segunda-feira, 10 de janeiro de 2005

O painel do Jornal de Negócios (2) - As culpas da Justiça

É comum indicar-se a morosidade da Justiça, em particular da justiça cível, como causa de todos as nossas dificuldades, particularmente as das nossas empresas. Certamente que esses atrasos não favorecem a confiança nos negócios. E mais do que isso, não ajudam ao saneamento rápido dos que não são eficientes, nem à responsabilização dos não cumpridores das suas obrigações contratuais, fiscais ou outras (não sei se era nisso que estavam a pensar).
Mas sejamos cautelosos. Num estudo coordenado há uns anos pela Universidade de Oxford, em que tive o gosto de participar, os problemas da justiça cível eram mais ou menos os mesmos um pouco por todo o lado, com excepção da Holanda que tinha o sistema mais eficiente. Em vários países europeus a questão da morosidade e do "entupimento" do sistema pelas cobranças de dívidas assumia proporções semelhantes às nossas. Talvez os empresários deles também se queixem, mas os seus resultados económicos são diferentes.

O painel do Jornal de Negócios (1) - Só uma mulher?

Do painel do JN de hoje fazem parte 60 economistas, a maioria gestores de empresas públicas e privadas, mas também presidentes de autoridades reguladoras, consultores e professores universitários. Apenas uma mulher entre todos eles: Vera Pires Coelho, da Edifer. Espantoso, nem Teodora Cardoso, colunista do Jornal, teve lugar neste painel. De que nos vale ser o país com mais mulheres entre as pessoas doutoradas?
Mas devo confessar que não me espantei. Acho mesmo que só a monotonia da fotografia me chamou a atenção. De resto, não me lembro de nenhuma mulher por exemplo na administração do Banco de Portugal, há muito tempo. E só quem não frequenta os meios empresariais admitiria poder encontrar algo de muito distinto.
Que descanse o Sérgio Figueiredo. Não reivindico quotas para o painel do seu jornal, nem para qualquer outro lugar. Apenas lhe sugiro maior pluralismo na escolha. Com a certeza que isso não prejudicará a qualidade dos resultados e talvez aumente a diversidade de pontos de vista ou pelo menos de sensibilidades. Porque os resultados deste painel são, na verdade, um pouco decepcionantes (ver posts seguintes).

Diário eleitoral (8) - A declaração de guerra

«Não teremos problemas em propor moção de censura ao PS» - é que diz preto no branco o dirigente "bloquista", João Teixeira Lopes, em entrevista à Capital.
Assim, sem mais, esta declaração de guerra significa que o Bloco admite apresentar uma moção de censura mesmo que se trate de um governo minoritário, o que pode implicar o seu derrube automático, com o agradecimento da direita pela cortesia. Trata-se de uma declaração histórica. Suponho que até agora nenhuma força de esquerda alguma vez proclamou tal falta de pruridos em tomar a iniciativa de derrubar um governo do PS. Nem o PCP ousou dar esse passo, mesmo na fase mais quente dos seus conflitos com os governos socialistas. Negou outrora a confiança inadvertidamente pedida por Soares (1978), mas não propôs uma moção de censura contra ele, o que é muito diferente.
Esta entrevista ajuda a clarificar o quadro de hipóteses de governo na sequência das próximas eleições, afastando quaisquer veleidades sobre a possibilidade de governar sem maioria absoluta, se isso depender do BE. Fica-se a saber que o PS não só não pode contar com o seu apoio para viabilizar e sustentar o governo mas também que nem sequer pode contar que não parta dele na iniciativa de o demitir. Torna-se assim cada vez mais apertada a viabilidade de um governo minoritário. Só é de estranhar que o PS ainda não tenha feito da sustentabilidade e da estabilidade governamental uma questão-chave das próximas eleições.

