quinta-feira, 9 de junho de 2016

Não aprender

É um erro grosseiro a decisão do Governo de isentar alguns troços das autoestradas A3 e A4 de portagens, revertendo a decisão do anterior Governo.
De facto, não se vê nenhuma razão para que os utentes daquelas autoestradas tenham o privilégio de ficarem isentos do princípio utilizador-pagador, ao contrário de todas as outras autoestradas do país.
Se é por causa da alegada má qualidade das alternativas rodoviárias a essas autoestradas, então muitas exceções haveriam de ser criadas, como por exemplo entre Aveiro e Coimbra ou entre Aveiro e Viseu.
Depois de há vinte anos ter incorrido em dois erros fatais nesta matéria, que ficaram muito caras ao País - ao isentar a CREL de portagens e ao criar as malfadadas SCUTs -,  o PS insiste em não aprender que (i) as finanças públicas não admitem autoestradas gratuitas e que (ii) a equidade territorial não é compatível com favores locais.

Mercados protegidos


Eis o lead da minha coluna semanal de hoje do Diário Económico digital. Pela abertura dos "mercados protegidos" das farmácias e dos táxis.

Adenda
Para evitar equívocos devo dizer que defendo publicamente a liberalização das farmácias desde sempre (por exemplo aqui) e que defendo a liberalização dos táxis desde pelo menos há oito anos (como recordo aqui e aqui), pelo que a minha posição não tem nada a ver com a recente polémica suscitada pela Uber.

Turquia - ataques à Democracia e ao Estado de direito

"Os atentados à Democracia e ao Estado de Direito na Turquia sucedem-se, tal como se sucedem os ataques terroristas, como o de ontem, em Instanbul, que inequivocamente condenamos. Uns e outros estão, desgraçadamente, ligados.

A retirada colectiva de imunidade a 138 deputados é uma indisfarçavel ofensiva contra o Grupo Parlamentar HDP. A brutal repressão sobre a minoria curda e sobre todos os críticos do projecto de poder pessoal do President Erdogan passa agora por esta grosseira violação dos critérios de Copenhaga, da Democracia e do Estado de direito. 

Entretanto, apesar do que hoje aqui disse o Comissário Hahn, Conselho e Comissao continuam a negar a realidade, a deixar-se chantagear, desvalorizando a  trágica regressão democrática na Turquia, repetindo absurdamente que é “país seguro”, que "praticamente" todos os critérios para a liberalização de vistos estão cumpridos e defendendo o "dirty deal" para "outsource" refugiados. 

Nesta trajectoria alucinada, em breve estaremos aqui a debater como responder à crise do afluxo de refugiados… turcos!"


(Minha intervenção em debate ontem no plenário do PE sobre a situação na Turquia)


quarta-feira, 8 de junho de 2016

Cambalhota

No Governo de Passos Coelho o CDS aprovou o corte de pensões em pagamento (que o TC vetou) e o corte de pensões a atribuir a partir de 1/1/2014 (10% nas pensões do setor público). Não há ocasião em que o CDS não defenda a necessidade de assegurar a sustentabilidade do sistema de pensões, o que previsivelmente vai exigir novos cortes no cálculo das pensões no futuro. O mais provável é que os atuais contribuintes venham a ter de trabalhar mais tempo para a pensão e a gozar de pensões mais reduzidas do que as que hoje as suas contribuições estão a financiar.
Pois é este mesmo partido que hipocritamente vem agora exigir que os contribuintes do sistema de pensões sejam informados sobre a expetativa do valor da sua futura pensão! Como se alguém pudesse garantir tal expetativa! É preciso ter lata! 

Zero de execução de Plano Juncker em Portugal!

"Zero de taxa de execução do EFSI (Fundo Europeu para o Investimento Estratégico - Plano Juncker) em Portugal!
Senhor Vice-Presidente Katainen - 
Haverá mais incisiva avaliação do impacto do EFSI para criar emprego, apoiar PMEs e projectos que promovam crescimento económico, e para corrigir desiquilibrios macroeconomicos na Europa, num país que Comissão e Conselho e o seu chefe "ex-machina", Dr. Schäuble, diziam até Novembro passado "estar no bom caminho", depois de ter sido submetido a um duro programa de austeridade vigiado pela Troika?
Se o EFSI pode funcionar e até estará a funcionar noutros países, então a responsabilidade pelo falhanço em Portugal é do anterior governo português, ultraliberal e mais troikista do que a Troika. E sua, Senhor Vice-Presidente Katainen, que manifestamente não cuidou da aplicação do Fundo em Portugal!
A acrescer à incapacidade do governo ultraliberal dos últimos quatro anos para usar o EFSI, os portugueses vêem agora o Eurogrupo e alguns comissários, como o Senhor Vice-Presidente, ameaçar Portugal com sanções pelo défice orçamental de 2015, engendrado pelas políticas desastrosas desse mesmo governo ultraliberal. Quer o Senhor Vice Presidente Katainen por todos os portugueses contra a União Europeia?"

