quinta-feira, 17 de junho de 2004

Versatilidade...

...é o que não falta a Luís Nazaré. Além do seu oportuno e certeiro artigo de hoje sobre o projecto governamental de domesticação das entidades reguladoras, na sua coluna regular do Jornal de Negócios -- que pela sua importância vai arquivado no Aba da Causa --, ele também publica nestes dias um comentário diário sobre o Euro 2004 na Capital. Mais um "craque" do Causa Nossa seleccionado pelo jornal de Luís Osório...

... e também não falta a Maria Manuel Leitão Marques, que na sua crónica mensal do Diário Económico aborda a questão das soluções não judiciais a dar aos casos de sobreendividamento dos particulares (arquivado também no Aba da Causa).

O exemplo espanhol

O chefe do governo espanhol apresentou-se ontem perante o Congresso para dar conta da posição espanhola na reunião do Conselho Europeu e nos trabalhos da CIG sobre a Constituição Europeia. Em Portugal, quando sabemos as posições do Governo português é "a posteriori", pela imprensa. No caso das reuniões do Conselho Europeu costuma haver uma reunião privada do PM com os partidos de oposição. A Assembleia da República continua a ser secundarizada nos assuntos europeus. A comparência do Governo na AR, ou pelo menos perante a comissão parlamentar competente, deveria ser uma regra antes e depois de cada reunião do Conselho Europeu e também do Conselho de Ministros. O "défice democrático" da UE é desde logo o défice de informação e de prestação de contas dos governos nacionais sobre as suas posições nas instâncias europeias.

A grande inventona de Bush

Confirma-se agora oficialmente (tanto tempo para quê?) sem margem para dúvidas aquilo que desde o início se sabia, ou seja, que não tinha o mínimo fundamento a alegada ligação entre o Iraque e a AlQaeda no que respeita ao 11 de Setembro (ataque terrorista a Nova York), acusação que não passou de mais uma peça na grande inventona de Washington para pretextar a invasão e ocupação daquele País. A outra foi a das armas de destruição maciça, tão falsa como esta. Assim se vai para a guerra e se invadem países na era do império....

Aditamento
O New York Times chama «desonesto» a Bush por ter invocado inúmeras vezes a ligação entre Saddam Hussein e a AlQaeda -- quando nunca houve qualquer prova credível disso -- e por ter deliberadfamente enganado a opinião pública, ao ter justificado infundadamente a guerra no Iraque em nome da luta contra o terrorismo. Agora que a mentira é oficial, o jornal entende que Bush deve «pedir desculpas ao povo americano». Uma pergunta inocente: não será essa deliberada e grosseira mistificação fundamento suficiente para iniciar um processo de "impeachment" de Bush?

Completaram um ano ...

... o Aviz e o Blogo Social Português, ambos constantes da nossa selecção de blogues (lista à direita). Parabéns ao Franscisco José Viegas (agora no Brasil) e ao Paulo Pereira (que entretanto deixou de estar desempregado).

Das eleições europeias às parlamentares

«O PS venceu as eleições, aumentou o número de votos e mostrou, pela primeira vez, que é possível vencer sozinho uma coligação de direita. Só que, esta é apenas uma etapa para vencer as legislativas e o mais difícil está por fazer. O PS precisa de construir um projecto alternativo, com novas políticas e novos protagonistas. O PS precisa de um programa político e de pessoas que, em conjunto, mereçam a confiança dos portugueses. É o mais difícil que está por fazer

(Jorge Coelho, Diário de Notícias, 17 de Junho)
Jorge Coelho tem toda a razão. A vitória do PS nas europeias foi sobretudo produto da rejeição da coligação governamental. Importa agora construir uma alternativa de governo para enfrentar as eleições parlamentares de 2006. Todavia, pelos vistos, há que esperar primeiro pelo Congresso de Novembro. Até lá o PS já está envolvido de novo na competição pela liderança do partido. Quando se perfila no horizonte a possibilidade de regresso ao poder, não faltarão candidatos...

