Blogue fundado em 22 de Novembro de 2003 por Ana Gomes, Jorge Wemans, Luís Filipe Borges, Luís Nazaré, Luís Osório, Maria Manuel Leitão Marques, Vicente Jorge Silva e Vital Moreira
quarta-feira, 21 de setembro de 2005
Mas o propósito escondido não era mesmo esse?
Publicado por
Vital Moreira
«Os reitores acusam o Governo de estar a beneficiar o ensino superior privado. Em causa está o congelamento de vagas nas universidades do litoral [decidido pelo ex-ministro Pedro Lynce], com o objectivo político de desviar alunos para as instituições do interior. A prática está a demonstrar que, em vez de se deslocarem, os candidatos preferem ficar nas grandes cidades, optando pelas instituições privadas. As universidades mais frequentadas, impedidas de receber mais alunos, são ainda prejudicadas na divisão do bolo orçamental, devido ao critério de coesão entre instituições. Quem tem mais alunos acaba, no fim, por perder dinheiro.» (Diário de Notícias)
terça-feira, 20 de setembro de 2005
"Os negócios da Católica"
Publicado por
Vital Moreira
A escabrosa história vem contada aqui, no Diário das Beiras. Parecendo de veracidade inatacável, baseada em documentos, o que ela revela são as formas ínvias de financiamento da Universidade Católica à custa do património público, mediante "cambalachos" comprometedores com o poder local e com o Governo.
Perante os factos, há duas perguntas que carecem de resposta: (i) por que é que o Governo prescindiu da cláusula de reversão dos terrenos em causa, permitindo a realização de um pingue enriquecimento sem justa causa da UC? (ii) por que é que o município da Figueira da Foz resolveu viabilizar um hotel num terreno que era público e que foi alienado a preço de favor para a construção de instalações universitárias?
Que país, este!
Perante os factos, há duas perguntas que carecem de resposta: (i) por que é que o Governo prescindiu da cláusula de reversão dos terrenos em causa, permitindo a realização de um pingue enriquecimento sem justa causa da UC? (ii) por que é que o município da Figueira da Foz resolveu viabilizar um hotel num terreno que era público e que foi alienado a preço de favor para a construção de instalações universitárias?
Que país, este!
Correio dos leitores: Municipalização de centros de saúde
Publicado por
Vital Moreira
«Sob o título "Fatal", no dia 16 de Setembro, foi publicado por V. Exa. um comentário, com base em notícia do Jornal Público, sobre a oposição de uma associação nacional de médicos à ideia de confiar a gestão de centros de saúde aos municípios. Dada a não identificação da associação visada e, principalmente, dada a possibilidade de generalização da ideia de oposição, tomo a liberdade de esclarecer que o Sindicato Independente dos Médicos nunca se opôs à entrada dos municípios na gestão participada da saúde.
(...) Esta não oposição, mesmo o incentivo à gestão descentralizada, foi comunicada oficialmente a Sua Excelência o Ministro da Saúde em reunião de 20 de Julho de 2005. Não é certamente pelo SIM que a "descentralização territorial" não se concretiza.»
Carlos Arroz (Secretário-Geral do SIM)
Esclarecimento
De facto, foi a Federação Nacional dos Médicos (Fnam), que segundo o Públivo de 15 de Setembro passado declarou que a participação das autarquias na prestação de cuidados primários de saúde seria uma "medida perigosa", dado que esta "não é a sua vocação" e que não existe "qualquer tradição e experiência das autarquias nesta área" em Portugal.
(...) Esta não oposição, mesmo o incentivo à gestão descentralizada, foi comunicada oficialmente a Sua Excelência o Ministro da Saúde em reunião de 20 de Julho de 2005. Não é certamente pelo SIM que a "descentralização territorial" não se concretiza.»
Carlos Arroz (Secretário-Geral do SIM)
Esclarecimento
De facto, foi a Federação Nacional dos Médicos (Fnam), que segundo o Públivo de 15 de Setembro passado declarou que a participação das autarquias na prestação de cuidados primários de saúde seria uma "medida perigosa", dado que esta "não é a sua vocação" e que não existe "qualquer tradição e experiência das autarquias nesta área" em Portugal.
O que eles não percebem
Publicado por
Vital Moreira
Procurando uma explicação para o insucesso eleitoral da direita alemã, o Financial Times Deutschland diz que «os alemães gostam do seu Estado Social e não querem abandonar um modelo de sociedade que vem desde os tempos de Bismarck».
O que até um órgão dos meios financeiros percebe não o percebem os neo(ultra)liberais. Depois admiram-se que o sufrágio popular rejeite as suas propostas radicais.
(revisto)
O que até um órgão dos meios financeiros percebe não o percebem os neo(ultra)liberais. Depois admiram-se que o sufrágio popular rejeite as suas propostas radicais.
(revisto)
Rejeição
Publicado por
Vital Moreira
«Economists have already interpreted the outcome of the poll [na Alemanha] as a clear rejection of Ms Merkel's reform programme». (Finantial Times)
Há situações em que os economistas fazem melhores deduções políticas do que os políticos...
Há situações em que os economistas fazem melhores deduções políticas do que os políticos...
Manifestações militares
Publicado por
Vital Moreira
Não caindo na tentação de proibir a manifestação convocada pelas mulheres dos militares -- logo arranjariam outro estratagema para tentar mais uma e outra vez...--, o Governo preferiu ir "directo ao assunto", ou seja, proibir a participação de militares na dita manifestção, invocando os pertinentes preceitos da Lei de Defesa Nacional e advertindo para as consequências disciplinares do eventual desrespeito desta proibição. No clima de inaceitável complacência em que tem decorrido a agitação militar, é de esperar que o Governo e as chefias militares tenham conseguido passar claramente a mensagem de que desta vez estão a falar mesmo a sério...