Esta era a intervenção que escrevi para fazer no debate plenário no PE, esta manhã, sobre a aplicação do Plano Juncker para relançamento do investimento estratégico na UE. Mas não fiz, porque não me foi dada a palavra (num debate centrado nos membros da Comissão de Economia do PE). E não a posso mandar como "declaração escrita" para as actas do debate, porque cada MEP só tem direito a uma por sessão plenária e eu já exerci esse direito. Enfim, aqui fica! Para registo e à espera de próxima oportunidade de confrontar o Vice-Presidente finlandês.

Partilha e gestão de bases de dados para combater criminalidade, incluindo terrorismo

"Os atentados de Paris e de Bruxelas demonstram que precisamos de mais Europa para defender a nossa segurança e provam a interdependência entre segurança interna e externa. Combater o terrorismo e outras formas de criminalidade organizada é prioridade que nenhum Estado-Membro pode prosseguir sozinho: impõe partilha de capacidades, em especial na "intelligence", na justiça e na polícia, incluindo a polícia de fronteira e autoridade alfandegária.  Só assim conseguiremos cumprir os objetivos da Agenda para a Segurança, nos seus vários níveis: cooperação entre Estados-Membros, cooperação entre autoridades nacionais e as diferentes Agências da UE, cooperação a nível operacional, formação e exercício conjunto, o que exige financiamento adequado.

Hoje temos em vigor um quadro legislativo europeu para a proteção de dados que permite uma partilha de dados mais segura entre autoridades policiais e judiciais, que assim podem cooperar de forma eficaz para combater o crime e, especificamente, o terrorismo. Um quadro que, assegurando respeito pelos direitos fundamentais, e pelos principios da limitação da finalidade e da proporcionalidade, permite eliminar bloqueios e falhas na arquitectura do controle e gestão de dados e combater a fragmentação, incluindo a sentida na segurança e controlo de fronteiras. Um quadro que cria e regula as condições para ser agilizada a interoperabilidade entre bases de dados das forças de segurança a nível interno em cada Estado Membro e no plano europeu. E que impõe que em cada Estado Membro e em conjunto trabalhemos para eliminar deficiências nas funcionalidades dos sistemas existentes - e, portanto, no alcance e eficácia da necessária interoperabilidade. 

Por outro lado, no mês passado, este Parlamento aprovou o novo regulamento da EUROPOL, que determina o reforço do controlo democrático da cooperação policial, a exercer pelo Parlamento Europeu em associação com os parlamentos nacionais. Queremos ser mais eficazes na luta contra o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo. O que tem faltado é vontade política por parte dos Estados Membros para que os seus agentes se empenhem na utilização dos mecanismos europeus existentes. Cabe aos Governos impelir para a cooperação  europeia serviços de informação, polícias e instâncias judiciárias, que precisam de ter meios e capacidades reforçadas e não continuar a ser asfixiados por constrangimentos orçamentais.

Os ataques terroristas em Paris e Bruxelas demonstram como pagamos caro, e em vidas, a fragmentação, a desconfiança, a desunião. Para teremos mais Europa na seguranca e defesa dos cidadãos, incluindo na defesa das liberdade fundamentais, precisamos também de nos livrar das políticas neoliberais que, fomentando desemprego, exclusão social e discriminação, alimentam o ressentimento de tantos jovens europeus que se juntam às fileiras do Daesh, muitos depois de se radicalizarem sozinhos, online. O terrorismo não vem de fora, não nos iludemos a chamar-lhes "foreign fighters", nem a acusar refugiados e migrantes. O Conselho Europeu tem de  assumir as suas responsabilidades e acabar com políticas austeritarias desastrosas que só trazem insegurança aos europeus e inflamam forças extremistas anti-UE e anti-democracia".


Intervenção que fiz (mas que tive de cortar por exceder os 2 minutos que me foram dados) no debate plenário do PE, hoje, sobre gestão de bases de dados no combate ao terrorismo e criminalidade organizada.

 

Conivência de governos europeus no programa de tortura da CIA

"European Court of Human Rights judgements passed in the cases Al Nashiri and Abu Zubaydah vs Poland, and pending respectively versus Romania and Lithuania, and the Nasr and Ghali vs Italy, plus Al Masri vs FYROM, judicial decisions in the UK in favor of victims of torture, all prove that European governments lied to this Parliament to callously cover up active complicity with the CIA extraordinary renditions/torture program. Worse, their cooperation was payed with large sums of money, as the U.S. Senate Intelligence Committee of December 2015 reveals.