Ainda o direito de voto dos residentes no estrangeiro

«Não discuto a oportunidade e acerto da crítica [à negação do direito de voto dos residentes fora da UE nas eleições europeias] nos planos legal e político.
Mas já fico céptica quanto ao resultado prático de mais uma eleição participada por emigrantes, no Norte da América, com uma abstenção crónica na ordem dos 80 por cento. Gasta-se um dinheirão louco com estes arremedos de democracia, através dos consulados, e sobretudo das delegações partidárias, pejadas de boys e girls de olho posto no subsídio, na bolsa de estudo, na viagem paga e outras mordomias. O resultado eleitoral é nulo. O da educação cívica, esse vai descendo cada vez mais na valeta. É certo que os emigrantes mandam para Portugal enormes somas de dinheiro e, talvez por isso, os políticos sintam que devem ser simpáticos com o otário. Mas o otário prefere outro tipo de simpatia: consulados que funcionem, cônsules que cumpram com probidade os mandatos, escolas de português dotadas de professores bem preparados, assistência jurídica fiável e de fácil acesso na compra de propriedades e negócios em Portugal, intercâmbios regulares de jovens (porque eles são o futuro da Língua e da Cultura), negociações oportunas, sem carácter intrusivo, com as autoridades dos países de acolhimento com vista a melhores condições de trabalho, de habitação, de saúde.
Não estou a discordar da questão de fundo, apenas estou a alertar para as realidades que por aqui se vivem.»

(Fernanda Leitão)

quarta-feira, 16 de junho de 2004

"A festa do solstício"

E se, por uma noite, a blogosfera deixasse de ser virtual?
Vai acontecer no dia 22, terça-feira, pelas 21h, no LUX, em Lisboa, a pretexto da celebração (devidamente atrasada) do primeiro semestre do Causa Nossa. Os nossos amigos, os demais bloggers e os leitores do Causa Nossa são bem-vindos, acompanhados de posts, ideias para blogues e um link para o divertimento. Vai haver "stand-up comedy", copos, prémios para a blogolândia e para a sociedade. Desta vez, o Causa Nossa não será apenas nosso.
Pormenores nos próximos dias.

Cidadãos europeus sem direito de voto

«Muito se tem falado nos últimos dias sobre a elevada percentagem de Portugueses que decidiram não exercer o seu dever cívico e abster-se nas eleições europeias.
Mas no meio de toda esta discussão sobre desmobilização eleitoral e descontentamento dos eleitores face à situação política em Portugal, cabe-me a mim, uma dos muitos estudantes portugueses temporariamente a residir nos Estados Unidos, levantar outra questão. A impossibilidade de votar. Isto porque nas eleições europeias os portugueses residentes fora da União Europeia (UE) não têm direito de voto. Por isso, contra minha vontade, não pude votar nestas eleições.
Serei eu menos europeia ou menos capaz de participar na vida política do meu país e da UE só por viver num país que não pertence ao grupo dos Estados membros da UE?
(...)
Não vejo razões para esta discriminação entre os portugueses que vivem na UE e os que residem em outros países (...). No caso das eleições legislativas e presidenciais nacionais, este impedimento já não existe.
Para além desta diferenciação entre Portugueses europeus e não europeus, fiquei indignada ao saber que os nossos vizinhos espanhóis residentes fora da UE podem votar exactamente no mesmo acto eleitoral. (...) Parece-me que o mesmo se passa com outros Estados-membros da UE.
Penso que é altura de mudar a lei de modo a permitir que os Portugueses (independentemente do local onde residem) sejam incentivados a ter um papel activo no futuro do país enquanto membro da UE. Afinal, o facto de residirmos fora da UE não nos retira os direitos de "cidadãos europeus", que somos, entre os quais se conta o direito de voto nas eleições europeias. No fundo, é sentir que ainda fazemos parte do nosso país e da UE e que a nossa voz ainda pode ter algum peso em ambos...»


(Joana Branco, EUA)

terça-feira, 15 de junho de 2004

De mal a pior

Como se não bastasse o estendal público de bandeiras nacionais, a Federação Portuguesa de Futebol apela agora a que, além das bandeiras, se "acendam velas e se manifeste fé" em apoio à selecção nacional de futebol. Só falta mesmo pedir que se façam promessas de peregrinação a Fátima. Não será também de pedir a Scolari que encomende a equipa a um candomblé da Bahia?

«E todavia avança»

Tal é o título do meu artigo de hoje no Público, sobre as eleições europeias, também arquivado aqui no Aba da Causa.

Uma pesada baixa

J. Pacheco Pereira anuncia no Abrupto que vai deixar a actividade de comentador político, por causa da sua nomeação como representante português junto da Unesco. O debate público nacional, de que ele tem sido um dos principais protagonistas durante anos, vai ficar seguramente mais pobre. É pena...