A culpa é sempre dos árbitros, claro

Como é corrente, quando não se gosta de uma avaliação culpa-se o avaliador de parcialidade. Há quem não consiga escapar ao mau exemplo do futebol. É o caso de algumas reacções à avaliação oficial dos cursos de Direito. Não faltou quem enveredasse pela fácil tentativa de descredibilização.
Ora sucede que: (i) os professores das duas escolas públicas com melhores resultados (Coimbra e Lisboa) estavam em franca minoria no conjunto da comissão de avaliação; (ii) a maior parte deles são ou foram também professores de escolas privadas, nomeadamente da Universidade Católica, a começar pelo falecido Prof. Sousa Franco, que foi durante muitos anos director da respectiva faculdade de Direito; (iii) os professores não votaram na avaliação das suas próprias faculdades.
O resto é lançar poeira para os olhos ou desculpas de mau perdedor. Por que não ler directamente o relatório de avaliação?

O Livro dos Elogios (3)

Quando comparamos o serviço de assistência pós-venda do Ikea com o padrão a que estávamos habituados em muitos outros estabelecimentos, damo-nos conta da diferença e percebemos rapidamente as razões do seu sucesso. Ao contrário da EDP (ver post Call centers), funciona no Ikea o princípio da confiança na situação descrita pelo cliente e sobretudo um enorme desejo de repor muito rapidamente a sua satisfação. Como seria bom se estas boas práticas se tornassem regra em outros sectores de transacção de bens ou de serviços em Portugal!

A experiência dos Call Centers



Os call centers são uma forma de atendimento sobre qual tenho normalmente a maior desconfiança, mesmo admitindo que talvez o problema não esteja verdadeiramente no sistema, mas sobretudo na formação dos seus trabalhadores.

1. Ontem começámos pelo da TV Cabo, por causa de uma interrupção de sinal. Ouvimos uma gravação a garantir que seríamos atendidos dentro de... 5 minutos. Esperámos 5, 10, 12 m etc. pendurados ao telefone, e nada! Um exemplo do que não deve ser feito.

2. Seguiu-se a experiência do inacreditável atendimento da EDP, devido a uma falha de energia eléctrica na nossa rua. Primeiro, martirizam o cliente com o pedido do código de identificação. Sem luz, quase esgotadas as velas no Natal e num domingo à noite, não estão reunidas as melhores condições para procurar os recibos e disponibilizar a informação pretendida, nem a sabemos de cor naturalmente. Mas este argumento não se mostra eficaz. Sem identificar o cliente, não disponibilizam informação sobre as razões da avaria e sobre a hora a que estará reparada - que era tudo o que queríamos saber! -, mesmo com o nome da rua, o número da porta e a área da cidade. E ainda corremos o risco de nos desligarem o telefone em caso de um protesto mais agastado! Inadmissível! A EDP não presta um serviço público? Não parece!

3. Mas há em momentos felizes em que também se consegue dar a volta a um call center. Uma vez precisava de uma informação urgente da Air France. Liguei o número indicado, escolhi a língua e atendeu-me uma senhora que falava em português do Brasil. Lá fui dizendo o que pretendia, mas como saía fora do comum mandou-me "passar pelo escritório da companhia". Disse-lhe que morava em Coimbra e não podia ir a Lisboa. Estava a duas horas de viagem e por isso não obteria a informação em tempo útil, mas nada. Insistia, repetindo as mesmas palavras: «por favor dirija-se ao escritório etc., etc». Até que, em risco de perder o avião, desesperei. E aí a atendedora provou que não era um robot pré-programado. Não desligou e lá me confessou que até compreendia o meu desespero, mas não sabia responder à minha questão e estava a atender de... Londres. Não conhecia Portugal e não percebera, por isso, o meu problema relativamente ao contacto directo com o escritório em Lisboa. No fim de uns segundos de conversa amena, até conseguiu arranjar-me um número de telefone conveniente, que não era o de um call center, onde pude obter a informação que pretendia em tempo útil.

