segunda-feira, 12 de setembro de 2005

Manifestações militares

Estabelece o art. 31º da Lei de Defesa Nacional que os militares, «desde que estejam desarmados e trajem civilmente sem ostentação de qualquer símbolo nacional ou das Forças Armadas, têm o direito de participar em qualquer manifestação legalmente convocada que não tenha natureza político-partidária ou sindical, desde que não sejam postas em risco a coesão e a disciplina das Forças Armadas.»
A Constituição permite a restrição dos direitos dos militares, «na estrita medida das exigências próprias das suas funções», cabendo à lei a delimitação dessas restrições. Utilizando a lei conceitos relativamente indeterminados -- nomeadamente os de «coesão e disciplina das Forças Armadas» --, é evidente que a invocação desses limites em cada caso concreto necessita de adequada fundamentação.

Desautorização?

Ao fazer publicar no prestimoso "Expresso" um texto de há três anos sobre o papel do Presidente da República, Cavaco Silva pretendeu claramente contrariar as teorizações de alguns dos seus apoiantes no sentido de associar a sua candidatura a uma presidencialização do regime. Fiquemos atentos à reacção deles...

Correio dos leitores: As reformas de Cavaco

«Ao acabar de ler o artigo no PÚBLICO sobre o valor das várias reformas que Cavaco Silva foi acumulando fiquei surpreendido. É que, se bem fizermos o somatório dos anos de trabalho, verificamos que o ex-primeiro ministro já trabalhou cerca de 75,5 anos, que, se adicionarmos à idade com que provavelmente se iniciou no mundo do trabalho (suponhamos aí uns 23 anos), já perfaria hoje a bonita idade de 98,5 anos. Não está mal para quem se presta a ser candidato presidencial. E falam da idade de Mário Soares!
Mas passando por cima desta forma muito peculiar de determinar a idade das pessoas muito eu folgaria em saber a forma como Prof. CS conseguiu trabalhar no Banco de Portugal como Técnico (o que pressuporia um trabalho a tempo integral como funcionário do banco) e ao mesmo tempo como funcionário docente da universidade onde é suposto que praticasse o seu horário normal. Este dom de ubiquidade é de salientar e pode ser que até constitua um estímulo para a sua candidatura.»

