domingo, 22 de agosto de 2004

O Causa Nossa e a liderança do PS

Do conjunto de autores do Causa Nossa três são militantes do PS. Na disputa da liderança socialista, todos tomaram posição em relação às candidaturas em liça (como se pode ver nas respectivas listas de apoio e, em dois casos, em posts aqui publicados): Ana Gomes e Vicente Jorge Silva apoiam Manuel Alegre e Luís Nazaré apoia José Sócrates. Como é evidente, o CN, como tal, não toma posição nessa matéria, independentemente das preferências pessoais de cada uma dos seus membros. Pessoalmente, embora considere fora de questão alinhar com qualquer dos candidatos, não conto deixar de acompanhar o debate nem de me pronunciar sobre as posições de cada um dos candidatos. A orientação e a liderança do PS não são questões puramente internas.

Os iraquianos não contam

«Li hoje no Expresso que a guerra no Iraque mata menos que as estradas portuguesas.
Com a estranheza do caso, lancei-me a desbravar a notícia, para saber se a guerra era a mesma que todos os dias nos entra pela casa adentro.
Como neste país tudo o que é bizarro tem um toque de leviandade natural, lá estava preto no branco "na segunda semana de Agosto, entre os dias 9 e 15, as tropas da coligação registaram 18 baixas. No mesmo período nas estradas portuguesas faleceram 37 pessoas. Desde o inicio do ano morreram no Iraque 510 soldados; nas estradas portuguesas perderam a vida 730 pessoas."
Conclusão: os americanos, juntamente com outros países satélites, desencadearam uma guerra no Iraque para se matarem entre eles e como não fosse suficientemente divertido vão matando uns milhares de Iraquianos; mas esses não contam.
Esta notícia é o Expresso, a Imprensa, a nossa cultura judaico-cristã, no seu melhor!»

(FF, Covilhã)

sábado, 21 de agosto de 2004

Regresso Vital


Após duas semanas de descanso, regresso também à Causa - desde já revelando (acima) um dos muitos motivos para abraçar o ócio em Angra do Heroísmo. E ainda, entre lapas, cracas, touradas à corda, a nova marginal que nasce junto à marina, dezenas de esplanadas, novos bares e toda uma nova geração de bronzeadas moçoilas, saúdo o regresso do nosso Captain, My Captain, Vital Moreira - que trouxe consigo uns bons 500 visitantes mais! Quando é que chega o equinócio, afinal?

Para o Rodrigo

Seguindo os bons exemplos do Rui, do Alex e do Francisco, junto-me à celebração da vida do Rodri, filho dos espantosos Nuno e Mónica, iniciada na manhã do passado dia 17. Festejo com a canção que Caetano dedicou ao filho Moreno. Bem vindo, companheiro Leão!

Gosto muito de te ver, leãozinho, caminhando sob o sol
Gosto muito de você, leãozinho
Para desentristecer, leãozinho, o meu coração tão só
Basta eu encontrar você no caminho
Um filhote de leão, raio da manhã
Arrastando o meu olhar como um imã
O meu coração é o sol, pai de toda cor
Quando ele lhe doura a pele ao léu
Gosto de te ver ao sol, leãozinho, de te ver entrar no mar
Tua pele, tua luz, tua juba
Gosto de ficar ao sol, leãozinho, de molhar minha juba
De estar perto de você e entrar no mar.

Leãozinho
Caetano Veloso

Borobudur


Pede-me um leitor para publicar mais fotografias de Borobudur (ver post de há dias). A Internet está carregada delas. Basta porcurar pelo nome no Google. Eu fiz muitas dezenas. Aqui vai uma. Posted by Hello

sexta-feira, 20 de agosto de 2004

Coimbra (des)encantada

1. Via Latina escondida
Por causa de obras de conservação no "Paço das Escolas" da Universidade de Coimbra, a fachada principal do velho monumento encontra-se tapada por uma feia tela que encobre os andaimes, bem como grande parte da "Via Latina", incluindo a entrada da Faculdade de Direito. Assim vai manter-se durante meses, tanto quanto durarem as demoradas obras em causa. É pena que não se tenha ao menos pintado a tela com uma imagem do monumento escondido, em tamanho real, tal como vejo fazer lá fora -- e também já em Portugal, noutros casos --, em notáveis trabalhos de "trompe-l'oeil". Escassez de verbas ou simples falta de cuidado?

2. Pedra exótica
Os lambris das rotundas de Coimbra, até agora feitas de utilitários e feios perfis de betão, estão a ser substituídos por blocos talhados de pedra, desconhecendo-se se o mesmo vai ocorrer com os passeios das ruas. A ideia é de aplaudir, dada a maior nobreza da pedra. Só que está a ser utilizado o granito, que é uma pedra totalmente exótica em Coimbra, cidade de calcário. Ora o carácter das cidades assenta em grande medida na pedra de que são feitas. O granito caracteriza o Norte e o interior beirão, escuro e frio, como o Porto e Viseu, por exemplo. Coimbra é mais clara e mais luminosa, no clima e na pedra branca e amarela de que é feita. Não havia necessidade!...