O grande problema do regime

«O grande problema do nosso regime não está, a meu ver, com a obtenção de maiorias (43% ou menos é suficiente) nem com a duração dos mandatos. A meu ver o problema está nos partidos quando exigem pouca diversidade de pensamento aos seus deputados com uma estúpida disciplina de voto! Agrava-se com a distorção entre a eleição de deputados por distrito (com listas formadas por quotas) e a sua utilidade após a eleição, acantonados a uma obscuridade permanente!»
(Ricardo V. R.)

Joke do dia

«Santana Lopes é melhor primeiro-ministro». (Miguel Relvas, secretário-geral do PSD, na Capital)

Entre aspas: "A alarvidade da misoginia dominante"

«O escrutínio relativamente à competência de uma mulher na política continua a ser implacável e incomparavelmente maior do que aquele que se faz a um homem (e muitas vezes nem se faz).» (Ana Sá Lopes no Público)

domingo, 9 de janeiro de 2005

A mitologia dos círculos uninominais (3)

O sistema eleitoral alemão permite conjugar a existência de círculos uninominais com o princípio da proporcionalidade, ao mesmo tempo que permite eliminar ou atenuar as principais deficiências do sistema de tipo britânico (ver post precedente). Todavia, nesse sistema "misto" só uma parte dos deputados é que podem ser escolhidos em círculos uninominais, justamente para preservar a proporcionalidade.
A nossa Constituição permite o estabelecimento de um sistema desses, desde a revisão constitucional de 1997. Fizeram-se mesmo estudos aprofundados (que estão publicados) e houve uma proposta de lei apresentada pelo então Governo PS, que porém naufragou no Parlamento, mercê da oposição do PSD, que exigia uma concomitante redução do número de deputados (para facilitar a obtenção de maiorias monopartidárias...), o que só poderia agravar a rejeição dos pequenos partidos, desde o CDS-PP ao BE.
Como decorre desta notícia da Capital de hoje, o PS vai insistir nessa proposta na legislatura que vem. Sendo previsível e natural a oposição dos pequenos partidos, resta saber a posição do PSD. Dada a importância da questão, conviria conhecê-la antes das eleições, não é?

A mitologia dos círculos uninominais (2)

O sistema de círculos uninominais está longe de ter virtualidades salvíficas nos países onde existe, a começar pelo seu berço, o Reino Unido, onde está longe de ser pacífico. A pessoa dos candidatos tem afinal uma escassa importância no voto dos eleitores, continuando a ser decisiva a opção partidária destes; os dirigentes partidários e os favoritos do líder continuam a ter lugar garantido nos círculos seguros (safe seats); os pára-quedistas não desaparecem; os eleitores que votam noutros candidatos que não o vencedor não se sentem representados no deputado eleito, podendo ser uma grande parte dos eleitores, se bastar a maioria relativa, como sucede nos sistemas de tipo anglo-saxónico; as hipóteses de eleição de deputados independentes são pouco menos que nulas, etc.
Por outro lado, os círculos uninominais favorecem a candidatura e a eleição de "caciques locais" e das pessoas com mais meios, facilitam o "patrocínio" de candidaturas pelos interesses organizados, abrem caminho aos candidatos "identitários" e ao voto "tribal", dificultam a candidatura e eleição de mulheres, etc..
Além disso, os sistemas exclusivamente baseados em círculos uninominais tendem para a bipolarização partidária, distorcem grosseiramente a representatividade relativa dos partidos concorrentes, em favor do partido vencedor, permitem maiorais absolutas com pequenas maiorias relativas de votos (ou até maiorias de deputados sem maioria de votos) e expulsam do parlamento os pequenos partidos. O facto de na maior parte dos círculos ser antecipadamente conhecido o vencedor induz um aumento da abstenção eleitoral. O parlamento tornar-se-ia menos efectivamente representativo da sociedade e dos partidos políticos.