A democratização da Constituição
Publicado por
Vital Moreira
1. Notável a quantidade de pessoas sem formação jurídica que entenderam tomar posição sobre a árida, e controversa, questão constitucional de saber se, afinal, o recomeço do ano parlamentar no dia 15 de Setembro iniciou ou não uma nova sessão legislativa (condição para a validade do novo requerimento do PS a convocar o referendo da despenalização do aborto).
Embora muitas vezes sem uma adequada separação entre os argumentos políticos e a leitura constitucional, é bem-vinda esta "democratização" da Constituição e dos problemas constitucionais. Fomenta a formação constitucional e obriga os constitucionalistas profissionais a apurarem os seus argumentos e contra-argumentos.
2. No Quarta República (um blog sereno da área do PSD), David Justino coloca-me uma dúvida sobre o assunto. Se, como eu defendo, a AR pode ter cinco sessões legislativas no caso de eleições antecipadas, então como é que isso é compatível com o art. 171º-1 da CRP, que diz que "a legislatura tem a duração de quatro sessões legislativas"?
Já expliquei isso aqui, mas não quero fugir a voltar à questão. A razão é simples: o nº 2 do mesmo artigo estabelece uma excepção à regra do quadriénio, quando diz que, em caso de eleições antecipadas, a legislatura da AR então eleita é acrescida da parte da sessão legislativa que estava em curso à data da eleição. Portanto, nesse caso a legislatura comporta mais de 4 anos, pelo que às 4 sessões legislativas normais soma-se o período de tempo que restava da sessão legislativa interrompida pela antecipação de eleições.
É como dizer estas duas coisas: "1. O mês de Fevereiro tem 28 dias. 2. Nos anos bissextos, [porém,] o mês de Fevereiro tem 29 dias". Ou seja, uma regra e uma excepção. Na linguagem legislativa os "porém" e os "contudo" são quase sempre implíticos.
De resto, aquela regra do quadriénio tem uma outra óbvia excepção implícita: quando a AR é dissolvida, a sua legislatura também não comporta 4 sessões legislativas, agora por defeito, podendo ficar reduzida a 3, duas ou uma! Elementar, não é? Os preceitos das leis, mesmo os mais rotundos, não podem ser lidos isoladamente...
3. David Justino pergunta também por que é que no passado, em situações semelhantes, a própria AR considerou que a parte sobrante da sessão legislativa à data da eleição se integrava, sem descontinuidade, na primeira sessão legislativa ordinária da nova AR? A minha resposta também é simples: por inadvertência ou ignorância. Mas nem uma nem outra são modos legítimos de revisão da Constituição.
Aliás, não é esse o único caso, longe disso, em que subsistem durante muito tempo rotinas contrárias à Constituição, sem que os protagonistas se dêem conta disso. Por exemplo, durante muitos anos, a promulgação presidencial dos decretos-leis não era referendada pelo primeiro-ministro, por se entender, erradamente, que bastava a assinatura deste que já constava no diploma quando era enviado para Belém.
4. Invocando uma suposta "golpaça" de Jaime Gama -- que, a meu ver (e de vários outros constitucionalistas, como bem se sabe...), se limitou a cumprir a Constituição e não podia deixar de aceitar o requerimento --, David Justino termina com um rotundo "referendo assim, não!". Sucede que essa matéria vai ser necessariamente apreciada pelo Tribunal Constitucional, quando for chamado a verificar a licitude do referendo. Se o TC concluir que não houve nenhuma ilicitude na convocação do referendo, manterá DJ a sua radical, e temperamental, oposição ao mesmo?
Embora muitas vezes sem uma adequada separação entre os argumentos políticos e a leitura constitucional, é bem-vinda esta "democratização" da Constituição e dos problemas constitucionais. Fomenta a formação constitucional e obriga os constitucionalistas profissionais a apurarem os seus argumentos e contra-argumentos.
2. No Quarta República (um blog sereno da área do PSD), David Justino coloca-me uma dúvida sobre o assunto. Se, como eu defendo, a AR pode ter cinco sessões legislativas no caso de eleições antecipadas, então como é que isso é compatível com o art. 171º-1 da CRP, que diz que "a legislatura tem a duração de quatro sessões legislativas"?
Já expliquei isso aqui, mas não quero fugir a voltar à questão. A razão é simples: o nº 2 do mesmo artigo estabelece uma excepção à regra do quadriénio, quando diz que, em caso de eleições antecipadas, a legislatura da AR então eleita é acrescida da parte da sessão legislativa que estava em curso à data da eleição. Portanto, nesse caso a legislatura comporta mais de 4 anos, pelo que às 4 sessões legislativas normais soma-se o período de tempo que restava da sessão legislativa interrompida pela antecipação de eleições.
É como dizer estas duas coisas: "1. O mês de Fevereiro tem 28 dias. 2. Nos anos bissextos, [porém,] o mês de Fevereiro tem 29 dias". Ou seja, uma regra e uma excepção. Na linguagem legislativa os "porém" e os "contudo" são quase sempre implíticos.
De resto, aquela regra do quadriénio tem uma outra óbvia excepção implícita: quando a AR é dissolvida, a sua legislatura também não comporta 4 sessões legislativas, agora por defeito, podendo ficar reduzida a 3, duas ou uma! Elementar, não é? Os preceitos das leis, mesmo os mais rotundos, não podem ser lidos isoladamente...
3. David Justino pergunta também por que é que no passado, em situações semelhantes, a própria AR considerou que a parte sobrante da sessão legislativa à data da eleição se integrava, sem descontinuidade, na primeira sessão legislativa ordinária da nova AR? A minha resposta também é simples: por inadvertência ou ignorância. Mas nem uma nem outra são modos legítimos de revisão da Constituição.