Hooligans olímpicos

«Os selvagens que constituem a selecção olímpica de futebol, foram vergonhosamente eliminados e humilhados em Creta, por selecções de países onde "ainda" se joga com uma bola quadrada, Iraque e Costa Rica.
Três dos ditos, certamente inspirados na mitologia Cretense, pelo desporto designado de Taurokatapsia, investiram quais touros furiosos contra os adversários e foram expulsos por comportamento violento, o que, a bem dizer, revela uma postura de grande coerência cívico-desportiva, de quem há uns tempos atrás destruiu os balneários de Fontainbleau, enquanto festejava o apuramento para os jogos.
É lógico que possamos deduzir que se conquistassem uma medalha, iriam celebrar para a Acrópole e não deixavam pedra sobre pedra no Parthenon.
Creio que se impunha que o Presidente da República recomendasse agora às autoridades(?) desportivas, que promovessem um estágio para estes "cavalheiros", alguns dos quais futuros integrantes da selecção principal, no reformatório de Caxias, supervisionado pelo "Democrata" Scolari, a fim de começarem a interiorizar desde já o espírito do "Mata! Mata!" a aplicar no próximo mundial.»

(JD)

quinta-feira, 19 de agosto de 2004

Faz hoje um ano, morreu-me um amigo

Faz hoje um ano, morreu Sérgio Vieira de Mello. Um homem bom, inteligente, bonito, simpático, divertido, ambicioso, brilhante e dedicado servidor da Humanidade. Barbaramente colhido no meio duma guerra bárbara como todas as guerras são. E apagando-se em lenta agonia porque tardaram recursos de salvamento.
Morreu como passou a maior parte da vida: a trabalhar pela ONU e pelos seus nobres ideais, que tantos desprezam e violam. Como Bush e os neo-conservadores que lançaram o mundo nesta guerra ilegal, injusta, escusada, baseada em mentiras, a que ainda hoje não vemos o fim, nem o sentido, depois de milhares de mortos iraquianos, americanos, britânicos e de gente todas as nacionalidades, incluindo o Sérgio e mais vinte e um companheiros da ONU.
Estar em Brasilia dá-me a sensação de estar perto do Sérgio, hoje. Enfim, cada qual lambe as feridas como pode... pois sei bem que ele, além de cidadão do mundo, era muito cioso das suas raízes cariocas. Como evidenciou naquela contundente observação, pouco antes de morrer, de que compreendia a raiva dos iraquianos contra os invasores, auto-proclamados libertadores: «Eu também não gostava de ser libertado com tanques estrangeiros a passearem por Copacabana...».
Logo de manhã, revivi episódios em que conspiramos com bons resultados - pouco em Genebra, bastante em Nova Iorque e muito entre Jacarta e Dili (ficam para as memórias da Indonésia que tive de pôr em pousio e espero em breve retomar).
Os jornais brasileiros trazem evocações da sua memória e da vileza do atentado que o vitimou, enlutando o mundo inteiro. Há uma cerimónia no Itamaraty. E a CNN trouxe-me Genebra em directo. O Kofi Annan a contar como foi devastador para a ONU o abalo da perda do Sérgio e dos seus 21 companheiros, e a frisar que ainda está à espera dos resultados do inquérito prometido pelas autoridades americanas de ocupação, responsáveis pela segurança da ONU em Bagdad.
Coitado do Kofi - envelheceu tanto! Percebia-se quanto sofre realmente e quanto lhe foi doloroso ler aquele discurso(que o Shashi Taroor provavelmente escreveu, também ele a sangrar pelo amigo perdido). As câmaras filmaram a Nane Annan, quando ele disse que só ela, talvez, saberá o que lhe custou viver este ano, desde o desaparecimento do Sérgio e dos outros 21 colegas. E evocou as vezes sem conta que é assaltado pela memória das últimas conversas que teve com eles, precisamente quando os instruiu a avançarem para o Iraque, para a morte...
Meia-hora depois tocou o telemóvel. Era o meu querido Gordon Martin, correspondente do «Daily Telegraph», o decano dos correspondentes de imprensa nas Nações Unidas em Genebra. Já não falávamos há um ano, precisamente desde o funeral do Sérgio, onde a Joana o fora reencontrar. Para dizer que acabava de vir da cerimónia e tinha pensado em mim. Afinal, mesmo longe, muito longe, conseguimos estar perto dos amigos.

Ana Gomes

Alcatrão e penas

A nossa selecção olímpica de futebol sentiu-se injustiçada e maltratada pela opinião pública portuguesa após a humilhante eliminação ante a Costa Rica. Tem toda a razão. A atitude miserável que revelou durante todo o torneio de qualificação merecia outra sorte - alcatrão e penas à chegada a Lisboa.

Luís Nazaré

Jogos inúteis

Para um punhado de reflexões sobre os jogos do petróleo e os da modernidade olímpica, aqui vai o meu texto das quintas-feiras no Jornal de Negócios.