A mitologia dos círculos uninominais

É fatal. Sempre que há novas eleições para a Assembleia da República surge uma multidão de defensores dos círculos uninominais, como panaceia contra todos os defeitos do actual sistema de candidaturas de lista em círculos plurinominais: a designação dos candidatos pelas direcções partidárias nacionais, os candidatos "pára-quedistas", a distância entre os eleitores e os eleitos, etc. Um bom exemplo é a coluna de António Barreto no Público de hoje.
Entre as vantagens apontadas aos círculos uninominais contam-se a maior importância das pessoas dos candidatos, uma maior identificação e proximidade entre os eleitores e os eleitos, a possibilidade de chamar os deputados a prestar contas no seu círculo, a exclusão da substituição de deputados, obrigando a novas eleições locais, sempre que um deputado deixe de o ser, etc. Sucede, porém que as vantagens não são tantas nem tão sensíveis como se apregoa. E as desvantagens não são poucas nem pequenas, longe disso.

As melhores (e as piores) faculdades de Direito

Foi agora publicado o relatório da avaliação externa dos cursos de Direito, efectuada por uma comissão internacional composta por professores e profissionais de Direito. Sem grande surpresa os cursos mais bem classificados são os das duas faculdades públicas mais antigas, ou seja, as da Universidade de Coimbra (FDUC) e da Universidade de Lisboa ("Clássica") (FDUL). Uma visita aos respectivos websites pode ajudar a perceber porquê.
Dada a importância que o Direito continua a ter entre nós e a competição que existe entre as respectivas escolas, seria natural que a sua avaliação merecesse a atenção dos média. E ninguém tem dúvidas de que ela talvez suscitasse mesmo algumas manchetes de primeira página, se a avaliação premiasse uma universidade não pública. Como não foi esse o resultado, talvez seja por isso que a ocorrência passou praticamente despercebida, com o Público, por exemplo, a remeter o caso para o interior profundo do jornal, com uma pequena chamada na primeira página.
Tão importante como a revelação das melhores escolas de Direito é a verificação das piores, todas elas privadas. A avaliação confirma a péssima impressão colhida há cinco anos pelo relatório do Grupo de Missão que investigou o ensino superior privado (excepto a Universidade Católica), a que pertenci. A verdade é que algumas escolas não cumprem sequer os requisitos mínimos legalmente estabelecidos, por exemplo quanto ao pessoal docente qualificado, pelo que não deveriam estar abertas. O Ministério do Ensino Superior deveria promover imediatamente uma inspecção com vista ao seu encerramento se as anomalias se confirmarem. E a Ordem dos Advogados, em vez de defender a limitação do acesso aos cursos de Direito, deveria era lutar contra a má qualidade de vários deles.

Haverá uma atmosfera tipicamente lusitana?

A resposta está, como habitualmente, no Aba da Causa.

sábado, 8 de janeiro de 2005

Perplexidade

Como se não bastassem os muitos temas em aberto nos projectos de reforma do sistema político (limitação dos mandatos, governo municipal, sistema eleitoral, descentralização territorial, etc.), o Presidente da República veio agora sugerir também o alargamento da duração dos mandatos políticos, incluindo aparentemente a duração da legislatura (e portanto dos governos), que é de 4 anos, e do mandato presidencial, que é de 5 anos, e que correspondem à norma mais frequente para tais mandatos em direito constitucional comparado.
Para além da manifesta inoportunidade deste inesperado questionamento, cabe perguntar qual é o seu "racional". O melhor caminho para não mudar nada é questionar tudo. Além disso, essa mudança necessitaria de uma revisão constitucional -- mais uma --, o que não confere propriamente com a justíssima censura presidencial da banalização das mexidas constitucionais.
Definitivamente não foi uma noite feliz de Jorge Sampaio.