Dignificar a política

[Sousa Franco] provou que é possível ganhar votos e simpatias sem descer ao primarismo, à banalidade e à demagogia, lembra hoje Teresa de Sousa no Público. Vale a pena ler e, sobretudo, não esquecer.

O medo dos brasileiros

No meio de um comentário sobre o resultado da selecção nacional, hoje no ginásio, o meu treinador, que também é brasileiro, confessou-me que já tinha ido à igreja esta semana duas vezes. Intrigada com tamanha devoção, devo ter feito uma cara de algum espanto, visto que ele se justificou de imediato. Ia rezar por Luiz Felipe Scolari, acrescentando: "que será dos brasileiros que trabalham em Portugal se a selecção não ganha o próximo jogo?" Bem o procurei tranquilizar. Contei-lhe como festejámos a vitória da selecção dele no último mundial, como gostamos de Chico Buarque e de tantos outros. Mas não estou certa de o ter conseguido. Resta-me assim desejar a vitória de Portugal na quarta-feira, mais que não seja para dar sossego aos simpáticos brasileiros que temos entre nós!

Maria Manuel Leitão Marques

Apostilas das terças

1. Discriminação
Nas eleições europeias não têm direito de voto os portugueses residentes no estrangeiro, salvo nos Estados-membros da UE. Considerando que todos eles votam nas eleições legislativas e nas eleições presidenciais nacionais - só não votando nas eleições de âmbito infra-estadual, ou seja, nas eleições regionais e locais -, não se compreende esta discriminação quanto às eleições europeias.

2. Os trunfos de última hora
No que respeita às "desculpas" pela derrota, pior do que os que disseram que a vitória foi da abstenção (o que é um insulto aos votantes) foi a declaração de Vasco Graça Moura, segundo o qual a campanha eleitoral foi interrompida antes de a coligação governamental ter mostrado os seus principais trunfos. Não esclareceu que bomba de última hora é que a coligação havia escondido.

3. Os culpados
Como era de prever, afiam-se as espadas no PSD. Há-de haver culpados do desastre eleitoral, cujas cabeças devem rolar. Como quase sempre, o culpado não é o líder...

Problemas de audição ...

O primeiro-ministro garantia no domingo à noite: "Entendo a mensagem que nos quiseram dar". Pareceu-me logo que não era o caso. Vista a Imprensa de segunda-feira, lidos os comentadores da direita neoliberal, confirmo: não percebeu, não perceberam.
Ao contrário daquilo que pensam, os eleitores não podem apenas escolher entre concordar com a governação, ou não querer pagar a factura da governação. Não. Podem também, muito mais simplesmente, não concordar com a governação.
Nenhum outro Governo desde o do Bloco Central, em 1983, iniciou o seu mandato com tanta disponibilidade do eleitorado para apoiar - doesse o que doesse - o saneamento e a recuperação da coisa pública. Mas, em dois anos, o Governo de Durão Barroso mostrou-se incapaz de o fazer e, em vez de tirar o país de um buraco, meteu-nos num beco sem saída.
"Aguenta Portugal!" podia ser aceitável para os eleitores, mas era preciso que tivessem confiança no resultado desse esforço. Acontece que não têm!

A direita de tanga

A História tem destas ironias tristes: o PS obteve o seu melhor resultado eleitoral de sempre e a direita governamental sofreu o maior castigo que se poderia prever à custa das eleições europeias. Não faltou sequer um episódio trágico: a morte de Sousa Franco depois de um episódio miserável de fratricídio partidário na lota de Matosinhos. Triste, tristíssimo, na verdade, e por todas as razões.

Disse já, aqui e noutros sítios, o que pensava da campanha futebolística nacional dos cartões amarelos, vermelhos ou verdes. Num post anterior não escondi a minha melancolia com a taxa de abstenção europeia nestas eleições que, sejam quais forem os álibis que encontremos para desculpar o facto, voltaram a mostrar o divórcio existente entre a Europa e os seus cidadãos. Este é, quanto a mim, o aspecto essencial. Mas a abstenção não apaga o significado político do teste eleitoral em cada país, designadamente em Portugal.