Luís Nazaré

Alqueva


Fotografia de António Cunha

Durante o Verão, sempre gostei de regressar ao Norte pelo interior do Alentejo, passando por Mértola ou Barrancos, e subindo pelo meio dos chaparros de sombras arredondadas, numa estrada quase sem carros e pequenas terras sem turistas. Por diversas vezes, fiz escala em Monsaraz para visitar o cromeleque nas redondezas e contemplar de cima do monte a planície a perder de vista. Este ano passei de novo na pequena jóia alentejana, expressamente para espreitar a albufeira de Alqueva. Vim subindo pelo meio dela a partir da barragem, mas nada se compara a sensação de ver um mar de água de cima da muralha, que transforma radicalmente a paisagem, mesmo agora quando a terra ainda se mantém com o mesmo tipo de vegetação e a mesma cor alaranjada. Talvez seja até bonito, mas o efeito que me causou foi o de uma enorme estranheza, de arrepio e até de uma certa violência, tão profunda que foi a mudança já operada. Esta espécie de incómodo prolongou-se quando soube que o Cromeleque do Xerez, aquelas pedras mágicas colocadas naquele local silencioso há pelo menos 6000 anos, que sempre me intrigaram e me fizeram imaginar rituais tão distantes quanto desconhecidos, tinham sido removidas para não ficar debaixo de água. Não fui revisitá-las, mas desconfio que nunca mais sentirei o mesmo quando isso acontecer. Quanto ao resto, talvez para o ano tudo me pareça quase natural!

Maria Manuel Leitão Marques

A vergonha de Creta

A prestação da selecção olímpica de futebol na Grécia foi humilhante a todos os títulos, tanto no plano dos resultados (duas derrotas em três jogos com selecções medianas ou sofríveis, nove golos sofridos, entre quais quatro da Costa Rica, que não marcou mais nenhum nas demais partidas), como sobretudo no plano disciplinar, com três expulsões, muitos cartões amarelos, tudo a revelar um inaceitável comportamento antidesportivo. Uma contradição absoluta com o espírito olímpico.
Estes senhoritos e o seu treinador não merecem representar o desporto nacional e envergar as cores nacionais. Eles devem desculpas à opinião pública. O Presidente da República, que há umas semanas se emocionou a condecorar os membros da selecção que disputou com galhardia o campeonato da Europa, deveria agora condenar com indignação a vergonha de Creta.

Debates socialistas

É de louvar que os socialistas tenham decidido travar perante a opinião pública os debates sobre a eleição do próximo líder do Partido, na sequência da súbita saída de Ferro Rodrigues, após o desenlace da crise política que terminou na nomeação do actual Governo. Mas, perante várias tomadas de posição verbalmente pouco contidas dos candidatos e dos seus apoiantes mais excitados, não será descabido lembrar-lhes que depois das eleições e da vitória de um deles todos continuarão membros do mesmo partido e terão de cooperar na realização dos seus objectivos. Por isso, seria aconselhável alguma moderação nas palavras e nas atitudes. O crédito público do partido também passa por aí.

Constituição electrónica

Já pude apreciar devidamente a excelente edição feita recentemente pelo Jornal "Público" do CD-ROM organizado pelo deputado José Magalhães com os trabalhos da última revisão constitucional. Trata-se de um trabalho exaustivo, que inclui designadamente o texto da nova versão da Lei Fundamental e todos os materiais relativos à revisão constitucional (projectos, propostas de alteração, debates, votações, relatórios, declarações de voto, etc.), não faltando mesmo uma amostra videográfica de intervenções de vários deputados. A edição é complementada por uma síntese das sucessivas revisões constitucionais, bem como pela reedição das correspondentes versões da CRP, desde a versão originária de 1976. Uma colectânea de artigos do Público sobre a revisão e temas conexos (entre os quais vários da minha autoria...) ajudam a contextualizá-la e a torná-la mais compreensível.
Com este trabalho José Magalhães adiciona mais uma peça relevantíssima às suas contribuições para a história constitucional da III República, desde a primeira edição do seu conhecido Dicionário da Revisão Constitucional de 1989, que tive o gosto de prefaciar. Com os instrumentos que a versão electrónica confere, especialmente no respeitante à busca de referências e às interconexões, este novo contributo tornar-se-á imprescindível para todos os estudiosos e interessados no conhecimento da Constituição.

Viagens


Há emoções tão impressivas que valem só por si umas férias inteiras. Por exemplo, sobrevoar a pequena altura as crateras vulcânicas de Bali à luz fluida do amanhecer ou perambular detidamente pelo recuperado monumento budista de Borobudur na ilha de Java, relembrando as páginas de Roger Vaillant, que por lá andou nos anos 40 do século passado. Viajar é preciso!

quarta-feira, 18 de agosto de 2004

De regresso (II)

Também retomei a minha coluna semanal no "Público". O artigo de ontem era dedicado ao escândalo dos últimos dias, ou seja, as repercussões das já célebres gravações de um jornalista do Correio da Manhã com os seus interlocutores, entre os quais o então director da Polícia Judiciária e a assessora de imprensa do Procurador-Geral da República, com informações e comentários sobre matérias que estavam em segredo de justiça. Uma vergonha!
Entretanto, apesar de cada vez mais "chamuscado", o PGR resolveu manter-se em funções,aparentemente confortado pelo oportunista apoio vocal que lhe proporcionado pelo Presidente da República e pelo primeiro-ministro. Até ao próximo incidente! Entretanto o crédito público da justiça levou mais uma forte machadada.