Fernando Barros

domingo, 11 de setembro de 2005

As pombinhas do Katrina

11 de Setembro. Passaram quatro anos da noite, em Jacarta, em que emudeci de horror, indignação, fúria, desespero, diante de um televisor, vendo gente atirar-se das torres do WTC, que eu tratara por tu das minhas janelas em Nova Iorque, e assistindo em directo ao desmoronamento das torres. Rebentaram depois mais guerras insanas, mais prédios, comboios e autocarros cheios de cidadãos inocentes, espalharam-se ódios e, como não podia deixar de ser, proliferaram terroristas. Nasceram netos, também, para vincar mais a preocupação pelo mundo que lhes deixamos e a responsabilidade de tudo tentar para travar a loucura de quem desgoverna, governando, de quem empurra para o abismo, supostamente liderando.
Hoje, 11 de Setembro de 2005, é «Ground Zero» em New Orleans, na Louisiana afogada em água podre, viscosa, envenenada. Para além da destruição e do sofrimento, tal como o 11 de Setembro de 2001, também o furacão Katrina não pode deixar de ter consequências profundas para a América e para o Mundo.
Emmanuel Todd em 2000 já antecipava no «Après l'Empire» o «imperial overstreching» dos EUA. Mas o Katrina é que veio realmente mostrar a verdadeira face da América governada pelos «falcões» neo-conservadores e mudar o modo como o resto do mundo olha para a única, mas subitamente vulnerável hiperpotência, com uma Administração alheada dos interesses dos seus cidadãos e flagrantemente incompetente.
Reagan tornou-se Presidente alegando que o Estado, o governo, não eram a solução mas o problema. Bush pai, embora reluctante, e Bil Clinton, embora Democrata, não conseguiram resistir à vaga. Que com George W. Bush cresceu, cresceu e... rebentou com a força arrasadora dum tsunami, insuflado pelo sopro furioso do Katrina. Desde 2001, só as despesas militares não sofreram cortes no orçamento desta América, com um Presidente que passou a vida a salivar pela guerra, a invocar Deus e a desdenhar do Estado. Mas o Katrina, o mais previsto e anunciado dos desastres naturais na história americana, expôs os limites e consequências catastróficas do «conservadorismo com compaixão» dos defensores do «small government»: depois de décadas a desmantelar o Estado, não admira que ele não funcionasse quando mais era preciso.
O incompetente Bush desviou agulhas do Afeganistão sem acabar o trabalho e apanhar Osama Bin Laden nem Al-Zawahari, que atacaram no 11 de Setembro. Mas quer que os americanos vivam na fantasia de que tudo está no bom caminho no Iraque e no Afeganistão, de que espalhar democracia é encenar eleições-farsa (como no Egipto, onde o povo nem se maçou a ir votar), ou legitimar eleições falseadas (como na Etiópia, apesar do povo ter votado massivamente pela democracia, contra a ditadura). Uma fantasia criminosa onde cortes nos impostos são receita de governação, Estado de direito e direito internacional são para mandar às urtigas, direitos humanos um luxo só para ricos, o aquecimento global uma abstracção, a pobreza e a miséria uma fatalidade.
Mas o Katrina e a resposta calamitosa do Governo de George W. Bush mudaram tudo.
Na América, onde as raízes da liberdade e da democracia vão mais fundo do que a propaganda da oligarquia no poder, o Congresso começa a agitar-se para avaliar os colossais falhanços desta Administração. Sinal de que o povo, indubitavelmente, vai exigir mais e melhor Governo, mais e melhor Estado, das Administrações seguintes.
E no Mundo, a América que tudo sabe melhor, a América que prega moral e dita soluções (à bomba se for preciso), a América que põe e dispõe sem cuidar dos sentimentos e interesses dos outros, tem os dias contados. Porque o Katrina está a mudar a forma como a própria América se olha a si mesma e a ideologia politica de dominação mundial dos falcões no poder. O Katrina pôs a nu, para americanos e todo o mundo (terroristas incluidos), que os EUA, sob a Administração incompetente de Bush, aumentaram a vulnerabilidade ao terrorismo: se não estão preparados para evitar um desastre anunciado e socorrer as populações afectadas, como lidarão com mais ataques traiçoeiros como o 11/9 ? O Katrina também pôs a nu, à vista dos americanos e de todo o mundo, diferenças abismais de riqueza, de classe, de cor de pele, de protecção, de acesso que envergonham a América e a sua magnífica história de luta pelos direitos e liberdades cívicas e pela igualdade dos cidadãos. O sentimento de superioridade que os EUA exibiam na política externa, e que tantos pelo mundo fora acatavam servil e acríticamente, ficou esfrangalhado pelo Katrina.
Como escrevia há dias Tom Friedman no NYT «o Katrina destruiu New Orleans, mas terá ajudado a restaurar a América». Ao pedir «ajuda, amor e compaixão» para as vítimas do Katrina, Bush profetizou «out of the darkness will come some light». Já vejo: as pombinhas do Katrina estão a afogar os falcões. Talvez o mundo dos netos ainda possa salvar-se.

sábado, 10 de setembro de 2005

Novas Fronteiras almariam SIC (ou sick?)