Aliás, não é esse o único caso, longe disso, em que subsistem durante muito tempo rotinas contrárias à Constituição, sem que os protagonistas se dêem conta disso. Por exemplo, durante muitos anos, a promulgação presidencial dos decretos-leis não era referendada pelo primeiro-ministro, por se entender, erradamente, que bastava a assinatura deste que já constava no diploma quando era enviado para Belém.
4. Invocando uma suposta "golpaça" de Jaime Gama -- que, a meu ver (e de vários outros constitucionalistas, como bem se sabe...), se limitou a cumprir a Constituição e não podia deixar de aceitar o requerimento --, David Justino termina com um rotundo "referendo assim, não!". Sucede que essa matéria vai ser necessariamente apreciada pelo Tribunal Constitucional, quando for chamado a verificar a licitude do referendo. Se o TC concluir que não houve nenhuma ilicitude na convocação do referendo, manterá DJ a sua radical, e temperamental, oposição ao mesmo?
segunda-feira, 19 de setembro de 2005
Correio dos leitores: Contra a municipalização dos centros de saúde
Publicado por
Vital Moreira
«A propósito do seu post "Fatal" de 16/9 pergunto-lhe se acha descabido que se desconfie da entrega da gestão dos Centros de Saúde (e até, como aqui ou ali se diz, das escolas do ensino básico e secundário) a autarcas como Ferreira Torres e muitos outros como ele, ou quase... Ver a gestão da nossa saúde nessas mãos faz-me arrepiar. De uma forma geral não vislumbro hoje nas autarquias capacidade bastante para, de uma forma honesta (com tudo o que esta palavra implica), gerirem sector tão essencial. Como é que, em tal caso, se faria a ligação necessária com os cuidados de saúde diferenciados ou hospitalares? Seria pacífica essa interligação? Julgo sinceramente que não. É só imaginar-se a conflitualidade, mesmo que artificial, que se criaria entre os dois sectores de saúde se isso servisse mesquinhos interesses eleitoralistas.»
Fernando Barros
Comentário
O poder local não pode ser julgado pelo exemplo que dá, tal como a autonomia regional não pode ser aferida pelo governo da Madeira. Por essa ordem de ideias deveria acaber-se com o poder local e regional e reconcentrar tudo nas mãos do Governo e da administração central. A solução está, porém, em melhorar a governação do poder local, sobretudo quanto à "accountability" e transparência.
Não tenho poupado críticas ao poder local, mas não vejo razão para a demonização que hoje parece estar em moda. A descentralização territorial constitui a base da democracia. Não há razão nenhuma para continuarmos a ser o Estado mais centralizado da Europa ocidental.
Fernando Barros
Comentário
O poder local não pode ser julgado pelo exemplo que dá, tal como a autonomia regional não pode ser aferida pelo governo da Madeira. Por essa ordem de ideias deveria acaber-se com o poder local e regional e reconcentrar tudo nas mãos do Governo e da administração central. A solução está, porém, em melhorar a governação do poder local, sobretudo quanto à "accountability" e transparência.
Não tenho poupado críticas ao poder local, mas não vejo razão para a demonização que hoje parece estar em moda. A descentralização territorial constitui a base da democracia. Não há razão nenhuma para continuarmos a ser o Estado mais centralizado da Europa ocidental.
Lições alemãs (3)
Publicado por
Vital Moreira
Uma das conclusões destas eleições alemãs é que o sistema eleitoral germânico -- que combina o apuramento proporcional com a eleição de metade dos deputados em círculos uninominais -- não conduz à bipolarização do sistema partidário. Embora os resultados dos círculos uninominais favoreçam claramente os dois grandes partidos -- apenas 4 dos 299 círculos não foram ganhos por eles (todos em Berlim...) --, já o 2º voto, que determina a distribuição proporcional dos deputados, é muito menos concentrado. Aliás, nestas eleições a soma dos votos SPD+CDU/CSU é uma das mais baixas de sempre (se não a mais baixa), sendo em contrapartida maior a presença dos pequenos partidos no Bundestag. Se não fosse a cláusula-barreira dos 5%, o parlamento teria ainda maior número de partidos representados.
Estes dados são importantes para nós, visto que existe um projecto do PS (no essencial apoiado pelo PSD) de reformar o nosso sistema eleitoral no sentido do alemão. Ora a oposição dos demais partidos a essa reforma baseia-se essencialmente na objecção de que essa reforma fomentará uma bipolarização favorável ao PS e ao PSD. Os resultados destas eleições alemãs mostram que esse argumento precisa de ser reconsiderado.
Estes dados são importantes para nós, visto que existe um projecto do PS (no essencial apoiado pelo PSD) de reformar o nosso sistema eleitoral no sentido do alemão. Ora a oposição dos demais partidos a essa reforma baseia-se essencialmente na objecção de que essa reforma fomentará uma bipolarização favorável ao PS e ao PSD. Os resultados destas eleições alemãs mostram que esse argumento precisa de ser reconsiderado.
Lições alemãs (2)
Publicado por
Vital Moreira
Compreende-se a satisfação pós-eleitoral do líder do SPD. Contra todas as previsões, a coligação SPD-Verdes não perdeu eleitorado para a direita (pelo contrário, talvez tenha até obtido ganhos marginais). O SPD perdeu somente para o partido da Esquerda (pós-comunistas mais dissidentes do SPD), mas as perdas são relativamente moderadas (pouco mais de 4%), o que permite considerar sufragadas à esquerda as reformas económicas e sociais desencadeadas por Schroeder. A mensagem do chanceler -- pela reforma do Estado social e da "economia social de mercado", como condição da sua defesa contra os projectos ultraliberais de direita -- encontrou nos alemães um inesperado apoio.