Worse even: Impunity has been granted by EU States to those responsible for these crimes. In Italy, for instance, "state secrecy" was used to block the judiciary and as a result, innocent low level officers were convicted while top culprits are protected: Italy wants now to put in jail Portuguese-American Sabrina de Sousa, a former CIA officer who was tried in absentia and never given the chance to prove her denial of any involvement. Even the victim of torture and kidnapping in that case, Mr. Abu Omar, the imam of Milan, has stated that she is but a scapegoat.

In my country, Portugal, all cover up efforts were made to protect Mr. Durão Barroso, who as Prime Minister abetted the CIA renditions program, as I reported in detail to the General Public Prosecutor - the case was closed to spare the, in the meantime, made President of the European Commission.

How can the European Union be credible in the eyes of its citizens and the world and effectively fight terrorism, if European States behave in this criminal way and actually play into the hands and propaganda of terrorists?

Also I will never, ever, let this investigation go without accountability happening."


Minha intervenção ontem, no debate plenário do PE sobre o seguimento do inquérito sobre a cumplicidade de governos europeus com o programa de "extraordinary renditions"/tortura da CIA.

 

Leviandade

«Os tratados exigem-nos que tenhamos o défice abaixo de 3% e o que estamos a discutir é se esse défice é de 2,2%, 2,3% ou 2,5%. Para o país qual é a diferença de ter um défice de 2,2% ou 2,7%?»
Esta passagem da entrevista da deputada do BE, Mariana Mortágua, ao DN mostra a compulsiva leviandade política do Bloco.
Primeiro, a UE não exige somente um défice nominal abaixo dos 3% do PIB; quer também a redução continuada do défice estrutural para 0,5%, o que na atual situação da economia supõe um défice nominal bem abaixo dos 3%.
Segundo, a diferença entre um défice orçamental de 2,2% e de 2,7% [a OCDE já fala em 2,9%!] está entre o Governo cumprir ou falhar os seus compromissos orçamentais, com o crédito ou descrédito político que vai associado a cada uma dessas opções.
Terceiro, e mais importante, a diferença essencial entre uma e outra meta do défice está em pelo menos uns 700 milhões de dívida pública adicional em cima da montanha que o País já tem, falhando o compromisso de redução da dívida pública e agravando a dependência externa do País e as condições de acesso ao financiamento externo.
Que ideias destas possam ser defendidas por quem defende a "reestruturação da dívida" e o "calote" aos credores, pode entender-se. O problema é se tais ideias encontram eco também dentro do PS...

terça-feira, 7 de junho de 2016

Sobre o "compacto migrações" tirado da cartola na UE...

"Mil mortos só na semana passada no Mediterrâneo: pelo falhanço em responder à crise humanitária que há muito vimos vir, percebe-se que Conselho e Comissão não têm ideias nem sobre como lidar com as causas, nem para enfrentar as consequências, apostando em replicar com outros o imoral negócio de "outsourcing" feito com a Turquia.  E assim continuam a dar negócio aos traficantes não abrindo vias legais e seguras de acesso a quem pede protecção, tal como se demitem de explicar aos europeus que os fluxos de migrantes e refugiados, se bem geridos, podem ajudar a travar o envelhecimento da Europa. E não avançam sequer para criar  instrumentos para financiar a integração de refugiados e migrantes.
Tratar África “one-size-fits-all” é erro grosseiro. Vários dos regimes tidos como parceiros são causadores da opressão e da miséria de que fogem refugiados e migrantes: fabricam-nos.
Um Plano Marshall para Africa deve começar por parar a austeridade destruidora de emprego na própria União. Mas, sem duvida, precisamos de uma resposta política estratégica: ela implica que os governos europeus parem de acolher fluxos ilicitos de capitais que elites cleptocratas desviam dos recursos dos seus povos e Estados. Parem de sustentar regimes opressivos, como os do Egipto, Sudões, Etiopia, Eritreia, entre outros que reuniram na Conferência de La Valetta. E parem de desperdiçar a União para agir coordenadamente nos quadros PESC e PCSD a fim de resolver conflitos, combater terrorismo e criminalidade organizada, reforçar a "rule of the law" e promover o desenvolvimento sustentável em África, na vizinhança e além delas."


Declaração que não pude fazer, mas enviei por escrito, para debate sobre "migration compact" no PE, esta tarde.