De regresso

Após uma ausência de várias semanas, cá estou de regresso às lides bloguísticas e outras. Estas semanas de propositado recato público serviram para me convencer de duas coisas: que a minha adicção bloguística não é tão fatal como temia e que o CN não depende de mim para singrar... Ainda bem que assim é!

Cassetes que cheiram mal

Entendo que, no limite, é lícito gravar conversas com fontes ouvidas em «on» (para que o jornalista possa prevenir futuros desmentidos e «correcções» ao que efectivamente foi dito). Mas para além da ilicitude de gravações não combinadas com as fontes, para quê gravar testemunhos dados em «off» se não for numa lógica de chantagem subreptícia entre o jornalista e as fontes anónimas?

Uma coisa é prevenir desmentidos quando confrontamos uma fonte identificada com a sua posição ou as suas responsabilidades num determinado assunto. Outra coisa inteiramente diversa é construir uma peça jornalística com implicações graves para terceiros a partir de informações de fontes anónimas sem o jornalista estar efectivamente convicto da sua fiabilidade.

Por outras palavras, se Octávio Lopes, do Correio da Manhã, gravou as conversas com as suas fontes anónimas foi por não estar verdadeiramente seguro de estas serem fiáveis. No entanto, isso não o impediu de publicar manchetes estrondosas visando a reputação e o carácter de figuras públicas e que configuravam autênticos assassinatos de carácter. Ora, um comportamento tão execrável pôde passar sem uma condenação radical de quem se propõe representar oficialmente a deontologia profissional dos jornalistas. Pelo contrário: o Sindicato fez questão de condenar o alegado roubo das cassetes e a sua divulgação à revelia do «repórter» gravador, mas não verberou o repugnante exercício jornalístico por este praticado.

Entretanto, a intolerável leviandade moral de Octávio Lopes (secundada pela direcção do seu jornal) põe outra questão: a da leviandade «funcional», digamos assim, com que expôs material para ele tão sensível à possibilidade de um extravio ou um roubo. A acreditar que este efectivamente aconteceu, é incompreensível que ele não tivesse tomado os maiores cuidados em guardar permanentemente consigo, em lugar a que só ele pudesse ter acesso, tantos registos «secretos» e «explosivos». A não ser que a sua mitomania de intocável «abutre» judicial o tenha levado a descurar a mais elementar prudência de quem é suposto guardar ciosamente os seus segredos. Em qualquer caso, tudo isto cheira a história muitíssimo mal contada, tão mal contada como o jornalismo «investigativo» de Octávio Lopes.

Foi, porém, um jornalista com estas características patológicas, responsável por esse infecto «jornalismo» de sarjeta das primeiras páginas do Correio da Manhã, que conseguiu captar e explorar, durante meses e meses a fio, a confiança de fontes colocadas em lugares estratégicos decisivos (como a direcção-nacional da PJ e a assessoria de imprensa da PGR, esta assegurada, imagine-se, por alguém cujo percurso académico culminou numa tese sobre deontologia jornalística!!!. Desgraçado jornalismo, desgraçada justiça que nele se revê! Se a promiscuidade é sempre detestável, esta dá vontade de vomitar.

A partir daqui, todos os enigmas da violação do segredo de justiça, que o sr. Procurador sempre fugiu a investigar e esclarecer, parecem charadas infantis. Eis-nos assim chegados à incontornável questão: como é que um homem que lava as mãos como Pilatos das suas responsabilidades institucionais e tem demonstrado tamanha falta de carácter (como justamente apontou o Bloco de Esquerda) pode garantir qualquer estabilidade ao funcionamento da Justiça e à isenção da investigação criminal? Quem é que ainda pretende meter a cabeça na areia (seguindo, assim, o próprio comportamento de Souto Moura) e convencer-se de que este Procurador tem condições éticas e políticas para permanecer no cargo?

Vicente Jorge Silva

Justiça e jornalismo de sarjeta

O processo Casa Pia, tal como tem vindo a decorrer desde o início, só remotamente servirá para apurar a verdade e garantir justiça às vítimas indefesas dos crimes pedófilos. Mas, em contrapartida, serviu para tentativas anónimas de assassinato de carácter, perpetradas por um tenebroso conluio entre mentes doentias, mitómanas e ressentidas que reúnem o que há de pior em dois pilares de uma sociedade democrática: a justiça e os media. O reles atrai o reles: eis uma velha verdade nunca desmentida.

Entretanto, como Deus escreve direito por linhas tortas, é sempre possível que, à falta da justiça propriamente dita, se obtenha, pelo menos e para já, uma justiça?poética. É esse o efeito imediato do «caso das cassetes roubadas», através do qual se celebraram as núpcias entre o rebotalho da justiça e o jornalismo de sarjeta.

Depois deste strip-tease, deste cair de máscaras, é preciso que se tirem todas as consequências do caso e se vençam os bloqueios corporativos para que a miséria moral dos comportamentos não fique impune (custe o que isso custar aos seus autores, cúmplices ou encobridores, chamem-se estes Procurador-Geral da República ou Sindicato dos Jornalistas) e para que as aparências da hipocrisia institucional não prevaleçam uma vez mais. É fundamental pôr inteiramente a nu a tramóia de uma justiça que, em vez de investigar, intoxica e difama a coberto do anonimato, e de um jornalismo dito investigativo que vorazmente se alimenta desse anonimato irresponsável e sórdido.