Os que se preparavam para rezar o requiem pelo modelo social europeu têm de adiar as suas exéquias. Mas os que defendem que é possível salvá-lo sem o reformar também levaram uma lição.
(revisto)
Os que se preparavam para rezar o requiem pelo modelo social europeu têm de adiar as suas exéquias. Mas os que defendem que é possível salvá-lo sem o reformar também levaram uma lição.
(revisto)
Lições alemãs
Publicado por
Vital Moreira
Provavelmente nunca uma vitória eleitoral teve tanto sabor a derrota; e nunca uma derrota deu tanto a sensação de vitória. A inicial vantagem de 20 pontos percentuais da CDU sobre o SPD esfumaram-se no dia das eleições. Segundo as últimas projecções, Angela Merkel consegue menos de 1 ponto de vantagem nos votos e somente uns 3 ou 4 deputados a mais do que Schroeder (as eleições em Dresden, adiadas para daqui a duas semanas, ainda podem alterar o balanço dos deputados).
Em vez da esperada vitória em toda a linha, a coligação de direita (CDU/CSU mais liberais) é claramente superada pela esquerda, perde terreno em relação a 2002 e fica longe da maioria absoluta, pelo que não conseguirá formar governo (a não ser que -- hipótese pouco provável -- consiga a tolerância de algum outro partido para um governo minoritário). Mesmo que venha a formar-se um governo de "grande coligação", compreeendendo os dois grandes partidos, não será certamente com as políticas da direita, nem com Merkel, rejeitada à partida pelo SPD. A "salvadora" da direita europeia termina a carreira antes de a começar.
Com o "desaire" de Merkel e da CDU saem também derrotadas as ideias-base da sua proposta política, designadamente a visão neoliberal na política social, o "partido" norte-americano na política externa (o insucesso de Merkel é também a derrota de Bush), a ideia de taxa única no imposto de rendimento, a substituição do eixo Paris-Berlim pelo eixo Londres-Berlim como espinha dorsal da UE, o veto da entrada da Turquia na UE.
Em vez da esperada vitória em toda a linha, a coligação de direita (CDU/CSU mais liberais) é claramente superada pela esquerda, perde terreno em relação a 2002 e fica longe da maioria absoluta, pelo que não conseguirá formar governo (a não ser que -- hipótese pouco provável -- consiga a tolerância de algum outro partido para um governo minoritário). Mesmo que venha a formar-se um governo de "grande coligação", compreeendendo os dois grandes partidos, não será certamente com as políticas da direita, nem com Merkel, rejeitada à partida pelo SPD. A "salvadora" da direita europeia termina a carreira antes de a começar.
Com o "desaire" de Merkel e da CDU saem também derrotadas as ideias-base da sua proposta política, designadamente a visão neoliberal na política social, o "partido" norte-americano na política externa (o insucesso de Merkel é também a derrota de Bush), a ideia de taxa única no imposto de rendimento, a substituição do eixo Paris-Berlim pelo eixo Londres-Berlim como espinha dorsal da UE, o veto da entrada da Turquia na UE.
domingo, 18 de setembro de 2005
A Europa e a «responsabilidade de proteger»
Publicado por
AG
Em artigo publicado pelo EXPRESSO em 6.8.05. sob o título "A EUROPA DA DEFESA" - e que se pode ler também na ABA da CAUSA - defendi a necessidade de investir na Europa da Defesa, considerando, entre outros aspectos,que «a intervenção militar é também uma ferramenta, de último recurso, que deve ser posta ao serviço do direito internacional e do multilateralismo. Ao serviço da «responsabilidade de proteger» que Kofi Annan vem promovendo como principio estruturante de uma ONU reformada, consequência dos direitos humanos e do objectivo da Paz. Principio que decorre do conceito de «segurança humana» e pode assim sobrepor-se à velha «soberania dos Estados».
O conceito da «responsabilidade de proteger» foi, aparentemente, o principal resultado da Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da ONU da passada semana, que tinha desígnios muito mais ambiciosos, incluindo a reforma estrutural da organização. Que ficou no tinteiro, como está a ficar na prática o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, que os ditos Chefes subscreveram solenemente há 5 anos.
Mas a aquisição do principio da «responsabilidade de proteger» como estruturante das relações internacionais e do Direito internacional é, de facto, muito importante - opera uma verdadeira viragem em relação à sacrossanta «soberania nacional», em muitos aspectos desfasada da realidade - da globalização à importância que ganhou a protecção dos direitos humanos. Embora tudo vá agora depender de como o novo princípio venha - ou não - a ser aplicado. E isso depende muito da Europa.
O conceito da «responsabilidade de proteger» foi, aparentemente, o principal resultado da Cimeira de Chefes de Estado e de Governo da ONU da passada semana, que tinha desígnios muito mais ambiciosos, incluindo a reforma estrutural da organização. Que ficou no tinteiro, como está a ficar na prática o cumprimento dos Objectivos de Desenvolvimento do Milénio, que os ditos Chefes subscreveram solenemente há 5 anos.
Mas a aquisição do principio da «responsabilidade de proteger» como estruturante das relações internacionais e do Direito internacional é, de facto, muito importante - opera uma verdadeira viragem em relação à sacrossanta «soberania nacional», em muitos aspectos desfasada da realidade - da globalização à importância que ganhou a protecção dos direitos humanos. Embora tudo vá agora depender de como o novo princípio venha - ou não - a ser aplicado. E isso depende muito da Europa.
ONU - desmascarar o bluff
Publicado por
AG
Está na ABA DA CAUSA o meu artigo sob o título acima, publicado na última edição do COURRIER INTERNACIONAL.