Incoerência absoluta

Se há uma força política que não pode censurar o Presidente da República, por este ter defendido mudanças no sistema eleitoral para facilitar a formação de maiorias parlamentares monopartidárias, é justamente o PSD, que foi desde sempre o campeão dessa posição, tendo proposto todas as medidas nesse sentido (redução da dimensão dos círculos eleitorais, diminuição do número de deputados, etc.). De resto, o Presidente limitou-se a secundar uma "deixa" de J. Pacheco Pereira, que não fez mais do que defender a posição tradicional do seu partido nessa matéria. Portanto o PSD está a condenar o Presidente por apoiar as suas próprias posições! Haja pudor!
Está visto que do PSD de Santana Lopes é de esperar tudo menos coerência. De resto, como anunciou o oficioso (ou oficial?) comissário satanista, Luís Delgado, não é verdade que o PSD também vai lutar pelo objectivo da maioria absoluta!?

Diário eleitoral (7) - Sondagem

Na primeira grande sondagem de opinião sobre as intenções de voto, o PS surge com uma ampla vantagem sobre o PSD, atingindo uma votação que lhe permitiria alcançar uma maioria absoluta de deputados (o que nunca conseguiu até agora). Como era de esperar, dado o descrédito governamental do PSD e o reajuste do posicionamento político do PS sob a liderança de Sócrates, verifica-se que o crescimento eleitoral deste se dá no eleitorado do centro, à custa do partido de Santana Lopes, perdendo porém algum terreno à sua esquerda, sobretudo em benefício do BE, que sobe consideravelmente o seu "score" eleitoral em relação às eleições passadas.
Globalmente considerada, a vantagem das forças de esquerda nesta sondagem é muito grande, não sendo de prever que se desvaneça até às eleições.

Maiorias absolutas

Independentemente da concordância, ou não, com a idea do Presidente da República de favorecer deliberadamente a obtenção de maiorias parlamentares absolutas, parece evidente que ela não prima pela oportunidade nem pela profundidade, apresentada como foi, de passagem, numa conversa televisiva, no início de um processo eleitoral.

Ainda as maiorias absolutas

Além da redução do número médio de deputados por cada círculo eleitoral (ver post precedente) existe um método mais sofisticado de tornar menos difícil alcançar maiorias absolutas no parlamento, sem reduzir formalmente a proporcionalidade na repartição dos deputados.
A solução consiste em promover a bipolarização do voto, induzindo os eleitores a escolher fundamentalmente entre dois partidos. Tal poderia ser o efeito da falhada tentativa de reforma do sistema eleitoral lançada por António Costa no primeiro Governo Guterres, que consistia em criar círculos uninominais de candidatura, que elegeriam cerca de metade dos deputados, embora sem afastar a regra da proporcionalidade na distribuição do total dos deputados pelas forças concorrentes. Na verdade, os círculos uninominais favorecem a concentração de votos nos candidatos com possibilidade de vencer, normalmente os principais partidos, que desse modo podem franquear mais facialmente o limiar da maioria absoluta sem ter de o baixar excessivamente.
Afinal, talvez tenha sido esse modelo que Jorge Sampaio teve em mente quando falou em facilitar a obtenção de maiorias parlamentares sem afectar a proporcionalidade eleitoral.

Estabilidade e proporcionalidade

Na conversa da SIC Notícias o Presidente da República apoiou a ideia de mexer no sistema eleitoral, de modo a facilitar a obtenção de maiorias parlamentares absolutas (ou seja, mais de metade dos deputados), mas sem prejudicar a proporcionalidade. Ora essas duas ideias são por princípio contraditórias. As maiorias parlamentares monopartidárias (são elas que o Presidente pretende favorecer) só podem ser facilitadas à custa de menos proporcionalidade. A relação entre as duas coisas está há muito estabelecida.
Actualmente, para se obter uma maioria parlamentar é necessário algo como 45% dos votos, conferindo já um "majoração" significativa ao partido vencedor. A maneira mais simples de tornar menos exigente a maioria absoluta -- ou seja, possibilitar a sua obtenção com menor percentagem de votos --, consiste em diminuir o número médio de deputados por círculo eleitoral, o que se consegue por dois modos: (i) diminuição do número total de deputados e/ou (ii) aumento do número de círculos eleitorais, fraccionando os actuais. Aliás, nenhuma dessas alterações necessita de revisão constitucional, podendo ser feita por via de lei, embora aprovada por maioria de 2/3.
Em qualquer caso, se se baixar muito o liminar da maioria absoluta -- aumentando o fosso entre a proporção de deputados alcançados e a proporção de votos obtida --, será que podemos continuar a dizer que o sistema ainda é proporcional e que a Constituição ainda está a ser respeitada? E independentemente da questão constitucional será politicamente justo diminuir desproporcionadamente a representação dos partidos menos votados ou até reduzir o leque de forças políticas com representação parlamentar, em homengem à obtenção de maiorias absolutas?