Esperava, como toda a gente, que o PS ganhasse as eleições. Mas nunca imaginei que a diferença pudesse ser tão ampla e que a coligação de direita fosse alvo de um movimento de rejeição de tal modo esmagador e que põe em causa a sua consistência e credibilidade como projecto de governo. À conta de sermos um país de tanga, ficou agora de tanga a direita --, e não se vê que suave milagre comunicacional poderá resgatar tantos erros acumulados e tanta falta de sensibilidade e orientação política que converteu Portugal num mero campo de ensaio contabilístico por causa do défice orçamental.

Ao eleger o combate ao despesismo e ao défice como único horizonte visível da actuação do Governo, Durão Barroso perdeu a noção do país e do que queria fazer com ele e para ele. As próprias pretensões reformistas que exibiu acabaram por soçobrar nos escolhos que por culpa exclusivamente sua foi semeando pelo caminho, com uma sobranceria e uma inconsequência justamente merecedoras de castigo. Quando a oposição, apesar da sua óbvia vulnerabilidade, regista uma vitória tão demolidora, que conclusões políticas poderão extrair o Governo do seu desastre e a aliança de direita do equívoco dos interesses em que alicerçou o seu poder? Depois de ter ficado de tanga, que lhe resta? Quem semeia ventos colhe sempre tempestades. E face às tempestades que se avizinham esta direita já demonstrou que não tem estofo para enfrentá-las.

Vicente Jorge Silva

... e problemas de gestão

O que Durão Barroso não pode deixar de ver é o que todos vêem: a coligação eleitoral com o PP é desastrosa para o PSD. Qualquer cego vê. Mas como pode um primeiro-ministro falho de carisma gerir um Governo de coligação sem garantir ao seu fraco parceiro a garantia de sobrevivência?
No dia em que Paulo Portas vislumbrar que vai ter de ir a votos sozinho em 2006, a vida fica difícil para Durão Barroso, para a coligação e para qualquer governante. Mas matar o Governo para poder pensar numa vitória do PSD nas legislativas, também não é solução: Pinto Balsemão bem sabe que não se ganham eleições quando não se aguenta uma coligação em que tudo se apostou.
E então? Temo que a resposta seja soprar no balão da retoma com dinheiros públicos. Desastre à vista!

Jorge Wemans

Adeus selecção, venha o Euro2004!

Não, não me parece! Vêm aí o jogo Rússia-Portugal e, ao contrário dos sábios conselhos do João Pinto, arrisco um prognóstico: empate à vista, seguido de derrota frente à Espanha. Claro, há o sistema e tudo mais, mas a selecção portuguesa precisava de uma vitória inaugural convincente para se poder transformar naquilo que não conseguiu em dois anos de preparação: ser uma equipa - com patrão, estilo de jogo e automatismos eficazes. Perdido o jogo contra a Grécia, já nada a salva. Vai-se a selecção portuguesa, fica o Euro2004. Esperemos por futebol vistoso e de rasgo, porque até agora... viva a Suécia!

Jorge Wemans

segunda-feira, 14 de junho de 2004

A Europa minoritária

A persistência do fenómeno abstencionista nas eleições europeias (que, significativamente, se fez sentir sobretudo nos países recém-chegados à União) impõe-nos várias conclusões melancólicas e um aviso grave para o futuro. Exemplos:
A Europa tornou-se muito mais uma conveniência do que um projecto, um destino, uma paixão (como o foi nos tempos heróicos dos pais-fundadores ou de Jacques Delors).
A participação democrática europeia é muito mais débil onde os direitos democráticos estiveram mais tempo interditos no plano nacional (veja-se o caso extremo da Polónia), contrariando o desejo de democracia que, teoricamente, deveria ser mais forte nesses países.
Cresce a onda dos partidos eurocépticos e anti-europeus, incluindo nos países que acabam de entrar na União (vide, de novo, o caso polaco, onde a Europa já funciona como álibi para as frustrações nacionais).
As eleições europeias tornaram-se um mero pretexto para castigar as actuações governativas internas de cada país (só os países com governos recentemente eleitos escapam à regra).
A rarefacção do voto popular traduz a abstracção institucional europeia. O Parlamento Europeu tem hoje mais poderes do que no passado, mas esse facto não é perceptível pelos cidadãos, sendo certo que o voto popular continua a não ter uma influência concreta na arquitectura do poder político executivo da União.
Finalmente, o projecto de Constituição Europeia foi o grande ausente da maior consulta eleitoral jamais realizada num espaço democrático plurinacional.
Na sexta-feira, 11 de Junho, Eduardo Lourenço escrevia no Público: «A Europa real é uma colecção de identidades que já não têm a capacidade de se viver plenamente como nações, nem a força de querer e imaginar a futura Europa como uma nova espécie de nação». Temos, assim, uma Europa cada vez mais alargada e uma Europa cada vez menos participada e minoritária. Uma Europa máxima e uma Europa, de facto, mínima.