Dilema
Publicado por
Vital Moreira
O Governo tem um dilema com os protestos militares. Ou insiste em proibir manifestações, sem ter a garantia de que os tribunais continuem a validar essa proibição -- dadas as "habilidades" com que a lei pode ser contornada -- e ainda menos sem nenhuma esperança de isso parar a contestação, com novas tentativas de manifestação e com excitadas reuniões ampliadas pela televisão; ou então deixa realizar a manifestação mas advertindo solenemente que, se ela enveredar por caminhos ilícitos -- isto é, se se transformar em manifestação de militares com objectivos sindicais, como está nos propósitos dos seus promotores --, então serão accionados acto contínuo os mecanismos da responsabilidade disciplinar em relação aos responsáveis e participantes.
É tempo de parar a agitação militar, sob pena de ela se transformar em sedição. Depois de ter contemporizado com manifestações claramente ilegais, como o desfile e a vigília junto a S. Bento, com militares fardados, o Governo tem de atalhar definitivamente o desenvolvimento do processo. O RDM ainda está em vigor, não está?!
Adenda - E o Presidente da República, por que espera ele para promulgar os diplomas contestados e cortar cerce as esperanças de recuo nessa matéria?
É tempo de parar a agitação militar, sob pena de ela se transformar em sedição. Depois de ter contemporizado com manifestações claramente ilegais, como o desfile e a vigília junto a S. Bento, com militares fardados, o Governo tem de atalhar definitivamente o desenvolvimento do processo. O RDM ainda está em vigor, não está?!
Adenda - E o Presidente da República, por que espera ele para promulgar os diplomas contestados e cortar cerce as esperanças de recuo nessa matéria?
Quem são os próximos?
Publicado por
Vital Moreira
A direita "nacionalista" (eufemismo tradicional dos movimentos fascistas) manifestou-se desta vez contra o que designa como "lobby gay". Na manifestação anterior tinham-se ocupado dos imigrantes. Quem serão os próximos alvos da sanha nacionalista? Os "judeus"? Os "intelectuais degenerados"? Os "políticos corruptos"? Os "comunistas"? A "mentira democrática"?
Quem sabe um mínimo da história dos movimentos fascistas conhece-lhes os ódios. A democracia deve tolerar os seus inimigos; mas não pode fingir que eles não existem.
Quem sabe um mínimo da história dos movimentos fascistas conhece-lhes os ódios. A democracia deve tolerar os seus inimigos; mas não pode fingir que eles não existem.
"Serviço público de propaganda do PSD"
Publicado por
Vital Moreira
Um leitor fez-me chegar um texto onde denuncia que «o espaço autárquico da RDP/Antena 1 [Passeio Público] só conhece municípios "laranja"». Segundo declara, «nos últimos 3 meses, o espaço semanal que aquela rádio dedica aos municípios foi quase exclusivamente preenchido com autarquias onde o PSD é a força maioritária, com especial incidência nalgumas que os social-democratas poderiam correr o risco de perder.» Para fundamentar a sua acusação informa que «nos últimos 3 meses, em 14 emissões, 12 foram dedicadas a concelhos onde manda o PSD. Apenas 2 visitaram autarquias liderada pelo PS. As restantes forças políticas foram simplesmente ignoradas!!!»
De facto, se é assim, então parece evidente o enviesamento pró-PSD, sobretudo tendo em conta a proximidade das eleições. O mínimo que se exige é um esclarecimento da direcção da RDP sobre o assunto.
De facto, se é assim, então parece evidente o enviesamento pró-PSD, sobretudo tendo em conta a proximidade das eleições. O mínimo que se exige é um esclarecimento da direcção da RDP sobre o assunto.
sábado, 17 de setembro de 2005
Citações
Publicado por
Vital Moreira
«(...) Sinto-me obrigado a abandonar o silêncio que tenho guardado para deixar escrito o meu profundo e ponderado protesto contra a inadmissível atitude dos sindicatos dos magistrados de decidirem uma greve e a fazerem pelas razões corporativas e desefesa de vantagens que os motivam» (José Miguel Júdice, Público, 17-9-2005)
Citações
Publicado por
Vital Moreira
«Não estão em causa, obviamente e ao contrário do que Sócrates nos tenta fazer crer, as qualificações ou a competência de Guilherme d'Oliveira Martins. O que está em causa é a separação clara entre o partido e o Estado, é defender os órgãos de fiscalização da actividade do Governo da legítima e inevitável suspeição que a partidarização dos seus cargos acarreta.» (J. A. Lima, " O caso GOM", Expresso on line)
Correio dos leitores: Privilégios
Publicado por
Vital Moreira
«(...) Não compreendo porque é que ataca tão violentamene quem se limita a usufruir de direitos que a lei lhes reconhece. Será que deviam renunciar a eles? Não se aposentarem aos 60 anos, não utilizarem os respectivos sistemas de saúde, etc.? Afinal o Sr. também é funcionário público e parece-me que os professores universitários também têm os seus privilégios. (...)»
J. A. Rodrigues
Comentário
1. Há aqui um manifesto equívoco. Eu não ataco ninguém por aproveitar as regalias ou prerrogativas de que legalmente goza. É um direito que lhes assiste, sendo descabida qualquer renúncia individual. Só critico duas coisas: (i) o regime legal em si mesmo, ou seja, o estatuto priviligiado de certas categorias ou sectores; (ii) as posições dos que defendem a continuação desses regimes e se opõem à sua extinção.
2. É claro que, como funcionário público e professor universitário, sou beneficiário do respectivo regime. Mas isso não me obriga a defendê-lo nem me tira legimidade para o criticar. É evidente que algumas das medidas recentes me afectam também. Devia eu por isso opor-me a elas?!