Telejornal das 8 da noite de hoje. Por acaso a TV está sintonizada na SIC. Reportagem sobre as «Novas Fronteiras», sessão do PS aberta a independentes e público em geral, para fazer o balanço dos primeiros seis meses de governação.
Estive lá, do princípio ao fim. E por isso constato que a SIC parece estar sick, doente, enjoada, transtornada, almeriada.... É que a reportagem do telejornal resumiu as «Novas Fronteiras» ao balanço autista de José Sócrates, fazendo auto-avaliação e dando-se nota máxima. E passou rapidamente ao final da sessão - umas imagens da intervenção do Dr. Mário Soares e... já está.
Qualquer que seja a avaliação que a SIC faça da intervenção de José Sócrates (e tem todo o direito de a fazer negativa - tanto como eu, de a fazer positiva), é demasiado mau profissionalismo ignorar por completo, nem sequer referir, que houve outras intervenções que complementaram criticamente o balanço feito pelo Primeiro-Ministro. Em especial a intervenção de Vital Moreira, que não apenas elencou decisões e medidas prometidas e já tomadas pelo Governo (incluindo nomeações descredibilizantes), como as que o Governo se comprometeu a tomar e resistências emperram(o referendo sobre a descriminalização do aborto, por exemplo) e ainda outras que deveria urgentemente ter a coragem de adoptar para ser consequente com as reformas que está a lançar - como as referentes à descentralização e regionalização, revisão da lei eleitoral para criação de círculos uninominais, controlo democrático das autarquias, escrutínio parlamentar e transparência das posições governamentais quanto às decisões tomadas em Bruxelas, etc..
Críticas, sugestões, propostas, exigências de um independente, que muitos outros independentes subcrevem (e muitos militantes do PS também, como eu) e que o Primeiro-Ministro ouviu ali nas «Novas Fronteiras», à frente de toda a gente e das câmaras da TV (e é inegável o mérito de se ter disposto a ouvi-las assim).
E não é isto notícia? E não são as críticas e recomendações produzidas o mais relevante para quem deva informar a opinião pública?
Só que a SIC não reparou. Passou uma esponja. Obnubilou. Porque não convinha à tese autista ?
Mas de que almeriamentos anda padecendo o jornalismo SIC?

Repor benefícios fiscais

«Governo vai reintroduzir incentivos fiscais» à poupança. Os benefícios fiscais à poupança no IRS têm três efeitos negativos: tornam o sistema fiscal mais complexo e mais difícil de fiscalizar, têm elevados custos fiscais (redução da receita) e favorecem os titulares de mais altos rendimentos, que são quem mais deles aproveita, diminuindo a progressividade real do imposto. Será que as vantagens em matéria de incentivo à poupança superam os aspectos negativos? Esperemos pelo estudo referido pelo Ministro para ter uma resposta a essa pergunta.

Boa notícia

«'Ciberdúvidas' regressa com apoio dos CTT e da Vodafone».

Correio dos leitores: Anonimato

«É muito fácil dizer mal do anonimato quando (...) se tem uma profissão segura e não sujeita a pressões políticas. Mas muita gente não está nessas circunstâncias. Há muitas profissões em que os patrões não toleram - em certos casos porque não podem mesmo tolerar - que os funcionários exprimam certas opiniões, ou digam certas coisas que sabem. Ou então podem nem ser os patrões, podem ser as pessoas com quem se tem contactos profissionais, etc.
É claro que quem é anónimo pode ter a tentação de abusar desse anonimato. (Tal como quem não é anónimo pode ter a tentação de exibir arrogância moral para quem o é.) Mas, se não houvesse anonimato, muitos blogues não poderiam, pura e simplesmente, existir. E muitas verdades (e mentiras, claro) ficariam por dizer.
Dito isto, é claro que eu detesto o anonimato.»