Vicente Jorge Silva

O voto electrónico

Ontem, finalmente, começaram as experiências para modernizar o sistema de voto. Ouvi dizer que correram bem e que as pessoas mais idosas se adaptavam perfeitamente ao sistema. Espero que assim tenha acontecido e, já agora, que não se fique eternamente a experimentar!

Dúvidas pós-eleitorais

a) Com o melhor resultado eleitoral de sempre do PS, será que os "challengers" internos de Ferro Rodrigues ainda têm alguma chance no próximo Congresso?
b) Com esta humilhante derrota, será que a coligação entre o PSD e o CDS-PP ainda tem hipóteses de se repetir em alguma futura eleição?
c) Com esta forte rejeição da política governativa, será que a inevitável remodelação governamental pode limitar-se a uma simples mudança de pastas?
d) Com a manutenção de dois deputados no PE e somente uma ligeira descida na percentagem de votos, será que o PCP acredita que está para lavar e durar?
e) Com o seu notável resultado eleitoral, será que êxito vai subir à cabeça do BE?
f) Com o insignificante resultado do novel PND, será que Manuel Monteiro continuará a brincar a dirigente partidário?

Uma vitória da Europa?

Se a discussão sobre a Europa e o seu futuro, em particular a sua Constituição, tivessem estado no centro desta campanha eleitoral, o que aconteceu poucas vezes, Durão Barroso teria alguma razão nas suas palavras de há instantes: esta seria também uma vitória das ideias pro-europeístas, seguramente representadas pelo PS e PSD, sobre as euro-cépticas, nas suas diversas cambiantes à esquerda (incluindo o Bloco) e à direita.

Maria Manuel Leitão Marques

O referendo sobre as culpas

Acertadamente, espero, José António Teixeira vaticinou há pouco na SIC Notícias: a imputação ao passado das culpas desta crise acabou de vez. Ela foi o mote da campanha da coligação (com o "o pai do défice" e outras frases semelhantes). O referendo sobre as culpas está feito. Os resultados não deixam margem para dúvidas.

domingo, 13 de junho de 2004

O nome da coligação

Protestei aqui, a seu tempo, pela utilização abusiva do slogan da selecção de futebol, «Força Portugal», pela coligação governamental. Continuo a pensar que essa confusão propositada não devia ter sido permitida. Ficou mal a quem a propôs e a quem a consentiu. Resta-me o contentamento de verificar, uma vez mais, que os eleitores não vão em manobras óbvias. Aí está a prova. Que sirva de lição para todos os partidos.

Maria Manuel Leitão Marques

E aí estão os resultados

1. Por uma vez: não somos estúpidos e sabemos ler os resultados de eleições. Poupem-se de o fazer por nós. Há 30 anos que votamos em liberdade!

2. É pena, mas de facto o que se discutiu nesta campanha foi muito mais Portugal do que a Europa. Por mim, até preferiria que tivesse sido o contrário. Por isso, gostei de ouvir Sousa Franco, num jantar em Lisboa, discutir, com rigor e seriedade, algumas questões europeias da actualidade, e de assistir, em Coimbra, ao debate sobre a Constituição. Agora não me venham dizer que a escolha do eleitorado foi apenas entre o projecto europeu do PS e o da coligação. Mesmo que o seu resultado directo seja apenas a eleição de deputados para o Parlamento Europeu, todos sabemos muito bem no que votámos e o que fundamentou o nosso voto.

3. Que ninguém se esqueça do que escreveu e disse nos últimos dias, talvez em estado de choque, sobre o modo de organizar as campanhas eleitorais, de se aproximar dos eleitores e de lhes transmitir uma mensagem. Temos muito tempo para pensar em formas alternativas a certas práticas gastas e envelhecidas até às próximas eleições. (Não sei porquê, sinto-me ingénua ao escrever este último parágrafo, e ainda assim sei que estou muito acompanhada!)