Vicente Jorge Silva

Notícias da Madeira

6 de Agosto -- O Presidente do Governo Regional, Alberto João Jardim, ordena a um agente da PSP que multe uma cidadã estrangeira por alegada infracção de estacionamento na Avenida de Zarco, no Funchal. O agende obedece.

7 de Agosto -- A condutora multada dá a conhecer o acontecimento na secção de cartas do leitor do «Diário de Notícias» do Funchal (o jornal mais lido na Madeira, cujo accionista maioritário é o grupo Blandy, de origem britânica). Interpelado pelos jornalistas durante a inauguração de um caminho rural (foram anunciadas 129 inaugurações até às eleições regionais de Outubro, período durante o qual irá fazer 156 discursos, todos de improviso), Alberto João Jardim confirma que voltaria a ordenar a multa à cidadã estrangeira e, a propósito, mostra-se irritado com as «mentiras» divulgadas pela «folha reles» e «subserviente». E esclarece: «O meu principal inimigo, na Madeira, é o diário dos Blandy».

8 de Agosto -- Durante a entrega de prémios da final dos «Jogos Lúdicos» (sic) promovidos pelo PSD numa freguesia do Funchal, Alberto João Jardim anuncia a intenção de expropriar os grupos económicos estrangeiros, designadamente os Blandy. «Eu entendo - afirma Jardim - que quando um grupo económico está a prejudicar a vida da região, esse grupo económico deve ser expropriado ou deve-se tomar, em relação a ele, qualquer medida que a lei prevê para deixar de perturbar». Jardim adianta que se prepara para, em Outubro, «se o PSD ganhar as eleições, tomar as medidas que se impõem em relação a grupos económicos que são pessoas não gratas aqui na região».

9 de Agosto -- Alberto João Jardim começa as suas habituais férias no Porto Santo. Mal desembarca, logo anuncia o seu propósito de explorar «até ao tutano» as novas competências legislativas que a última revisão constitucional atribui às regiões autónomas. Entre as iniciativas previstas, conta-se a criação de uma polícia regional (seguindo o modelo do País Basco e da Catalunha). Durante um passeio pelas ruas de Vila Baleira, Jardim manda alterar a localização de um cartaz de propaganda eleitoral onde aparece vestido com uma camisa vermelha e branca às riscas e colarinho branco, acompanhado pela frase, sobre fundo verde: «Conseguimos!...e há que fazer mais!». Jardim confidencia que é o autor das frases deste cartaz e de outro que irá ser afixado em Setembro. Deduz-se que será também o responsável criativo pelo «design», a indumentária e a pose fotográfica.

11 de Agosto -- À saída de casa, no Porto Santo, Jardim promete processar judicialmente a autora da carta publicada no «Diário de Notícias» e o próprio jornal (ainda a história da multa). Entretanto, em resposta ao grupo parlamentar do PS, que pretendia convocá-lo a prestar esclarecimentos no parlamento madeirense sobre a anunciada intenção de expropriar grupos estrangeiros, o Presidente do Governo Regional limita-se a afirmar: «Defeco». Mas para que não restem dúvidas, acrescenta: «Tenho um desprezo tão grande pela oposição que podem dizer o que quiserem que não me afectam. Quando insultam, processo-os». E conclui: «Só vou à Assembleia se a maioria, de que eu dependo, me mandar». Nota de indumentária: no seu passeio pela praia, Jardim exibe um boné de um movimento independentista catalão.

14 de Agosto -- Ostentando uma boina com a efígie de Che Guevara, Jardim anuncia que, no comício do próximo dia 21, no Porto Santo, vai desmontar uma tentativa de «golpe de Estado» na Madeira. «Estavam a contar que eu não me recandidatasse e estava idealizado um governo de bloco central. A maçonaria já se tinha perfilado, mas eu surpreendi-os. Vou contar a tentativa de golpe de Estado que se iria fazer nas minhas costas».

(Que eu saiba, nenhuma destas fabulosas notícias mereceu atenção dos media nacionais).

Vicente Jorge Silva

sexta-feira, 13 de agosto de 2004

Cartier-Bresson

Já aqui manifestei, a propósito de Sophia, Brando e Pintasilgo, a minha relutância em escrever sobre mortos que me são queridos. Não me peçam que explique as razões desta reserva. Mas a verdade é que acabo por não conseguir libertar-me do dever de memória (comovida, sofrida) que sinto para com eles. Chego tarde às despedidas, gostaria de adiá-las, mas ainda assim chego. Atrasado, arrastando o remorso da minha cobardia, mas chego.

Cartier-Bresson partiu já há uns dias, com a serena naturalidade de quem se aproximava de um século de vida. Há cerca de vinte anos trocara a fotografia pelo desenho, sua paixão inicial. Mas foi como fotógrafo que ficou como «o olho do século».