Inconstitucionalidade

1. Creio que não faz muito sentido invocar a "lei travão orçamental" (que proíbe iniciativas legislativas dos deputados que aumentem a despesa prevista no orçamento do ano em curso) contra a redução do tempo de trabalho semanal dos funcionários públicos para as 35 horas, por dois motivos: (i) o previsível aumento da despesa pública não resulta direta e automaticamente da redução do horário, podendo este ser feito teoricamente à custa do desempenho do serviços; (ii) a "lei travão" existe para proteger o Governo contra a irresponsabilidade orçamental dos deputados; ora neste caso o Governo não só não se opõe como apoia!

2. Para além das objeções políticas contra as 35 horas, as objeções de constitucionalidade só poderiam derivar da eventual infracção do princípio da igualdade, dada a discriminação que se cria em relação aos trabalhadores do setor privado e, mesmo dentro do setor público, a discriminação contra os trabalhadores com contrato de trabalho de direito laboral comum, que não são abrangidos pela redução.
Quando se trata de princípios constitucionais, as questões de constitucionalidade não são liquidas. Mas sabe-se a especial sensibilidade do TC à questão da igualdade de tratamento entre os trabalhadores do setor público e os do privado, que levou o Tribunal a declarar a inconstitucionalidade de cortes de remuneração que só afetavam os primeiros. A questão da desigualdade é previsivelmente mais sensível quando afeta trabalhadores sujeitos à mesma entidade empregadora.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

Amanhã vou estar aqui


Primeira de uma série de conferências sobre os quarenta anos da CRP.

Laicidade


Este é o lead da minha coluna da semana passada no Diário Económico. O Estado tem uma obrigação constitucional de respeitar e fazer respeitar a liberdade religiosa das pessoas, mas não tem de financiar as religiões. E num Estado laico não deve. Cabe aos crentes fazê-lo.

Congresso (3)

Ensina a arte bélica que exércitos animicamente mobilizados e confiantes nos seus generais lutam mais empenhadamente e têm mais condições de êxito. O mesmo vale no campo da luta política.
António Costa mostrou mais uma vez a sua mestria em "puxar" pela confiança dos militantes no partido e no Governo. Não há líderes sem essa qualidade.
Compreensivelmente, os motivos de preocupação provindos da frente económica e orçamental ficaram nos bastidores...

Congresso (2)

Segundo Pacheco Pereira, convidado no Congresso, não há condições de realização de políticas de esquerda enquanto se mantiver em vigor o Tratado Orçamental, que veio apertar os critérios da disciplina orçamental e de controlo do endividamento público na zona euro. Rezam as crónicas que foi muito aplaudido quando defendeu que o PS devia "rasgar" tal tratado.
O problema é que o respeito do Tratado Orçamental não pode ser considerado nem esquerda nem de direita, sendo condição de manutenção da moeda comum. De resto, a meu ver, o maior ultraje que se pode fazer às políticas de esquerda é aceitar que elas só são financiáveis através do défice e da dívida.

Congresso

Foi quase unanimemente ratificada a aliança do PS com a extrema-esquerda parlamentar, como se ela não fosse a base parlamentar de uma solução de governo conjuntural e tivesse vocação de continuidade para além dele.
Com isso foi substancialmente alterado o xadrez político nacional e a posição do PS nele. Em vez da tradicional trilogia direita-PS-esquerda de protesto, com um PS tão distante (ou mais) da segunda quanto da primeira, passamos a ter uma bipolarização direita-esquerda, com o PS a liderar o bloco à esquerda.
Resta saber se a aliança de esquerda tem pés para andar depois da "geringonça" e se, alinhado à esquerda, o PS mantém a capacidade de atração do centro sociológico, que dita as vitórias eleitorais..

Adenda
O PS deveria agradecer a Francisco Assis a quebra da unanimidade celebratória da aliança do PS à esquerda. Receio bem que no dia em que o PS perder o seu pilar social-democrata liberal, perderá também a sua condição estrutural de partido de governo, que nunca deixou de ser nestas quatro décadas de democracia.

sábado, 4 de junho de 2016

Desafios socialistas para Portugal e para a Europa


Minha intervenção no XXI Congresso do PS, esta tarde:

"Mil milhões de euros - que folga não nos dariam no défice face ao famigerado Pacto Orçamental? no alívio das famílias da classe média sobrecarregadas de impostos? e das PMEs, que em Portugal e na UE pagam mais 30% de impostos, em média, do que as grandes multinacionais?
Mas mais de mil milhões de euros foram desbaratados só em 2015, quando o Governo Coelho/Portas deu isenções e benefícios fiscais, em total opacidade, a certas empresas, muitas de fachada para encobrir esquemas de corrupção e criminalidade, nacional e estrangeira, abrigados em jurisdições offshore. Não havia dinheiro, diziam Direita e Troika para justificar a austeridade cega com que brutalmente impuseram cortes nos salários, pensões e serviços públicos e sobrecarregaram de impostos quem trabalha. Pois não havia dinheiro porque ele se acumulava - acumula - nas offshores!
É preciso que nós, socialistas, tenhamos consciência de que, contando com transferências de lucros, dividendos e investimentos de carteira, foram saindo de Portugal, ano após ano, subtraindo recursos ao Estado, montantes astronómicos - nos ultimos quinze anos totalizando porventura mais do que a dívida pública nacional, que a Direita no poder só fez aumentar.
O PS, agora no Governo, tem de agir para travar a indústria de escroques que, dominando a banca, consultoras financeiras, escritórios de advocacia, etc., vivem de procurar capturar a governação para organizar esse desvio de recursos, legal e ilegalmente, para paraísos fiscais como Holanda, Luxemburgo, Panamá, Hong Kong, Bahamas, etc... 
Como aqui hoje frisou o Martin Schulz, é preciso pressionarmos para serem aplicadas por Comissão Europeia, Conselho e Estados Membros as medidas propostas pelo Parlamento europeu depois de ter inquirido sobre os chamados "Luxleaks", inquérito que vai prosseguir aos chamados "Panamá Papers". Para que sectores financeiros, imobiliários e empresariais, nacionais e europeus, não continuem a ser verdadeiros agentes, não apenas de desvio das receitas dos Estados à conta dos impostos dos contribuintes, mas também de lavagem e reciclagem dos recursos roubados a outros povos, por cleptocratas e corruptos, sejam angolanos, russos, chineses, brasileiros ou outros. Não se trata apenas de assegurar justiça fiscal: é a democracia e a integridade da governação que estão em causa.
Sem fazer tudo para recuperar esses recursos e os mobilizar para relançar investimento público e privado e o emprego, os cidadãos não vão voltar a acreditar nos governos e nas instituições europeias. E cada vez mais veremos crescer perigosos movimentos populistas, nacionalistas e extremistas, que louvam Brexits e ditaduras, levantam fronteiras e impelem governantes fracos a fazer indecentes negócios, como o aprovado pelo Conselho Europeu com a Turquia para empurrar  refugiados e migrantes, que desumanamente deixamos atacar e afogar.  E é neste quadro que um país que cumpre as suas obrigações de solidariedade, como Portugal pela mão do governo do PS, se torna exemplo excepcional - como destacou o Presidente do PE. Diz muito, isto, do triste estado a que chegou a nossa Europa.
Mas não podemos baixar os braços: para regular o mundo globalizado e em descontrolada transformação pela evolução tecnológica, precisamos de governação a nível europeu. Face a ameaças e desafios cada vez mais transnacionais, incluindo à nossa segurança, como a ameaça terrorista demonstra, precisamos absolutamente de mais solidariedade e cooperação europeias: é tempo de avançar para uma Europa federal, com soberania partilhada, mas com mais democracia e transparência, porque só assim terá autoridade e capacidade regulatória. Se aceitarmos continuar sob a batuta de uma "Grosse Koalition" em que a social democracia se desacredita, com uma  preconceituosa, impositiva, sem principios e sem estratégia, veremos a Europa, com ou sem Brexit, fragmentar-se e enfraquecer. E da actual insegurança não tardaremos a resvalar para a guerra. 
Não o queremos. Por isso é que temos de continuar a trabalhar para fazer funcionar a "geringonça", mas também precisamos que o Governo português se bata no Conselho Europeu, e na nossa própria família política socialista europeia, por uma agenda de esquerda.  Pela integração política, o emprego, progresso econômico, justiça fiscal, Estado social e respeito pelos valores e princípios europeus, em especial os direitos humanos. Para combater a austeridade destrutiva da direita neo-liberal e os ventos xenófobos e violentos que ela semeia. Para voltar a dar esperança e confiança aos povos europeus, como já as estamos devolver aos portugueses.

Viva o PS!
Viva Portugal! 
Por uma Europa Unida ao serviço dos cidadãos!"

quarta-feira, 1 de junho de 2016

Democracia participativa

1. Neste interessante debate aqui relatado pelo Público sobre o ensaio da democracia participativa protagonizado pela "Carta Constitucional de Coimbra" aprovada há 15 anos - em cuja redação me envolvi -, o principal fator em que insisti para explicar o seu insucesso, a par da inamistosidade do poder municipal de Coimbra, foi o erro de conceção que consistiu em tentar institucionalizar algo que resiste à institucionalização e que é por natureza descontinuo e fragmentário, vivendo de causas e de momentos propícios, como é participação cívica no poder local.

2. Como mostram os exemplos noutras paragens, incluindo em Portugal, as experiências de democracia participativa mais bem sucedidas giram à volta de um número contado de temas e de mecanismos, como o orçamento participativo, a convocação de referendos locais, a resposta a consultas públicas lançadas pelo município, os observatórios cívicos setoriais (cultura, ambiente, transportes públicos, habitação social, etc.), os painéis ou júris cívicos destinados a debater e "julgar" as iniciativas ou políticas municipais mais críticas (reordenamento urbanístico, grandes obras públicas, etc.).