Maria Manuel Leitão Marques

Infeliz regresso

Há 35 anos que eu não ia a um estádio de futebol, desde a final da Taça de Portugal de 1969, entre o Benfica e a Académica, no Estádio do Jamor. Fui ontem ao Estádio do Dragão, ao jogo inaugural do Euro 2004, graças a um convite do BPI, como patrocinador da prova (um obrigado ao Artur Santos Silva). O Estádio é um deslumbramento, o ambiente era de festa; mas o jogo foi muito mau, e a selecção nacional péssima. A continuar a jogar assim não ganhará um jogo contra quem quer que seja.
Grandes expectativas, grandes desilusões!

O voto

Se hoje pago os meus impostos numa caixa automática aqui ao mesmo lado de casa, onde também compro os bilhetes de comboio e vários outros serviços. Se posso gerir a minha conta bancária sem sair de casa, a partir do meu computador, por que será que o exercício do direito de voto se faz exactamente como antes e depois de 1974? Se a abstenção é um problema, qual o motivo pelo qual, em especial numas eleições de círculo único como as de hoje, não se facilitam as formas de votar, tornando-as mais próximas e amigáveis para os cidadãos cuja mobilidade aumentou tanto nos últimos anos? Seguramente que não é por falta de tecnologia segura e adequada e também não creio que seja por falta de recursos financeiros e humanos para proceder à mudança. Acredito sim, que ela nunca foi prioridade. Mas devia ser.
E agora? Agora, lá vou votar no outro lado da cidade, aonde, aliás, neste dia esplêndido de sol, nem gostaria de ter regressado.

Maria Manuel Leitão Marques

sexta-feira, 11 de junho de 2004

Amor à primeira leitura

Apaixonei-me pela serra da Arrábida muito antes de a conhecer, quando recebi no liceu uma bela edição do Diário de Sebastião da Gama como prémio escolar (no 2º ano ou no 5º, já não sei bem). Depois encontrei na biblioteca do liceu a Serra Mãe, que li com o mesmo sentido de descoberta.
Foi com verdadeira emoção que, muitos anos mais tarde, em sucessivas visitas, conheci ao vivo o Portinho escondido no seu recovo, o convento alvejando a meio da encosta (nessa altura em solitário abandono), as veredas da serra por entre a vegetação mediterrânica, as imponentes falésias brancas caindo a pique sobre o mar. Desde então, sempre que cá regresso, como agora, continuam a fascinar-me como da primeira vez estes sítios agora familiares. Há locais assim de encanto na nossa geografia pessoal...

quinta-feira, 10 de junho de 2004

O fascismo das telenovelas

Não creio que haja alguma vantagem, ou sequer legitimidade, em estender a noção de fascismo de tal modo que certos fenómenos sociais correntes, como as telenovelas, possam ser vistas como expressão dele, como faz Jorge Leitão Ramos no seu artigo no Expresso On-line.
Como categoria histórica, política e cultural, o fascismo representa um modo de domínio político e de enquadramento autoritário da sociedade, fundado na aniquilação da liberdade e da autonomia individual, na subjugação da colectividade a entidades transcendentes (Nação, Raça, Império, etc.), na exaltação e mobilização demagógica das massas com base em emoções e sentimentos elementares, no controlo estatal do espaço público, na negação da autonomia e diversidade da sociedade civil, na glorificação e fidelidade a chefes providenciais, no cancelamento da liberdade e da pluralidade artística e cultural, na execração da razão e dos intelectuais, no culto da força e da autoridade, enfim, numa cultura anti-individualista, antiliberal e antidemocrática, nacionalista, xenófoba e tendencialmente racista.
Por mais que as telenovelas representem um fenómeno de alienação e de "normalização" de massas, não me parece que elas preencham os traços definidores da síndrome fascista. A banalização esvazia e degrada o sentido dos conceitos.

A democratização das condecorações

Todos os anos, a 10 de Junho, o Presidente da República aumenta com mais umas dezenas de nomes as listas dos cidadãos ou instituições a quem a República manifesta a sua gratidão pelos mais variados motivos.
No seguimento da revolução republicana de 1910 aboliram-se as distinções honoríficas (juntamente com os títulos nobiliárquicos) em nome do princípio da igualdade. Está em vias de se encontrar um meio de conciliar umas e outro --, tornando toda a gente beneficiária de uma qualquer condecoração. Todos condecorados, todos iguais...