quarta-feira, 5 de março de 2025

O caso Montenegro (3): A desconsideração do PR

1. Tenho por evidente que, ao não informar previamente o PR da sua intenção de desafiar publicamente as oposições a apresentarem uma moção de censura, sob pena de ser ele a avançar com uma moção de confiança - com o risco óbvio de abrir uma crise política, que iria estalar nas mãos de Belém - Montenegro violou, não somente uma obrigação de cortesia institucional, mas também uma obrigação constitucional de informação ao PR

Com efeito, não tenho dúvida em sustentar que, além da obrigação constitucional explícita de «informar o PR acerca da condução da política interna e externa do país», a responsabilidade (inominada) do PM perante o PR, prevista no art. 190º da Constituição, embora não revista manifestamente a natureza de responsabilidade política - que só existe perante a AR -, compreende implicitamente outras dimensões em matéria de informação, como a de comunicar previamente qualquer iniciativa governamental suscetível de pôr em causa a estabilidadade política, como foi o caso. 

Embora esta grave desfeita do PM não seja suscetível de nenhuma sanção hard, ela devia, porém, ter merecido, não o "amuo" do Presidente  - recusando-se a atender uma chamada telefónica de Montenegro depois da comunicação pública deste -, mas sim uma reprimenda em forma e a imputação das consequências da precipitação de uma crise política, saindo por cima neste lamentável episódio. Embora, o PM não seja politicamente responsável perante o PR, não pode ficar sem a devida sanção o deliberado incumprimento da suas obrigações institucionais para com ele.

2. Em contrapartida, entendo que, depois desse desafio público do PM à oposição, quanto à confiança política no Governo, MRS faz bem em não se pronunciar publicamente sobre o assunto, muito menos e título de "garante do regular funcionamento das instituições", como alguns comentadores e algumas forças políticas levianamente reivindicaram.

Por um lado, estando a questão política da responsabilidade de Montenegro, pela sua suposta empresa familiar, na sua sede própria, sob moção de censura no parlamento, compreende-se e justifica-se o silêncio presidencial sobre a matéria, sob pena da pertinente acusação de ingerência nas competências da AR; por outro lado, considero de todo descabida a invocação da questão do "regular funcionamento das instituições", como base para uma demissão direta do Governo pelo PR, quando é evidente que elas estão a funcionar em pleno, com o Governo a ser chamado a responder politicamente perante o parlamento, como deve ser.

Não se pode solicitar ao PR que use uma "arma de destruição maciça", como essa, até agora nunca utilizada, para se susbtituir à AR na cobrança da responsabilidade política do Governo.