Nenhum fotógrafo foi tão decisivo como ele, nenhum como ele soube captar o mistério do «instante decisivo»: a coincidência mágica entre o pulsar da vida e a geometria do real. Como se por detrás de cada situação surpreendida em flagrante pela câmara houvesse sempre uma ordem secreta de linhas, sombras e luz que lhe emprestava um sentido único e a resgatava do caos. A mais extrema simplicidade, o mais genuíno despojamento, a recusa do artifício, conjugavam-se com o número perfeito, a arquitectura do único enquadramento possível.

Tal como Antonioni no cinema, Cartier-Bresson foi quem, na fotografia, me ensinou a olhar. O rigor e a elegância com que compunha espontaneamente as suas imagens eram atributos de um caçador que apanha a presa no momento exacto e faz desse momento um instante de beleza fulgurante. Uma beleza que perdura para além da fracção de segundo em que foi surpreendida e que a deixou suspensa para sempre.

Cartier-Bresson foi um dos meus heróis. Como fotógrafo, como fotojornalista, como referência humana, ele que tornava absurda a separação entre estética e ética, entre forma e conteúdo. E que, por isso, repudiava vigorosamente a instrumentalização da imagem por legendas retóricas que alterassem a evidência singela do que estava lá e se oferecia à liberdade dos nossos olhos. Bastava apenas que soubéssemos olhar. Como ele.

Vicente Jorge Silva
(Por erro meu, o texto acima esteve desaparecido do blogue nos últimos dias. Embora com atraso, volto a colocá-lo em órbita com pequeníssimas alterações. Cartier-Bresson merece-o).

O PGR pêgêerra alguma coisa?

O inefável Dr. Souto Moura, que ainda não se demitiu nem foi demitido de Procurador-Geral da República, produziu mais um indigente comunicado a chutar para canto a propósito deste episódio, só atentando no ilícito cometido pelo jornalista, mas passando à margem de eventuais crimes praticados por agentes do Estado, como o Director e inspectores da PJ nas conversas com o jornalista.
Será pelo desconforto de eventualmente ele próprio, a sua assessora de imprensa e alguns dos magistrados sob a sua tutela e ligados a investigação do caso Casa Pia, terem tido conversas no mínimo tão «insensatas» como as que levaram o Governo a despedir sumariamente o Dr. Salvado? Para esclarecer dúvidas, porque não manda divulgar os registos das gravações de agentes da PGR com o jornalista do «Correio da Manhã»?
Este é o PGR que em Novembro de 2003, quando eu perguntei porque não se sabia nada de investigações sobre a pista lançada pela revista «Le Point» que apontava para dois ministros frequentadores do Parque Eduardo VII e ligados a actividades pedófilas, veio dizer que não havia matéria para investigar! Ora, bastava recuperar memórias da Esquadra da Alegria...
Não vale a pena esperar pelo inquérito sobre as cassetes roubadas que há dois dias o PGR não queria fazer e que o PM aparentemente lhe ordenou ontem que faça e rápido. É que nada do que este PGR pêgêerre tem já qualquer credibilidade. Excepto, claro, demitir-se.

Ana Gomes

Perguntas avulsas sobre as gravações «roubadas»

Eis algumas perguntas que precisamos de ver esclarecidas, a propósito destas gravações alegadamente roubadas e para além delas:
- O que disse Adelino Salvado ao jornalista? Segundo os jornais referiu-se a Ferro Rodrigues. O que disse que tanto incomodou o Governo, a ponto de o despedir sumariamente? E ao dize-lo foi apenas insensato, ou cometeu crime de violação de segredo de Justiça, ou, pior ainda, manipulou informação para manchar a reputação de Ferro Rodrigues e comprometer o PS, o que significa ter conspirado para subverter a democracia? E agiu assim por motu proprio ou a mando de alguém, mancomunado com alguém? De quem? Com quem? E não há responsabilidades politicas a pedir a quem o nomeou e manteve no cargo, designadamente à Sra. Dra. Celeste Cardona e ao Sr. Dr. José Manuel Durão Barroso?
- O que disseram ao jornalista a inspectora da PJ Rosa Mota e outros agentes da PJ que estão referenciados como regulares interlocutores do jornalista ? Uma das primeiras tarefas do novo Director da PJ vai ser investigar os crimes eventualmente praticados pelo seu antecessor e agentes sob as suas ordens, para começar a por a casa em ordem?
- O que disseram outros figurões do processo Casa Pia, como Catalina Pestana, Pedro Namora, Adelino Granja, Pedro Strecht, etc?.
- O que disseram ao jornalista do «Correio da Manhã» magistrados ligados à investigação do caso Casa Pia ? Que magistrados ?
- O PGR, Souto Moura, falou com o jornalista? O que lhe disse? E a sua assessora de imprensa, Sara Pina ?