Imperialismo


Por descuido só hoje registo aqui no Causa Nossa, como habitualmente, a minha coluna no Diário Económico da semana passada. Ou como o imperialismo da liberdade de expressão sacrifica abusivamente outros direitos fundamentais não menos importantes, como o direito à honra e ao bom nome.

domingo, 29 de maio de 2016

E ele, ao menos, escuta?

Segundo a imprensa, os conselheiros do Presidente da República aconselham moderação e prudência na sua frenética loquacidade sobre tudo e mais alguma coisa. Nada que não tivesse sido anotado aqui, desde cedo.
A pergunta, porém, é: ele, ao menos, escuta os conselhos?!

Tonterias

Há quem leve a sério a tonteria de um apresentador de televisão sobre as supostas raízes marxistas do fascismo, invocando o facto de Mussolini ter sido marxista antes de se tornar líder fascista. Pelo mesmo diapasão poderíamos dizer que o marxismo também está na origem do neoliberalismo, pois alguns dos seus principais próceres (e não só entre nós) vieram do marxismo, sobretudo nas suas versões trotskista e maoísta...
Marx tem costas largas, bem se sabe, sendo reivindicado por várias ideologias ao longo dos últimos 150 anos - desde a social-democracia originária aos comunismos e neocomunismos de todos os matizes -, várias das quais ele teria enjeitado liminarmente. Largas são, mas nem tanto!

Falsificação

1. Parece que há hoje uma manifestação pela "liberdade de ensino" protagonizada pelos colégios privados. O lema da manifestação é, porém, uma falsificação política e ideológica.

2. Se por liberdade de ensino se quer dizer o que a expressão significa em primeiro lugar, ou seja, liberdade de ensinar e de aprender de escolas, professores e alunos, então estas manifestação não faz nenhum sentido, pois em Portugal as únicas escolas onde tal liberdade vigora em pleno são as escolas públicas, que gozam de autonomia pedagógica e que não podem ter agenda confessional nem doutrinária, ao contrário de muitos colégios privados, empenhados numa missão de "doutrinação" no pior sentido da expressão.

3. Se se quer dizer a liberdade de criar e de frequentar escolas privadas, a manifestação também não faz nenhum sentido, pois tal liberdade não está nem nunca esteve em causa em Portugal desde 1976. Como se sabe as obrigações constitucionais do Estado em relação às liberdades são respeitar o seu exercício pelos interessados e fazê-las respeitar pelos outros.
Entre nós, o Estado cumpre rigorosamente essas obrigações. Aliás, a proteção dessa liberdade só tem sido reforçada, por exemplo através da equiparação plena do seu ensino com o das escolas públicas. Por isso, ninguém é obrigado a frequentar o ensino público nem sofre nenhuma desvantagem escolar por preferir as escolas privadas.

4. Se se quer dizer o que efetivamente se quer - ou seja, reivindicar o financiamento público dos colégios privados -, então a manifestação faz sentido como defesa de interesses particulares, mas não mais do que isso.
Não é preciso ter estudado direito constitucional, para se saber que o Estado não tem nenhuma obrigação de financiar o exercício das liberdades individuais (seja a "liberdade de ensino", seja a liberdade de religião ou de associação, ou outra qualquer). A obrigação do Estado é sustentar os serviços públicos, não os serviços privados paralelos, que devem ser financiados pelos seus clientes. É assim na medicina privada, nos serviços sociais privados, nos transportes privados e até na segurança privada e na justiça privada (arbitragem). Em nenhum caso o Estado têm obrigação de as financiar para assegurar uma suposta "liberdade de escolha" entre o público e o privado.
Porque haveria de ser diferente no ensino privado, salvo os casos de falha da rede escolar pública, pondo a cargo do Estado o financiamento de colégios privados em prejuízo da sua obrigação de financiar o serviço público de ensino?