3. Devo acrescentar que no caso dos professores universitários há uma tradição de aposentação tardia, sendo muitos os que o fazem só aos 70 anos, por imposição legal. Prouvera que essa tradição existisse também noutras actividades intelectuais, para as quais os 60 anos não implicam nenhuma perda de faculdades e que agora contestam a elevação da idade de reforma para os 65 anos...
J. A. Rodrigues
Comentário
1. Há aqui um manifesto equívoco. Eu não ataco ninguém por aproveitar as regalias ou prerrogativas de que legalmente goza. É um direito que lhes assiste, sendo descabida qualquer renúncia individual. Só critico duas coisas: (i) o regime legal em si mesmo, ou seja, o estatuto priviligiado de certas categorias ou sectores; (ii) as posições dos que defendem a continuação desses regimes e se opõem à sua extinção.
2. É claro que, como funcionário público e professor universitário, sou beneficiário do respectivo regime. Mas isso não me obriga a defendê-lo nem me tira legimidade para o criticar. É evidente que algumas das medidas recentes me afectam também. Devia eu por isso opor-me a elas?!
3. Devo acrescentar que no caso dos professores universitários há uma tradição de aposentação tardia, sendo muitos os que o fazem só aos 70 anos, por imposição legal. Prouvera que essa tradição existisse também noutras actividades intelectuais, para as quais os 60 anos não implicam nenhuma perda de faculdades e que agora contestam a elevação da idade de reforma para os 65 anos...
Acima de toda a suspeita
Publicado por
Vital Moreira
Acusa-me um leitor de, na questão de saber se há ou não nova sessão legislativa, fazer um "frete" ao PS, ao defender a posição que permite a renovação da proposta de referendo à despenalização do aborto.
É uma acusação inteiramente descabida. Como constitucionalista não faço leituras politicamente oportunistas da Constituição, tanto mais que as minhas posições constitucionais estão exaradas em abstracto no comentário à Constitução de que sou co-autor, juntamente com J. J. Gomes Canotilho. Sucede que na questão em causa, a posição que exprimi aqui há dias (aliás, reconhecendo que a questão é controversa) é a que defendo há vinte anos. Na 2ª edição da referida CRP Anotada (1985) escrevíamos:
Resta dizer que a nossa opinião nessa matéria é sufragada por vários outros constitucionalistas. O facto de não aparecer na televisão não lhe retira validade nem autoridade...
É uma acusação inteiramente descabida. Como constitucionalista não faço leituras politicamente oportunistas da Constituição, tanto mais que as minhas posições constitucionais estão exaradas em abstracto no comentário à Constitução de que sou co-autor, juntamente com J. J. Gomes Canotilho. Sucede que na questão em causa, a posição que exprimi aqui há dias (aliás, reconhecendo que a questão é controversa) é a que defendo há vinte anos. Na 2ª edição da referida CRP Anotada (1985) escrevíamos:
«A legislatura da Assembleia saída de eleições determinadas por dissolução terá, normalmente, uma duração superior a 4 anos, podendo mesmo atingir quase os 5 anos, se a eleição tiver lugar pouco tempo após a data normal de início de cada sessão legislativa, que é 15 de Outubro. (...) Nesse caso, a legislatura parece compreender 5 sessões legislativas (não apenas 4), visto que o período sobrante da sessão legislativa em curso à data da eleição haverá de constituir uma sessão legislativa autónoma da nova Assembleia.»É evidente não podíamos estar a pensar numa situação que viria a ocorrer 20 anos depois (aliás em 1985 ainda nem sequer havia o referendo...). Se há quem faça leituras politicamente interessadas, não somos seguramente nós.
Resta dizer que a nossa opinião nessa matéria é sufragada por vários outros constitucionalistas. O facto de não aparecer na televisão não lhe retira validade nem autoridade...
sexta-feira, 16 de setembro de 2005
Atribulações parlamentares
Publicado por
Vital Moreira
1. Admitir que uma sessão legislativa, ou "ano parlamentar" (é o mesmo) -- que segundo a Constituição, se inicia em 15 de Setembro, depois do recesso parlamentar --, começou em Março deste ano e continua até Setembro do próximo ano, seria o mesmo que admitir que o corrente ano escolar começou em Março passado, ou que o ano de 2006 pode começar neste mês de Setembro...
2. A divisória entre sessões legislativas é naturalmente constituída pelo recesso parlamentar, ou seja, pelas férias parlamentares. É pelo menos exótico admitir o contrário, ou seja, que depois das férias parlamentares continua o mesmo ano parlamentar; a tese da continuidade da sessão parlamentar com um recesso parlamentar pelo meio é tudo menos lógica.
3. A Constituição não diz que o tempo que faltava para concluir a sessão legislativa interrompida pelas eleições antecipadas acresce à 1ª sessão legislativa da nova legislatura; o que ela diz é que a parte sobrante dessa sessão legislativa interrompida "acresce à nova legislatura", como excepção à regra de que cada legislatura compreende 4 sessões legislativas.
4. Vamos à substância da questão. A única razão por que a Constituição proíbe a repetição de iniciativas de referendo (e outras) na mesma sessão legislativa, só permitindo uma por ano parlamentar, é somente evitar a chicana política da multiplicação de iniciativas inviáveis. Se estivéssemos numa legislatura normal, é evidente que se poderia agora repetir uma iniciativa referendária que tivesse sido rejeitada em Julho ou Agosto pelo PR, mesmo por razões de fundo. Ora, a anterior iniciativa do referendo sobre a despenalização do aborto teve lugar há vários meses e foi rejeitada pelo Presidente por razões de oportunidade do referendo, e não por discordância quanto à sua realização. Onde é que está a chicana? Obviamente na contestação da licitude da sua convocação, com base na alegada continuidade da sessão legislativa passada...