Luís Lavoura

Correio dos leitores: Gestores públicos

«Estou 200% de acordo com a necessidade de publicitação das remunerações dos gestores públicos. Também me parece inaceitável que haja remunerações fixadas pelos beneficiários (mas haverá?; e se houver, não seria caso para reclamar devoluções?).
É para mim evidente que se não justifica a multiplicação ou mesmo a continuação de muitos "fringe benefits", a começar pelos automóveis.
Mas tudo isso não me leva a deixar de ver como lamentável a forma como os gestores foram nesta campanha apresentados como sanguessugas sociais a uma sociedade que tem mais inveja do que seria desejável. A verdade é que os ordenados de um administrador de uma empresa pública está porventura abaixo dos vencimentos de muitos jornalistas ou de um modesto engenheiro técnico responsável por qualquer frente de obra de um empreiteiro de média dimensão.
Grave me parece que o Estado tenha um limitado campo de recrutamento para poder seleccionar os responsáveis por muitas entidades públicas. Se a qualidade é cara, a ignorância e a incompetência são mais. Por isso, eu gostaria de ver o Estado a instituir o recrutamento dos responsáveis das empresas públicas por forma profissional (publicitação atempada da vaga, dos requisitos técnicos e das condições de retribuição, apreciação técnica de candidaturas e definição de "short lists", selecção final do gestor pelo Estado-accionista, que obviamente responderá politicamente pelo acerto da opção que fizer ). A ser assim, as nomeações da D. Celeste ou do Sr. Vara ou mesmo do Eng. Mira Amaral dificilmente seriam possíveis!»

AMF, Lisboa

sexta-feira, 9 de setembro de 2005

Anonimato

«Os blogues políticos anónimos enojam-me e os blogues políticos anónimos onde colaboram jornalistas enojam-me muito mais -- envergonham-me, enquanto blogger mas sobretudo enquanto jornalista. Nomes? Não digo -- a bufaria é um "privilégio" dos tais anónimos. Mas de uma coisa tenho a certeza: alguém enfiará a carapuça. Enfia sempre.» (J. P. Henriques, Glória Fácil)

Chuva

Sempre gostei das primeiras chuvas no final do Verão, a anunciar o Outono que aí vem, a lavar o ar e as árvores do pó estival e a levantar do chão aquele inconfundível cheiro a terra molhada. Depois da prolongada, e dura, seca deste ano, esta chuva que agora cai é bem-vinda como uma bênção.
(Crédito da imagem: 7art-screensavers.com)

Aditamento
Foram finalmente atendidas as súplicas "ad petendam pluviam" (pluviam nobis tribue congruentem, como reza o velho Latim) impetradas por esse país fora na primavera passada. Aliás, resultam sempre: é uma questão de tempo. É certo que a chuva surge irremediavelmene atrasada, tendo-se entretanto perdido colheitas e gados, enquanto os fogos florestais aproveitaram a seca para se exibirem em todo o seu esplendor. Mas quem somos nós, pecadores e incréus, para podermos reclamar dos insondáveis desígnios divinos?

Também estes!?

«The shaming of America», ou The Economist convertida ao "anti-americanismo primário", é evidente!
«Since Hurricane Katrina, the world's view of America has changed. The disaster has exposed some shocking truths about the place: the bitterness of its sharp racial divide, the abandonment of the dispossessed, the weakness of critical infrastructure. But the most astonishing and most shaming revelation has been of its government's failure to bring succour to its people at their time of greatest need.»

Júbilo prematuro

Como era de esperar, Cavaco Silva está à frente, à partida. Os seus adeptos rejubilam. Prematuramente o fazem, porém. Deveriam esperar para ver se ele se mantém na frente à chegada...

O que é que os eleitores votam?

Costuma dizer-se que nas democracias parlamentares contemporâneas as eleições deixarem de consistir na escolha dos deputados ou dos partidos, para passarem a constituir a eleição do primeiro-ministro. Mas essa ideia não é confirmada no caso nas próximas eleições alemãs. As previsões eleitorais apontam para que a CDU vai ganhar as eleições com grande avanço sobre o SPD (neste momento a vantagem é estimada em 8-10%), mas as mesmas sondagens de opinião indicam que nas preferências para o cargo de chefe do governo (chanceler) o líder do SPD leva a melhor sobre a candidata da direita.
O que as eleições alemãs parecem revelar é que elas vão ser essencialmente um referendo de rejeição do governo SPD/Verdes, o que confirma outra das linhas de leitura das eleições parlamentares na actualidade.