Ana Gomes



Em causa o Estado de Direito e a Democracia

As cassetes gravadas e alegadamente roubadas podem até não ter nada de especial. Mas criou-se na opinião pública a ideia contrária e o despedimento liminar do Director da PJ ainda mais a reforçou. E o Governo a oferecer subitamente pactos de regime sobre a Justiça ao bloco central dos interesses ainda mais acentuou o cheiro a podre de toda a história. Cheiro para que contribuem também personagens que procuram abafar tudo, defendendo que se reservem os esclarecimentos apenas aos ofendidos, Ferro Rodrigues e PS...
Não, não nos vamos contentar com nada menos do que toda a verdade, nua e crua, sobre o conteúdo das gravações, acessível a todos os portugueses.
Como a mulher de César, à Justiça não importa apenas ser séria, importa parecê-lo. E não parece.
Não basta mandar para casa o Dr. Adelino Salvado. Vai ter de se esclarecer tudo e apurar responsabilidades políticas, profissionais e criminais, doa a quem doer, esteja por detrás ou pela frente quem estiver. E não apenas por Ferro Rodrigues, Paulo Pedroso e o PS vilipendiados. Mas pelas crianças abusadas na Casa Pia. E pela Justiça e pelo Estado de Direito democrático.
Para mim, cidadã da República Portuguesa, está muito em causa, para além da privacidade dos interlocutores do jornalista gravador e roubado.
Está em causa o funcionamento da Justiça, que tem agentes que deviam ser garantes do segredo de justiça e parecem ser os primeiros a violá-lo em conversas com jornalistas.
Está em causa o funcionamento da Justiça, que tem agentes que deveriam ser os principais garantes da imparcialidade e isenção da investigação criminal e sob os quais recaem fortes suspeitas de serem, afinal, manipuladores dela e da informação prestada ao público sobre ela.
Está em causa o funcionamento da Justiça e do Estado quando há fortes suspeitas de que agentes da Policia e da Magistratura, sob instruções da tutela política ou não, manipularam e perverteram investigações criminais e a informação pública sobre ela para por em causa cidadãos que exercem funções políticas e são dirigentes do principal partido da oposição.
Está em causa, em suma, o normal funcionamento das instituições democráticas. Está em causa o Estado de Direito. E a Democracia. Por isso aqui todos temos responsabilidades a assumir. E os mais altos magistrados da Nação não podem continuar a assobiar para o ar.

Ana Gomes

Gravações oficialmente divulgadas, já!

Não, ainda ninguém me fez chegar os CDs com a reprodução das cassetes alegadamente roubadas que andam a circular pelas redacções, apesar de eu ter dito que divulgaria aqui o que me parecesse relevante. Ainda não ouvi as gravações, portanto.
Mas a demora e o despedimento sumário de Adelino Salvado levam a concluir que o que está nelas deve ser realmente explosivo, a ponto de, desta vez, ninguém ter coragem de o divulgar. E que lestos (porventura encorajados por fontes policiais, judiciais ou governamentais) foram antes os media a publicitar transcrições de conversas de Ferro Rodrigues e Paulo Pedroso, apesar de estarem em causa não apenas conversas telefónicas de um jornalista com as suas fontes, mas peças de um processo em segredo de justiça.
A FOCUS ia publicar extractos das gravações, mas foi impedida por uma providência cautelar sustentada em horas, pasme-se, em tempo de férias judiciais, por um tribunal cível, incompetente para se pronunciar sobre a ilicitude das gravações, mas hiper-zeloso do «bom nome» dos escutados - alguns dos quais, nada tendo a temer, logo autorizaram a divulgação. Providência cautelar pedida, pasme-se, pelo jornalista que cometeu o crime de gravar à revelia dos interlocutores (se ele tem atenuante ou isenção da culpa, isso apura-se judicialmente em momento posterior). Jornalista que, na pretensão de impedir a divulgação das gravações, é apoiado, pasme-se, pelo respectivo Sindicato (se um jornalista matar alguém para escrever sobre a experiência de assassinar, o Sindicato impedirá a divulgação das provas do crime, para lhe preservar o material de trabalho?)
Perante o descalabro a que assistimos, o mínimo é exigir a divulgação integral do conteúdo das muitas horas de gravações. E, de preferência, em primeira mão, não por nenhum jornal, canal de rádio, TV ou blog, mas em site oficial, por exemplo o da PGR, que superintende a investigação do caso Casa Pia, ou do Ministério da Justiça que tutela a PJ cujo director foi demitido pelo Governo depois de ter ouvido as gravações.

Ana Gomes

quinta-feira, 12 de agosto de 2004

Que organização é esta?

Quem se dispuser a perder uns minutos numa reflexão sobre o absurdo da actual orgânica governativa, consulte aqui o texto que sobre a matéria hoje escrevi para o Jornal de Negócios.

Luís Nazaré

quarta-feira, 11 de agosto de 2004

Causa Nossa e o estranho caso das gravações roubadas

Estou em pulgas para conhecer o teor das gravações "roubadas" que levaram à demissão do director da PJ, Adelino Salvado. A minha colega de blogue, Ana Gomes, já prometeu que o tornaria público aqui no Causa Nossa, do mesmo modo que personalidades tão diversas quanto Pacheco Pereira, Luís Delgado e Miguel Sousa Tavares defenderam sem reservas a sua divulgação, a bem da decência e do interesse público. Não posso falar em nome do colectivo, impossibilitado de se reunir dado encontrar-se maioritariamente a banhos, mas acreditem que o Causa Nossa vai fazer uma cobertura intensiva dos acontecimentos. Deixem regressar o Vital...