2. A divisória entre sessões legislativas é naturalmente constituída pelo recesso parlamentar, ou seja, pelas férias parlamentares. É pelo menos exótico admitir o contrário, ou seja, que depois das férias parlamentares continua o mesmo ano parlamentar; a tese da continuidade da sessão parlamentar com um recesso parlamentar pelo meio é tudo menos lógica.
3. A Constituição não diz que o tempo que faltava para concluir a sessão legislativa interrompida pelas eleições antecipadas acresce à 1ª sessão legislativa da nova legislatura; o que ela diz é que a parte sobrante dessa sessão legislativa interrompida "acresce à nova legislatura", como excepção à regra de que cada legislatura compreende 4 sessões legislativas.
4. Vamos à substância da questão. A única razão por que a Constituição proíbe a repetição de iniciativas de referendo (e outras) na mesma sessão legislativa, só permitindo uma por ano parlamentar, é somente evitar a chicana política da multiplicação de iniciativas inviáveis. Se estivéssemos numa legislatura normal, é evidente que se poderia agora repetir uma iniciativa referendária que tivesse sido rejeitada em Julho ou Agosto pelo PR, mesmo por razões de fundo. Ora, a anterior iniciativa do referendo sobre a despenalização do aborto teve lugar há vários meses e foi rejeitada pelo Presidente por razões de oportunidade do referendo, e não por discordância quanto à sua realização. Onde é que está a chicana? Obviamente na contestação da licitude da sua convocação, com base na alegada continuidade da sessão legislativa passada...
Privilégios (2)
Publicado por
Vital Moreira
Ainda segundo o Público (mesmo link) «(...) o Imposto Municipal sobre Veículos (o famoso selo do carro) vem perdendo peso nas receitas das autarquias. A explosão dos sistemas de pagamento de automóveis através do "leasing" levou a que o grosso desse imposto seja retido nas sedes dessas empresas, a maioria das quais está sediada em Lisboa ou no Porto.»
Os automóveis ocupam os espaços públicos e usam as infra-estruturas dos municípios por esse país fora, desde Caminha a V. R. de Sto. António. Mas o imposto que deveria compensar esses gastos e encargos reverte em favor de... Lisboa e do Porto! Privilégios territoriais...
Os automóveis ocupam os espaços públicos e usam as infra-estruturas dos municípios por esse país fora, desde Caminha a V. R. de Sto. António. Mas o imposto que deveria compensar esses gastos e encargos reverte em favor de... Lisboa e do Porto! Privilégios territoriais...
Privilégios
Publicado por
Vital Moreira
Segundo o Público de hoje (link disponível para assinantes)«uma das hipóteses que têm sido equacionadas para suportar um sistema de financiamento [das autarquias locais] mais equilibrado -- menos dependente do sector imobiliário -- passa pela criação de uma derrama sobre o IRS». Ora, segundo o Estatuto dos Magistrados do Ministério Público vigente, estes estão isentos das derramas das autarquias locais. Afinal, sempre vale a pena manter essa regalia na lei, em standby...
Fatal
Publicado por
Vital Moreira
Uma associação nacional de médicos, segundo o Público (link reservado a assinantes), opõe-se à ideia de confiar a gestão de centros de saúde aos municípios. Sabendo-se que isso é corrente em muitos outros países, porquê essa oposição? Que temem eles?
Queixamo-nos, com razão, de sermos um país com baixo nível de descentralização territorial e alto grau de centralização de funções no Governo e na Administração central. Mas quando surgem propostas para corrigir essa situação, logo se levantam todas as oposições, em geral de grupos profissionais. É fatal!
Queixamo-nos, com razão, de sermos um país com baixo nível de descentralização territorial e alto grau de centralização de funções no Governo e na Administração central. Mas quando surgem propostas para corrigir essa situação, logo se levantam todas as oposições, em geral de grupos profissionais. É fatal!
Enviesamento de linguagem
Publicado por
Vital Moreira
Que os opositores à despenalização do aborto falem em "referendo sobre o aborto" (ou "referendo do aborto"), compreende-se, pois isso favorece a sua posição. Mas que essa expressão imprópria seja utilizada inadvertidamente pelos media e mesmo por alguns adeptos da despenalização, isso é que já não se entende.
O referendo não é sobre o aborto, ou seja, não é para exprimir uma posição a favor ou contra o recurso ao aborto (até porque, suponho, ninguém é a favor dele). O referendo é, sim, sobre a despenalização (parcial) do aborto, ou seja, tem por objecto saber se a interrupção voluntária da gravidez -- quando realizada nas primeiras 10 semanas de gestação em estabelecimento de saúde legal -- deve, ou não, deixar de ser punida criminalmente, como actualmente sucede (salvo nas três situações limitadas que hoje já não são puníveis).
Uma coisa é a posição ou o juízo social ou moral de cada um sobre o aborto em si mesmo, outra coisa é saber se, qualquer que seja essa posição, achamos que as mulheres que o pratiquem devem ser punidas como criminosas e condenadas a prisão. O objecto do referendo é somente a criação, ou não, de uma excepção ao artigo do Código Penal que o qualifica como crime.
O referendo não é sobre o aborto, ou seja, não é para exprimir uma posição a favor ou contra o recurso ao aborto (até porque, suponho, ninguém é a favor dele). O referendo é, sim, sobre a despenalização (parcial) do aborto, ou seja, tem por objecto saber se a interrupção voluntária da gravidez -- quando realizada nas primeiras 10 semanas de gestação em estabelecimento de saúde legal -- deve, ou não, deixar de ser punida criminalmente, como actualmente sucede (salvo nas três situações limitadas que hoje já não são puníveis).