Entre os piores

Mais preocupante do que a queda de um lugar no ranking do desenvolvimento humano da ONU -- ainda assim uma posição que não envergonha -- é o aprofundamento do fosso entre ricos e pobres em Portugal, ao pior nível na Europa.
E lembrar que há entre nós quem, ecoando as políticas de Bush nos Estados Unidos, condene as prestações sociais públicas (que minoram a pobreza) e advogue uma substancial diminuição do IRS para os mais ricos...

quinta-feira, 8 de setembro de 2005

Moralização e transparência

Depois do escândalo das turbopensões e megapensões de alguns gestores de empresas públicas e das notícias sobre as suas elevadas remunerações e regalias acessórias, o Governo não podia tardar em estabelecer novas regras nessa área. As medidas hoje tomadas -- obrigatoriedade de publicação pelas empresas de todas remunerações e regalias existentes e forte limitação das pensões e outras regalias -- vão no bom sentido da transparência e da morigeração.
Nisto o principal não é a poupança de gastos que assim se obtém, mas antes uma questão de moralidade e responsabilidade no sector empresarial do Estado. O mínimo que se deve exigir é que idênticas regras, a começar pela transparência, sejam aplicáveis igualmente ao sector empresarial das regiões autónomas e dos municípios.

Stand-up Tragedy



7, 8, 9 e 10 de Setembro | 21h30 | No NEGÓCIO
Novo Spot ZDB para artes performativas, R. de O Século, nº 9, porta 5
Bairro Alto - Lisboa

Entrada: 6 Euros.
Venda de bilhetes pelo tel. 21 343 02 05 ou e-mail: tania@zedosbois.org
Reservas até às 18h.
Os bilhetes podem ser levantados entre as 20h45 e as 21h25, no NEGÓCIO.

Stand-up Tragedy é um ensaio sobre o riso e o público, explorando a
exposição do actor e a manipulação da plateia, enquanto se constrói e desmonta uma personagem durante uma hora e meia de monólogo.
Este espectáculo estreou no Teatro Maria Matos, em Lisboa, em Novembro de 2003 e fez digressão por Coimbra, Tomar, Angra do Heroísmo, Ponta Delgada, Torres Vedras, Gouveia e Amadora. Ao longo da sua carreira por mais de 4500 espectadores.
Dois anos depois, Luís Filipe Borges e Nuno Costa Santos, autores do texto original, colaboraram com Tiago Rodrigues numa recriação desta obra onde os motivos e efeitos do humor são dissecados, produzindo um diálogo de provocação e cumplicidade permanentes entre actor e público.
Stand-up Tragedy foi a primeira criação do Mundo Perfeito, estrutura
responsável por espectáculos como "Vagabundos de nós", de Daniel Sampaio, "Urgências", em colaboração com as Produções Fictícias e "Berenice", em
co-produção com a companhia belga STAN.

Ficha técnica e artística:
Concepção cénica e interpretação de Tiago Rodrigues.
Texto de Luís Filipe Borges, Nuno Costa Santos e Tiago Rodrigues.
Desenho de luz e cenografia - Tiago Costa Gonçalves.
Música - Pedro Almeida.
Voz Off - Alfredo Brito.
Apoio técnico - João José Gomes e Rui Capitão.
Grafismo - Digiscript.
Produção executiva e fotografia - Magda Bizarro.
Uma criação Mundo Perfeito.

O candidato que falta

Diz o Diário de Notícias de hoje:«A estratégia presidencial do CDS [apoiar Cavaco Silva à partida] está a merecer reservas entre muitas das suas principais figuras. Face ao quadro de candidatos já definido, a ideia de que o partido deve apresentar um candidato próprio a Belém está a ganhar adeptos.»
Como já disse aqui (e aqui), a ideia de uma candidatura autónoma na "direita da direita" parece ser de uma lógica elementar (mesmo sob o ponto de vista dos interesses do próprio Cavaco Silva). Resta saber se existe alguém disponível para a "ir ao sacrifício"...