Luís Nazaré

segunda-feira, 9 de agosto de 2004

Novos compromissos

Sei que há quem pense que tenho um preconceito contra o Expresso. E tenho. Não lhe perdoo o facilitismo, a tentação pela intriga cortesã, a perda de qualidade, os links pagos e os três euros que me obriga a gastar todos os sábados (ossos do ofício...). O fair play obriga-me porém a saudar o último artigo de Nicolau Santos no suplemento Economia, intitulado "9 compromissos até 2010". Recomendo vivamente a sua leitura a toda a classe política.

Luís Nazaré

domingo, 8 de agosto de 2004

A Ideia

Quando, há três meses atrás, atribuímos o prémio Causa Nossa "5ª dimensão" ao director do semanário de referência, julgávamos que o Arquitecto tinha finalmente atingido o seu Nirvana e que os novos afazeres celestiais o impediriam de nos deliciar com novas epístolas. Puro engano. É que o Arquitecto arranjou uma maneira astuciosa de continuar a transmitir-nos as suas revelações ao sábado - através dos seus alter-egos. Esta semana, foi Óscar Niemeyer.

Com os casos de sucesso de Islamabade e Brasília como bandeiras, o Arquitecto desenvolve uma sublime argumentação em favor de uma nova capital. Com a visão celestial de que dispõe, já tratou até de escolher o melhor sítio - algures num triângulo cujos vértices são Castelo Branco, Portalegre e Abrantes. Seria "uma cidade construída de novo, (?) moderna, projectada por arquitectos contemporâneos, voltada para o futuro, capaz de ficar como um marco do nosso tempo".

Na reunião dominical do Clube de Reflexão Expresso, alguns dos meus amigos mais simplistas não alcançaram a elevação intelectual do Arquitecto, ridicularizando-lhe os propósitos e as justificações. Mas quando alguém tentou equipará-lo ao célebre Mr. Chance, aí insurgi-me. Com que direito punham em causa a omnisciência do Arquitecto? Ou será que não tinham pura e simplesmente percebido a fina subtileza das suas razões, confundindo-as com um rol de tontices infantis? Esperem para ver.

Por mim, não duvido por um instante da visão do Arquitecto. Como ele humildemente relembra na sua mensagem de ontem, quantas ideias originais e grandiosas não foram já anunciadas em epístolas anteriores, para bem do país? Vou mais longe: o projecto da nova capital deveria ser entregue ao único espírito capaz de apreender o seu alcance, o próprio Arquitecto. Para começar, trataria de convencer os críticos com um projecto-piloto. Através de outro dos seus alter-egos, o de director do semanário de referência, é só mudar a sede do Expresso - talvez mesmo da Impresa - para Alcains. Vão ver como todos ficarão rendidos à Ideia.

Luís Nazaré

sábado, 7 de agosto de 2004

Casa ImPia

Tudo indica que a «silly season» do Circo Santaneli vai ser agitada por mais um episódio da saga Casa ImPia. É ver o relato do PUBLICO on line de hoje, sobre o roubo dos suportes de dezenas de horas de gravações que o jornalista do CM Octávio Lopes foi fazendo com interlocutores da PJ e outros ligados à investigação, à revelia deles aparentemente.
Confesso aguardar com expectativa que a SIC, tal como fez com as gravações que envolviam Ferro Rodrigues, comece a pôr no ar as transcrições desses registos, para ver o que era confidenciado ao jornalista e se o Director da PJ e sua rapaziada só usam linguagem elevada. Se não, não é SIC não é nada! É que o segredo de justiça há muito que é uma balela - e a SIC e o CM foram dos orgãos de comunicaão social que mais ajudaram a demonstrá-lo.
Já agora a SIC também podia entrevistar a jornalista Felícia Cabrita, para ela explicar de viva voz o que diz na entrevista à CARAS desta semana:
«Há uma coisa curiosa: inicialmente todos os nomes que me apareceram eram pessoas de direita, políticos de direita, que ainda não vieram a lume. Provavelmente serão crimes prescritos, sabemos que há investigações em curso, portanto ainda é cedo. E há uma coisa fundamental: este é o processo da Casa Pia, mas muitos outros miúdos foram ouvidos no meio disto. Havia ligações, nomeadamente 'amigos' do Parque Eduardo VII que falaram seguramente de outras pessoas. Não tenho dúvida de que o Parque está a ser investigado.
QUE NOMES ERAM ESSES? Eram pessoas até do governo da época, de 1982, que continuam a ter peso. (...) neste teste à democracia vimos como o PS reagiu, que foi muito mal. (...) Mas estou ansiosa, gostava de saber como reagiria o PSD ou o PP se isto lhes batesse à porta.»
Eu também. E porque é que não bate? Quem estava no governo em 1982? Porque é que nada se sabe da investigação do Parque?
Em Novembro de 2003 incomodei muita gente ao berrar que tudo estava a ser feito para descredibilizar o processo, em detrimento das crianças abusadas, tudo para proteger e encobrir criminosos, desviando atenções de alguns deles através de pistas falsas, calúnias e urdiduras ignóbeis como as lançadas sobre Paulo Pedroso e Ferro Rodrigues. Pois não retirei, nem retiro, uma palavra do que então disse.

Ana Gomes