Uma coisa é a posição ou o juízo social ou moral de cada um sobre o aborto em si mesmo, outra coisa é saber se, qualquer que seja essa posição, achamos que as mulheres que o pratiquem devem ser punidas como criminosas e condenadas a prisão. O objecto do referendo é somente a criação, ou não, de uma excepção ao artigo do Código Penal que o qualifica como crime.
quinta-feira, 15 de setembro de 2005
Preocupações
Publicado por
Vital Moreira
Esta sondagem sobre as presidenciais já dá margem para reais preocupações a Mário Soares (e à esquerda), visto que aponta para a eleição de Cavaco Silva à 1ª volta.
É ilícita a convocação do referendo?
Publicado por
Vital Moreira
Condenando a proposta socialista de convocação do referendo da despenalização do aborto, o director do Público, J. Manuel Fernandes, escreve hoje no seu editorial (link só para assinantes), que «A Constituição diz que cada legislatura dura quatro sessões legislativas, mas o PS acha que quatro é igual a quatro e meio». Mas, a meu ver, não tem razão em qualificá-la como "golpe".
Na verdade, embora a questão não seja pacífica, o PS limita-se a seguir neste ponto a opinião defendida desde há muito tempo por vários constitucionalistas. Depois de dizer que a legislatura compreende 4 sessões legislativas anuais, a Constituição, no mesmo preceito, logo ressalva que, no caso de eleições decorrentes de dissolução parlamentar, a duração da legislatura é acrescida da parte da sessão legislativa que estava em curso à data da eleição. Ora, como sabe qualquer aprendiz de jurista, as regras especiais prevalecem sobre as regras gerais. Completada essa sessão legislativa "preliminar", não existe nenhuma razão para que a legislatura não seja composta depois pelas 4 sessões legislativas normais, com a duração de um ano, começando a 15 de Setembro de cada ano, como também dispõe a Constituição.
Por conseguinte, a convocação do referendo sobre a despenalização do aborto nesta altura, embora possa ser controversa sob o ponto de vista político, não é na minha opinião de modo algum ilícita sob o ponto de vista constitucional. Convém não misturar os dois planos. Se deve haver referendo --, isso cabe ao Presidente da República. Se ele pode ter lugar--, isso será avaliado em última instância pelo Tribunal Constitucional.
Na verdade, embora a questão não seja pacífica, o PS limita-se a seguir neste ponto a opinião defendida desde há muito tempo por vários constitucionalistas. Depois de dizer que a legislatura compreende 4 sessões legislativas anuais, a Constituição, no mesmo preceito, logo ressalva que, no caso de eleições decorrentes de dissolução parlamentar, a duração da legislatura é acrescida da parte da sessão legislativa que estava em curso à data da eleição. Ora, como sabe qualquer aprendiz de jurista, as regras especiais prevalecem sobre as regras gerais. Completada essa sessão legislativa "preliminar", não existe nenhuma razão para que a legislatura não seja composta depois pelas 4 sessões legislativas normais, com a duração de um ano, começando a 15 de Setembro de cada ano, como também dispõe a Constituição.
Por conseguinte, a convocação do referendo sobre a despenalização do aborto nesta altura, embora possa ser controversa sob o ponto de vista político, não é na minha opinião de modo algum ilícita sob o ponto de vista constitucional. Convém não misturar os dois planos. Se deve haver referendo --, isso cabe ao Presidente da República. Se ele pode ter lugar--, isso será avaliado em última instância pelo Tribunal Constitucional.
Privilégios territoriais
Publicado por
Vital Moreira
«Estado paga 9,1 milhões para manter privados no passe social». É evidente que os transportes públicos devem incluir compensações pela sua componente de serviço público. Mas por que é que no caso de transportes locais de Lisboa e municípios limitrofes essas indemnizações de serviço público devem ser encargo do Estado e não dos municípios beneficiários? Pelos vistos, não existem somente privilégios profissionais, mas também territoriais.
"Flat tax"
Publicado por
Vital Moreira
Continua o encantamento de alguns pelo imposto de rendimento com taxa única (flat rate), que agora também apareceu defendido pelo indigitado ministro das finanças de um hipotético governo CDU na Alemanha (se a direita ganhar as eleições).
Ora os cândidos entusiasmos pelo imposto de taxa única, proporcional -- em vez de taxas progressivas --, deveriam ter pelo menos em conta as decisivas objecções recentemente aparecidas nos insuspeitos The Economist e Finantial Times. Essa fórmula do IRS implicaria agravar o imposto para os rendimentos que hoje são tributados abaixo da taxa única que viesse a ser adoptada (ou seja, rendimentos baixos ou médio-baixos) e o desagravamento dos que hoje são tributados acima dessa taxa, ou seja, os rendimentos mais elevados. Não admira por isso que esse milagroso modelo seja defendido principalmente entre os titulares de mais altos rendimentos ou seus porta-vozes.
Et pour cause!
Ora os cândidos entusiasmos pelo imposto de taxa única, proporcional -- em vez de taxas progressivas --, deveriam ter pelo menos em conta as decisivas objecções recentemente aparecidas nos insuspeitos The Economist e Finantial Times. Essa fórmula do IRS implicaria agravar o imposto para os rendimentos que hoje são tributados abaixo da taxa única que viesse a ser adoptada (ou seja, rendimentos baixos ou médio-baixos) e o desagravamento dos que hoje são tributados acima dessa taxa, ou seja, os rendimentos mais elevados. Não admira por isso que esse milagroso modelo seja defendido principalmente entre os titulares de mais altos rendimentos ou seus porta-vozes.
Et pour cause!
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