"Associação de comerciantes"

A Ordem dos Médicos Dentistas, sancionada pela Autoridade da Concorrência pelo facto de ter fixado preços mínimos pelos serviços dos seus membros, veio contestar a competência da referida autoridade, dizendo que ela não é uma "associação de comerciantes".
Sucede que, quando se dedicam, ilegalmente, a actividades de regulação económica, as ordens equiparam-se a si mesmas a associações de agentes económicos. Se, em vez de restringirem a concorrência na prestação dos serviços profissionais sob sua jurisdição, para as quais são incompetentes (desde logo por que a lei não lhes atribui tais poderes), as ordens desempenhassem bem as tarefas de que estão realmente incumbidas, nomeadamente a fiscalização e punição das infracções das "leges artis" e da deontologia profissional, seguramente que não seriam importunadas pela Autoridade da Concorrência, que se limita a desincumbir-se da sua missão de velar pelo respeito das regras da concorrência leglamente estabelecidas.

Dedicação ao serviço público

O Presidente da República alertou para que as reformas em curso na função pública devem ter em conta a «dedicação ao serviço público». Ora a principal reforma da função pública consiste justamente em criar mecanismos que permitam diferenciar apropriadamente entre quem se move por essa dedicação no exercício de funções públicas e quem se está "marimbando" para elas. Infelizmente, a dedicação ao serviço público não se desenvolve universalmente por geração espontânea...

A rentrée socialista

Quem quiser consultar o meu artigo desta semana no Público -- um balanço de meio ano do Governo de Sócrates e uma análise das perspectivas para o novo ano político -- pode encontrá-lo também, como habitualmente, na Aba da Causa (com correcção de algumas gralhas do original).
Termina assim:
«Ai dos governos que, em circunstâncias adversas e com um programa de reformas exigente e susceptível de criar descontentamentos sectoriais, governarem em função das sondagens eleitorais de cada momento ou das perdas de popularidade transitórias. Dificilmente chegarão ao fim da viagem, e sem a missão cumprida.»

quarta-feira, 7 de setembro de 2005

Correio dos leitores: Colégio Militar

«Mas qual é o mal de o Estado ser proprietário de uma escola que se rege pelos princípios da escola privada? O Colégio Militar é um colégio como qualquer outro - sujeito a propinas - a única diferença é que, em vez de ser propriedade de um particular, de uma cooperativa, de uma IPSS, ou de uma igreja, é propriedade do Estado. Tal como o Estado fornece, nas suas Universidades, mestrados que se regem pelos princípios do utilizador-pagador - ou seja, que não são gratuitos - também pode perfeitamente fornecer Colégios que se regem pelos mesmos princípios. (...)»
Luís Lavoura

Comentário
O "mal" está na violação dos princípios constitucionais da gratuitidade, igualdade e universalidade do sistema público de ensino básico. O pretenso paralelismo com as actividades "de valor acrescentado" das universidades públicas não é procedente, visto que o ensino universitário nem é universal nem gratuito, havendo um mercado de pós-graduações com operadores públicos e privados sujeito às regras do mercado.
O Colégio Militar podia compreeender-se no século XIX, quando não havia sistema de ensino público universal e quando ele funcionava como instrumento de formação da "classe militar". Não tem nenhum sentido hoje, salvo como sobrevivência de um privilégio de casta do passado.