As listas

«As listas eleitorais do PPD/PSD, são, aliás, um misto de clube de amigos, de nulidades políticas e de pára-quedistas de toda a espécie. A incredulidade de uma primeira reacção quando se olham os nomes das listas dá rapidamente lugar à hilariedade, tal o absurdo a que se chegou. A apagada aparelhista Helena Lopes da Costa em 3º lugar em Lisboa?! O enovelado e intermitente investigador Freire Antunes em 2º no Porto?! E o pitoresco alentejano Raul dos Santos transplantado para o Porto?! Parece o salve-se quem puder numa ordenação sem rei nem roque.» - José António Lima .

«Se as listas [do PS] queriam que voltássemos "a acreditar", então falharam. Comparadas com elas havia, pelo menos na aparência, mais frescura nas listas de Ferro Rodrigues. Uma frescura que, mesmo assim, foi sol de muito pouca dura.» - José Manuel Fernandes.

«Opositores do aborto lideram listas do PS» - Diário de Notícias

O que é que não piorou?

O anterior bastonário da Ordem dos Advogados, José Miguel Júdice, declarou na posse do seu sucessor que o sistema judicial está «muito pior» do que há três anos. Mas na verdade que sectores é que não ficaram pior nestes (quase) três anos de Governos PSD/CDS?

sexta-feira, 7 de janeiro de 2005

Condomínio (4) - "No children are allowed"

«A discussão sobre o regulamento insano no condomínio americano fez-me lembrar uma música do Stevie Wonder, nos tempos em que este era um compositor inspirado e usava a sua voz para denunciar o estado das coisas nos USA.
Trata-se da música Cash in Your Face (1980) e como se percebe trata-se de um diálogo entre o pretendente a inquilino e o agente imobiliário do condomínio (ou algo semelhante). Aqui vai o trecho que no contexto da discussão me parece mais a propósito:
Our first child is due here any day
That's why we're desperate for a place to stay
The location is so perfect too
So please try to do what you can do

Well in this apartment complex no children are allowed
And if you told me that I could have saved you a lot of time
Well I thought the Bill was passed that said you could not discriminate
But I know some excuse you'll find
(...)»
(Sachondel Gouveia)

Pessimismo excessivo?

«O próximo parlamento deverá ser, por isso, um dos mais pobres, cinzentos e desqualificados de todos os que conhecemos desde o 25 de Abril. Ora, era precisamente agora, porventura mais do que nunca, que se impunha responder à apatia e desencanto dos cidadãos com sinais fortes de reabilitação e aggiornamento da vida política.» Vicente Jorge Silva

Pior, só a peste

«Eu, católico, monárquico e português, votarei, em nome de uma pátria livre que amo, com um «não» veemente à famigerada Constituição da famigerada UE, arredada das raízes cristãs e mais próxima do pedofilismo grego.»
Carlos Azeredo.