A diferença

A UGT é contra a redução do horário de trabalho semanal para a 35 horas no setor privado, argumentando sensatamente que isso levaria ao encerramento de empresas e ao consequente desemprego.
Mas ao ser a favor da redução de horário no setor público (sem redução correspondente de remuneração), a UGT admite implicitamente que isso só não leva ao encerramento de serviços públicos e ao desemprego dos respectivos funcionários... porque os patrões são os contribuintes!
Onde fica o princípio da igualdade de tratamento e da não discriminação legal dos trabalhadores do setor público e no setor privado, eis o que fica por explicar...

sábado, 28 de maio de 2016

"Aristocracia operária"

O acordo laboral entre os armadores e os estivadores do porto de Lisboa, negociado sob a égide do Governo, inclui não somente as progressões automáticas por efeito do tempo mas também a limitação da entrada de novos trabalhadores, com o pretendia o sindicato.
Se a primeira cláusula é nociva, a segunda é péssima. Que num país a braços com elevado desemprego, um sindicato consiga impor às empresas e ao Governo um veto à contratação de mais trabalhadores, só para assegurar a remuneração acrescida de mais horas extraordinárias, é ultrajante!
Enquanto na capital uma "aristocracia operária", forte do apoio dos sindicatos e os partidos de esquerda, consegue fazer valer os seus privilégios indevidos, por esse país fora inúmeros trabalhadores, desamparados por uns e por outros, passam toda a vida a ganhar o salário mínimo, sem qualquer progressão na sua carreira, restando-lhes a consolação de terem emprego!
Com efeito, também entre os trabalhadores há os filhos e os enteados do poder político e sindical...

Erro crasso

O "relatório" do Tribunal de Contas que considera válidos os contratos de associação com colégios privados sem verificação de carência da rede escolar pública, com o argumento de que o Estatuto do ensino particular de 2013 revogou esse requisito, baseia-se num erro crasso, não se dando conta de que tal diploma governamental tinha de respeitar a Lei de bases do ensino, que estabelece tal requisito.
Recomenda-se um curso elementar de Direito constitucional por aquelas bandas!
De qualquer modo, o referido relatório não constitui nenhuma decisão judicial, que aliás não teria efeitos fora do caso concreto em que foi elaborado e nem sequer impediria a apreciação da ilegalidade dos contratos em causa pelos tribunais administrativos competentes, se for caso disso, pelo que nenhuma serventia tem para legitimar o assalto da corporação dos colégios privados ao dinheiro dos contribuintes.

Arrumado

O Ministério da Educação considera que o parecer da PGR sobre os contratos de associação com os colégios privados lhe dá dá razão quanto aos dois pontos-chave em questão, a saber:
    - os contratos firmados pelo anterior Governo cobrem as turmas contratadas até ao fim do respetivo ciclo escolar mas não cobrem a abertura de outras tantas turmas no próximo ano escolar para a abertura de novos ciclos;
   - o Estatuto do ensino particular de 2013, que removeu o requisito da carência da rede pública, é ilegal, pelo que são inválidos os contratos de associação que não passem esse teste.
Todavia, quanto ao segundo ponto, a PGR considera, erradamente, que o Estatuto não é incompatível com a lei de bases.
Seja como for, o ME não põe em causa os contratos existentes. O que diz é que eles só cobrem as turmas iniciadas no corrente ano e que só celebra novos contratos em caso de carência da rede pública, e a lei não obriga a fazer mais. Não existe nenhuma obrigação de financiamento público fora dessa situação. Questão arrumada, portanto.
[revisto]

Adenda
O lóbi dos colégios privados vem contestar a interpretação dada pelo ME ao Parecer da PGR, quanto ao primeiro ponto. Mas sem razão; a PGR só faz uma exceção, mais uma vez erradamente, para os contratos do 2º ciclo do básico, que, na sua interpretação, ainda abrangem a abertura de novos turmas no próximo ano.
[revisto]

Adenda 2
Por mais que os colégios privados tentem tresler a seu favor o parecer da PGR, é evidente que perderam a favor do ME a guerra que travavam sobre o âmbito dos contratos de associação em vigor.  A partir de agora já não podem continuar a dizer que o Governo quer "cortar nos contratos", porque não há corte nenhum. Há, sim, corte no âmbito imaginário que os colégios reivindicavam.

sexta-feira, 27 de maio de 2016

Sem escrúpulos

O Presidente da República veio desautorizar o lóbi dos colégios privados quando estes anunciaram publicamente o alegado apoio total que tinham recebido de Belém.
É evidente que, quaisquer que sejam as suas simpatias políticas, Marcelo Rebelo de Sousa não podia consentir ser apresentado publicamente como apoiante de um grupo de interesses privados contra o Governo - o que seria inédito nos anais da democracia portuguesa -, ainda por cima quando está em causa a defesa de privilégios ilegalmente obtidos do anterior Governo e quando o Governo tem toda a razão, política e constitucional, na defesa da escola pública e do bom uso dos dinheiros públicos.
Mas o episódio mostra a vergonhosa falta de escrúpulos institucionais e políticos da corporação dos colégios privados na instrumentalização política do Presidente da República, com o despudorado apoio de toda a direita política e mediática.

quinta-feira, 26 de maio de 2016

Há 15 anos

Sobre um ensaio de democracia participativa local.

Contra!