Correio dos leitores: Militares

«Esquece que ser militar, para os militares de carreira desde sempre, e agora - com o fim do Serviço Militar Obrigatório - para todos os militares, é uma PROFISSÃO. As pessoas decidem, ou não, ser militares largamente em função dos benefícios salariais e extra-salariais que daí esperam obter. Os militares de carreira esperam, como quaisquer trabalhadores, uma remuneração adequada. Têm as suas expectativas, tal como quaisquer trabalhadores, tal como Você e eu. E, tal como Você e eu temos o direito de protestar se nos cortarem subitamente regalias, também os militares devem ter esse direito. (...)»
Luís Lavoura

Comentário
Em nenhum país os militares gozam de direitos sindicais dos trabalhadores comuns. No nosso caso está legalmente vedada (aliás de acordo com a Constituição), entre outras restrições, a manifestação de militares fardados. Quem é militar sabe desde o início dessas limitações. Isso faz parte da "condição militar". Quem violar esta limitação incorre em responsabilidade disciplinar, devendo ser punido por isso.

Cinismo

É pelo menos chocante o cinismo com que a maior parte dos adoradores da America de Bush tentou ignorar a "outra América" -- a da pobreza, da desorganização, do atraso indesculpável nas operações de socorro, do falhanço rotundo da protecção civil, etc. -- que a tragédia de Nova Orleães escancarou perante o mundo. Afinal, atrás da imagem do paraíso pode existir o inferno. Mas como o paraíso da nação "abençoada por Deus" não pode ter mácula, pior para a realidade...

O triunfo da União Europeia

Segundo o inquérito de opinião Transatlantictrends, realizado anualmente em vários países europeus e nos Estados Unidos, uma considerável maioria de europeus -- com a excepção esperada da opinião britânica (e da norte-americana, bem entendido...) -- deseja a representação da UE como membro permanente do Conselho de Segurança das Nações Unidas, em substituição dos actuais Estados europeus nele representados (Reino Unido e França). Essa opinião é partilhada mesma na França, um dos membros permanentes originários do CS, e na Alemanha, que integra os candidatos a sê-lo nas propostas de reforma da ONU.
Trata-se de um fenómeno de notável significado quanto à identificação dos europeus com a UE como realidade política autónoma, sobrepondo-se à sua pertença nacional. O falhanço da constituição europeia é porventura mais transitório e conjuntural do que os adversários da integração europeia concluíram...

"O furacão da pobreza"

Impressionantes os dados fornecidos, a propósito da tragédia de Nova Orleães, neste artigo de Nicholas D. Kristof no New York Times, sobre a pobreza e as carências sanitárias nos Estados Unidos.

«Hurricane Katrina also underscores a much larger problem: the growing number of Americans trapped in a never-ending cyclone of poverty. (...)
The U.S. Census Bureau reported a few days ago that the poverty rate rose again last year, with 1.1 million more Americans living in poverty in 2004 than a year earlier. After declining sharply under Bill Clinton, the number of poor people has now risen 17 percent under Mr. Bush.
If it's shameful that we have bloated corpses on New Orleans streets, it's even more disgraceful that the infant mortality rate in America's capital is twice as high as in China's capital. That's right - the number of babies who died before their first birthdays amounted to 11.5 per thousand live births in 2002 in Washington, compared with 4.6 in Beijing.
Indeed, according to the United Nations Development Program, an African-American baby in Washington has less chance of surviving its first year than a baby born in urban parts of the state of Kerala in India.
Under Mr. Bush, the national infant mortality rate has risen for the first time since 1958. The U.S. ranks 43rd in the world in infant mortality, according to the C.I.A.'s World Factbook; if we could reach the level of Singapore, ranked No. 1, we would save 18,900 children's lives each year.
Nationally, 29 percent of children had no health insurance at some point in the last 12 months, and many get neither checkups nor vaccinations. On immunizations, the U.S. ranks 84th for measles and 89th for polio.
(...) That's the larger hurricane of poverty that shames our land
Na verdade, uma vergonha mais própria de países do 3º mundo...

Em causa própria

O presidente Bush instituiu uma comissão de inquérito, presidida por si mesmo, para analisar as falhas, a nível federal, estadual e local, na resposta às destruições do furacão Katrina. Como ele próprio é apontado por muita gente como o primeiro responsável pelas falhas a nível federal, parece óbvio que há um juízo em causa própria...
Brilhante, como exercício de desresponsabilização!

