foi divulgado pelo FMI, dois dias antes do referendo grego, por pressão dos americanos?...
Mas onde está a Comissão? Alguns colegas bem sublinharam a importância de ser retomado o método comunitário contra o intergovernamental que produz tão desastrosos resultados.
Apelo a todos os colegas alemães pró-europeus, de direita e de esquerda. Reparem no editorial de hoje do "New York Times", sob o título : "Germany's destructive anger". 
"Timeout" para a Grécia? Não! "Timeout" para o Dr. Strangelove que trabalha para destruir o euro, a confiança dos cidadãos na UE e a própria União Europeia!  
Salvar a Grécia é salvar o Euro, é salvar a União!"

Minha intervenção esta manhã, na Comissão de Economia do Parlamento Europeu, em debate sobre a Grécia.

Duas lições gregas


Cabeçalho do meu artigo semanal de ontem no Diário Económico.

quarta-feira, 15 de julho de 2015

O acordo (2)

Alcançado o acordo, resta saber se a Grécia vai cumpri-lo. A incerteza não pode ser maior.
Primeiro, porque já falhou os dois anteriores. Segundo, porque este foi acordado pelo Governo Syriza sem convicção e sem nenhuma vontade o cumprir, Terceiro, porque, dada a vertiginosa degradação da situação económica e financeira do país sob o Governo Syriza (prevê-se uma queda de 4% no PIB!), as condições objectivas para cumprir o acordo não são as melhores.
Pode, portanto, suceder que este acordo seja somente deitar mais dinheiro à rua, não sendo mais do que um "trapo quente" para aliviar  a "doença grega", que não tem economia nem Estado para satisfazer as exigências do euro. Mas saber se a saída do euro é uma questão  apenas adiada, depois de queimados ingloriamente mais uns milhares de milhões de euros dos contribuintes europeus, depende mais uma vez somente de Atenas.

O acordo (1)

Não tem fundamento acusar a Alemanha de principal responsável pelo acordo para um terceiro resgate da Grécia, aliás aprovado por unanimidade.
Na verdade, a Alemanha (junto com a Finlândia e a Holanda) foi quem cedeu mais (até porque arcará com a principal responsabilidade pelo novo empréstimo), pois entendia que a Grécia, depois de ter desperdiçado dois resgates, não oferece garantias de cumprir mais um. Por isso, a Alemanha tinha uma clara preferência por uma saída temporária negociada da Grécia do euro, de modo a reconstruir a sua economia em bases mais competitivas, através da necessária "desvalorização externa".
Deve aliás dizer-se que nas negociações a Grécia só teve o apoio claro de Chipre (que é uma espécie de filial grega e está em programa de assistência), da Itália (que tem a maior dívida pública a seguir à Grécia) e da França (que está há anos em défice excessivo); ou seja, só o "clube de prevaricadores" da zona euro é que apoiou a Grécia...
No final vingou um compromisso, em que a Alemanha cedeu e a Grécia conseguiu o dinheiro que precisa para evitar a bancarrota, mas com algumas condições mais exigentes, como era de esperar. Quanto menos fiável é o devedor mais garantias tem de oferecer....

Um pouco mais de rigor sff


A ideia de imputar ao PS o Memorando de maio de 1911 com a troika (como decorre deste titulo do Jornal de Negócios de hoje) é uma óbvia inventona. Primeiro, a intervenção da troika foi querida e desencadeada pelo PSD e demais oposições, unidas na rejeição do PEC IV, a fim de encostar o governo Sócrates à parede (o que conseguiram). Segundo, a memorando foi negociado e assinado não somente pelo PS, nessa altura já demitido, mas também  pelo PSD e pelo CDS.
Se era ou não cumprível, isso é debatível. Mas rever a História do acordo e imputá-lo exclusivamente ao PS para alijar as responsabilidades próprias, isso é uma falsificação política.

terça-feira, 14 de julho de 2015

A questão não é a Grécia...

"O problema não é a Grécia, está longe de o ser e nunca o foi. Nem sequer é o euro,  que era sobretudo um instrumento politico para integrar mais a Europa. O problema é a Europa, esse projecto politico: como lembrou o Presidente Hollande, na noite de domingo, o que está em causa é "a concepção da Europa". A crise grega foi o sintoma, o estado da Europa é a doença. 
A revista alemã 'Der Spiegel', numa capa da semana passada, apresentava Angela Merkel sentada sobre as ruínas da União Europeia. Sob o título "A Senhora das Ruínas", estava a legenda: "Se o euro falhar, a chancelaria Merkel falha também". Com o frágil acordo de ontem, todos se mantêm em jogo, por enquanto. Veremos o que dizem os europeus. Veremos que Europa querem os alemães e que Alemanha aceitam os europeus. A questão não é a Grécia, é a Alemanha! Eu quero a Alemanha na Europa. Mas não quero uma Europa alemã".

(Extracto da minha crónica de hoje no Conselho Superior, ANTENA 1. Que pode ser lida na íntregra aqui http://aba-da-causa.blogspot.be/2015/07/contra-uma-europa-alema.html)