É evidente que os muçulmanos de Lisboa, tal como os crentes de qualquer religião, têm todo o direito de construir uma nova mesquita onde quiserem, nomeadamente na Mouraria. Mas o município de Lisboa não é para aí chamado (salvo para licenciar a obra), muito menos para assumir o encargo de facultar o terreno e construir a mesquita à custa dos contribuintes.
Num Estado laico, assente na separação entre o Estado e a religião, não cumpre às entidades públicas encarregarem-se da construção de templos religiosos ou financiarem atividades religiosas. Cabe-lhes, sem dúvida, respeitar a liberdade religiosa de toda a gente e de todas as igrejas, sem discriminações, e fazê-la respeitar por todos. Não lhes compete, nem podem, financiar o exercício da liberdade religiosa.
O oportunismo filorrelioso do Estado não é menos censurável do que o militantismo laicista. Ambos são incompatíveis com a laicidade respeitosa da liberdade e da diversidade religiosa.
Quando é que, de uma vez por todas, se leva a sério a laicidade do Estado em Portugal?!

Causas

1. Ao longo dos anos - aqui no Causa Nossa desde 2003 e antes disso no Público e noutros jornais - fui militando persistentemente por muitas causas públicas, em geral alinhadas à esquerda (como a despenalização do aborto, a defesa do SNS, a instituição do ensino pré-escolar público, a descentralização regional do Estado), outras nem tanto (como a luta contra o protecionismo corporativo na economia e nas profissões, a liberalização do arrendamento urbano, a sustentabilidade financeira do Estado social, a limitação de atividades políticas e sindicais na defesa, na segurança e na justiça, o reordenamento das autarquias locais, a eficiência do setor público, a disciplina orçamental e a contenção do endividamento público).
Muitas delas foram/são causas coletivas, compartilhadas com muita gente; outras, porém, foram/são mais ou menos quixotescas, muitas vezes sem companhia visível.

2. A lista seguinte, limitada ao plano nacional (excluindo a UE), enuncia as minhas causas eletivas mais "heterodoxas", sem preocupação de hierarquia:
- pagamento de propinas no ensino superior público e aumento das bolsas de estudo;
- extinção das autoestradas SCUT;
- fim da subvenção orçamental da ADSE;
- cumprimento da obrigação constitucional relativa à cobertura e à qualidade da escola pública e fim dos "contratos de associação" com colégios privados;
- imposto sobre sucessões e doações de elevado montante;
- convergência dos regimes públicos de pensões;
- levar a sério a laicidade do Estado e fim da promiscuidade entre a política e a religião;
- educação cívica obrigatória nas escolas do ensino básico e secundário;
- extinção dos privilégios corporativos na esfera pública, incluindo o regime especial de pensões dos embaixadores, dos juízes e do Ministério Público;
- fim dos colégios militares;
- obrigação efetiva dos proprietários de reabilitação dos seus edifícios degradados;
- extinção do estacionamento automóvel gratuito nas cidades;
- punição efetiva das baixas médicas fraudulentas e das aposentações por falsa incapacidade;
- proibição das touradas, começando pela proibição da sua transmissão na RTP;
- reversão da invasão do eucalipto e taxação dos eucaliptais;
- contribuição das regiões autónomas para as despesas gerais da República.

3. É bom de ver que, apesar de alguns ganhos de causa (indicados no topo da lista), o balanço continua muito negativo. Averbei mais inimigos do que êxitos nessas causas.
Mas não irei desistir de lutar por nenhuma delas, em vista de um país mais justo, mais igual e mais decente, mas também mais livre, mais eficiente e mais responsável.

quarta-feira, 25 de maio de 2016

Estranha noção de democracia

1. Passos Coelho tem toda legitimidade, como líder da oposição, para criticar as opções políticas do novo Governo (e em alguns casos nem sequer está sozinho nessa crítica...).
Mas partir daí para acusar o Governo de "deterioração da democracia" (sic!), só porque rejeita as propostas do PSD e reverte muitas das medidas do anterior Governo -, eis um passo que é politica e democraticamente inadmissível. O Governo, apoiado na sua maioria parlamentar, tem todo o direito de levar a cabo o seu programa político e isso não é menos democrático do que quando a coligação de direita executava o seu, politicamente "a ferro e fogo", contra os protestos da então oposição.

2. Aparentemente, tal como quando impugnou a legitimidade democrática do atual Governo aquando da sua formação, o ex-primeiro-ministro parece entender que só há democracia quando a direita governa, Mas a primeira regra democrática numa democracia liberal é que a democracia não constitui monopólio de nenhuma força política nem de nenhum campo político.
Há retóricas políticas insensatas que não se admitem numa oposição responsável, muito menos a recomendam.