Como a história mostra...

... um Governo que tolere a rebelião entre os militares deixará de ter condições para exercer a autoridade civil. Espera-se que a mensagem que as chefias militares ontem colheram em Belém tenha sido a de que têm a obrigação de garantir a cadeia de comando nas forças armadas no cumprimento das decisões do poder civil respeitantes ao estatuto dos militares.
Fora das suas missões, o lugar das fardas é nos quartéis.

Correio dos leitores: Colégio Militar

«No seu blogue "Causa Nossa" afirma (11-08-2005):
«A propósito de escolas militares, o que é que justifica hoje a existência de escolas de ensino básico e secundário, como o Colégio Militar, se não um deslocado espírito de casta (aliás reservado a rapazes)?»
Em resposta aos protestos de alguns leitores publica um segundo post:
«Não vejo onde é que se enquadra, constitucional e legalmente, a possibilidade do Estado manter Colégios "privados"».
Desconhecerá o Prof. Vital Moreira a história e a excelência do ensino do Colégio Militar? Não creio! Insurge-se contra aquilo que chama "espírito de casta". Mas que casta? A casta dos que promovem essa excelência: a instituição militar, os professores, os funcionários, os antigos alunos e os pais que pagam um ensino com um elevado padrão de qualidade, procurando incutir nos jovens valores e levando à prática a máxima grega, "mente sã em corpo são".
O Prof. Vital Moreira questiona a constitucionalidade e a própria legalidade de "o Estado manter Colégios "privados"". Ora, o Colégio Militar não é uma escola "privada". É um colégio público. As elevadas propinas são suportadas pelos pais. O Prof. Vital Moreira defende a ideia da gratuitidade absoluta do ensino, com propinas praticamente inexistentes. Nesse caso o que poderia propor era a igualização das propinas do Colégio Militar ao valor das propinas das demais escolas públicas!
(...) Escola Pública, tutelada pelo Ministério da Defesa e com tutela pedagógica do Ministério da Educação, é frequentada por rapazes a partir dos 10 anos. Com regras mais exigentes de que as demais escolas públicas no que tange ao aproveitamento escolar, é um exemplo de excelência no ensino. (...) Neste enquadramento, o que explica a existência de algumas vozes questionando a existência do Colégio Militar? Desejo de nivelar o ensino por baixo? (...)».


Comentário
O que eu disse, e mantenho, é que não cabe ao Estado manter escolas pagas (como se fossem escolas privadas), à margem do sistema nacional de ensino. Por uma simples questão de universalidade e igualdade. Seria o mesmo que o Estado manter clínicas de luxo, pagas, ao lado dos hospitais do SNS. Quem quiser escolas de elite, exclusivas, crie-as e pague-as -- é para isso que existe a liberdade de escolas privadas --, em vez de colocar o Estado ao serviço de privilégios de grupo.
O que eu defendo é a separação entre a lógica da escola pública e a lógica da escola privada. O Estado não deve invadir a esfera própria dos privados.
É a Constituição que estabelece a gratuitidade para o ensino básico obrigatório público e é a lei que o estabelece para o ensino secundário. E bem, por que se trata de níveis de ensino que são, ou deveriam ser, de frequência universal, incluindo para quem não tem dinheiro para frequentar o Colégio Militar...

terça-feira, 6 de setembro de 2005

Nem tudo é belo visto do céu

Eis uma fotografia de satélite de Coimbra depois do recente grande incêndio florestal que investiu a cidade e povoações limítrofes com uma devastadora frente de chamas, sobretudo do lado nascente e do sul, penetrando na zona urbana em diversos locais (incluindo o "pinhal de Marrocos", adjacente ao pólo II da Universidade, perto da curva do rio). Impressionante imagem, na verdade (pode ampliar-se, clicando nela).