Diário eleitoral (6) - A ficção orçamental

Como já se tinha aqui afirmado em várias ocasiões, e o relatório do Banco de Portugal hoje veio comprovar de forma gritante, o orçamento para 2005 assenta em pressupostos fictícios quanto ao crescimento da economia -- em vez dos imaginários 2,4% será apenas um medíocre 1,6%, ou menos, novamente abaixo da média comunitária --, o que arrasa a previsão do défice orçamental, que deverá superar a fasquia dos 5% (cálculo aliás conservador, parece-me...), tornando necessário um orçamento rectificativo com medidas adicionais, quer do lado do corte nas despesas quer do lado do aumento das receitas. Bela herança recebe o próximo Governo!
A prometida consolidação orçamental continua portanto uma miragem. Ora a falta de credibilidade dos números orçamentais foi a seu tempo devidamente denunciada pela oposição. Por isso, o Orçamento, agora fatalmente desacreditado, bem como o bizarro anúncio do "fim da austeridade" e a arenga da descida de impostos não passaram de grosseira irresponsabilidade, bem à medida deste (des)governo. Nestas condições, qualquer promessa eleitoral de redução de impostos (como já insinuou outra vez o PSD) devia dar direito a uma pesada punição eleitoral por escandalosa trafulhice política.

quinta-feira, 6 de janeiro de 2005

Maremoto = tsunami (2)

Um leitor objecta que as fontes por mim indicadas no post anterior sobre o assunto em epígrafe eram todas em Espanhol e pergunta-me se existem fontes em Português no mesmo sentido. A resposta é: há muitas. Um exemplo, num jornal científico brasileiro:
Terremoto, maremoto ou tsunami?
(...) O maremoto ou tsunami - as palavras significam a mesma coisa - é o efeito causado por esse tremor [de terra] na água do mar, que leva à formação de ondas gigantes na superfície.
(...) Os maremotos ou tsunamis (palavra japonesa) ocorrem quando há um terremoto no leito marinho envolvendo movimento vertical de uma das placas.
(...) O que matou a grande maioria das pessoas no domingo, portanto, foi um maremoto, ocasionado por um terremoto.
Por conseguinte, nada justifica entre nós o uso da palavra japonesa em vez do termo português equivalente, que sempre foi usado para designar o mesmo fenómeno. A RTP e a RDP em especial não só não deveriam incorrer nessa prática como deveriam fazer alguma pedagogia quanto ao uso da língua portuguesa.

Adenda
Uma explicação elucidativa também pode encontrar-se neste site especializado português.

"Manifesto anti-Lopes"...

... de um "ácrata derretido", ou Paulo Querido no seu melhor!

Uma Universidade em cada vale

O ainda primeiro-ministro anunciou "in loco", como convinha à finalidade eleitoralista do evento, a criação da Universidade do Vale do Sousa (por transformação de um instituto de ciências da saúde privado). O facto de tal decisão não caber na competência de um "governo de gestão" é obviamente uma objecção que só pode ser levantada por mesquinhos espíritos legalistas, que não querem ver o alto desígnio do governo da Nação.
É aliás uma decisão justíssima. Parece que este Governo ainda não tinha criado nenhuma universidade. Era uma lacuna imperdoável. Em Portugal nenhum Governo digno desse nome poderá ficar na história sem ter criado pelo menos uma nova universidade (e uma nova ordem profissional, pois claro). Se Durão Barroso criou a Universidade de Viseu, Santana cria a do Vale do Sousa, que não tem direito a menos. Ainda por cima, trata-se de uma Universidade privada, que nem sequer custa milhões ao orçamento público, como a de Durão.
Doravante aliás fica aberto o caminho para mais "universidades fluviais". Assim, os próximos anos deverão assistir à criação das universidades do vale do Minho (com sede em Monção), do vale do Lima (Ponde de Lima), do vale do Homem (Terras de Bouro) e assim por diante, até à Universidade do vale do Guadiana (Alcoutim). Desse modo, Portugal ficará à frente num critério decisivo para a classificação do "desenvolvimento humano" dos países, a saber, o número de universidades per capita.
A velha aspiração da democratização da universidade ficará definitivamente realizada entre nós. Honra ao Governo que assim eleva bem alto a bandeira da disseminação universal da formação superior em Portugal!

Comentário a "Uma história pouco edificante"

Ele há diplomatas (embaixadores ou ainda não) que mais valia não estivessem nos postos! Nunca.